A madrugada roça a vaga
lambe as botas dos pescadores adormecidos
desune as mãos calosas do servente de pedreiro
desperta os seios nus das raparigas que amassam o pão
e afasta-se para o céu
onde crianças magoadas
andam à procura de lume
Tahar Ben Jelloun. Arzila. Estação de espuma.Texto Bilingue. Tradução de Al Berto Ilustrações de Luís Miguel Gaspar. Hiena Editora. Lisboa, 1987
domingo, 17 de junho de 2012
O Pai
Na minha casa tenho as opiniões que me apetece. Não deixarei impor o silêncio na minha própria casa...
Bertold Brecht. «O Espião» in Teatro Contemporâneo. I antologia de teatro. Pirandello - Sartre - Anouilh - Arrabal - Brecht - Ionesco. Selecção de textos de Jacinto Ramos e Trad. de Virgínia Mendes. Editorial Presença, Lisboa, 1965., p. 260
Na minha casa tenho as opiniões que me apetece. Não deixarei impor o silêncio na minha própria casa...
Bertold Brecht. «O Espião» in Teatro Contemporâneo. I antologia de teatro. Pirandello - Sartre - Anouilh - Arrabal - Brecht - Ionesco. Selecção de textos de Jacinto Ramos e Trad. de Virgínia Mendes. Editorial Presença, Lisboa, 1965., p. 260
«Eu, Bertold Brecht, vim das florestas
negras.
A minha mãe também de lá veio
quando eu habitava no seu corpo.
Nas cidades, o frio das florestas negras.
Estará comigo até ao dia da minha
morte.
As coisas pertencem a quem as tornar
melhores.»
Bertold Brecht. «O Espião» in Teatro Contemporâneo. I antologia de teatro. Pirandello - Sartre - Anouilh - Arrabal - Brecht - Ionesco. Selecção de textos de Jacinto Ramos e Trad. de Virgínia Mendes. Editorial Presença, Lisboa, 1965., p. 255
declaração de Samuel Beckett ao tribunal pedindo a absolvição de Fernando Arrabal «Se existe culpa, que ela seja analisada à luz do grande mérito de ontem e da grande promessa de amanhã e, portanto, perdoada. Que Fernando Arrabal seja entregue à sua própria pena.»
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Tasla
Coragem! Não há motivo para corares de vergonha.
Viloro, entusiasmado
Acontece-me sem eu querer.
Tasla
De repente?
Viloro
Enfim, não é bem, mas quase.
Arrabal. «A Bicicleta do Condenado» in Teatro Contemporâneo. I antologia de teatro. Pirandello - Sartre - Anouilh - Arrabal - Brecht - Ionesco. Selecção de textos de Jacinto Ramos e Trad. de Virgínia Mendes. Editorial Presença, Lisboa, 1965., p. 214
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sexta-feira, 8 de junho de 2012
Senhor Orlas
Jean Anouilh. «Cecile ou a escola de pais» in Teatro Contemporâneo. I antologia de teatro. Pirandello - Sartre - Anouilh - Arrabal - Brecht - Ionesco. Selecção de textos de Jacinto Ramos e Trad. de Virgínia Mendes. Editorial Presença, Lisboa, 1965., p. 198
«Não é preferível a um lar, com filhos, a gritar agarrados às tuas saias, uma criada e as suas caçarolas para tomar conta? O amor afoga-se na vida de todos os dias. O nosso amor será todas as manhãs uma coisa nova a conquistar e a defender. Teremos cenas horrorosas, torturar-nos-emos atrozmente um ao outro, despedaçar-nos-emos todos os dias, sem podermos passar um sem o outro; ambos escravos e tiranos. Os homens hão-de desejar-te em todas as festas onde passaremos as noites, e o seu desejo revelar-te-á a ti própria. Tu divertir-te-ás a fazer-me sofrer e eu nunca saberei se tu me amas verdadeiramente, nem o que escondem os teus sorrisos; e se acontecer estares longe uma hora, um dia...um verme roer-me-á para sempre o coração. Porque tu mentir-me-ás sempre e serás para mim um eterno mistério...Viver é isto, Araminthe! É isto, ser mulher e amar!»
Jean Anouilh. «Cecile ou a escola de pais» in Teatro Contemporâneo. I antologia de teatro. Pirandello - Sartre - Anouilh - Arrabal - Brecht - Ionesco. Selecção de textos de Jacinto Ramos e Trad. de Virgínia Mendes. Editorial Presença, Lisboa, 1965., p. 198
Senhor Orlas
Jean Anouilh. «Cecile ou a escola de pais» in Teatro Contemporâneo. I antologia de teatro. Pirandello - Sartre - Anouilh - Arrabal - Brecht - Ionesco. Selecção de textos de Jacinto Ramos e Trad. de Virgínia Mendes. Editorial Presença, Lisboa, 1965., p. 180
«(...) Quando me fecho no meu gabinete, todos pensam que estou a trabalhar, não é assim? ( Em quê, meu Deus?Nunca fiz nada na minha vida!) A casa inteira caminha nas pontas dos pés para não me incomodar. E sabe o que eu faço nesse santuário? Fico sentado horas e horas a olhar a mesa em frente de mim.»
Jean Anouilh. «Cecile ou a escola de pais» in Teatro Contemporâneo. I antologia de teatro. Pirandello - Sartre - Anouilh - Arrabal - Brecht - Ionesco. Selecção de textos de Jacinto Ramos e Trad. de Virgínia Mendes. Editorial Presença, Lisboa, 1965., p. 180
Garcin
Morri cedo demais. Não me deram tempo para realizar os meus actos.
Inês
Morre-se sempre demasiado cedo - ou demasiado tarde...E no entanto a vida lá está, terminada, o traço marcado, é preciso fazer a soma. Tu não és nada além da tua vida.
Garcin
Víbora! Tens resposta para tudo.
Jean Paul-Sartre. A Porta Fechada in Teatro Contemporâneo. I antologia de teatro. Pirandello - Sartre - Anouilh - Arrabal - Brecht - Ionesco. Selecção de textos de Jacinto Ramos e Trad. de Virgínia Mendes. Editorial Presença, Lisboa, 1965., p. 140/1
Morri cedo demais. Não me deram tempo para realizar os meus actos.
Inês
Morre-se sempre demasiado cedo - ou demasiado tarde...E no entanto a vida lá está, terminada, o traço marcado, é preciso fazer a soma. Tu não és nada além da tua vida.
Garcin
Víbora! Tens resposta para tudo.
Jean Paul-Sartre. A Porta Fechada in Teatro Contemporâneo. I antologia de teatro. Pirandello - Sartre - Anouilh - Arrabal - Brecht - Ionesco. Selecção de textos de Jacinto Ramos e Trad. de Virgínia Mendes. Editorial Presença, Lisboa, 1965., p. 140/1
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Garcin
«Dar-te-ei o que puder. Não é muito. Não te amarei; conheço-te demasiadamente bem.»
Jean Paul-Sartre. A Porta Fechada in Teatro Contemporâneo. I antologia de teatro. Pirandello - Sartre - Anouilh - Arrabal - Brecht - Ionesco. Selecção de textos de Jacinto Ramos e Trad. de Virgínia Mendes. Editorial Presença, Lisboa, 1965., p. 123
«Dar-te-ei o que puder. Não é muito. Não te amarei; conheço-te demasiadamente bem.»
Jean Paul-Sartre. A Porta Fechada in Teatro Contemporâneo. I antologia de teatro. Pirandello - Sartre - Anouilh - Arrabal - Brecht - Ionesco. Selecção de textos de Jacinto Ramos e Trad. de Virgínia Mendes. Editorial Presença, Lisboa, 1965., p. 123
Inês
«Vem! Serás o que tu quiseres, água pura, água suja; encontrar-te-ás no fundo dos meus olhos tal como te desejas.»
Jean Paul-Sartre. A Porta Fechada in Teatro Contemporâneo. I antologia de teatro. Pirandello - Sartre - Anouilh - Arrabal - Brecht - Ionesco. Selecção de textos de Jacinto Ramos e Trad. de Virgínia Mendes. Editorial Presença, Lisboa, 1965., p. 122
«Vem! Serás o que tu quiseres, água pura, água suja; encontrar-te-ás no fundo dos meus olhos tal como te desejas.»
Jean Paul-Sartre. A Porta Fechada in Teatro Contemporâneo. I antologia de teatro. Pirandello - Sartre - Anouilh - Arrabal - Brecht - Ionesco. Selecção de textos de Jacinto Ramos e Trad. de Virgínia Mendes. Editorial Presença, Lisboa, 1965., p. 122
Inês
(...) Eu sou perversa.
Garcin
Sim. Eu também sou.
Inês
Não, você não é perverso, você é outra coisa.
Jean Paul-Sartre. A Porta Fechada in Teatro Contemporâneo. I antologia de teatro. Pirandello - Sartre - Anouilh - Arrabal - Brecht - Ionesco. Selecção de textos de Jacinto Ramos e Trad. de Virgínia Mendes. Editorial Presença, Lisboa, 1965., p. 92
(...) Eu sou perversa.
Garcin
Sim. Eu também sou.
Inês
Não, você não é perverso, você é outra coisa.
Jean Paul-Sartre. A Porta Fechada in Teatro Contemporâneo. I antologia de teatro. Pirandello - Sartre - Anouilh - Arrabal - Brecht - Ionesco. Selecção de textos de Jacinto Ramos e Trad. de Virgínia Mendes. Editorial Presença, Lisboa, 1965., p. 92
ESTELA
«Ah! sim, por dentro...Tudo o que se passa na cabeça é tão vago que me dá sono. (Um tempo). Tenho no meu quarto de dormir seis enormes espelhos. Estou a vê-los. Mas eles não me vêem. Reflectem a «Causeuse», o tapete, a janela...Como é vazio um espelho que não reflectia minha imagem. Enquanto falava procurava sempre a maneira de ter um espelho onde me pudesse ver. Falava e via-me falar. Via-me como os outros me viam e isso mantinha-me viva. (Com desespero). O meu bâton? Tenho a certeza que o pus mal. Não posso ficar sem espelho para a toda a eternidade.»
Jean Paul-Sartre. A Porta Fechada in Teatro Contemporâneo. I antologia de teatro. Pirandello - Sartre - Anouilh - Arrabal - Brecht - Ionesco. Selecção de textos de Jacinto Ramos e Trad. de Virgínia Mendes. Editorial Presença, Lisboa, 1965., p. 92
ESTELA
«Não posso suportar que esperem qualquer coisa de mim. Apetece-me imediatamente fazer o contrário.»
Jean Paul-Sartre. A Porta Fechada in Teatro Contemporâneo. I antologia de teatro. Pirandello - Sartre - Anouilh - Arrabal - Brecht - Ionesco. Selecção de textos de Jacinto Ramos e Trad. de Virgínia Mendes. Editorial Presença, Lisboa, 1965., p. 85
Garcin
(...)
«Não chora; ela nunca chorava. Está um belo dia de sol e ela está toda de negro na rua deserta, com os seus grandes olhos de vítima. Ah! Ela irrita-me.»
Jean Paul-Sartre. A Porta Fechada in Teatro Contemporâneo. I antologia de teatro. Pirandello - Sartre - Anouilh - Arrabal - Brecht - Ionesco. Selecção de textos de Jacinto Ramos e Trad. de Virgínia Mendes. Editorial Presença, Lisboa, 1965., p. 79
Garcin
«Compreendo muito bem que a minha presença a incomode. Pessoalmente, também preferia estar só. Necessito de pôr a minha vida em ordem e tenho absoluta necessidade de me concentrar. Mas estou certo que nos poderemos habituar um ao outro; não falo, não me mexo e faço pouco barulho. Simplesmente, se me permite dar-lhe um conselho, precisamos de conservar entre nós uma grande delicadeza. Essa será a nossa melhor defesa.»
Jean Paul-Sartre. A Porta Fechada in Teatro Contemporâneo. I antologia de teatro. Pirandello - Sartre - Anouilh - Arrabal - Brecht - Ionesco. Selecção de textos de Jacinto Ramos e Trad. de Virgínia Mendes. Editorial Presença, Lisboa, 1965., p. 72
domingo, 3 de junho de 2012
«Oh, Capaneu, já que o teu orgulho não se modera, mais ainda serás castigado; a dor que a tua raiva trará será o teu pior martírio.»
Dante. A Divina Comédia (Tomo I). Tradução Rui Viana Pereira. Ediclube., p. 54
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não meter prego nem estopa
não tomar parte num acto ou numa discussão, não emitir opinião, não ter nada a ver com o assunto
''não se voltou demasiado contra si próprio''
«Todos temos mais ou menos essa fraqueza; connosco, somos indulgentes, e descarregamos toda a nossa ira para cima do próximo: um criado, um subordinado, a própria esposa, às vezes até uma cadeira que voa pelos ares e vai espedaçar-se contra a porta.»
Nikolai Gógol. Almas Mortas. Círculo de Leitores, 1ª Edição, 1977, p. 187
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facúndia
nome feminino
1. | elocução fácil |
2. | eloquência |
3. | verbosidade |
(Do latim facundĭa- «eloquência»)
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« - Permite a estes humildes mortais a ousadia de lhe perguntarem qual o objecto dos seus pensamentos?»
Nikolai Gógol. Almas Mortas. Círculo de Leitores, 1ª Edição, 1977, p. 179
Nikolai Gógol. Almas Mortas. Círculo de Leitores, 1ª Edição, 1977, p. 179
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«Duas rolas te mostrarão
O meu cadáver gelado,
E os seus arrulhos te dirão
Que morri de tanto chorar.»
Nikolai Gógol. Almas Mortas. Círculo de Leitores, 1ª Edição, 1977, p. 172
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«''O que é a vida? Um vale de amarguras. O que é o mundo? Um amálgama de seres insensíveis.''»
Nikolai Gógol. Almas Mortas. Círculo de Leitores, 1ª Edição, 1977, p. 172
Nikolai Gógol. Almas Mortas. Círculo de Leitores, 1ª Edição, 1977, p. 172
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Boris Lavreniov (1891 - 1959)
''Na literatura, tal como na vida, detesto atitudes de orgulho, a afectação, a enfatuação, os trejeitos. Não gosto de escritores que se apresentam a si mesmos como cálices de eleição, que não falam uma linguagem humana e preferem os oráculos sentenciosos. Amo a língua viva e popular; cuido da sua pureza e luto por ela'', escreveu Boris Lavreniov na sua autobiografia, terminada pouco antes da sua morte.
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«Giulia
Então, ao menos, mata-me.
André, encolhendo os ombros com indeferença
Podes matar-te a ti mesma.»
Luigi Pirandello. O Torno in Teatro Contemporâneo. I antologia de teatro. Pirandello - Sartre - Anouilh - Arrabal - Brecht - Ionesco. Selecção de textos de Jacinto Ramos e Trad. de Virgínia Mendes. Editorial Presença, Lisboa, 1965., p. 52
Giulia
«Fica a meio da sala com os olhos terrivelmente fixos num pensamento cruel.»
Luigi Pirandello. O Torno in Teatro Contemporâneo. I antologia de teatro. Pirandello - Sartre - Anouilh - Arrabal - Brecht - Ionesco. Selecção de textos de Jacinto Ramos e Trad. de Virgínia Mendes. Editorial Presença, Lisboa, 1965., p. 32
hodierno
do dia de hoje; de agora; atual; moderno |
(Do latim hodiernu-, «idem»)
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imorredouro
1. | que não é morredouro |
2. | que não acaba; imperecível |
3. | imortal; eterno |
4. | perdurável |
(De in-+morredouro)
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segunda-feira, 28 de maio de 2012
«quando estiveres perante o doce olhar daquela cujos belos olhos tudo vêem, por ela conhecerás o caminho da tua vida.»
Dante. A Divina Comédia (Tomo I). Tradução Rui Viana Pereira. Ediclube., p. 43
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«(...) a vida sórdida que os deformou fá-los irreconhecíveis.»
Dante. A Divina Comédia (Tomo I). Tradução Rui Viana Pereira. Ediclube., p. 33
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domingo, 27 de maio de 2012
atavismo
nome masculino
condição que exprime o reaparecimento, num indivíduo, de caracteres que pertenciam a gerações antepassadas e que tinham já deixado de se
manifestar |
(Do latim atăvu-, «antepassado; pai do trisavô» +-ismo)
segunda-feira, 21 de maio de 2012
« - Tu és ingénuo e pedante...patrão, salvo o devido respeito - disse finalmente. - Tudo o que digo é como se estivesse a cantar.
- Como assim? - protestei eu. - Compreendo-te muito bem, Zorba!
- Sim, compreendes com a cabeça. Tu dizes: «Isso é justo, é assim, ou não é assim; tens razão ou não tens. Mas a que nos leva isso? Eu, enquanto tu falas, observo os teus braços, o teu peito. Pois bem, que fazem eles? Ficam mudos. Nada dizem. Como se não tivessem uma gota de sangue. Então como queres tu compreender? Com a cabeça? Pff!»
Nikos Kazantzaki. O Bom Demónio. Tradução de Fernando Soares. Editora Ulisseia, Lisboa,p. 239
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«As maravilhosas catedrais que encontramos nas grandes cidades ruidosas e ateias são conchas vazias», pensava eu. Monstros pré-históricos, de que resta só o esqueleto roído pelas chuvas e pelo sol.»
Nikos Kazantzaki. O Bom Demónio. Tradução de Fernando Soares. Editora Ulisseia, Lisboa,p. 222
Nikos Kazantzaki. O Bom Demónio. Tradução de Fernando Soares. Editora Ulisseia, Lisboa,p. 222
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«Tal como o grão de trigo, também tu, meu coração, deves mergulhar na terra e morrer. Não tenhas receio. Senão, como te poderás tornar espiga? Como poderás tu alimentar os homens que morrem de fome?»
Nikos Kazantzaki. O Bom Demónio. Tradução de Fernando Soares. Editora Ulisseia, Lisboa,p. 218
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«Cala-te!Cala-te! - gritou. - Porque me dizes isso patrão? Porque me envenenas o coração? Eu estava bem aqui; porque me transtornas? Tinha fome, e o bom Deus ou o Diabo ( que eu seja enforcado se vejo alguma diferença) dava-me um osso que eu lambia. E mexia a cauda dizendo: «Obrigado! Obrigado!» Agora...
Nikos Kazantzaki. O Bom Demónio. Tradução de Fernando Soares. Editora Ulisseia, Lisboa,p. 199
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''Só eu era impotente e racional, o sangue não me fervia, não amava nem odiava com paixão.''
«Só eu era impotente e racional, o sangue não me fervia, não amava nem odiava com paixão. Ainda agora tentara compor as coisas, deixando tudo, a cargo do destino.»
Nikos Kazantzaki. O Bom Demónio. Tradução de Fernando Soares. Editora Ulisseia, Lisboa,p. 177
Nikos Kazantzaki. O Bom Demónio. Tradução de Fernando Soares. Editora Ulisseia, Lisboa,p. 177
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«Pela minha carta, compreenderás como sou um homem infeliz. É só quando falo contigo que tenho a esperança de aliviar um bocado a minha neurastenia. Pois tu tens, como eu, um diabo dentro de ti, mas não sabes ainda como ele se chama, e, como não sabes, abafas. Baptiza-o, patrão, e alivias-te!»
Nikos Kazantzaki. O Bom Demónio. Tradução de Fernando Soares. Editora Ulisseia, Lisboa,p. 160
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«Eu também, patrão, tenho assim um diabo em mim e chamo-lhe Zorba. O Zorba de dentro não quer envelhecer, não envelheceu, nunca envelhecerá. É um comilão, tem os cabelos pretos como um corvo, trinta e dois dentes e um cravo vermelho atrás da orelha. Mas ao Zorba de fora deu-lhe a bolha, pobre-diabo, apareceram-lhe os cabelos brancos, tem rugas, está encarquilhado, os dentes caem-lhe e a grande barriga está cheia de pêlos brancos da velhice, de compridas crinas de burro.»
Nikos Kazantzaki. O Bom Demónio. Tradução de Fernando Soares. Editora Ulisseia, Lisboa,p. 159
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«Numa outra vida», murmurei, sorrindo amargamente, «numa outra vida conduzir-me-ei melhor!»
Nikos Kazantzaki. O Bom Demónio. Tradução de Fernando Soares. Editora Ulisseia, Lisboa,p. 135
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'' o coração do homem é uma sepultura cheia de sangue''
Nikos Kazantzaki. O Bom Demónio. Tradução de Fernando Soares. Editora Ulisseia, Lisboa,p. 131
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Mulher
«Quem criou portanto esse dédalo da incerteza, esse templo de presunção, esse cântaro de pecados, esse campo semeado de mil ardis, essa porta do Inferno, esse cesto transbordante de astúcias, esse veneno que lembra o mel, essa cadeia que prende os mortais à terra: a mulher?»
Nikos Kazantzaki. O Bom Demónio. Tradução de Fernando Soares. Editora Ulisseia, Lisboa,p. 124
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domingo, 20 de maio de 2012
Neste círculo são castigados os culpados de gula
«É o terceiro círculo, o da chuva eterna, maldita, fria e densa, que cai sempre abundante e com a mesma persistência. Grande granizo, água negra e neve caem em turbilhão através das trevas, a terra enlameada exala um odor hediondo. Cerbero, fera cruel e monstruosa, ladra com as três caninas fauces contra os infelizes que ali permanecem submersos. Tem olhos avermelhados, pelagem negra e hirsuta, ventre desmedido; e com as patas crava as unhas nos condenados, arranca-lhes a pele e esquarteja-os. A chuva fá-los uivar; umas vezes os desgraçados apresentam um lado do corpo à chuva, outras vezes o outro.»
Dante. A Divina Comédia (Tomo I). Tradução Rui Viana Pereira. Ediclube., p. 29/30
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turba
nome feminino
1. | magote de gente; multidão |
2. | povo; vulgo |
3. | coro de vozes;
em turba tumultuosamente
|
(Do latim turba-, «idem»)
Perguntei ainda: «Mestre, que amarga dor os faz lamentarem-se tanto?»
Dante. A Divina Comédia (Tomo I). Tradução Rui Viana Pereira. Ediclube., p. 20
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«Antes de mim nada foi criado»
Dante. A Divina Comédia (Tomo I). Tradução Rui Viana Pereira. Ediclube., p. 19
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verso solto
«Porque guardas tanta cobardia no coração?»
Dante. A Divina Comédia (Tomo I). Tradução Rui Viana Pereira. Ediclube., p. 18
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pugnar
verbo transitivo
1. | tomar a defesa de (algo ou alguém); defender |
2. | combater; lutar; pelejar |
3. | discutir
acaloradamente |
(Do latim pugnāre, «idem»)
«Se bem compreendi as tuas palavras - respondeu a sombra veneranda - a tua alma está possuída do medo que muitas vezes impede o homem de prosseguir uma empresa honrada, como uma sombra irreal assusta a fera que devassa a escuridão.»
Dante. A Divina Comédia (Tomo I). Tradução Rui Viana Pereira. Ediclube., p. 17
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excerto
Rosa Celeste: Dante and Beatrice gaze upon the highest Heaven, The Empyrean,século XIX, Alighieri, Dante; Cary, Henry Francis (ed) (1892) "Canto XXXI " in The Divine Comedy by Dante, Illustrated, Complete London, Paris & Melbourne: Cassell & Company
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Canto Primeiro
«Dante, afundado no pântano do pecado (a selva escura)
pelas paixões da luxúria, da soberba e da avareza,
simbolizadas por feras no poema, anseia por libertar-se
e é auxiliado na fuga por Virgílio»
Dante. A Divina Comédia (Tomo I). Tradução Rui Viana Pereira. Ediclube
pelas paixões da luxúria, da soberba e da avareza,
simbolizadas por feras no poema, anseia por libertar-se
e é auxiliado na fuga por Virgílio»
Dante. A Divina Comédia (Tomo I). Tradução Rui Viana Pereira. Ediclube
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sábado, 19 de maio de 2012
Misantropo
Arrefeceu. Tenho andado a apanhar lenha,
Com os dedos entorpecidos, quase insensíveis,
Revolvendo as folhas quebradiças para encontrar
Galhos húmidos. Tenho andado curvado
Toda a tarde, empilhando-os para secar,
E, toda a tarde, tenho ouvido, vezes sem conta,
Duas notas decrescentes: uma suave e melancólica melodia,
Como se uma ave chamasse, do seu abrigo de ramos,
Agora não, agora não, agora não.
Dos silvados, retiro um a um galhos para queimar.
Surpreendido pela sombra, ergo-me e vejo,
Ficando meio cego, o frio pôr-de-sol vermelho
Por entre os ramos enredados de uma árvore sem folhas.
Recordo-me de anteriores poentes, especialmente em
Que assim coloria o ferro, branco acinzentado
E escurecido, e o cimento enrugado de um posto de sentinela
Com o seu alaranjado frio. Deixem-me ver, um segundo,
Agora não, agora não, agora não.
É tão dolorosa e apagada essa recordação,
Embora eu ali também vivesse o dia-a-dia.
Porém a comparação torna-se consciente
Do calor e da luz ténues, que eram
Ou pareceram ter sido menos ténues que hoje.
A ave cala-se. Indiferente neste instante isolado
Eu sei que, ouvindo o vento agitar-se num galho,
Sempre hei-de escutar assim um incessante
Agora não, agora não, agora não.
Thom Gunn. A Destruição do Nada e outros poemas. Tradução de Maria de Lourdes Guimarães. Relógio D' Água, Lisboa, 1993., p. 35
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« - O seu secreto e silencioso desgosto.»
Thom Gunn. A Destruição do Nada e outros poemas. Tradução de Maria de Lourdes Guimarães. Relógio D' Água, Lisboa, 1993., p. 31
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quinta-feira, 17 de maio de 2012
quarta-feira, 16 de maio de 2012
''Escolhera permanecer morto,''
Thom Gunn. A Destruição do Nada e outros poemas. Tradução de Maria de Lourdes Guimarães. Relógio D' Água, Lisboa, 1993., p. 17
«E como uma esposa hei-de ensinar-te
A seres como eu sou, como tudo o que eu sou.»
Thom Gunn. A Destruição do Nada e outros poemas. Tradução de Maria de Lourdes Guimarães. Relógio D' Água, Lisboa, 1993., p. 11
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«Ensinei-te a falar, demos um nome às aves,
Anotaste então as suas grandes migrações
Como qualquer criança.»
Thom Gunn. A Destruição do Nada e outros poemas. Tradução de Maria de Lourdes Guimarães. Relógio D' Água, Lisboa, 1993., p. 11
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''Eu fui tudo o que sou e fui o que não sou.''
Thom Gunn. A Destruição do Nada e outros poemas. Tradução de Maria de Lourdes Guimarães. Relógio D' Água, Lisboa, 1993., p. 11
«Tive de deixar sarar aqueles vales iluminados pela tempestade.»
Thom Gunn. A Destruição do Nada e outros poemas. Tradução de Maria de Lourdes Guimarães. Relógio D' Água, Lisboa, 1993., p. 9
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«Era eu próprio: sem estar sujeito ao fôlego de outro homem: »
Thom Gunn. A Destruição do Nada e outros poemas. Tradução de Maria de Lourdes Guimarães. Relógio D' Água, Lisboa, 1993
Thom Gunn. A Destruição do Nada e outros poemas. Tradução de Maria de Lourdes Guimarães. Relógio D' Água, Lisboa, 1993
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sexta-feira, 11 de maio de 2012
«Virá um dia em que um olhar tranquilo estabelecerá a ordem e a unidade no laborioso caos que começa amanhã.»
(Fevereiro de 1940
Cesare Pavese. Trabalhar Cansa. Tradução e introdução de Carlos Leite. Edições Cotovia, Lisboa, 1997., p. 311
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poeta italiano
«És a grande fadiga
e a noite que sacia.»
e a noite que sacia.»
Cesare Pavese. Trabalhar Cansa. Tradução e introdução de Carlos Leite. Edições Cotovia, Lisboa, 1997., p. 329
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«Tu não mudas. És escura.»
Cesare Pavese
Trabalhar Cansa. Tradução e introdução de Carlos Leite. Edições Cotovia, Lisboa, 1997., p. 325
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verso solto
A PROPÓSITO DE CERTAS POESIAS AINDA NÃO ESCRITAS
«(...) virá um momento em que faremos poemas cansados, vazios de promessas, aqueles que justamente assinalarão o fim da aventura.»
Cesare Pavese.Trabalhar Cansa. Tradução e introdução de Carlos Leite. Edições Cotovia, Lisboa, 1997., p. 299
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O Ofício de Poeta
«Tornava-me cada vez mais capaz de subentendidos, de meios tons, duma composição rica, e cada vez menos convencido da necessidade do meu trabalho.»
(...)
«Obstinava-me em narrar e não podia, certamente, perder-me na decoração gratuita.Mas é um facto que as minhas imagens - as minhas relações imaginárias - se complicavam, ramificando-se incessantemente
em atmosferas rarefeitas.»
em atmosferas rarefeitas.»
(Novembro de 1934)
Cesare Pavese. Trabalhar Cansa. Tradução e introdução de Carlos Leite. Edições Cotovia, Lisboa, 1997., p. 299
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Trabalhar Cansa
''Não há coisa mais amarga do que a aurora dum dia
em que nada acontecerá. Não há coisa mais amarga
do que a inutilidade. Pende cansada no céu
uma estrela esverdeada, surpreendida pela madrugada.
Vê o mar ainda escuro e a mancha de fogo
a que o homem, para fazer alguma coisa, se aquece;
vê e cai de sono entre as pardas montanhas
onde há um leito de neve. A lentidão da hora
não tem piedade de quem já nada espera.''
em que nada acontecerá. Não há coisa mais amarga
do que a inutilidade. Pende cansada no céu
uma estrela esverdeada, surpreendida pela madrugada.
Vê o mar ainda escuro e a mancha de fogo
a que o homem, para fazer alguma coisa, se aquece;
vê e cai de sono entre as pardas montanhas
onde há um leito de neve. A lentidão da hora
não tem piedade de quem já nada espera.''
Cesare Pavese. Trabalhar Cansa. Tradução e introdução de Carlos Leite. Edições Cotovia, Lisboa, 1997., p. 273
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''Depois, na noite que faz desaparecer o mar, escuta-se
o grande vazio que há sob as estrelas.''
o grande vazio que há sob as estrelas.''
Cesare Pavese. Trabalhar Cansa. Tradução e introdução de Carlos Leite. Edições Cotovia, Lisboa, 1997., p. 269
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segunda-feira, 7 de maio de 2012
«Tinha caído tanto, que se tivesse de escolher entre ficar apaixonado por uma mulher e ler um bom livro sobre o amor, teria escolhido o livro.»
Nikos Kazantzaki. O Bom Demónio. Tradução de Fernando Soares. Editora Ulisseia, Lisboa,p. 112
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carpideira
nome feminino
1. | pessoa a quem se paga para chorar os defuntos durante os funerais |
2. | figurado mulher que anda sempre a lastimar-se |
3. | figurado lamúria; choradeira |
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«Grécia, pátria, dever, na verdade nada querem dizer, mas é por esse nada que vamos morrer voluntariamente.»
Mas porque te escrevo isto? Para te dizer que nada esqueci do que vivemos juntos. Para ter também uma ocasião de exprimir aquilo que nunca, por causa do hábito bom ou mau que adoptámos de nos contermos, me é possível revelar quando estamos juntos.
Agora que não estás na minha frente, que não vês a minha cara e que não corro o risco de parecer ridículo, digo-te que te amo muito.»
Nikos Kazantzaki. O Bom Demónio. Tradução de Fernando Soares. Editora Ulisseia, Lisboa,p. 103
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«Bem sabes como estas meditações cruéis, longe de me fazerem recuar, são, pelo contrário atiçadoras indispensáveis da minha chama interior.»
Nikos Kazantzaki. O Bom Demónio. Tradução de Fernando Soares. Editora Ulisseia, Lisboa,p. 101
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«Ao espírito voltam todas as recordações amargas enterradas no coração - separações de amigos, sorrisos de mulheres que se apagaram, esperanças que perderam as asas como borboletas de que só resta o verme. E o verme está pousado nas folhas do meu coração e rói-as.»
Nikos Kazantzaki. O Bom Demónio. Tradução de Fernando Soares. Editora Ulisseia, Lisboa,p. 99
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A mulher é a história eterna.
« Amaste-a assim tanto, a essa Nussa? - perguntei uns instantes mais tarde.
Zorba abriu os olhos.
- Tu és novo, patrão, és novo, não podes compreender. Quando também tiveres cabelos brancos, voltaremos a falar dessa eterna história.
-Que história eterna?
- A mulher, claro! Quantas vezes é preciso repetir-te? A mulher é uma história eterna. Para já, és como os galos novos que cobrem as galinhas em dois tempos e em três movimentos e depois incham o papo, sobrem ao monte de estrume e põem-se a cantar e a pavonear-se. Não é para a galinha que olham, é para a crista deles. Sendo assim, podem perceber do amor? Nada de nada.»
Nikos Kazantzaki. O Bom Demónio. Tradução de Fernando Soares. Editora Ulisseia, Lisboa,p. 97-8
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« - É que já tenho cabelos brancos, patrão, e os dentes começam a tremer; já não tenho tempo a perder. Tu és novo, podes ter paciência ainda. Eu não posso. Palavra de honra, quanto mais velho me faço, mais selvagem fico! Não me venham cá contar que a velhice abranda o homem e lhe acalma o ardor! Nem que ao ver a morte ele estica o pescoço, dizendo: «Corta-me a cabeça, se fazes o favor, para que eu vá para o Céu!» Eu, quanto mais velho mais rebelde. Não cedo, quero conquistar o mundo!»
Nikos Kazantzaki. O Bom Demónio. Tradução de Fernando Soares. Editora Ulisseia, Lisboa,p. 65
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domingo, 6 de maio de 2012
«Vale a pena ter fome ou ter sido traído
pela boca mais doce, só para sair com aquele céu
e voltar a encontrar no hálito as mais diáfanas recordações.»
Cesare Pavese. Trabalhar Cansa. Tradução e introdução de Carlos Leite. Edições Cotovia, Lisboa, 1997., p. 253
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REVOLTA
O morto está todo torcido e não olha para as estrelas:
tem os cabelos colados ao empedrado. A noite pôs-se mais fria.
Os vivos regressam a casa ainda a tremer.
É difícil acompanhá-los; dispersam-se todos
e um sobe as escadas, outro desce à adega.
E outro caminha até de madrugada e deita-se num prado,
ao sol. Amanhã no trabalho, alguém fará um sorriso
de desespero. Depois, também isto passará.
Quando dormem, parecem o morto: se também há uma mulher,
é mais pesado o odor, mas parecem mortos.
Cada corpo agarra-se, torcido, à cama,
como ao rubro empedrado: o longo cansaço
que dura desde a aurora vale bem uma breve agonia.
Sobre cada corpo coagula uma escuridão suja.
Solitário, o outro corpo morto está estendido às estrelas.
Também parece morto o monte de farrapos que o sol
escalda com força, encostado ao muro. Dormir
na rua demonstra confiança no mundo.
Há uma barba entre os farrapos e percorrem-na
moscas atarefadas; na rua, os transeuntes vão e vêm
como moscas; o pedinte faz parte da rua.
A miséria recobre de barba os sorrisos tensos.
como uma erva, e dá um aspecto pacato. Este velho
que podia morrer todo torcido, em sangue,
parece mais uma coisa e está vivo. Assim,
tirando o sangue, cada coisa é uma parte da rua.
E no entanto as estrelas viram sangue na rua.
Cesare Pavese. Trabalhar Cansa. Tradução e introdução de Carlos Leite. Edições Cotovia, Lisboa, 1997., p. 229
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envilecer
verbo transitivo,
intransitivo e pronominal
1. | tornar(-se) vil; rebaixar(-se) |
2. | diminuir o valor (de); depreciar(-se) |
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«A casa parece vazia e contudo encerra o indispensável, tão ecrto é que o homem verdadeiro precisa de poucas coisas.»
Nikos Kazantzaki. O Bom Demónio. Tradução de Fernando Soares. Editora Ulisseia, Lisboa,p. 65
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« - Aborreci-te, patrão? - disse, deixando de sorrir.
Tínhamos chegado à nossa choupana. Zorba olhou-me com ternura e inquietação.
Não respondi. Senti que o meu espírito estava de acordo com Zorba, mas o coração resistia, queria arremessar-se, romper a animalidade, abrir um caminho.
-Não tenho sono esta noite, Zorba - disse eu. - Vai deitar-te tu.
As estrelas cintilavam, o mar suspirava e beijava as conchas, um pirilampo acendeu sobre o ventre o seu pequeno farol erótico. Os cabelos da noite escorriam de orvalho.»
-Não tenho sono esta noite, Zorba - disse eu. - Vai deitar-te tu.
As estrelas cintilavam, o mar suspirava e beijava as conchas, um pirilampo acendeu sobre o ventre o seu pequeno farol erótico. Os cabelos da noite escorriam de orvalho.»
Nikos Kazantzaki. O Bom Demónio. Tradução de Fernando Soares. Editora Ulisseia, Lisboa,p. 64
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sábado, 5 de maio de 2012
''Quando eu morrer, tudo morrerá.''
Nikos Kazantzaki. O Bom Demónio. Tradução de Fernando Soares. Editora Ulisseia, Lisboa,p. 63
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«Quando o patrão é duro, os operários, temem-no, respeitam-no e trabalham. Quando o patrão é fraco, tiram-lhe as rédeas e andam devagar. »
Nikos Kazantzaki. O Bom Demónio. Tradução de Fernando Soares. Editora Ulisseia, Lisboa,p. 61
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«De repente gritou
que se o mundo sofria, se a luz do sol
arrancava blasfémias, não era o destino:
o culpado era o homem. Ao menos pudéssemos partir,
rebentar de fome em liberdade, dizer não
a uma vida que utiliza o amor e a piedade,
a família, o bocado de terra, para nos atar as mãos.»
Cesare Pavese. Trabalhar Cansa. Tradução e introdução de Carlos Leite. Edições Cotovia, Lisboa, 1997., p. 229
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« (...) Aprendeu a medir
pela sua própria fadiga a fome dos outros,
e em todo o lado encontrou injustiças.»
Cesare Pavese. Trabalhar Cansa. Tradução e introdução de Carlos Leite. Edições Cotovia, Lisboa, 1997., p. 227
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PAISAGEM IV
(Para a Tina)
Os dois homens fumam na margem. A mulher que nada
sem quebrar a água apenas vê o verde
do seu estreito horizonte. Entre o céu e as árvores
estende-se a água e a mulher desliza nela
sem corpo. No céu pousam nuvens
quase imóveis. O fumo detém-se no ar.
Sob o gelo da água também há erva. A mulher
atravessa-a, suspensa: mas nós calcamo-la,
a erva verde, com o corpo. Em toda aquela água não há
outro peso. Só nós os dois sentimos a terra.
Talvez o seu corpo alongado, submerso,
sinta o gelo voraz absorver-lhe o torpor
dos membros escaldantes de sol, dissolvendo-a viva
no verde imóvel. A sua cabeça não se mexe.
Também ela estava deitada onde a erva está calcada.
O seu rosto semioculto repousava no braço
e olhava a erva. Não falávamos.
No ar paira ainda aquela primeira comoção
das águas que a acolheram. Por cima de nós paira o fumo.
Agora alcançou a margem e fala, o seu corpo escuro,
gotejante, ergue-se entre os troncos.
A sua voz é bem o único som que se ouve por sobre a água
-rouca e fresca, é a mesma voz de antes.
Pensemos, deitados
na margem, naquele verde mais escuro e mais fresco
que submergiu o seu corpo. Depois, um de nós
mergulha na água e atravessa, mostrando os ombros
em braçadas espumosas, o verde imóvel.
Cesare Pavese. Trabalhar Cansa. Tradução e introdução de Carlos Leite. Edições Cotovia, Lisboa, 1997., p. 199
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sexta-feira, 4 de maio de 2012
JANTAR TRISTE
É por baixo da ramada, depois do jantar.
Em baixo há água que corre dócil.
Estamos calados, a escutar e a olhar para o rumor
que faz a água ao passar no rego lunar.
Este tempo suspenso é o momento mais doce.
A minha companheira goza o momento
e parece ainda morder o cacho de uvas,
tão cheia de vida é a sua boca: e o sabor perdura,
têm a doçura das uvas, mas os ombros firmes
e as faces bronzeadas encerram todo o Verão.
Na toalha branca ficaram pão e uvas.
Vazias, as duas cadeiras olham-se cara a cara.
Quem sabe que coisa ilumina o rego lunar
com aquele seu lume doce, nos bosques distantes.
Talvez antes da aurora um sopro mais frio
extinga a lua e os vapores e apareça alguém.
Uma frágil claridade mostraria a garganta
sobressaltada e as mãos febris fecharem-se
em vão sobre os alimentos. Continua o sobressalto da água,
mas no escuro. As uvas e pão continuam no mesmo sítio.
Os sabores atormentam a sombra esfomeada,
que nem sequer consegue lamber no cacho
o orvalho que já se condensa. E com todas as coisas perladas
na aurora, as cadeiras olham-se solitárias.
Por vezes, à beira da água, um cheiro,
como de uvas, de mulher, paira sobre a erva,
e a lua esvai-se em silêncio. Aparece alguém.
mas atravessa incorpóreo o arvoredo e lamenta-se
com aquele gemido rouco dos que não têm voz
e se estendem na erva e não encontram a terra:
tremem-lhe as narinas, somente. Está frio quando o dia nasce,
e estreitar um corpo seria a vida.
Mais difusa que o amarelo lunar, que tem horror
e filtrar-se nos bosques, é esta ânsia sôfrega
de contactos e sabores que macera os mortos.
Outras vezes no solo atormenta-os a chuva.
Na toalha branca ficaram pão e uvas.
Vazias, as duas cadeiras olham-se cara a cara.
Quem sabe que coisa ilumina o rego lunar
com aquele seu lume doce, nos bosques distantes.
Talvez antes da aurora um sopro mais frio
extinga a lua e os vapores e apareça alguém.
Uma frágil claridade mostraria a garganta
sobressaltada e as mãos febris fecharem-se
em vão sobre os alimentos. Continua o sobressalto da água,
mas no escuro. As uvas e pão continuam no mesmo sítio.
Os sabores atormentam a sombra esfomeada,
que nem sequer consegue lamber no cacho
o orvalho que já se condensa. E com todas as coisas perladas
na aurora, as cadeiras olham-se solitárias.
Por vezes, à beira da água, um cheiro,
como de uvas, de mulher, paira sobre a erva,
e a lua esvai-se em silêncio. Aparece alguém.
mas atravessa incorpóreo o arvoredo e lamenta-se
com aquele gemido rouco dos que não têm voz
e se estendem na erva e não encontram a terra:
tremem-lhe as narinas, somente. Está frio quando o dia nasce,
e estreitar um corpo seria a vida.
Mais difusa que o amarelo lunar, que tem horror
e filtrar-se nos bosques, é esta ânsia sôfrega
de contactos e sabores que macera os mortos.
Outras vezes no solo atormenta-os a chuva.
Cesare Pavese. Trabalhar Cansa. Tradução e introdução de Carlos Leite. Edições Cotovia, Lisboa, 1997., p. 195-197
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quinta-feira, 3 de maio de 2012
«Não há cama mais solitária para quem ao romper do dia
ainda dorme estendido, sonhando com a escuridão.»
Cesare Pavese. Trabalhar Cansa. Tradução e introdução de Carlos Leite. Edições Cotovia, Lisboa, 1997., p. 179
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terça-feira, 1 de maio de 2012
domingo, 29 de abril de 2012
«Eu não reflectia, nada procurava, não tinha qualquer dúvida. Vivia na certeza.»
Nikos Kazantzaki. O Bom Demónio. Tradução de Fernando Soares. Editora Ulisseia, Lisboa,p. 53
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No fim dos meus dias
Porque te encontrei...
Nikos Kazantzaki. O Bom Demónio. Tradução de Fernando Soares. Editora Ulisseia, Lisboa,p. 50
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Nikos Kazantzakis
« Jovem ou decrépita, bela ou feia, isso eram os pormenores sem importância, variantes. Por detrás de cada mulher levanta-se, austera, cheia de mistério, a face de Afrodite.
Ora, este rosto que Zorba via era a ele que falava e desejava; dona Hortênsia não passava de uma máscara efémera e transparente que Zorba rasgava para beijar a boca eterna.
- Levanta o teu pescoço de neve, meu tesouro - continuou em tom de súplica anelante -, levanta o teu pescoço de neve, e deita cá para fora a tua canção!»
Nikos Kazantzaki. O Bom Demónio. Tradução de Fernando Soares. Editora Ulisseia, Lisboa,p. 50
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«Eu, meu filho, ajo como se nunca devesse morrer». Eu respondo-lhe: «Eu ajo como se devesse morrer a cada instante.»
Nikos Kazantzaki. O Bom Demónio. Tradução de Fernando Soares. Editora Ulisseia, Lisboa,p. 42
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«Parei um instante no areal e olhei. A santa solidão estendia-se na minha frente, triste e fascinante como o deserto. O poema búdico elevou-se do solo e insinuou-se até ao fundo do meu ser. « Quando é que, enfim, me hei-de retirar na solidão, só, sem companheiros, sem alegria e sem tristeza, só com a certeza de que tudo não passa de um sonho? Quando é que, com os meus farrapos - e sem desejos - me hei-de retirar cheio de alegria para a montanha? Quando é que, vendo que o meu corpo não passa de doença e crime, velhice e morte - livre, sem medo, cheio de alegria - me hei-de retirar na floresta? Quando? Quando? Quando?»
Nikos Kazantzaki. O Bom Demónio. Tradução de Fernando Soares. Editora Ulisseia, Lisboa,p. 31
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« - Que podes tu dizer? - disse, medindo-me com o olhar ... - Se bem percebo, a tua senhoria nunca teve fome, nunca matou, nunca roubou, nunca se deitou com a mulher do próximo. Que podes tu saber, pois, do mundo? Espírito puro, carne que não conhece o sol... - murmurou com evidente desprezo.»
Nikos Kazantzaki. O Bom Demónio. Tradução de Fernando Soares. Editora Ulisseia, Lisboa,p. 28
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O homem é um animal feroz quando novo; sim, patrão, um homem feroz que come homens!
«Mas, naquela época, estás a ver que me fervia o sangue, Não me ficava a esmiuçar a questão. Para pensar bem e honestamente é preciso ter calma, idade e falta de dentes. Quando já não se tem dentes é fácil de dizer: «É uma vergonha, rapazes, não mordam mais!» Mas quando temos os trinta e dois dentes...O homem é um animal feroz quando novo; sim, patrão, um homem feroz que come homens!»
Nikos Kazantzaki. O Bom Demónio. Tradução de Fernando Soares. Editora Ulisseia, Lisboa,p. 27
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« - Aborrece-te falar, Zorba?
- Não é que me aborreça, patrão - respondeu -, mas custa-me fazê-lo.
-Custa-te? Porquê?
Não respondeu imediatamente. Passeou lentamente, mais uma vez o olhar ao longo da margem. Tinha dormido na ponte e os cabelos grisalhos e ondulados pingavam do orvalho. Todas as rugas profundas do rosto, do queixo e do pescoço eram iluminadas até ao fundo pelo Sol nascente. Por fim os lábios grossos e pendentes, como os de um bode, mexeram.
- De manhã custa-me a abrir a boca. Custa-me muito, desculpa.»
Nikos Kazantzaki. O Bom Demónio. Tradução de Fernando Soares. Editora Ulisseia, Lisboa,p. 25/6
- Não é que me aborreça, patrão - respondeu -, mas custa-me fazê-lo.
-Custa-te? Porquê?
Não respondeu imediatamente. Passeou lentamente, mais uma vez o olhar ao longo da margem. Tinha dormido na ponte e os cabelos grisalhos e ondulados pingavam do orvalho. Todas as rugas profundas do rosto, do queixo e do pescoço eram iluminadas até ao fundo pelo Sol nascente. Por fim os lábios grossos e pendentes, como os de um bode, mexeram.
- De manhã custa-me a abrir a boca. Custa-me muito, desculpa.»
Nikos Kazantzaki. O Bom Demónio. Tradução de Fernando Soares. Editora Ulisseia, Lisboa,p. 25/6
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« - Luas velhas! - murmurava com desprezo. - Não têm vergonha!
- Que quer isso dizer: luas velhas, Zorba?
- Mas tudo isso: reis, democracias, deputados! Que mascarada!»
Nikos Kazantzaki. O Bom Demónio. Tradução de Fernando Soares. Editora Ulisseia, Lisboa,p. 22
- Que quer isso dizer: luas velhas, Zorba?
- Mas tudo isso: reis, democracias, deputados! Que mascarada!»
Nikos Kazantzaki. O Bom Demónio. Tradução de Fernando Soares. Editora Ulisseia, Lisboa,p. 22
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