ARAÚJO, R. B (2009). Niilismo heróico em Samuel Beckett e Hilda Hilst: Fim e recomeço da narrativa. Tese de Doutoramento em Literatura Comparada, pela Universidade Federal da Paraíba, p. 39
sexta-feira, 15 de outubro de 2010
ARAÚJO, R. B (2009). Niilismo heróico em Samuel Beckett e Hilda Hilst: Fim e recomeço da narrativa. Tese de Doutoramento em Literatura Comparada, pela Universidade Federal da Paraíba, p. 39
Causas do Niilismo
ARAÚJO, R. B (2009). Niilismo heróico em Samuel Beckett e Hilda Hilst: Fim e recomeço da narrativa. Tese de Doutoramento em Literatura Comparada, pela Universidade Federal da Paraíba, p. 36
ARAÚJO, R. B (2009). Niilismo heróico em Samuel Beckett e Hilda Hilst: Fim e recomeço da narrativa. Tese de Doutoramento em Literatura Comparada, pela Universidade Federal da Paraíba, p. 33
Niilismo
No entanto, apesar desses registos anteriores, o termo “niilismo” tornou-se conhecido somente a partir do romance russo, Pais e filhos, de Ivan Turguêniev, escrito entre 1860 e 1862. De facto, é tarefa difícil remontar a história do niilismo, pois suas raízes tendem a se aprofundar cada vez mais à medida que se busca a sua origem. Mas, para além da origem do termo, o niilismo, enquanto sentimento, existiu desde sempre. Trata-se do sentimento de estranhamento e da falta de sentido diante do mundo.»
ARAÚJO, R. B (2009). Niilismo heróico em Samuel Beckett e Hilda Hilst: Fim e recomeço da narrativa. Tese de Doutoramento em Literatura Comparada, pela Universidade Federal da Paraíba, p. 30
quinta-feira, 14 de outubro de 2010
Se eu pudesse dizer quantas vezes quis morrer esta noite,
morrer sem salmo e sem mãe nem pai, morrer como os animais
que sufocam, encurralados entre os muros,
morrer como um verme pisado, sem qualquer assistência,
morrer como o melro esmagado pela roda do comboio aéreo,
morrer como a alma das árvores, que mandam com o vento
os seus segredos para os oceanos, quando a Primavera chega, porque
«à la fin tu es las de ce monde ancien...»,
tanto sofrimento, tanto cheiro de corpos humanos nunca eu antes
Thomas Bernhard. Na Terra e no Inferno. Trad. e introdução José A. Palma Caetano. Assírio & Alvim, 2000, p. 93
Sandip
Rabindranath Tagore. A casa e o mundo. Trad. de Fernanda Pinto Rodrigues. Minerva de Bolso. 1ª ed., 1973, p. 33/4
Rabindranath Tagore. A casa e o mundo. Trad. de Fernanda Pinto Rodrigues. Minerva de Bolso. 1ª ed., 1973, p. 33
Rabindranath Tagore. A casa e o mundo. Trad. de Fernanda Pinto Rodrigues. Minerva de Bolso. 1ª ed., 1973, p. 32
Rabindranath Tagore. A casa e o mundo. Trad. de Fernanda Pinto Rodrigues. Minerva de Bolso. 1ª ed., 1973, p. 31
ARAÚJO, R. B (2009). Niilismo heróico em Samuel Beckett e Hilda Hilst: Fim e recomeço da narrativa. Tese de Doutoramento em Literatura Comparada, pela Universidade Federal da Paraíba, p. 27
quarta-feira, 13 de outubro de 2010
132.
I
-«O que é a fama após a morte?
Uma vida sem vida, caro rapaz,
Uma vida que se vive e não apraz,
Um nome escrito à esquina duma rua,
Um busto que podemos espezinhar,
Um vento leve que a tempestade destrua:
Essa a fama póstuma. Maldito quem se agastar
Só por tê-la; e quem por ela morrer, Marino,
Se matará duas vezes. Por isso escuta...
II
É bom ser amado por toda a gente,
Melhor ainda o amor só de alguém;
Mas não há na vida maior amargura
Do que não ter o amor de ninguém.
III
Nunca as negras nuvens serão tão densas
Que não haja um azul para vislumbrar;
Nunca o céu tão escuro que um raio luminoso
Através dele não possa passar.
IV
Nada é mais frio do que as cinzas são
E contudo o lume ali se ateou;
A noite que envolve uma única estrela
Mais negra parece quem a olhou.
(...)
Alexander Search (1904). Poesia. Ed e Trad. Luísa Freire. Assírio&Alvim, Lisboa, 1999., pp. 313/314
124.
II
A visão que tenho deste dia frio,
A depressão funda em que o pensar extravio
Um símbolo e um resumo é, simplesmente,
Do que a minha vida é perpetuamente.
Em tristeza e dor, que fundo o pensamento!
Como a alma mergulha em desespero intensivo!
Que desolado o peito emudecido
Das palavras que são como odor expelido
Da flor aberta da plena juventude!
Como fico encerrado na minha inquietude!
Como fico neste círculo confinado,
Círculo trágico do meu ser odiado!
Nem uma ambição ou desejo me chama -
Humanitarismo, poder, riqueza ou fama.
Mas sinto-me cansado, frio, desiludido,
Tal como este dia. Tenho envelhecido
A ver os sonhos a passar e desaparecer,
Deixando a lembrança pura, luzindo,
De algo que, como a luz, se foi extinguindo
Sem o vivo horror de se ver morrer.
Alexander Search (1904). Poesia. Ed e Trad. Luísa Freire. Assírio&Alvim, Lisboa, 1999., pp. 291
122.
Oh, estrela brilhante que na solidão
Espreitas do seio da noite envolvente,
Nada iguala em beleza a tua amplidão
No céu despido e de estrelas ausente.
Promete manter o teu cintilar
Na noite luzindo em dormente prazer,
Como de uma fada o indolente olhar
Que, p'ra pensar, recusa adormecer.
Que há outras estrelas, eu sei muito bem,
Que podem ter mais brilho e verdade;
Mas não as desejo, porém só uma vem
Pedir atenção e vencer a vontade.
E se, disto, a lição não tiverdes tirado
Muito da Virtude terás desprezado.
Alexander Search (1904). Poesia. Ed e Trad. Luísa Freire. Assírio&Alvim, Lisboa, 1999., pp. 283
the same exercise book as about him. It is no
longer I, but another whose life is just beginning.
«O contexto histórico-filosófico de Beckett (1906-1989) é a passagem do existencialismo para o pessimismo. Eis a situação do sujeito do século XX, após vivenciar os anos de guerra. As paisagens inóspitas e os diálogos de seus personagens que denunciam a impossibilidade de comunicar algo são evidências da realidade do pós-guerra. Sua linguagem sem ornamentos tem como função ressaltar o silêncio dos personagens. Seu teatro exprime a angústia de personagens que se encontram condenados à incapacidade de a linguagem comunicar o que sentem.»
ARAÚJO, R. B (2009). Niilismo heróico em Samuel Beckett e Hilda Hilst: Fim e recomeço da narrativa. Doutorado em Literatura Comparada, pela Universidade Federal da Paraíba, p.22
Atraco-me comigo, disparo uma luta. Eu e meus alguéns, esses
dos quais dizem que nada têm a ver com a realidade e é
somente isto que tenho: eu e mais eu
«Desejo de eternizar-se. Desejo de abdicar da vida social para se dedicar totalmente à literatura. Desejo de alcançar a verdade, o conhecimento, a compreensão da vida e da morte. Desejo de ser santa aos oito anos de idade, quando era interna no colégio de freiras. Desejo de escrever um livro a cada novo amor que surgia em sua vida. Desejo de traçar um roteiro para a sua obra, mesmo que o final deste roteiro fosse dar no silêncio: “eu fui atingida na minha possibilidade de falar”. Eram tantos os desejos dessa autora, leitora de Joyce, Beckett, Kafka, Nietzsche, Kierkegaard, Kazantzákis, só para citar alguns de seus autores preferidos.»
Georg Lukács
(...)
Vem, pecado, ó belo pecado!
Que teus esbraseantes beijos vermelhos derramem
E atravessa na nossa fronte a coroa da exultante
Mancha sem vergonha o nosso peito com a mais
negra lama do descrédito!
Rabindranath Tagore. A casa e o mundo. Trad. de Fernanda Pinto Rodrigues. Minerva de Bolso. 1ª ed., 1973, p. 29
Rabindranath Tagore. A casa e o mundo. Trad. de Fernanda Pinto Rodrigues. Minerva de Bolso. 1ª ed., 1973, p. 16
106.
III
Os olhos são coisas raras.
Neles o sentido se transforma em vida.
Neles a vida tem asas.
Olha para mim. É louco e estranho o teu olhar.
Uma luta interior se vê reflectida.
Mais que belo Horror ele vem revelar!
IV
1.
Quanto tu falavas, apenas sentia
Um terror alienado e estranho.
Imagina. Ajoelhar-me poderia
Ante teus lábios, seu mover, seu desenho.
A forma dos lábios, cheia de expressão,
E teus dentes meio descobertos
Eram do delírio, chicotes despertos.
Senti desaparecer minha razão.
Um fetichismo mais que sensual
Visita minha mente delirante.
Maior do que o abismo se apresenta
A fenda entre a razão e sentimento,
Aberta ao alvião do sofrimento.
Tudo contém mais do que aparenta.
Alexander Search (1904). Poesia. Ed e Trad. Luísa Freire. Assírio&Alvim, Lisboa, 1999., pp. 241
Perdidos no Todo, um só vivente,
Essa prisão a que eu chamo a alma
E esse limite a que chamo mente.»
Alexander Search (1904). Poesia. Ed e Trad. Luísa Freire. Assírio&Alvim, Lisboa, 1999., pp. 233
Choro e desejo o que nunca fui eu,
Aquilo que não houve na Natureza
E o que havendo nunca será meu.
Saudade do prazer que já é passado,
Tristeza da dor outrora vivida,
A dor do que visto em vagas visões
É apenas eco da amargura tida.»
(...)
91. A minha vida
Alexander Search (1904). Poesia. Ed e Trad. Luísa Freire. Assírio&Alvim, Lisboa, 1999., pp. 201
89.
Um dia em delírio entorpecido,
Onde vi estranhas coisas a passar,
Vi num sonho, sem luz alguma a brilhar,
Um homem com um só lábio -
Exactamente, exactamente,
Exactamente um só lábio.
Lembro bem que ele não tinha rosto
Nem nariz, com a ponta para vê-lo,
Nem olhos, nem faces, nem cabelo
Mas apenas só um lábio -
Um somente, um somente
Apenas um, um só lábio.
Podeis pensar nisto sem terror?
E nenhum outro lábio ressalva
À visão, nem tampouco lhe faltava:
Havia somente um lábio.
Vendo-o como eu, ficaríeis loucos -
O homem com um só lábio.
Alexander Search (1904). Poesia. Ed e Trad. Luísa Freire. Assírio&Alvim, Lisboa, 1999., pp. 197/8
terça-feira, 12 de outubro de 2010
Na minha capital
Mas que encontrei eu na minha capital?
A morte com a sua boca de cinzas, aniquiladora, sede e fome,
que repugnava, porém, à minha própria fome, porque era
uma fome de carne e de pão, de rostos e retretes,
uma fome que balbucia o opróbio desta cidade,
uma fome de mesquinhez,
brilhando de janela a janela, gerando primavera e glória pútrida
sob as escadas do céu.
Eu estava preso e de podridão cansado,
longe das florestas e longe dos anseios da morte de anos em ruínas.
As pedras cinzentas e inconsistentes deste vigamento clamavam em
que me fizeram esquecer a cilada dos homens em que eu tinha caído,
uma hora negra do mundo
no vento de Novembro da minha existência...
Thomas Bernhard. Na Terra e no Inferno. Trad. e introdução José A. Palma Caetano. Assírio & Alvim, 2000, p. 87
«Vós não dizeis nada, porque estais demasiado doentes para dizer
e este nascer do Sol e esta labuta dos camponeses
e esta labuta dos pássaros
e esta labuta que cria destruição em cada caule, em cada leito de rio,
por toda a parte onde as mãos estão por cima da terra.»
Thomas Bernhard. Na Terra e no Inferno. Trad. e introdução José A. Palma Caetano. Assírio & Alvim, 2000, p. 81
segunda-feira, 11 de outubro de 2010
Por trás das árvores há um outro mundo
o rio traz-me as queixas,
o rio traz-me os sonhos,
o rio fica silente quando eu, à noite, nas florestas,
sonho com o Norte...
Por trás das árvores há um outro mundo,
que o meu pai trocou por dois pássaros,
que a minha mãe trouxe para casa num cesto,
que o meu irmão perdeu no sono, quando tinha sete anos e estava
cansado...
Por trás das árvores há um outro mundo,
uma erva que sabe a tristeza, um sol negro,
uma lua dos mortos,
um rouxinol que não pára de se queixar
do pão e do vinho
e do leite em grandes jarros
na noite dos prisioneiros.
Por trás das árvores há um outro mundo,
eles descem em longos sulcos
para as aldeias, para as florestas dos milénios,
amanhã perguntam por mim,
pela música dos meus achaques,
quando o trigo apodrece, quando de ontem
nada ficou, dos seus quartos, sacristias de espera.
Quero deixá-los. Já não quero
falar com nenhum,
eles atraiçoaram-me, os campos sabem-no, o sol
há-de defender-me, eu sei,
cheguei tarde de mais....
Por trás das árvores há um outro mundo,
aí há uma outra quermesse,
na caldeira dos camponeses bóiam os mortos e em volta dos charcos
derrete-se em silêncio a gordura dos esqueletos vermelhos,
aí já nenhuma alma sonha com a roda do moinho,
e o vento compreende
apenas o vento...
Por trás das árvores há um outro mundo,
a terra da podridão, a terra
dos negociantes,
deixa atrás de ti uma paisagem de sepulturas
e tu irás destruir, irás dormir cruelmente
e beber e dormir
de manhã à noite, de noite até de manhã,
e não hás-de entender mais nada, nem o rio nem a tristeza,
porque por trás das árvores,
amanhã,
e por trás dos montes,
amanhã,
há um outro mundo.
Thomas Bernhard. Na Terra e no Inferno. Trad. e introdução José A. Palma Caetano. Assírio & Alvim, 2000, p. 61/63
domingo, 10 de outubro de 2010
porque de asas negras se encontra
coberto.»
Thomas Bernhard. Na Terra e no Inferno. Trad. e introdução José A. Palma Caetano. Assírio & Alvim, 2000, p. 53
Que farei...
quando nenhum palheiro mendigar para a minha existência,
quando o feno arder em aldeias húmidas,
sem coroar a minha vida?
Que farei
quando a floresta crescer apenas na minha fantasia,
quando os regatos só já forem artérias vazias e lavadas?
Que farei
quando já das ervas não vier qualquer mensagem?
Que farei
quando estiver esquecido por todos, por todos...?
Thomas Bernhard. Na Terra e no Inferno. Trad. e introdução José A. Palma Caetano. Assírio & Alvim, 2000, p. 49
76.
Sinto uma raiva - sim, uma raiva! -
Do tempo que passa sem se deter,
Sede de vida que nada acalma,
Um ódio que nada pode reter.
E cada hora que sinto passar
E funde a noite com um novo dia
Faz, de pensá-lo, a alma clamar:
«Tortura eterna, tortura sem fim!
Os dias passam e nem uma acção!
Um forte desejo, como uma cobiça
Da vontade ausente - Oh, desolação! -
Um sonho dorido, condenado em mim!»
Sinto uma raiva! Raiva por sentir
Tristeza e mistério, em confusão,
Até que a mente num rodopiar,
Louca, contempla essa maldição
Descarnada, que é o mundo a passar,
Como ante um crime fica um paralítico
Sem ter o poder para o evitar.
Diante do sol, eu sinto estranheza,
Frente ao rio, aos campos, fico angustiado,
Sinto-me um cínico ante a baixeza
E, perante Deus, um revoltado.
Alexander Search (1904). Poesia. Ed e Trad. Luísa Freire. Assírio&Alvim, Lisboa, 1999., pp. 169/171
Família e amigos perto de mim.
Meus olhos detestam o encontrar
Do que é finito - a rua, o lar
E todas as coisas que têm fim.
Não sei o que é que aspiro a ter
Mas isto sei que não posso querer.
Em constante desajuste assim
E frio perante o que é vulgar,
Desço no próprio inferno até ao fim,
Ouvindo o sino a dobrar em mim
Que do meu envelhecer me vem falar,
Mas isto num tom tão estranho vem
Que da Mudança o mistério contém.»
Alexander Search (1904). Poesia. Ed e Trad. Luísa Freire. Assírio&Alvim, Lisboa, 1999., pp. 163
Alexander Search (1904). Poesia. Ed e Trad. Luísa Freire. Assírio&Alvim, Lisboa, 1999., pp. 145
54.
Tudo para mim é um duvidar
Com a normalidade sempre em cisão,
E o seu incessante perguntar
Cansa meu coração.
As coisas são e parecem e o nada sustém
O segredo da vida que contém.
A presença de tudo sempre perguntado
Coisas de angústia premente,
Em terrível hesitação experimentando
A minha mente.
É falsa a verdade? Qual o seu aparentar
Já que tudo são sonhos e tudo é sonhar?
Perante o mistério vacila a vontade
Em luta dividida dentro do pensar,
E a Razão cede, qual cobarde,
No encontrar
Mais do que as coisas em si revelam ser,
Mas que elas, por si só, não deixam ver.
Alexander Search (1904). Poesia. Ed e Trad. Luísa Freire. Assírio&Alvim, Lisboa, 1999., pp. 117
Ora doce, ora dor inominada,
Nunca a dor humana a dor atura.»
51. A dor suprema
Alexander Search (1904). Poesia. Ed e Trad. Luísa Freire. Assírio&Alvim, Lisboa, 1999., pp. 113
e vendiam vacas doentes a cidades cinzentas e obscuras, onde
roubavam às mães a erva e a vida e
ensinavam os filhos a morrer em colinas abandonadas.
Só há sombras e bancos desconfortáveis que não deixam
à minha carne, por muito que te esfaltes, a glória
que lhe é devida após as suas viagens.»
(...)
Thomas Bernhard. Na Terra e no Inferno. Trad. e introdução José A. Palma Caetano. Assírio & Alvim, 2000, p. 43
sábado, 9 de outubro de 2010
Podridão
quando regressei ao sono, em busca do meu pai,
que trouxe a mensagem do último vento
à minha miserável condição, que molestava a sua glória,
a glória de que ele dizia: «Os grandes destinos
são um fracasso para amanhã...»
Imperecíveis elevavam-se as florestas, que enchiam outrora
a noite com as suas queixas e o seu discorrer
sobre o mosto e o declínio. Só o vento
passava sobre as espigas, como se a Primavera vivesse
no meio desta doce podridão.
A neve tomava uma atitude hostil e fazia-me
arrepiar os braços e as pernas, ao olhar
o Norte agitado, que parecia uma cemitério gigantesco
e inesgotável, o cemitério dos prisioneiros
desta forma de progresso, que se
insinuava em cada encruzilhada, em cada pedra de gleba
e em todas as estradas e igrejas, cujas torres se
levantavam contra Deus e contra os convidados da boda,
que se acocoravam em volta do barril de vinho, para o
beberem todo com gargalhadas imundas.
Como é que eu vi na aldeia, em cima das tábuas, estes mortos,
com ventres inchados, comendo carne vermelha,
tartamudeando os hinos da cerveja forte,
a podridão, que furtivamente deslizava pela esplanada
sob o bramir indolente do trombone...
Ouvi o lento respirar da depravação
entre as colinas...
Vi a Terra imperecível como o Sol,
a Terra, cujo Agosto estava enfermo e era irrecuperável
para mim e para os meus irmãos, que aprenderam
o seu ofício melhor do que eu, que
ando torturado por milhões de mendicâncias e já
nenhuma árvore encontro para as minhas conversas de loucura.
Saí de uma noite do Inferno
para uma noite do Céu,
sem saber quem terá de espedaçar a minha vida
antes de ser tarde de mais para falar de glória e valentia,
da pobreza e dos mundanos desesperos
da carne, que me há-de aniquilar...
Thomas Bernhard. Na Terra e no Inferno. Trad. e introdução José A. Palma Caetano. Assírio & Alvim, 2000, p. 38-41
Nas arcas negras da terra dos camponeses
está escrito que eu terei de morrer no Inverno,
abandonado pelos meus sóis e pelo sussurro dos baldes,
dos baldes cheios de leite mungido,
pronunciando o tormento e o fim sob os golpes do vento de Março,
que me esmaga com a evocação
das macieiras em flor e do feitiço das eiras!
Nunca aniquilei uma noite com palavras afrontosas
nem com lágrimas, mas este tempo, este tempo absurdo,
extinguir-me-á
com a sua poesia seca e afiada como uma faca!
Terei não só de suportar o abandono, mas também
de conduzir o gado dos meus pais e das minhas mães através dos milénios!
Terei de criar chuva
e neve e maternalidade
para os meus crimes e louvar a raiva
que me arruína a seara nos meus próprios campos!
Reunirei os negociantes e as prostitutas de sábado num ponto da
floresta
e oferecerei esta terra, esta terra triste,
ao seu feroz desespero!
Farei entrar mil sóis na minha
fome! Amanhã criarei
algo de transitório para a imortalidade,
perto das fontes e das torres e longe
dos artesãos,
numa madrugada que está farta dos meus sofrimentos
e na qual não acontece senão o retorno das estrelas à sua morada...
...é aí que quero falar com os desesperados
e deixar tudo
o que foi desprezo, amargura e nojo deste mundo.
Thomas Bernhard. Na Terra e no Inferno. Trad. e introdução José A. Palma Caetano. Assírio & Alvim, 2000, p. 31-33
sexta-feira, 8 de outubro de 2010
quinta-feira, 7 de outubro de 2010
49.
Quereria de novo ser menino
E tu também criança, doce e pura;
Pudéssemos ser livres, sem destino,
Em nossa consciência, de obscura;
Jogos loucos pudéssemos jogar
Sob a ramagem calada e sombria,
Nomes de contos de fadas usar,
Eu de senhor e tu de senhoria.
E tudo seria plena candura
E desejo saudável de pensar,
E quanta dança e quanta travessura
Fariam nossos pés sem descansar;
E eu bem de palhaço actuaria
Para o teu riso infantil ganhar,
E de minha querida eu te chamaria
Sem outra coisa querer significar.
Sentados juntos nos comoveríamos
Com contos ora tristes, no passado;
Não tendo sexo, não nos amaríamos,
O bem sem contra o mal ter lutado.
E numa flor nosso prazer teríamos,
Barco do tesouro a casca de noz:
À noite num armário fechá-lo-íamos
Como na memória um prazer, a sós.
Gastaríamos o tempo, qual riqueza
De um bem grande de mais para fartar,
Gozaríamos saúde e a pureza
Sem saber que os gozámos a gozar...
Ah, quão mais amargo é tudo isso agora
Que um sentimento em mim faz regressar -
O saber de que se nos foi embora
E do que isso deixou em seu lugar.
Alexander Search (1904). Poesia. Ed e Trad. Luísa Freire. Assírio&Alvim, Lisboa, 1999., pp. 108-111
43.
Um não-existir dentro do Ser,
Um etéreo não-ser fundo sentido,
Uma mais que real Idealidade,
Sujeito e objecto um todo unido.
Nem Vida ou Morte, razão ou sem-razão,
Mas fundo sentir do não-sentimento,
Que calma profunda! Mais funda que a angústia,
Talvez como um pensar sem pensamento.
Beleza e fealdade, amor e ódio,
Virtude e vício - tudo já estranhezas;
Essa paz toda calma apagará
De nossa vida e eterna incerteza.
Um sossego de toda a humana esp'rança,
Um fio de exausto, febril respirar...
A alma em vão tacteia a expressão certa;
A lógica da fé vai ultrapassar.
Um oposto de alegria, do fundo
Desconsolo pela vida que temos,
Um acordar para o sono que dormimos
Um dormir para a vida que vivemos.
Tudo diferente da vida que é nossa
E do que atravessa o nosso pensar;
É um lar se vida nos é túmulo,
É um túmulo se nossa vida um lar.
Tudo o que choramos e o que aspiramos,
Como a criança ao peito, ali está,
E seremos mais do que desejamos
E nossas almas malditas terão paz.
Alexander Search (1904). Poesia. Ed e Trad. Luísa Freire. Assírio&Alvim, Lisboa, 1999., pp. 94-97
Teu espírito tem asas, p'ra que alturas?
Que alta visão lhe dói até cegar?»
Alexander Search (1904). Poesia. Ed e Trad. Luísa Freire. Assírio&Alvim, Lisboa, 1999., p. 95
38.
Não sei se em mim a mente se quebrou
Nem se a razão me foi adoecer;
Não sei se o amor é só o último sinal
De Deus em mim, ou a voz que se calou
No caos do querer.
Meu pensar deve ser o da loucura
E minha alma é por fantasmas habitada -
Formas grotescas e estranhas a rolar
Em minha mente, quais vermes em sepultura...
Alexander Search (1904). Poesia. Ed e Trad. Luísa Freire. Assírio&Alvim, Lisboa, 1999., p. 91
- ¿Que tienen de particular los habladores?
(...)
- Son una prueba prueba palpable de que contar historias puede ser algo más que una mera diversión – se me ocurrió decirle - . Algo primordial, algo de lo que depende la existencia misma de un pueblo.
(...)
((Es hora de descasar)), ((Es hora de sentarse a escuchar lo que habla)). Así lo hacían: descasaban con el sol o se reunían a oír el hablador hasta que empezaba a oscurecer. Entonces desperezándose, decían: (( Ha llegado el momento de vivir.)) p.62
Vidal, A. C (2009). Vargas Llosa: um intelectual latino-americano entre Sartre e Camus. Revista Brasileira de História & Ciências , - Número I .
quarta-feira, 6 de outubro de 2010
“... nenhuma mãe arranca os olhos de um príncipe, por ele achar bela a filha”.
porém só de maneira alusiva através de corpos.
Gotthold Ephraim Lessing,Laokoon (Laocoonte ou Sobre os Limites da Pintura e Poesia), de 1766
«Ah, quando, em mim, eu for minha esperança,
Meu próprio ser, divino e redimido.
E minha sombra apenas for lembrança
Bem longe, em outro mundo transcendente,
À luz sem sol jamais anoitecido,
Serei contigo, amor, eternamente.»
Teixeira Pascoaes, Elegias, Renascença Portuguesa, Porto, 1912.
Para Vivenciar Nadas
borboleta é um ser irrequieto4.
para vestes usa pólen.
tem um cheiro colorido
e babas de amizade.
descola por ventos
e facilmente aterriza em sonhos.
borboleta tem correspondência directa
com a palavra alma.
para existir usa liberdades.
desconhece o som da tristeza
embora saiba afogá-la.
usa com afinidades
o palco da natureza.
nega maquilhagens isentas
de materiais cósmicos. como digo:
pó-de-lua, lápis solar
castanho-raíz, cinzento-nuvem.
borboleta dispõe de intimidades
com arco-íris
a ponto de cócegas mútuas.
para beijar amigos e vidas ela usa olhos.
borboleta é um ser
de misteriosos nadas.
Ondjaki, Há Prendisajens com o Xão O Segredo Húmido da Lesma &Outras Descoisas, Lisboa, Editorial Caminho, 2002, pp. 38/39
terça-feira, 5 de outubro de 2010
(This Photograph is My Proof, 1974)
João Barrento. As pedras brancas de Eduardo Lourenço, p.5
João Barrento. As pedras brancas de Eduardo Lourenço, p.4
A atenção à vida presente nos três principais heterónimos de Fernando Pessoa...
recriar o mundo pedra a pedra”
Carlos de Oliveira
“Ao longe, ao luar,/No rio uma vela,/Serena a passar,/Que é que me revela?//Não sei, mas meu ser/Tornou-se-me estranho”
Fernando Pessoa
segunda-feira, 4 de outubro de 2010
Eduardo Lourenço
''Krétakör''
Pela primeira vez eu encontrara efectivamente alguém que sabia descer um pouco aos recantos ignorados do meu espírito — os mais sensíveis, os mais dolorosos para mim. E com ele o mesmo acontecera — havia de mo contar mais tarde.
Não éramos felizes — oh não!As nossas vidas passavam torturadas de ânsias, e incompreensões, de agonias de sombra…»
Mário de Sá-Carneiro. A confissão de Lúcio., p.14
Ah! como Gervásio tinha razão, como eu no fundo abominava essa gente —os artistas. Isto é, os falsos artistas cuja obra se encerra nas suas atitudes; que falam petulantemente, que se mostram complicados de sentidos e apetites, artificiais, irritantes, intoleráveis. Enfim, que são os exploradores da arte apenas no que ela tem de falso e de exterior.
Mas, na minha incoerência de espírito, logo me vinha outra ideia: — Ora, se os odiava, era só afinal por os invejar e não poder nem saber ser como eles…»
Mário de Sá-Carneiro. A confissão de Lúcio., p.8
E eis o que ninguém sabe; eis no que ninguém pensa. Assim, para todos, os prazeres dos sentidos são a luxúria, e se resumem em amplexos brutais, em beijos húmidos, em carícias repugnantes, viscosas. Ah! mas aquele que fosse um grande artista e que, para matéria-prima, tomasse a voluptuosidade, que obras irreais de admiráveis não alteraria!… Tinha o fogo, a luz, o ar, a água, e os sons, as cores, os aromas, os narcóticos e as sedas — tantos sensualismos novos ainda não explorados… Como eu me orgulharia de ser esse artista!… E sonho uma grande festa no meu palácio encantado, em que os maravilhasse de volúpia… em que fizesse descer sobre vós os arrepios misteriosos das luzes, dos fogos multicolores — e que a vossa carne, então, sentisse enfim o fogo e a luz, os perfumes e os sons, penetrando-a a dimaná-los, a esvaí-los, a matá-los!… Pois nunca atentaram na estranha voluptuosidade do fogo, na perversidade da água, nos requintes viciosos da luz?.. Eu confesso-lhes que sinto uma verdadeira excitação sexual — mas de desejos espiritualizados de beleza — ao mergulhar as minhas pernas todas nuas na água de um regato, ao contemplar um braseiro incandescente, ao deixar o meu corpo iluminar-se de torrentes eléctricas, luminosas… Meus amigos, creiam-me, não passam de uns bárbaros, por mais requintados, por mais complicados e artistas que presumam aparentar!»
Mário de Sá-Carneiro. A confissão de Lúcio., p.6
Mário de Sá-Carneiro. A confissão de Lúcio., p.4
nunca que possuo as minhas amantes; elas é que me possuem…»
Mário de Sá-Carneiro. A confissão de Lúcio., p.4
domingo, 3 de outubro de 2010
Uma corola
esplende uma corola
de cor vermelho-queimado
metálico
não está em nenhum jardim
em nenhum jarro
da sala
ou da janela
não cheira
não atrai abelhas
não murchará
apenas fulge
em alguma parte alguma
da vida
Ferreira Gullar in Jornal de letras, artes e ideias, Nº 1043, 22 de Setembro a 5 de Outubro de 2010
O Jasmim
no limite do veneno
assim de muito perto
esse aroma rude é um oculto
fogo verde
(quase fedor)
que me lesiona
as narinas
entre o orgasmo e a morte
mal pergunto
o que é isto um cheiro?
quem o faz?
a flor ou eu?
um invento
milenar da flora?
quando? desde quando?
já estaria na massa das estrelas
[ o cheiro da alfazema?
Nasce o perfume com as
[florestas
um silêncio a inventar-se nas
[plantas
vindo da terra escura
como caules, talos ramos
[folhas
o aroma
que se torna arbusto
[ - um jasmineiro.
Nos jardins dos prédios
[ (na rua senadir Eusébio,
por exemplo), nos matagais,
são usinas de aromas
a fabricar jasmim anis
[ alfazema
(alguns cheiros são perversos
como o anis
que a muitos poetas endoidou
durante a belle époque:
já o da alfazema
dorme manso nas gravatas
[de roupas
em São Luís
e reacende o perdido)
Tudo isto para dizer que
[ontem à noite
arranquei flores de um
[jasmineiro
no Flamengo
e vim com elas
- um lampejo entre
[as mãos-
pela rua
sorvendo-lhe o aroma
[selvagem
enquanto foguetes Tomahawk
[caíam sobre Bagdá.
Ferreira Gullar in Jornal de letras, artes e ideias, Nº 1043, 22 de Setembro a 5 de Outubro de 2010
sexta-feira, 1 de outubro de 2010
O dia dos fantasmas
erguer-se como pó
e desatar às gargalhadas.
Amanhã é o dia dos fantasmas, que
caíram na terra das batatas. Não posso
negar que eu
sou culpado desta morte dos rebentos.
Sou culpado!
Amanhã é o dia dos fantasmas, que trazem
na fronte o meu tormento,
que possuem o meu trabalho diário.
Amanhã é o dia dos fantasmas, que dançam
como carne no muro do cemitério
e me mostram o Inferno.
Porque tenho eu de ver o Inferno? Não há outro caminho
para Deus?
Uma voz: Não há outro caminho! E este caminho
passa pelo dia dos fantasmas,
passa pelo Inferno.
Thomas Bernhard. Na Terra e no Inferno. Trad. e introdução José A. Palma Caetano. Assírio & Alvim, 2000, p. 25
A persona che mai tornasse al mondo,
Questa fiamma staria senza più scosse.
Ma per cìo che giammai di questo fondo
Non tornò viva alcun, s'i'odo il vero,
Senza tema d'infamia ti rispondo.
Então vem, vamos juntos os dois,
A noite cai e já se estende pelo céu,
Parece um doente adormecido a éter sobre
[a mesa;
Vem comigo por certas ruas semi-desertas
Que são refúgio de vozes murmuradas
De noites sem repouso em hotéis baratos de
[uma noite
E restaurantes com serradura e conchas
[de ostra:
Ruas que se prolongam como argumento
[enfadonho
De insidiosa intenção
Que te arrasta àquela questão inevitável...
Oh, não perguntes «Qual será?»
Vem lá comigo fazer a tal visita.
(...)
T.S.Eliot. A canção de amor de J. Alfred Prufrock. Edição bilingue do poema e de um texto crítico de E. Pound. Trad. de João Almeida Flor. Assírio & Alvim, Lisboa, 1985, p.17
quarta-feira, 29 de setembro de 2010
oscilar. Simplesmente, este momento culminante raras são as criaturas que o vivem. As que o viveram ou são, como eu, os mortos-vivos, ou — apenas — os desencantados que, muita vez, acabam no suicídio.»
terça-feira, 28 de setembro de 2010
«Acontece que, tendo-me voltado, nesta ocasião, para o meu percurso, eu me dei conta de que, para não me perder de mim próprio, como na história célebre do Pequeno Polegar dos Irmãos Grimm, fui deixando muitas pedras brancas no meu caminho, mais numerosas do que eu podia imaginar, algumas hoje já desconhecidas de mim próprio. Hoje, nem essas pedras brancas me servem para eu, através delas, reinventar o meu próprio passado. Mas elas estão lá, podem ser lidas por outros, revisitadas como objecto de curiosidade ou objecto de interesse, se o tiverem.»
Eduardo Lourenço a 21 de Janeiro de 2003, por ocasião de uma homenagem pelos seus sessenta anos de vida literária e filosófica.
segunda-feira, 27 de setembro de 2010
Green Night
We walked down the path to breakfast.
The morning swung open like an iron gate.
We sat in Adirondack chairs and argued
for hours about the self—it wasn’t personal—
and the nature of nature, the broken
Word, the verse of God in fragments.
We trotted back and forth to readings.
The trees were the greenest I had ever seen.
We cut bread from a large brown loaf
at a long wooden table in the mountains.
A farmer hayed the meadows
and the afternoon flared around us.
Pass the smoky flask. Pass the cigarettes:
twenty smoldering friends in a package.
We swam in the muddy pond at dusk.
The sky was a purple I had never seen.
Someone was always hungover,
scheming with rhymes, hanging out.
Nothing could quench our thirst for each other.
At the bonfire, we flamed with words.
The houses were named after trees.
I slept with someone at the top of a maple.
It was a green night to be a poet in those days.
We didn’t care if the country didn’t care about us.
Edward Hirsch
Mas aspiração tal em mim não sinto.
De bosques e de prados cedo farto,
Nunca invejei aos pássaros as asas.
Como o prazer do estudo outro nos leva
De livro em livro, de uma a outra página!
Assim se tornam belas, tediosas
Noites de inverno, e calorosa vida
Os membros nos aquece, e, ai!, se acaso
Um douto pergaminho desenrolas,
É o céu que sobre ti baixar se digna!
J. W. Goethe. Fausto. Trad. Agostinho D'Ornelas. Ed. ao cuidado de Paulo Quintela. , 1953, Acta Universitatis Conimbrigensis.,p 55
domingo, 26 de setembro de 2010
Que me dizes, senão que em outro tempo,
Como o meu, delirou teu pobre cérebro,
A luz do dia procurou, com vasto
Desejo de verdade, e vagou triste
Em deprimente, lúgubre crepúsculo?
J. W. Goethe. Fausto. Trad. Agostinho D'Ornelas. Ed. ao cuidado de Paulo Quintela. , 1953, Acta Universitatis Conimbrigensis.,p 40
Se o próprio coração vos ficar mudo.»
J. W. Goethe. Fausto. Trad. Agostinho D'Ornelas. Ed. ao cuidado de Paulo Quintela. , 1953, Acta Universitatis Conimbrigensis.,p 35
Espírito. - Reluz uma chama avermelhada. O Espírito aparece na chama)
J. W. Goethe. Fausto. Trad. Agostinho D'Ornelas. Ed. ao cuidado de Paulo Quintela. , 1953, Acta Universitatis Conimbrigensis.,p 33
37.
Seja ilusão só, a enganar;
Que o rio que ora passa a correr
Encontre, inda que longe, um mar;
Que para além do frágil saber
Uma vida maior vá guardar.»
Alexander Search (1904). Poesia. Ed e Trad. Luísa Freire. Assírio&Alvim, Lisboa, 1999., p. 89
quinta-feira, 23 de setembro de 2010
terça-feira, 21 de setembro de 2010
segunda-feira, 20 de setembro de 2010
17.
Homens do presente, nada do passado,
Antes de serdes as coisas que vemos,
Quem podia ter sabido ou pensado
Que seríeis hoje aquilo que temos?
Ah, passantes pela mesma via,
Quem pôde pensar-vos antes deste dia?
Homens do presente e pó de amanhã,
Ao passar dos anos aonde ireis ter?
Que rude mudez ou ânsia em pressa vã
Irá registar vossa dor ou prazer?
Ondas ou cristas do mar desta vida,
Quem vos pensará passado este dia?
Só o génio pode o fogo atiçar
Que na natureza em vós abrigais;
Só o génio pode a lira tocar
E erguer vosso nome aos céus dos mortais;
O génio pode a morte romper
E o nada de ontem num tudo verter.
Mas a virtude, como os choros humanos,
Pelos areais depressa bebida,
Mergulha no pó dos passados anos
E nem sabereis onde está escondida.
Que o génio, então, possa ser laureado;
Que o pó de amanhã seja eternizado.
Alexander Search (1904). Poesia. Ed e Trad. Luísa Freire. Assírio&Alvim, Lisboa, 1999., p. 29
domingo, 19 de setembro de 2010
14.
Pudesse o que penso exprimir e dizer
Cada pensamento oculto e silente,
Levar meu sentir moldado na mente
A ser natural perante o viver;
Pudesse a alma verter, confessar
Os segredos íntimos em meu ser;
Grande eu seria, mas não pude aprender
Uma língua bem, que expressasse o pesar.
(...)
Alexander Search (1904). Poesia. Ed e Trad. Luísa Freire. Assírio&Alvim, Lisboa, 1999., p. 29
13.
(...)
«Pois quando no pensar o escuro pesa
E sobre a tua alma a noite desce,
Não regressam de novo os teus pesares?
Não fica a tua alma presa às sombras?
Não sentes em ti que o medo cresce?»
Alexander Search (1904). Poesia. Ed e Trad. Luísa Freire. Assírio&Alvim, Lisboa, 1999., p. 29
2.
Do grande ventre da noite a manhã rompeu em dor,
Sobre a terra palpitante ronca a feroz a trovoada,
O Titã acorda enfim, sua cara ensanguentada,
E o rude carvalho arranca, brutal, em seu estertor.
Em agonia mortal delira e, ao seu rugido,
Aves tremem, a costa afunda-se em mar e de terror
Rios secam, montes sucumbem no seu interior,
Rochedos fendem e o manto das nuvens é rompido.
Uiva o relâmpago, os mares extravasam em estrondo;
O gigante vacila e então, com embate hediondo
Cai, e dos tronos brilhantes as estrelas irrompem.
Caiu; a terra alarmada, em louca fúria ferida,
Fendeu, rompeu, vergou; no ar, o eco da praga ouvida;
Mas no céu, o som continuou a sorrir em seu desdém.
Alexander Search (1904). Poesia. Ed e Trad. Luísa Freire. Assírio&Alvim, Lisboa, 1999., p. 11
Fedeli, M. A mão que balança o berço. Funções do feminino em Júlio Dinis. São Paulo, 2007 Universidade de São Paulo. Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas. Departamento de Letras Clássicas e Vernáculas,.p.34
tour doit se poser l'interprète, consiste à reconnaître [...]ce que
fut la question d'abord posé, et comment fut articulée la réponse»
Jean Starobinski
sábado, 18 de setembro de 2010
Ânimo sinto de arrojar-me ao mundo,
Da terra os gozos partilhar e as penas,
Lutar com a tormenta , e ao estrondo
De naufrágio cruel suster o rosto!»
J. W. Goethe. Fausto. Trad. Agostinho D'Ornelas. Ed. ao cuidado de Paulo Quintela. , 1953, Acta Universitatis Conimbrigensis.,p 32/3
E perguntas ainda porque ansioso
Teu coração no peito confrange,
E oculto sofrer inexplicado
A energia vital em ti comprime?
Em lugar de vivente natureza.
Em cujo seio Deus criou os homens,
Rodeiam-te entre a podridão e o fumo
Somente ossadas nuas e esqueletos.»
J. W. Goethe. Fausto. Trad. Agostinho D'Ornelas. Ed. ao cuidado de Paulo Quintela. , 1953, Acta Universitatis Conimbrigensis.,p 30/1
J. W. Goethe. Fausto. Trad. Agostinho D'Ornelas. Ed. ao cuidado de Paulo Quintela. , 1953, Acta Universitatis Conimbrigensis.,p 22
Nunca ao homem que hesita ela se mostra.
Se vos dais por poetas, que a poesia
A vosso mando ceda. O que é preciso
Já de mais o sabeis; licor bem forte
245 Desejamos beber; pois sem demora
No-lo dai preparado. Não se cumpre
Amanhã o que hoje não for feito,
E nem um dia só perder se deve.
Um homem resoluto, do possível
250 Lança mão com ardor, fugir não o deixa
E na empresa prossegue, assim lhe é a força.
Sabeis que cada qual nos nossos palcos
Exp'rimenta o que quer; pois neste dia
Prospectos não poupeis nem maquinismos.
255Da lua e sol servi-vos, e aos centos
Espalhai as estrelas. Fogo e águas,
Rochedos, bosques, pássaros não faltem.
Do bastidor no acanhado espaço
A criação inteira se desdobre,
260E caminhai, com rapidez medida,
Desce o céu, pela terra, ao fundo inferno.
J. W. Goethe. Fausto. Trad. Agostinho D'Ornelas. Ed. ao cuidado de Paulo Quintela. , 1953, Acta Universitatis Conimbrigensis.,p 19/20
Em vossos cantos brilhem; mas cuidado,
Que neles a loucura também entre.
J. W. Goethe. Fausto. Trad. Agostinho D'Ornelas. Ed. ao cuidado de Paulo Quintela. , 1953, Acta Universitatis Conimbrigensis.,p 15
A saudosa lembrança. Sombras caras
Ressurgem numerosas; qual remota
Tradição esquecida, vão volvendo
Primeiro amor, antigas amizades;
A memória cruel com dor recorda
A marcha errante que seguiu a vida,
E nobres peitos lembra, que, frustrados
Pela sorte de dias deleitosos,
Antes de mim a vida terminaram.
Dedicatória
J. W. Goethe. Fausto. Trad. Agostinho D'Ornelas. Ed. ao cuidado de Paulo Quintela. , 1953, Acta Universitatis Conimbrigensis.,p 11
sexta-feira, 17 de setembro de 2010
quinta-feira, 16 de setembro de 2010
Sonho de prisão
Canti Orfici
Rita Ciotta Neves. Dino Campana, Um Poeta Maldito (seguido da tradução de quatro poemas) .Babilónia n.3 pp. 121
No quarto um cheiro a podre: há
No quarto uma chaga vermelha languescente.
As estrelas são botões de madrepérola e a noite veste-se de veludo:
E treme a noite fátua: é fátua a noite e treme mas há
No coração da noite há,
Sempre uma chaga vermelha languescente.
Canti Orfici
Rita Ciotta Neves. Dino Campana, Um Poeta Maldito (seguido da tradução de quatro poemas) .Babilónia n.3 pp. 121
São todos autores que falam da loucura. Dino Campana não fala dela, mas vive-a na pele, no corpo martirizado, na alma atormentada e recria-a através do poder mágico das palavras.
Nele, a Vida transforma-se, definitivamente, em Literatura.»
Rita Ciotta Neves. Dino Campana, Um Poeta Maldito (seguido da tradução de quatro poemas) .Babilónia n.3 pp. 115
Rita Ciotta Neves. Dino Campana, Um Poeta Maldito (seguido da tradução de quatro poemas) .Babilónia n.3 pp. 114
«Mi volevano matto per forza» (2)
Dino Campana
1 «Mas se vós tiverdes uma qualquer necessidade de criação não sentireis que sobe à vossa
volta a energia primordial que dá ossos aos vossos fantasmas?»
2 «Queriam à força que eu fosse louco »
O ESTUDANTE DE LATIM
Hermann Hesse.Contos de Amor. Trad. Maria Adélia Silva Melo. Difel, 1995., p.19/20
Ordena que às árvores subam as lagartas.»
Frédéric Mistral. Miréia. Trad. Manuel Bandeira. Editora Opera Mundi. Rio de Janeiro, 1973., p.85