E os meus olhos rasgarão a noite;
E a chuva que vier ferir-se nas vidraças
compreenderá, então, a sua inutilidade;
E todos os sinos que alimentavam insónias
hão-de repetir as horas mortas
só para os ouvidos da torre;
E os outros ruídos abafar-se-ão no manto negro da noite;
E a mão alva que me apontava as noites
e ficou debruçada no postigo
amortalhada pela neve
reviverá de novo;
E os meus braços se erguerão transfigurados
para o abraço virgem dos teus braços
que andava perdido, sem dar fé deste meu reino;
E todas as luzes que tresnoitarem os homens
apagar-se-ão;
E o silêncio virá cheio de promessas
que não se cansaram na viagem;
E todos os povos de Babel
com as riquezas que há no mundo
virão festejar a paz em minha honra;
E os caminhos se abrirão
para os homens que seguirem de mãos dadas;
O sangue derramado de Cristo
terá finalmente significação,
e da inútil cruz do martírio
se erguerá o pendão da vitória;
E assim terão começo
os sonhados dias dos meus dias!
Fernando Namora in Adolfo Casais Monteiro. A Poesia da ''Presença''. Círculo de Poesia. Moraes Editores, Lisboa, 1972., p. 342/343
segunda-feira, 17 de março de 2014
domingo, 16 de março de 2014
Donas de Casa
Algumas mulheres casam-se com casas.
É outro tipo de pele, tem um coração,
uma boca, um fígado e movimento de entranhas. As paredes são
permanentes e cor-de-rosa. Vejam como ela está ajoelhada
o dia todo, lavando-se fielmente de alto a baixo...
Os homens entram à força, atraídos como Jonas
para as suas mães carnudas.
Uma mulher é a sua própria mãe
e isso é o mais importante.
É outro tipo de pele, tem um coração,
uma boca, um fígado e movimento de entranhas. As paredes são
permanentes e cor-de-rosa. Vejam como ela está ajoelhada
o dia todo, lavando-se fielmente de alto a baixo...
Os homens entram à força, atraídos como Jonas
para as suas mães carnudas.
Uma mulher é a sua própria mãe
e isso é o mais importante.
Anne Sexton
(trad. Maria Sousa)
(trad. Maria Sousa)
Why do you come here ?
And why do you hang around ?
I'm so sorry
I'm so sorry
Why do you come here
When you know it makes things hard for me ?
When you know, oh
Why do you come ?
Why do you telephone ? (Hmm...)
And why send me silly notes ?
I'm so sorry
I'm so sorry
Why do you come here
When you know it makes things hard for me ?
When you know, oh
Why do you come ?
You had to sneak into my room
'just' to read my diary
"It was just to see, just to see"
(All the things you knew I'd written about you...)
Oh, so many illustrations
Oh, but
I'm so very sickened
Oh, I am so sickened now
Oh, it was a good lay, good lay
It was a good lay, good lay
It was a good lay, good lay
Oh
It was a good lay, good lay
It was a good lay, good lay
Oh, it was a good lay, good lay
Oh
Oh, it was a good lay
It was a good lay
Oh, a good lay
Oh, it was a good lay
Good lay, good lay
Oh
It was a good lay
And why do you hang around ?
I'm so sorry
I'm so sorry
Why do you come here
When you know it makes things hard for me ?
When you know, oh
Why do you come ?
Why do you telephone ? (Hmm...)
And why send me silly notes ?
I'm so sorry
I'm so sorry
Why do you come here
When you know it makes things hard for me ?
When you know, oh
Why do you come ?
You had to sneak into my room
'just' to read my diary
"It was just to see, just to see"
(All the things you knew I'd written about you...)
Oh, so many illustrations
Oh, but
I'm so very sickened
Oh, I am so sickened now
Oh, it was a good lay, good lay
It was a good lay, good lay
It was a good lay, good lay
Oh
It was a good lay, good lay
It was a good lay, good lay
Oh, it was a good lay, good lay
Oh
Oh, it was a good lay
It was a good lay
Oh, a good lay
Oh, it was a good lay
Good lay, good lay
Oh
It was a good lay
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NEVOEIRO
A névoa desce sobre a terra,
abraçada à noite.
Vejo, imprecisamente,
o casario e as luzes
da outra margem do rio.
Mais à direita, ao longe,
são já da névoa a praia, o mar.
Ouve-se apenas o ronco
do farol - um som molhado.
Para os lados dos pinhais,
anda a bruma a fazer medo
e a pôr mais pressa nos passos
de quem lhe quer fugir.
Não há luar, não há estrelas.
De novo, olho para o rio.
Não sei se o vejo:
anda a névoa, já, com ele
e os meus olhos dizem
o que é bruma, o que é rio.
E ela não para:
avança ao meu encontro,
cauta, subtil, insinuante...
Cerca-me.
E eu tenho, apenas
orvalho nas árvores do jardim,
gotas de água que se partem na alameda,
o ar húmido que me trespassa,
os cabelos encharcados
e pensamento de névoa...
Alberto de Serpa in Adolfo Casais Monteiro. A Poesia da ''Presença''. Círculo de Poesia. Moraes Editores, Lisboa, 1972., p. 324/5
abraçada à noite.
Vejo, imprecisamente,
o casario e as luzes
da outra margem do rio.
Mais à direita, ao longe,
são já da névoa a praia, o mar.
Ouve-se apenas o ronco
do farol - um som molhado.
Para os lados dos pinhais,
anda a bruma a fazer medo
e a pôr mais pressa nos passos
de quem lhe quer fugir.
Não há luar, não há estrelas.
De novo, olho para o rio.
Não sei se o vejo:
anda a névoa, já, com ele
e os meus olhos dizem
o que é bruma, o que é rio.
E ela não para:
avança ao meu encontro,
cauta, subtil, insinuante...
Cerca-me.
E eu tenho, apenas
orvalho nas árvores do jardim,
gotas de água que se partem na alameda,
o ar húmido que me trespassa,
os cabelos encharcados
e pensamento de névoa...
Alberto de Serpa in Adolfo Casais Monteiro. A Poesia da ''Presença''. Círculo de Poesia. Moraes Editores, Lisboa, 1972., p. 324/5
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7
- Porque esconder as lágrimas,
disfarçar a emoção que te cansa?
Fútil o motivo?
- Embora!
Chora, poeta,
chora como uma criança!
Saul Dias in Adolfo Casais Monteiro. A Poesia da ''Presença''. Círculo de Poesia. Moraes Editores, Lisboa, 1972., p. 325
disfarçar a emoção que te cansa?
Fútil o motivo?
- Embora!
Chora, poeta,
chora como uma criança!
Saul Dias in Adolfo Casais Monteiro. A Poesia da ''Presença''. Círculo de Poesia. Moraes Editores, Lisboa, 1972., p. 325
sábado, 15 de março de 2014
VIVER SEMPRE TAMBÉM CANSA!
Viver sempre também cansa!
O sol é sempre o mesmo e o céu azul,
ora é azul, nitidamente azul,
ora é cinzento, negro, quase verde...
Mas nunca tem a cor inesperada.
O mundo não se modifica!
As árvores dão flores,
folhas, frutos e pássaros,
como máquinas verdes;
As paisagens também não se transformam!
Não cai neve vermelha!
Não há flores que voem!
A lua não tem olhos
e ninguém vai pintar olhos à lua!
Tudo é igual, mecânico e exacto.
Ainda por cima os homens são homens!
Soluçam, bebem, riem e digerem
sem imaginação!
E há bairros miseráveis, sempre os mesmos;
discursos de Mussolini,
guerras, orgulhos em transe,
automóveis de corrida...
E obrigaram-me a viver até à Morte!
Pois não era mais humano,
morrer por um bocadinho,
de vez em quando,
e recomeçar depois,
achando tudo mais novo?
Ah! se eu pudesse suicidar-me por seis meses,
morrer em cima de um divã
com a cabeça sobre uma almofada,
confiante e sereno por saber
que tu velavas, meu amor do Norte!
Quando viessem perguntar por mim,
havias de dizer, com teu sorriso
onde há um coração em melodia:
«Matou-se esta manhã!
Agora não o vou ressuscitar
por uma bagatela!»
E virias, depois, suavemente,
velar por mim, subtil e cuidadosa,
pé ante pé, não fosses acordar
a morte, ainda menina, no meu colo!
Maio, 1931
José Gomes Ferreira in Adolfo Casais Monteiro. A Poesia da ''Presença''. Círculo de Poesia. Moraes Editores, Lisboa, 1972., p. 312/13
O sol é sempre o mesmo e o céu azul,
ora é azul, nitidamente azul,
ora é cinzento, negro, quase verde...
Mas nunca tem a cor inesperada.
O mundo não se modifica!
As árvores dão flores,
folhas, frutos e pássaros,
como máquinas verdes;
As paisagens também não se transformam!
Não cai neve vermelha!
Não há flores que voem!
A lua não tem olhos
e ninguém vai pintar olhos à lua!
Tudo é igual, mecânico e exacto.
Ainda por cima os homens são homens!
Soluçam, bebem, riem e digerem
sem imaginação!
E há bairros miseráveis, sempre os mesmos;
discursos de Mussolini,
guerras, orgulhos em transe,
automóveis de corrida...
E obrigaram-me a viver até à Morte!
Pois não era mais humano,
morrer por um bocadinho,
de vez em quando,
e recomeçar depois,
achando tudo mais novo?
Ah! se eu pudesse suicidar-me por seis meses,
morrer em cima de um divã
com a cabeça sobre uma almofada,
confiante e sereno por saber
que tu velavas, meu amor do Norte!
Quando viessem perguntar por mim,
havias de dizer, com teu sorriso
onde há um coração em melodia:
«Matou-se esta manhã!
Agora não o vou ressuscitar
por uma bagatela!»
E virias, depois, suavemente,
velar por mim, subtil e cuidadosa,
pé ante pé, não fosses acordar
a morte, ainda menina, no meu colo!
Maio, 1931
José Gomes Ferreira in Adolfo Casais Monteiro. A Poesia da ''Presença''. Círculo de Poesia. Moraes Editores, Lisboa, 1972., p. 312/13
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quinta-feira, 13 de março de 2014
Passei a vida a amar e a esquecer...
Florbela Espanca. Antologia da Poesia Feminina Portuguesa - António Salvado., p. 164
(...)
«E eu oiço a Noite imensa soluçar!
E eu oiço soluçar a Noite escura!
Porque és assim tão escura, assim tão
[triste?!
É que, talvez, ó Noite, em ti existe
Uma saudade igual à que eu contenho!
Saudade que eu nem sei donde me vem...
Talvez de ti, ó Noite!...Ou de ninguém!...
Que eu nunca sei quem sou, nem o que tenho!!»
Florbela Espanca. Antologia da Poesia Feminina Portuguesa - António Salvado., p. 162
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As lágrimas interiores choradas
Irene Lisboa. Antologia da Poesia Feminina Portuguesa - António Salvado., p. 159
barregã
nome feminino
antiquado pessoa que mantém uma relação amorosa com outra com a qual não é casada; amante, concubina, amásia
«E isto é a Conde Redondo em dia de todo o ano: uma rua empinada que leva à cadeia e ao manicómio Miguel Bombarda, a casas de passe, a quartéis e ao mais que há e não se vê. Boa merda tudo aquilo. O mundo é um grandessíssimo cadáver com moscas de vaivém para abrilhantar.»
José Cardoso Pires. Balada da Praia dos Cães. 2ª Edição, 1982. Edições «O Jornal», Lisboa., p. 34
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«(...) Um padre é pai, é Deus, é pecado, tudo duma assentada. Há gajas que não querem outro petisco.
Otero: Você, Covas, só lê livros depravados.
Elias: É.
José Cardoso Pires. Balada da Praia dos Cães. 2ª Edição, 1982. Edições «O Jornal», Lisboa., p. 20
Otero: Você, Covas, só lê livros depravados.
Elias: É.
José Cardoso Pires. Balada da Praia dos Cães. 2ª Edição, 1982. Edições «O Jornal», Lisboa., p. 20
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quarta-feira, 12 de março de 2014
OLHAR
Límpidas serenidades de águas claras
com algas verdes, flutuantes, lentas,
em ondulações tenuíssimas e raras...
Desmaios da manhã, em claridade,
roçando, leve, a prata silenciosa
de um lago
vago....
Dormência funda; serena eternidade
como um sonho de esfinge misteriosa...
Ondas revoltas do mar
com cadáveres de naufrágios a boiar
de bruços, olhos mergulhados
e perdidos
na busca dos abismos desejados
e nunca conseguidos...
Adolfo Casais Monteiro in Adolfo Casais Monteiro. A Poesia da ''Presença''. Círculo de Poesia. Moraes Editores, Lisboa, 1972., p. 292
com algas verdes, flutuantes, lentas,
em ondulações tenuíssimas e raras...
Desmaios da manhã, em claridade,
roçando, leve, a prata silenciosa
de um lago
vago....
Dormência funda; serena eternidade
como um sonho de esfinge misteriosa...
Ondas revoltas do mar
com cadáveres de naufrágios a boiar
de bruços, olhos mergulhados
e perdidos
na busca dos abismos desejados
e nunca conseguidos...
Adolfo Casais Monteiro in Adolfo Casais Monteiro. A Poesia da ''Presença''. Círculo de Poesia. Moraes Editores, Lisboa, 1972., p. 292
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o sabor entre os dentes dos sabores todos da noite
Adolfo Casais Monteiro in Adolfo Casais Monteiro. A Poesia da ''Presença''. Círculo de Poesia. Moraes Editores, Lisboa, 1972., p. 287
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verso solto
Os cafés estão abertos nas casas como olhos que não podem ter sono
Adolfo Casais Monteiro in Adolfo Casais Monteiro. A Poesia da ''Presença''. Círculo de Poesia. Moraes Editores, Lisboa, 1972., p. 286
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MUNDO REMOTO
Noite opaca e impenetrável
noite que parece conter todos os caminhos
a possibilidade de todas as vitórias
os segredos de todas as interrogações
noite
afinal pasmada e morta
inerte e gelada
noite enganosa
esfinge vazia que dá a treva como um sinal que parece
esperar-nos e é só indiferença
noite
flexível como um corpo de prostituta a estrear
dando-se como ela de sentidos ausentes
de sentidos fechados e fingindo
opaca e impenetrável
opaca e insensível
derramando névoas que empapam os olhos de sonho
afinal porta falsa para qualquer parte
varanda irreal sem Ocidente nem Oriente sem Norte nem
Sul
afinal como um cenário pintado
muda e distante
alheia...
(...)
Adolfo Casais Monteiro in Adolfo Casais Monteiro. A Poesia da ''Presença''. Círculo de Poesia. Moraes Editores, Lisboa, 1972., p. 283
noite que parece conter todos os caminhos
a possibilidade de todas as vitórias
os segredos de todas as interrogações
noite
afinal pasmada e morta
inerte e gelada
noite enganosa
esfinge vazia que dá a treva como um sinal que parece
esperar-nos e é só indiferença
noite
flexível como um corpo de prostituta a estrear
dando-se como ela de sentidos ausentes
de sentidos fechados e fingindo
opaca e impenetrável
opaca e insensível
derramando névoas que empapam os olhos de sonho
afinal porta falsa para qualquer parte
varanda irreal sem Ocidente nem Oriente sem Norte nem
Sul
afinal como um cenário pintado
muda e distante
alheia...
(...)
Adolfo Casais Monteiro in Adolfo Casais Monteiro. A Poesia da ''Presença''. Círculo de Poesia. Moraes Editores, Lisboa, 1972., p. 283
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INOCÊNCIA
Eu que procuro a paz e a detesto
que sonho as Babilónias, já sabendo
o cansaço que delas hei-de ter,
eu que tudo amo...e nada quero,
embora sempre em busca doutra coisa,
donde tiro ainda a força dos meus braços?
Adolfo Casais Monteiro in Adolfo Casais Monteiro. A Poesia da ''Presença''. Círculo de Poesia. Moraes Editores, Lisboa, 1972., p. 277
que sonho as Babilónias, já sabendo
o cansaço que delas hei-de ter,
eu que tudo amo...e nada quero,
embora sempre em busca doutra coisa,
donde tiro ainda a força dos meus braços?
Adolfo Casais Monteiro in Adolfo Casais Monteiro. A Poesia da ''Presença''. Círculo de Poesia. Moraes Editores, Lisboa, 1972., p. 277
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terça-feira, 11 de março de 2014
« (...); o mais, animus conspirandi ou anus conspirandi, mais cu, menos cu, soa a conversa de um empata para jornais amestrados se rirem. Elias lá para ele sabe apenas que: houve intenção, mais nada. Alguém segredou à imprensa que desviasse o caso para crime comum, apresentando o major De Cuju como um viciado de rabo para a lua a ser estraçalhado por uma matilha de arrebenta-cus.»
José Cardoso Pires. Balada da Praia dos Cães. 2ª Edição, 1982. Edições «O Jornal», Lisboa., p. 20
a agonia lenta duma alma não minha.
Adolfo Casais Monteiro in Adolfo Casais Monteiro. A Poesia da ''Presença''. Círculo de Poesia. Moraes Editores, Lisboa, 1972., p. 277
«Sim;
Mordi bocas que choravam
Para de novo as morder;
Depois, um dia, casei
Pra mais vida conhecer.»
António Botto in Adolfo Casais Monteiro. A Poesia da ''Presença''. Círculo de Poesia. Moraes Editores, Lisboa, 1972., p. 270
Mordi bocas que choravam
Para de novo as morder;
Depois, um dia, casei
Pra mais vida conhecer.»
António Botto in Adolfo Casais Monteiro. A Poesia da ''Presença''. Círculo de Poesia. Moraes Editores, Lisboa, 1972., p. 270
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« - Numa lágrima
Dizia
O meu passado e o meu presente.»
António Botto in Adolfo Casais Monteiro. A Poesia da ''Presença''. Círculo de Poesia. Moraes Editores, Lisboa, 1972., p. 269
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(...)
Anoitece nos meus olhos.
- Se vens falar-me d'amor,
vê lá bem se isso é verdade.»
António Botto in Adolfo Casais Monteiro. A Poesia da ''Presença''. Círculo de Poesia. Moraes Editores, Lisboa, 1972., p. 265
Anoitece nos meus olhos.
- Se vens falar-me d'amor,
vê lá bem se isso é verdade.»
António Botto in Adolfo Casais Monteiro. A Poesia da ''Presença''. Círculo de Poesia. Moraes Editores, Lisboa, 1972., p. 265
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OBSCURA PALAVRA DO DESERTO
"Em cada um de nós, dizia ele, há um livro que nos transforma em vocábulos, como o sangue se reforma no sangue. A cada palavra, a cada vocábulo corresponde um baque de coração.
O preço do livro é o preço de uma aliança."
Edmond Jabés. A Obscura Palavra do Deserto.
O preço do livro é o preço de uma aliança."
Edmond Jabés. A Obscura Palavra do Deserto.
segunda-feira, 10 de março de 2014
PAÍS DA MAGIA #2
"Até neste país de magia será necessário as cidades que realmente me atraem mostrarem-se insuportáveis? Eu irritava-me, ficava como doido, lamentava já não ser criança para ter o direito de gritar, chorar, bater o pé, queixar-me a alguém. O que fazer?
Só ouvia reclamações:
Telefonaram-te. Acabam de te telefonar (ou devo dizer telecomunicar?). Obrigaram-te a voltar a telefonar... Isto o que significa?... Por que não respondeste?
Porque não podem conceber que se não entendam as mensagens ocultas, não leiam nas paredes palavras em maiúsculas, três vezes sublinhadas."
"No País da Magia"
Henri Michaux
«De facto, a minha aparência é algo medonha, mas censurar-me é censurar a Deus. Pudesse eu recriar-me novamente, não te decepcionaria. Pudesse eu abarcar o mundo de pólo a pólo ou abraçar o oceano num amplexo, seria medido pela minha alma, a base da mente do homem.» |
Coração, ó coração, por males sem remédio derrubado,
ergue-te! Defende-te dos inimigos, opondo-lhes um peito
adverso, firme suportando as ciladas dos que te são hostis!
Se venceres, em demasia não rejubiles,
nem, vencido, em casa te deites em pranto.
Alegra-te antes com as alegrias, dói-te com as tristezas,
sem exagero. Aprende bem o ritmo que domina os homens.
Arquíloco, (frg. 128 W.)
ergue-te! Defende-te dos inimigos, opondo-lhes um peito
adverso, firme suportando as ciladas dos que te são hostis!
Se venceres, em demasia não rejubiles,
nem, vencido, em casa te deites em pranto.
Alegra-te antes com as alegrias, dói-te com as tristezas,
sem exagero. Aprende bem o ritmo que domina os homens.
Arquíloco, (frg. 128 W.)
carpe diem
«A solução única reservada aos homens é a fruição do momento – que Horácio haveria de formular magistralmente na máxima do carpe diem –, seja pelo envolvimento amoroso, pelo degustar de um bom vinho ou mesmo pelo prazer de uma borracheira menos contida.»
Pois o meu outrora delicado] corpo, já a velhice
me arrebatou, e brancos] se tornaram os cabelos, negros que eram.
Pesado o meu coração se tornou, não me suportam já as pernas,
em tempos ligeiras na dança, como pequenas corças.
Isso lamento a toda a hora; mas que fazer?
alguém que não envelhece é algo que não pode existir.
Safo
me arrebatou, e brancos] se tornaram os cabelos, negros que eram.
Pesado o meu coração se tornou, não me suportam já as pernas,
em tempos ligeiras na dança, como pequenas corças.
Isso lamento a toda a hora; mas que fazer?
alguém que não envelhece é algo que não pode existir.
Safo
Nós somos como as folhas que cria a florida estação
da Primavera, quando crescem depressa sob os raios do sol.
Como elas nos deleitamos num braço de tempo com as flores
da juventude, sem sabermos o que de mau ou de bom
nos virá dos deuses. Mas as negras Desgraças estão
ao nosso lado: uma delas segura o desfecho da áspera velhice;
a outra, o da morte. O fruto da juventude é tão breve
quanto é o tempo de o sol se espalhar sobre a terra.
Porém quando passa este fim de estação,
melhor do que ficar vivo é morrer logo.
Mimnermo
da Primavera, quando crescem depressa sob os raios do sol.
Como elas nos deleitamos num braço de tempo com as flores
da juventude, sem sabermos o que de mau ou de bom
nos virá dos deuses. Mas as negras Desgraças estão
ao nosso lado: uma delas segura o desfecho da áspera velhice;
a outra, o da morte. O fruto da juventude é tão breve
quanto é o tempo de o sol se espalhar sobre a terra.
Porém quando passa este fim de estação,
melhor do que ficar vivo é morrer logo.
Mimnermo
«Num epodo de Arquíloco, publicado apenas em 1973 (frg. 196a W.)7 o sujeito seduz uma jovem, comparada a uma cerva, em campos verdejantes e odoríferos, terminando por sossegá-la e quase consumar o acto sexual (vv. 42-53):
Tais foram as minhas palavras. Tomei então a donzela
e num leito de flores
a estendi. Com sedoso manto
a cobri e o seu colo rodeei com meus braços,
acalmando o seu sobressalto,
tal como uma cerva ...
Os seus seios gentis com as mãos acariciei:
tenra brilhava a sua pele,
feitiço da sua juventude .
Todo o seu belo corpo percorri
e então libertei o branco vigor,
ao toque dos seus louros cabelos?
Tais foram as minhas palavras. Tomei então a donzela
e num leito de flores
a estendi. Com sedoso manto
a cobri e o seu colo rodeei com meus braços,
acalmando o seu sobressalto,
tal como uma cerva ...
Os seus seios gentis com as mãos acariciei:
tenra brilhava a sua pele,
feitiço da sua juventude .
Todo o seu belo corpo percorri
e então libertei o branco vigor,
ao toque dos seus louros cabelos?
Cântico dos Cânticos (II. 8-13)
«Na literatura grega, a imagem mais comum é a do homem (identificado com o poeta) que persegue a sua presa por campos verdejantes, desejando tão só a consumação do amor. Ela foge, mas sabem ambos que a própria fuga é um esquema para aumentar o desejo e dar mais prazer ao encontro, que no fim se revelará inevitável.»
J. Tolentino Mendonça 21999: 12 refere já o paralelo com os textos do Papiro Harris 500 e do Papiro Chester Beatty I.
J. Tolentino Mendonça 21999: 12 refere já o paralelo com os textos do Papiro Harris 500 e do Papiro Chester Beatty I.
Imortal Afrodite do trono variegado,
filha de Zeus, urdidora de enganos, suplico-te:
com sofrimentos e angústias não subjugues,
ó rainha, o meu coração
(...)
Vem até mim, agora também! Salva-me da aflitiva
ansiedade; e para mim faz cumprir tudo o que
meu coração deseja ver cumprido; e tu própria
combate a meu lado.
filha de Zeus, urdidora de enganos, suplico-te:
com sofrimentos e angústias não subjugues,
ó rainha, o meu coração
(...)
Vem até mim, agora também! Salva-me da aflitiva
ansiedade; e para mim faz cumprir tudo o que
meu coração deseja ver cumprido; e tu própria
combate a meu lado.
BUCÓLICA
Venho de dentro, abriu-se a porta:
nem todas as horas do dia e da noite
me darão para olhar de nascente
a poente e pelo meio as ilhas.
Há um jogo de relâmpagos sobre o mundo.
De só imaginá-la a luz fulmina-me,
na outra face ainda é sombra.
Banhos de sol
nas primeiras areias da manhã.
Mansidões na pele e do labirinto só
a convulsa circunvalação do corpo.
"A Lume"
Luiza Neto Jorge
nem todas as horas do dia e da noite
me darão para olhar de nascente
a poente e pelo meio as ilhas.
Há um jogo de relâmpagos sobre o mundo.
De só imaginá-la a luz fulmina-me,
na outra face ainda é sombra.
Banhos de sol
nas primeiras areias da manhã.
Mansidões na pele e do labirinto só
a convulsa circunvalação do corpo.
"A Lume"
Luiza Neto Jorge
domingo, 9 de março de 2014
«Vira tudo isso tantas vezes, entusiasmos e desalentos, e de tal modo misturados, que compreendera de uma vez para sempre que o marido só poderia sentir-se feliz com uma existência em que esses sentimentos se alternassem. Ela já evitava acompanhá-lo nas miragens e nos fracassos.»
Fernando Namora. O Trigo e o Joio, Círculo de Leitores., p. 38
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O BELO VERSO
Apetecia-me escrever um belo verso.
Sonoro, elegante, correcto, de mármore!
Nele pôr o que outros me inspirassem.
O que ali aquele poeta estava cantando.
Ele o cantava e eu o repetia.
Acrescentava, desdobrava, acrescia da minha
[ansiedade.
Mas verso bem feito!
Cheio do que se sonha, não do que se sente.
Parece-me pobre o que sinto.
E vulgar.
Estes olhos que sem querer se envidraçam,
[fúteis, sem recato, infantis, esta
[voz insegura, enfim, tudo isto...
Que figura iriam fazer dentro de um verso ele-
[gante, lapidar?
Belo verso, trair-te-iam, roubar-te-iam toda a
[graça e até a ressonância, o êxtase
[e aquela espécie de embalo que ao
[espírito sempre dás.
Mas sinceramente me apetecia escrever um
[verso de mármore belo!
Tudo, tudo por causa daquele poema...»
Irene Lisboa. Antologia da Poesia Feminina Portuguesa - António Salvado., p. 157
ESTRELA
Legenda
para aquela estrela
azul
e fria
que me apontaste
já de madrugada:
amar
é entristecer
sem corrompermos
nada.
Carlos de Oliveira. Obras de Carlos de Oliveira. Editorial Caminho, Lisboa, 1992., p. 192
para aquela estrela
azul
e fria
que me apontaste
já de madrugada:
amar
é entristecer
sem corrompermos
nada.
Carlos de Oliveira. Obras de Carlos de Oliveira. Editorial Caminho, Lisboa, 1992., p. 192
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LÁGRIMA
A cada hora
o frio
que o sangue leva ao coração
nos gela como o rio
do tempo aos derradeiros glaciares
quando a espuma dos mares
se transformar em pedra.
Ah no deserto
do próprio céu gelado
pudesses tu suster ao menos na descida
uma estrela qualquer
e ao seu calor fundir a neve que bastasse
à lágrima pedida
pela nossa morte.
Carlos de Oliveira. Obras de Carlos de Oliveira. Editorial Caminho, Lisboa, 1992., p. 179
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O FUNDO DAS ÁGUAS
(...)
«O que me espanta é a aceitação de cada dia. E desta angústia vou tecendo as palavras, desta água salgada e doce como as lágrimas e o sangue. Tecendo escuramente as palavras.»
Carlos de Oliveira. Obras de Carlos de Oliveira. Editorial Caminho, Lisboa, 1992., p. 163
«O que me espanta é a aceitação de cada dia. E desta angústia vou tecendo as palavras, desta água salgada e doce como as lágrimas e o sangue. Tecendo escuramente as palavras.»
Carlos de Oliveira. Obras de Carlos de Oliveira. Editorial Caminho, Lisboa, 1992., p. 163
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«Eis o que torna o amor mais forte:
amar quem está tão próximo da morte.»
Carlos de Oliveira. Obras de Carlos de Oliveira. Editorial Caminho, Lisboa, 1992., p. 153
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VILANCETE CASTELHANO DE GIL VICENTE
Por mais que nos doa a vida
nunca se perca a esperança;
a falta de confiança
só da morte é conhecida.
Se a lágrimas for cumprida
a sorte, sentindo-a bem,
vereis que todo o mal vem
achar remédio na vida.
E pois que outro preço tem
depois do mal a bonança,
nunca se perca a esperança
enquanto a morte não vem.
Carlos de Oliveira. Obras de Carlos de Oliveira. Editorial Caminho, Lisboa, 1992., p. 143
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o desenho do voo antes das asas
Carlos de Oliveira. Obras de Carlos de Oliveira. Editorial Caminho, Lisboa, 1992., p. 99
«Andam os mortos enfeitando-se ao frio,
servindo-se das árvores para ter cabelos;
deslizam ao fulgor das estrelas, loiros, amarelos,
e fitam-se no tempo, ou no espelho dum rio?»
Carlos de Oliveira. Obras de Carlos de Oliveira. Editorial Caminho, Lisboa, 1992., p. 99
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cilício
nome masculino
1. vestido tosco de pele de cabra proveniente da Cilícia
2. peça de vestuário incómoda
3. cinto áspero de corda ou arame outrora usado sobre a pele para mortificação e penitência
4. figurado mortificação voluntária
(Do latim cilicĭu-, «pano da Cilícia, fabricado com pêlo de cabra»)
sábado, 8 de março de 2014
De mágoa eu tinha lágrimas em fio,
Edmundo de Bettencourt in Adolfo Casais Monteiro. A Poesia da ''Presença''. Círculo de Poesia. Moraes Editores, Lisboa, 1972., p. 198
TRINUFO
O acrobata pairava sobre um silêncio de morte. Ele suspenso por dois fios de seda vermelha e uma vara de bambu; a multidão suspensa pelo prazer doloroso de gozar o perigo que ele sofria.
De repente um grito e o acrobata caindo... Desceu num voo, tombou: e toda a gente se ergueu, gritou, a-cla-mooou!!
Agora, mesmo aqueles que só o tinham condenado, todos sorriam de completa satisfação e diziam: Que belo! Aqueles saltos no ar, aquelas idas e vindas com os braços a voar!...
Mas isto era o que ele fazia todas as noites e que raros apreciavam. Hoje, a mais, só tinha feito o cair, trabalhar mal e cair.
Quando a multidão serenou e de novo olhou a pista, então viu: as pessoas que tinham acudido levando nos braços o corpo quebrado e morto do acrobata que tinha conseguido fazer compreender o seu valor.
Branquinho da Fonseca in Adolfo Casais Monteiro. A Poesia da ''Presença''. Círculo de Poesia. Moraes Editores, Lisboa, 1972., p. 196
De repente um grito e o acrobata caindo... Desceu num voo, tombou: e toda a gente se ergueu, gritou, a-cla-mooou!!
Agora, mesmo aqueles que só o tinham condenado, todos sorriam de completa satisfação e diziam: Que belo! Aqueles saltos no ar, aquelas idas e vindas com os braços a voar!...
Mas isto era o que ele fazia todas as noites e que raros apreciavam. Hoje, a mais, só tinha feito o cair, trabalhar mal e cair.
Quando a multidão serenou e de novo olhou a pista, então viu: as pessoas que tinham acudido levando nos braços o corpo quebrado e morto do acrobata que tinha conseguido fazer compreender o seu valor.
Branquinho da Fonseca in Adolfo Casais Monteiro. A Poesia da ''Presença''. Círculo de Poesia. Moraes Editores, Lisboa, 1972., p. 196
Agnus Dei
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