segunda-feira, 28 de maio de 2012
«quando estiveres perante o doce olhar daquela cujos belos olhos tudo vêem, por ela conhecerás o caminho da tua vida.»
Dante. A Divina Comédia (Tomo I). Tradução Rui Viana Pereira. Ediclube., p. 43
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«(...) a vida sórdida que os deformou fá-los irreconhecíveis.»
Dante. A Divina Comédia (Tomo I). Tradução Rui Viana Pereira. Ediclube., p. 33
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domingo, 27 de maio de 2012
atavismo
nome masculino
condição que exprime o reaparecimento, num indivíduo, de caracteres que pertenciam a gerações antepassadas e que tinham já deixado de se
manifestar |
(Do latim atăvu-, «antepassado; pai do trisavô» +-ismo)
segunda-feira, 21 de maio de 2012
« - Tu és ingénuo e pedante...patrão, salvo o devido respeito - disse finalmente. - Tudo o que digo é como se estivesse a cantar.
- Como assim? - protestei eu. - Compreendo-te muito bem, Zorba!
- Sim, compreendes com a cabeça. Tu dizes: «Isso é justo, é assim, ou não é assim; tens razão ou não tens. Mas a que nos leva isso? Eu, enquanto tu falas, observo os teus braços, o teu peito. Pois bem, que fazem eles? Ficam mudos. Nada dizem. Como se não tivessem uma gota de sangue. Então como queres tu compreender? Com a cabeça? Pff!»
Nikos Kazantzaki. O Bom Demónio. Tradução de Fernando Soares. Editora Ulisseia, Lisboa,p. 239
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«As maravilhosas catedrais que encontramos nas grandes cidades ruidosas e ateias são conchas vazias», pensava eu. Monstros pré-históricos, de que resta só o esqueleto roído pelas chuvas e pelo sol.»
Nikos Kazantzaki. O Bom Demónio. Tradução de Fernando Soares. Editora Ulisseia, Lisboa,p. 222
Nikos Kazantzaki. O Bom Demónio. Tradução de Fernando Soares. Editora Ulisseia, Lisboa,p. 222
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«Tal como o grão de trigo, também tu, meu coração, deves mergulhar na terra e morrer. Não tenhas receio. Senão, como te poderás tornar espiga? Como poderás tu alimentar os homens que morrem de fome?»
Nikos Kazantzaki. O Bom Demónio. Tradução de Fernando Soares. Editora Ulisseia, Lisboa,p. 218
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«Cala-te!Cala-te! - gritou. - Porque me dizes isso patrão? Porque me envenenas o coração? Eu estava bem aqui; porque me transtornas? Tinha fome, e o bom Deus ou o Diabo ( que eu seja enforcado se vejo alguma diferença) dava-me um osso que eu lambia. E mexia a cauda dizendo: «Obrigado! Obrigado!» Agora...
Nikos Kazantzaki. O Bom Demónio. Tradução de Fernando Soares. Editora Ulisseia, Lisboa,p. 199
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''Só eu era impotente e racional, o sangue não me fervia, não amava nem odiava com paixão.''
«Só eu era impotente e racional, o sangue não me fervia, não amava nem odiava com paixão. Ainda agora tentara compor as coisas, deixando tudo, a cargo do destino.»
Nikos Kazantzaki. O Bom Demónio. Tradução de Fernando Soares. Editora Ulisseia, Lisboa,p. 177
Nikos Kazantzaki. O Bom Demónio. Tradução de Fernando Soares. Editora Ulisseia, Lisboa,p. 177
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«Pela minha carta, compreenderás como sou um homem infeliz. É só quando falo contigo que tenho a esperança de aliviar um bocado a minha neurastenia. Pois tu tens, como eu, um diabo dentro de ti, mas não sabes ainda como ele se chama, e, como não sabes, abafas. Baptiza-o, patrão, e alivias-te!»
Nikos Kazantzaki. O Bom Demónio. Tradução de Fernando Soares. Editora Ulisseia, Lisboa,p. 160
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«Eu também, patrão, tenho assim um diabo em mim e chamo-lhe Zorba. O Zorba de dentro não quer envelhecer, não envelheceu, nunca envelhecerá. É um comilão, tem os cabelos pretos como um corvo, trinta e dois dentes e um cravo vermelho atrás da orelha. Mas ao Zorba de fora deu-lhe a bolha, pobre-diabo, apareceram-lhe os cabelos brancos, tem rugas, está encarquilhado, os dentes caem-lhe e a grande barriga está cheia de pêlos brancos da velhice, de compridas crinas de burro.»
Nikos Kazantzaki. O Bom Demónio. Tradução de Fernando Soares. Editora Ulisseia, Lisboa,p. 159
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«Numa outra vida», murmurei, sorrindo amargamente, «numa outra vida conduzir-me-ei melhor!»
Nikos Kazantzaki. O Bom Demónio. Tradução de Fernando Soares. Editora Ulisseia, Lisboa,p. 135
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'' o coração do homem é uma sepultura cheia de sangue''
Nikos Kazantzaki. O Bom Demónio. Tradução de Fernando Soares. Editora Ulisseia, Lisboa,p. 131
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Mulher
«Quem criou portanto esse dédalo da incerteza, esse templo de presunção, esse cântaro de pecados, esse campo semeado de mil ardis, essa porta do Inferno, esse cesto transbordante de astúcias, esse veneno que lembra o mel, essa cadeia que prende os mortais à terra: a mulher?»
Nikos Kazantzaki. O Bom Demónio. Tradução de Fernando Soares. Editora Ulisseia, Lisboa,p. 124
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domingo, 20 de maio de 2012
Neste círculo são castigados os culpados de gula
«É o terceiro círculo, o da chuva eterna, maldita, fria e densa, que cai sempre abundante e com a mesma persistência. Grande granizo, água negra e neve caem em turbilhão através das trevas, a terra enlameada exala um odor hediondo. Cerbero, fera cruel e monstruosa, ladra com as três caninas fauces contra os infelizes que ali permanecem submersos. Tem olhos avermelhados, pelagem negra e hirsuta, ventre desmedido; e com as patas crava as unhas nos condenados, arranca-lhes a pele e esquarteja-os. A chuva fá-los uivar; umas vezes os desgraçados apresentam um lado do corpo à chuva, outras vezes o outro.»
Dante. A Divina Comédia (Tomo I). Tradução Rui Viana Pereira. Ediclube., p. 29/30
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turba
nome feminino
1. | magote de gente; multidão |
2. | povo; vulgo |
3. | coro de vozes;
em turba tumultuosamente
|
(Do latim turba-, «idem»)
Perguntei ainda: «Mestre, que amarga dor os faz lamentarem-se tanto?»
Dante. A Divina Comédia (Tomo I). Tradução Rui Viana Pereira. Ediclube., p. 20
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«Antes de mim nada foi criado»
Dante. A Divina Comédia (Tomo I). Tradução Rui Viana Pereira. Ediclube., p. 19
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«Porque guardas tanta cobardia no coração?»
Dante. A Divina Comédia (Tomo I). Tradução Rui Viana Pereira. Ediclube., p. 18
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pugnar
verbo transitivo
1. | tomar a defesa de (algo ou alguém); defender |
2. | combater; lutar; pelejar |
3. | discutir
acaloradamente |
(Do latim pugnāre, «idem»)
«Se bem compreendi as tuas palavras - respondeu a sombra veneranda - a tua alma está possuída do medo que muitas vezes impede o homem de prosseguir uma empresa honrada, como uma sombra irreal assusta a fera que devassa a escuridão.»
Dante. A Divina Comédia (Tomo I). Tradução Rui Viana Pereira. Ediclube., p. 17
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Rosa Celeste: Dante and Beatrice gaze upon the highest Heaven, The Empyrean,século XIX, Alighieri, Dante; Cary, Henry Francis (ed) (1892) "Canto XXXI " in The Divine Comedy by Dante, Illustrated, Complete London, Paris & Melbourne: Cassell & Company
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Canto Primeiro
«Dante, afundado no pântano do pecado (a selva escura)
pelas paixões da luxúria, da soberba e da avareza,
simbolizadas por feras no poema, anseia por libertar-se
e é auxiliado na fuga por Virgílio»
Dante. A Divina Comédia (Tomo I). Tradução Rui Viana Pereira. Ediclube
pelas paixões da luxúria, da soberba e da avareza,
simbolizadas por feras no poema, anseia por libertar-se
e é auxiliado na fuga por Virgílio»
Dante. A Divina Comédia (Tomo I). Tradução Rui Viana Pereira. Ediclube
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sábado, 19 de maio de 2012
Misantropo
Arrefeceu. Tenho andado a apanhar lenha,
Com os dedos entorpecidos, quase insensíveis,
Revolvendo as folhas quebradiças para encontrar
Galhos húmidos. Tenho andado curvado
Toda a tarde, empilhando-os para secar,
E, toda a tarde, tenho ouvido, vezes sem conta,
Duas notas decrescentes: uma suave e melancólica melodia,
Como se uma ave chamasse, do seu abrigo de ramos,
Agora não, agora não, agora não.
Dos silvados, retiro um a um galhos para queimar.
Surpreendido pela sombra, ergo-me e vejo,
Ficando meio cego, o frio pôr-de-sol vermelho
Por entre os ramos enredados de uma árvore sem folhas.
Recordo-me de anteriores poentes, especialmente em
Que assim coloria o ferro, branco acinzentado
E escurecido, e o cimento enrugado de um posto de sentinela
Com o seu alaranjado frio. Deixem-me ver, um segundo,
Agora não, agora não, agora não.
É tão dolorosa e apagada essa recordação,
Embora eu ali também vivesse o dia-a-dia.
Porém a comparação torna-se consciente
Do calor e da luz ténues, que eram
Ou pareceram ter sido menos ténues que hoje.
A ave cala-se. Indiferente neste instante isolado
Eu sei que, ouvindo o vento agitar-se num galho,
Sempre hei-de escutar assim um incessante
Agora não, agora não, agora não.
Thom Gunn. A Destruição do Nada e outros poemas. Tradução de Maria de Lourdes Guimarães. Relógio D' Água, Lisboa, 1993., p. 35
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« - O seu secreto e silencioso desgosto.»
Thom Gunn. A Destruição do Nada e outros poemas. Tradução de Maria de Lourdes Guimarães. Relógio D' Água, Lisboa, 1993., p. 31
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quinta-feira, 17 de maio de 2012
quarta-feira, 16 de maio de 2012
''Escolhera permanecer morto,''
Thom Gunn. A Destruição do Nada e outros poemas. Tradução de Maria de Lourdes Guimarães. Relógio D' Água, Lisboa, 1993., p. 17
«E como uma esposa hei-de ensinar-te
A seres como eu sou, como tudo o que eu sou.»
Thom Gunn. A Destruição do Nada e outros poemas. Tradução de Maria de Lourdes Guimarães. Relógio D' Água, Lisboa, 1993., p. 11
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«Ensinei-te a falar, demos um nome às aves,
Anotaste então as suas grandes migrações
Como qualquer criança.»
Thom Gunn. A Destruição do Nada e outros poemas. Tradução de Maria de Lourdes Guimarães. Relógio D' Água, Lisboa, 1993., p. 11
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''Eu fui tudo o que sou e fui o que não sou.''
Thom Gunn. A Destruição do Nada e outros poemas. Tradução de Maria de Lourdes Guimarães. Relógio D' Água, Lisboa, 1993., p. 11
«Tive de deixar sarar aqueles vales iluminados pela tempestade.»
Thom Gunn. A Destruição do Nada e outros poemas. Tradução de Maria de Lourdes Guimarães. Relógio D' Água, Lisboa, 1993., p. 9
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«Era eu próprio: sem estar sujeito ao fôlego de outro homem: »
Thom Gunn. A Destruição do Nada e outros poemas. Tradução de Maria de Lourdes Guimarães. Relógio D' Água, Lisboa, 1993
Thom Gunn. A Destruição do Nada e outros poemas. Tradução de Maria de Lourdes Guimarães. Relógio D' Água, Lisboa, 1993
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sexta-feira, 11 de maio de 2012
«Virá um dia em que um olhar tranquilo estabelecerá a ordem e a unidade no laborioso caos que começa amanhã.»
(Fevereiro de 1940
Cesare Pavese. Trabalhar Cansa. Tradução e introdução de Carlos Leite. Edições Cotovia, Lisboa, 1997., p. 311
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«És a grande fadiga
e a noite que sacia.»
e a noite que sacia.»
Cesare Pavese. Trabalhar Cansa. Tradução e introdução de Carlos Leite. Edições Cotovia, Lisboa, 1997., p. 329
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«Tu não mudas. És escura.»
Cesare Pavese
Trabalhar Cansa. Tradução e introdução de Carlos Leite. Edições Cotovia, Lisboa, 1997., p. 325
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A PROPÓSITO DE CERTAS POESIAS AINDA NÃO ESCRITAS
«(...) virá um momento em que faremos poemas cansados, vazios de promessas, aqueles que justamente assinalarão o fim da aventura.»
Cesare Pavese.Trabalhar Cansa. Tradução e introdução de Carlos Leite. Edições Cotovia, Lisboa, 1997., p. 299
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O Ofício de Poeta
«Tornava-me cada vez mais capaz de subentendidos, de meios tons, duma composição rica, e cada vez menos convencido da necessidade do meu trabalho.»
(...)
«Obstinava-me em narrar e não podia, certamente, perder-me na decoração gratuita.Mas é um facto que as minhas imagens - as minhas relações imaginárias - se complicavam, ramificando-se incessantemente
em atmosferas rarefeitas.»
em atmosferas rarefeitas.»
(Novembro de 1934)
Cesare Pavese. Trabalhar Cansa. Tradução e introdução de Carlos Leite. Edições Cotovia, Lisboa, 1997., p. 299
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''Não há coisa mais amarga do que a aurora dum dia
em que nada acontecerá. Não há coisa mais amarga
do que a inutilidade. Pende cansada no céu
uma estrela esverdeada, surpreendida pela madrugada.
Vê o mar ainda escuro e a mancha de fogo
a que o homem, para fazer alguma coisa, se aquece;
vê e cai de sono entre as pardas montanhas
onde há um leito de neve. A lentidão da hora
não tem piedade de quem já nada espera.''
em que nada acontecerá. Não há coisa mais amarga
do que a inutilidade. Pende cansada no céu
uma estrela esverdeada, surpreendida pela madrugada.
Vê o mar ainda escuro e a mancha de fogo
a que o homem, para fazer alguma coisa, se aquece;
vê e cai de sono entre as pardas montanhas
onde há um leito de neve. A lentidão da hora
não tem piedade de quem já nada espera.''
Cesare Pavese. Trabalhar Cansa. Tradução e introdução de Carlos Leite. Edições Cotovia, Lisboa, 1997., p. 273
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''Depois, na noite que faz desaparecer o mar, escuta-se
o grande vazio que há sob as estrelas.''
o grande vazio que há sob as estrelas.''
Cesare Pavese. Trabalhar Cansa. Tradução e introdução de Carlos Leite. Edições Cotovia, Lisboa, 1997., p. 269
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segunda-feira, 7 de maio de 2012
«Tinha caído tanto, que se tivesse de escolher entre ficar apaixonado por uma mulher e ler um bom livro sobre o amor, teria escolhido o livro.»
Nikos Kazantzaki. O Bom Demónio. Tradução de Fernando Soares. Editora Ulisseia, Lisboa,p. 112
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carpideira
nome feminino
1. | pessoa a quem se paga para chorar os defuntos durante os funerais |
2. | figurado mulher que anda sempre a lastimar-se |
3. | figurado lamúria; choradeira |
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«Grécia, pátria, dever, na verdade nada querem dizer, mas é por esse nada que vamos morrer voluntariamente.»
Mas porque te escrevo isto? Para te dizer que nada esqueci do que vivemos juntos. Para ter também uma ocasião de exprimir aquilo que nunca, por causa do hábito bom ou mau que adoptámos de nos contermos, me é possível revelar quando estamos juntos.
Agora que não estás na minha frente, que não vês a minha cara e que não corro o risco de parecer ridículo, digo-te que te amo muito.»
Nikos Kazantzaki. O Bom Demónio. Tradução de Fernando Soares. Editora Ulisseia, Lisboa,p. 103
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«Bem sabes como estas meditações cruéis, longe de me fazerem recuar, são, pelo contrário atiçadoras indispensáveis da minha chama interior.»
Nikos Kazantzaki. O Bom Demónio. Tradução de Fernando Soares. Editora Ulisseia, Lisboa,p. 101
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«Ao espírito voltam todas as recordações amargas enterradas no coração - separações de amigos, sorrisos de mulheres que se apagaram, esperanças que perderam as asas como borboletas de que só resta o verme. E o verme está pousado nas folhas do meu coração e rói-as.»
Nikos Kazantzaki. O Bom Demónio. Tradução de Fernando Soares. Editora Ulisseia, Lisboa,p. 99
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O bom demónio
A mulher é a história eterna.
« Amaste-a assim tanto, a essa Nussa? - perguntei uns instantes mais tarde.
Zorba abriu os olhos.
- Tu és novo, patrão, és novo, não podes compreender. Quando também tiveres cabelos brancos, voltaremos a falar dessa eterna história.
-Que história eterna?
- A mulher, claro! Quantas vezes é preciso repetir-te? A mulher é uma história eterna. Para já, és como os galos novos que cobrem as galinhas em dois tempos e em três movimentos e depois incham o papo, sobrem ao monte de estrume e põem-se a cantar e a pavonear-se. Não é para a galinha que olham, é para a crista deles. Sendo assim, podem perceber do amor? Nada de nada.»
Nikos Kazantzaki. O Bom Demónio. Tradução de Fernando Soares. Editora Ulisseia, Lisboa,p. 97-8
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O bom demónio
« - É que já tenho cabelos brancos, patrão, e os dentes começam a tremer; já não tenho tempo a perder. Tu és novo, podes ter paciência ainda. Eu não posso. Palavra de honra, quanto mais velho me faço, mais selvagem fico! Não me venham cá contar que a velhice abranda o homem e lhe acalma o ardor! Nem que ao ver a morte ele estica o pescoço, dizendo: «Corta-me a cabeça, se fazes o favor, para que eu vá para o Céu!» Eu, quanto mais velho mais rebelde. Não cedo, quero conquistar o mundo!»
Nikos Kazantzaki. O Bom Demónio. Tradução de Fernando Soares. Editora Ulisseia, Lisboa,p. 65
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domingo, 6 de maio de 2012
«Vale a pena ter fome ou ter sido traído
pela boca mais doce, só para sair com aquele céu
e voltar a encontrar no hálito as mais diáfanas recordações.»
Cesare Pavese. Trabalhar Cansa. Tradução e introdução de Carlos Leite. Edições Cotovia, Lisboa, 1997., p. 253
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REVOLTA
O morto está todo torcido e não olha para as estrelas:
tem os cabelos colados ao empedrado. A noite pôs-se mais fria.
Os vivos regressam a casa ainda a tremer.
É difícil acompanhá-los; dispersam-se todos
e um sobe as escadas, outro desce à adega.
E outro caminha até de madrugada e deita-se num prado,
ao sol. Amanhã no trabalho, alguém fará um sorriso
de desespero. Depois, também isto passará.
Quando dormem, parecem o morto: se também há uma mulher,
é mais pesado o odor, mas parecem mortos.
Cada corpo agarra-se, torcido, à cama,
como ao rubro empedrado: o longo cansaço
que dura desde a aurora vale bem uma breve agonia.
Sobre cada corpo coagula uma escuridão suja.
Solitário, o outro corpo morto está estendido às estrelas.
Também parece morto o monte de farrapos que o sol
escalda com força, encostado ao muro. Dormir
na rua demonstra confiança no mundo.
Há uma barba entre os farrapos e percorrem-na
moscas atarefadas; na rua, os transeuntes vão e vêm
como moscas; o pedinte faz parte da rua.
A miséria recobre de barba os sorrisos tensos.
como uma erva, e dá um aspecto pacato. Este velho
que podia morrer todo torcido, em sangue,
parece mais uma coisa e está vivo. Assim,
tirando o sangue, cada coisa é uma parte da rua.
E no entanto as estrelas viram sangue na rua.
Cesare Pavese. Trabalhar Cansa. Tradução e introdução de Carlos Leite. Edições Cotovia, Lisboa, 1997., p. 229
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envilecer
verbo transitivo,
intransitivo e pronominal
1. | tornar(-se) vil; rebaixar(-se) |
2. | diminuir o valor (de); depreciar(-se) |
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«A casa parece vazia e contudo encerra o indispensável, tão ecrto é que o homem verdadeiro precisa de poucas coisas.»
Nikos Kazantzaki. O Bom Demónio. Tradução de Fernando Soares. Editora Ulisseia, Lisboa,p. 65
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« - Aborreci-te, patrão? - disse, deixando de sorrir.
Tínhamos chegado à nossa choupana. Zorba olhou-me com ternura e inquietação.
Não respondi. Senti que o meu espírito estava de acordo com Zorba, mas o coração resistia, queria arremessar-se, romper a animalidade, abrir um caminho.
-Não tenho sono esta noite, Zorba - disse eu. - Vai deitar-te tu.
As estrelas cintilavam, o mar suspirava e beijava as conchas, um pirilampo acendeu sobre o ventre o seu pequeno farol erótico. Os cabelos da noite escorriam de orvalho.»
-Não tenho sono esta noite, Zorba - disse eu. - Vai deitar-te tu.
As estrelas cintilavam, o mar suspirava e beijava as conchas, um pirilampo acendeu sobre o ventre o seu pequeno farol erótico. Os cabelos da noite escorriam de orvalho.»
Nikos Kazantzaki. O Bom Demónio. Tradução de Fernando Soares. Editora Ulisseia, Lisboa,p. 64
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sábado, 5 de maio de 2012
''Quando eu morrer, tudo morrerá.''
Nikos Kazantzaki. O Bom Demónio. Tradução de Fernando Soares. Editora Ulisseia, Lisboa,p. 63
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«Quando o patrão é duro, os operários, temem-no, respeitam-no e trabalham. Quando o patrão é fraco, tiram-lhe as rédeas e andam devagar. »
Nikos Kazantzaki. O Bom Demónio. Tradução de Fernando Soares. Editora Ulisseia, Lisboa,p. 61
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«De repente gritou
que se o mundo sofria, se a luz do sol
arrancava blasfémias, não era o destino:
o culpado era o homem. Ao menos pudéssemos partir,
rebentar de fome em liberdade, dizer não
a uma vida que utiliza o amor e a piedade,
a família, o bocado de terra, para nos atar as mãos.»
Cesare Pavese. Trabalhar Cansa. Tradução e introdução de Carlos Leite. Edições Cotovia, Lisboa, 1997., p. 229
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« (...) Aprendeu a medir
pela sua própria fadiga a fome dos outros,
e em todo o lado encontrou injustiças.»
Cesare Pavese. Trabalhar Cansa. Tradução e introdução de Carlos Leite. Edições Cotovia, Lisboa, 1997., p. 227
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PAISAGEM IV
(Para a Tina)
Os dois homens fumam na margem. A mulher que nada
sem quebrar a água apenas vê o verde
do seu estreito horizonte. Entre o céu e as árvores
estende-se a água e a mulher desliza nela
sem corpo. No céu pousam nuvens
quase imóveis. O fumo detém-se no ar.
Sob o gelo da água também há erva. A mulher
atravessa-a, suspensa: mas nós calcamo-la,
a erva verde, com o corpo. Em toda aquela água não há
outro peso. Só nós os dois sentimos a terra.
Talvez o seu corpo alongado, submerso,
sinta o gelo voraz absorver-lhe o torpor
dos membros escaldantes de sol, dissolvendo-a viva
no verde imóvel. A sua cabeça não se mexe.
Também ela estava deitada onde a erva está calcada.
O seu rosto semioculto repousava no braço
e olhava a erva. Não falávamos.
No ar paira ainda aquela primeira comoção
das águas que a acolheram. Por cima de nós paira o fumo.
Agora alcançou a margem e fala, o seu corpo escuro,
gotejante, ergue-se entre os troncos.
A sua voz é bem o único som que se ouve por sobre a água
-rouca e fresca, é a mesma voz de antes.
Pensemos, deitados
na margem, naquele verde mais escuro e mais fresco
que submergiu o seu corpo. Depois, um de nós
mergulha na água e atravessa, mostrando os ombros
em braçadas espumosas, o verde imóvel.
Cesare Pavese. Trabalhar Cansa. Tradução e introdução de Carlos Leite. Edições Cotovia, Lisboa, 1997., p. 199
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sexta-feira, 4 de maio de 2012
JANTAR TRISTE
É por baixo da ramada, depois do jantar.
Em baixo há água que corre dócil.
Estamos calados, a escutar e a olhar para o rumor
que faz a água ao passar no rego lunar.
Este tempo suspenso é o momento mais doce.
A minha companheira goza o momento
e parece ainda morder o cacho de uvas,
tão cheia de vida é a sua boca: e o sabor perdura,
têm a doçura das uvas, mas os ombros firmes
e as faces bronzeadas encerram todo o Verão.
Na toalha branca ficaram pão e uvas.
Vazias, as duas cadeiras olham-se cara a cara.
Quem sabe que coisa ilumina o rego lunar
com aquele seu lume doce, nos bosques distantes.
Talvez antes da aurora um sopro mais frio
extinga a lua e os vapores e apareça alguém.
Uma frágil claridade mostraria a garganta
sobressaltada e as mãos febris fecharem-se
em vão sobre os alimentos. Continua o sobressalto da água,
mas no escuro. As uvas e pão continuam no mesmo sítio.
Os sabores atormentam a sombra esfomeada,
que nem sequer consegue lamber no cacho
o orvalho que já se condensa. E com todas as coisas perladas
na aurora, as cadeiras olham-se solitárias.
Por vezes, à beira da água, um cheiro,
como de uvas, de mulher, paira sobre a erva,
e a lua esvai-se em silêncio. Aparece alguém.
mas atravessa incorpóreo o arvoredo e lamenta-se
com aquele gemido rouco dos que não têm voz
e se estendem na erva e não encontram a terra:
tremem-lhe as narinas, somente. Está frio quando o dia nasce,
e estreitar um corpo seria a vida.
Mais difusa que o amarelo lunar, que tem horror
e filtrar-se nos bosques, é esta ânsia sôfrega
de contactos e sabores que macera os mortos.
Outras vezes no solo atormenta-os a chuva.
Na toalha branca ficaram pão e uvas.
Vazias, as duas cadeiras olham-se cara a cara.
Quem sabe que coisa ilumina o rego lunar
com aquele seu lume doce, nos bosques distantes.
Talvez antes da aurora um sopro mais frio
extinga a lua e os vapores e apareça alguém.
Uma frágil claridade mostraria a garganta
sobressaltada e as mãos febris fecharem-se
em vão sobre os alimentos. Continua o sobressalto da água,
mas no escuro. As uvas e pão continuam no mesmo sítio.
Os sabores atormentam a sombra esfomeada,
que nem sequer consegue lamber no cacho
o orvalho que já se condensa. E com todas as coisas perladas
na aurora, as cadeiras olham-se solitárias.
Por vezes, à beira da água, um cheiro,
como de uvas, de mulher, paira sobre a erva,
e a lua esvai-se em silêncio. Aparece alguém.
mas atravessa incorpóreo o arvoredo e lamenta-se
com aquele gemido rouco dos que não têm voz
e se estendem na erva e não encontram a terra:
tremem-lhe as narinas, somente. Está frio quando o dia nasce,
e estreitar um corpo seria a vida.
Mais difusa que o amarelo lunar, que tem horror
e filtrar-se nos bosques, é esta ânsia sôfrega
de contactos e sabores que macera os mortos.
Outras vezes no solo atormenta-os a chuva.
Cesare Pavese. Trabalhar Cansa. Tradução e introdução de Carlos Leite. Edições Cotovia, Lisboa, 1997., p. 195-197
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quinta-feira, 3 de maio de 2012
«Não há cama mais solitária para quem ao romper do dia
ainda dorme estendido, sonhando com a escuridão.»
Cesare Pavese. Trabalhar Cansa. Tradução e introdução de Carlos Leite. Edições Cotovia, Lisboa, 1997., p. 179
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terça-feira, 1 de maio de 2012
domingo, 29 de abril de 2012
«Eu não reflectia, nada procurava, não tinha qualquer dúvida. Vivia na certeza.»
Nikos Kazantzaki. O Bom Demónio. Tradução de Fernando Soares. Editora Ulisseia, Lisboa,p. 53
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No fim dos meus dias
Porque te encontrei...
Nikos Kazantzaki. O Bom Demónio. Tradução de Fernando Soares. Editora Ulisseia, Lisboa,p. 50
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« Jovem ou decrépita, bela ou feia, isso eram os pormenores sem importância, variantes. Por detrás de cada mulher levanta-se, austera, cheia de mistério, a face de Afrodite.
Ora, este rosto que Zorba via era a ele que falava e desejava; dona Hortênsia não passava de uma máscara efémera e transparente que Zorba rasgava para beijar a boca eterna.
- Levanta o teu pescoço de neve, meu tesouro - continuou em tom de súplica anelante -, levanta o teu pescoço de neve, e deita cá para fora a tua canção!»
Nikos Kazantzaki. O Bom Demónio. Tradução de Fernando Soares. Editora Ulisseia, Lisboa,p. 50
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«Eu, meu filho, ajo como se nunca devesse morrer». Eu respondo-lhe: «Eu ajo como se devesse morrer a cada instante.»
Nikos Kazantzaki. O Bom Demónio. Tradução de Fernando Soares. Editora Ulisseia, Lisboa,p. 42
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«Parei um instante no areal e olhei. A santa solidão estendia-se na minha frente, triste e fascinante como o deserto. O poema búdico elevou-se do solo e insinuou-se até ao fundo do meu ser. « Quando é que, enfim, me hei-de retirar na solidão, só, sem companheiros, sem alegria e sem tristeza, só com a certeza de que tudo não passa de um sonho? Quando é que, com os meus farrapos - e sem desejos - me hei-de retirar cheio de alegria para a montanha? Quando é que, vendo que o meu corpo não passa de doença e crime, velhice e morte - livre, sem medo, cheio de alegria - me hei-de retirar na floresta? Quando? Quando? Quando?»
Nikos Kazantzaki. O Bom Demónio. Tradução de Fernando Soares. Editora Ulisseia, Lisboa,p. 31
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« - Que podes tu dizer? - disse, medindo-me com o olhar ... - Se bem percebo, a tua senhoria nunca teve fome, nunca matou, nunca roubou, nunca se deitou com a mulher do próximo. Que podes tu saber, pois, do mundo? Espírito puro, carne que não conhece o sol... - murmurou com evidente desprezo.»
Nikos Kazantzaki. O Bom Demónio. Tradução de Fernando Soares. Editora Ulisseia, Lisboa,p. 28
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O homem é um animal feroz quando novo; sim, patrão, um homem feroz que come homens!
«Mas, naquela época, estás a ver que me fervia o sangue, Não me ficava a esmiuçar a questão. Para pensar bem e honestamente é preciso ter calma, idade e falta de dentes. Quando já não se tem dentes é fácil de dizer: «É uma vergonha, rapazes, não mordam mais!» Mas quando temos os trinta e dois dentes...O homem é um animal feroz quando novo; sim, patrão, um homem feroz que come homens!»
Nikos Kazantzaki. O Bom Demónio. Tradução de Fernando Soares. Editora Ulisseia, Lisboa,p. 27
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« - Aborrece-te falar, Zorba?
- Não é que me aborreça, patrão - respondeu -, mas custa-me fazê-lo.
-Custa-te? Porquê?
Não respondeu imediatamente. Passeou lentamente, mais uma vez o olhar ao longo da margem. Tinha dormido na ponte e os cabelos grisalhos e ondulados pingavam do orvalho. Todas as rugas profundas do rosto, do queixo e do pescoço eram iluminadas até ao fundo pelo Sol nascente. Por fim os lábios grossos e pendentes, como os de um bode, mexeram.
- De manhã custa-me a abrir a boca. Custa-me muito, desculpa.»
Nikos Kazantzaki. O Bom Demónio. Tradução de Fernando Soares. Editora Ulisseia, Lisboa,p. 25/6
- Não é que me aborreça, patrão - respondeu -, mas custa-me fazê-lo.
-Custa-te? Porquê?
Não respondeu imediatamente. Passeou lentamente, mais uma vez o olhar ao longo da margem. Tinha dormido na ponte e os cabelos grisalhos e ondulados pingavam do orvalho. Todas as rugas profundas do rosto, do queixo e do pescoço eram iluminadas até ao fundo pelo Sol nascente. Por fim os lábios grossos e pendentes, como os de um bode, mexeram.
- De manhã custa-me a abrir a boca. Custa-me muito, desculpa.»
Nikos Kazantzaki. O Bom Demónio. Tradução de Fernando Soares. Editora Ulisseia, Lisboa,p. 25/6
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« - Luas velhas! - murmurava com desprezo. - Não têm vergonha!
- Que quer isso dizer: luas velhas, Zorba?
- Mas tudo isso: reis, democracias, deputados! Que mascarada!»
Nikos Kazantzaki. O Bom Demónio. Tradução de Fernando Soares. Editora Ulisseia, Lisboa,p. 22
- Que quer isso dizer: luas velhas, Zorba?
- Mas tudo isso: reis, democracias, deputados! Que mascarada!»
Nikos Kazantzaki. O Bom Demónio. Tradução de Fernando Soares. Editora Ulisseia, Lisboa,p. 22
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diatribe
nome feminino
escrito ou discurso violento que critica ou acusa alguém; crítica severa; catilinária; injúria |
(Do grego diatribé, «discussão», pelo francês diatribe, «crítica violenta»)
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significados
«(...) .Diz-se com razão que o homem só encontra o seu verdadeiro caminho quando põe de lado as quimeras da juventude e assenta firmemente os pés em terreno sólido.»
Nikolai Gógol. Almas Mortas. Círculo de Leitores, 1ª Edição, 1977, p. 156
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BAGAÇO EM SETEMBRO
As manhãs passam claras e desertas
nas margens do rio que de madrugada se enevoa
e escurece o seu verde enquanto espera o sol.
O tabaco que vendem na última casa
ainda húmida, na orla dos prados, tem uma cor
quase negra e um sabor sumarento: o fumo é azulado.
Também têm bagaço, da cor da água.
Chegou o momento em que tudo pára
e amadurece. As árvores ao longe estão quietas:
tornaram-se mais escuras. Escondem frutos
que ao mínimo abanão cairiam. As nuvens esparsas
têm uma polpa madura. Ao longe, nas avenidas,
todas as casas amadurecem à calidez do céu.
A esta hora só se vêem mulheres. As mulheres não fumam
e não bebem, sabem simplesmente estar ao sol
e recebê-lo tépido, como se fossem frutos.
O ar, cru por causa da névoa, bebe-se aos golos
como bagaço, todas as coisas exalam um sabor a bagaço.
Até a água do rio bebeu as margens
e macera-as no fundo, sob o céu. As ruas
são como as mulheres, amadurecem paradas.
A esta hora todos devíamos parar
na rua e ver como tudo amadurece.
Há até uma brisa que não altera as nuvens,
mas que basta para dirigir o fumo azulado
sem o romper: é um novo sabor que passa.
E o tabaco impregnou-se de bagaço. E assim as mulheres
não serão as únicas a gozar a manhã.
Cesare Pavese. Trabalhar Cansa. Tradução e introdução de Carlos Leite. Edições Cotovia, Lisboa, 1997., p. 163-165
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«O rio corre tranquilo,
mas os pássaros fazem-no espumar.»
Cesare Pavese. Trabalhar Cansa. Tradução e introdução de Carlos Leite. Edições Cotovia, Lisboa, 1997., p. 139
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poeta italiano
Verrà la morte e avrà i tuoi occhi
Verrà la morte e avrà i tuoi occhi -
questa morte che ci accompagna
dal mattino alla sera, insonne,
sorda, come un vecchio rimorso
o un vizio assurdo. I tuoi occhi
saranno una vana parola,
un grido taciuto, un silenzio.
Così li vedi ogni mattina
quando su te sola ti pieghi
nello specchio. O cara speranza,
quel giorno sapremo anche noi
che sei la vita e sei il nulla
Per tutti la morte ha uno sguardo.
Verrà la morte e avrà i tuoi occhi.
Sarà come smettere un vizio,
come vedere nello specchio
riemergere un viso morto,
come ascoltare un labbro chiuso.
Scenderemo nel gorgo muti.
questa morte che ci accompagna
dal mattino alla sera, insonne,
sorda, come un vecchio rimorso
o un vizio assurdo. I tuoi occhi
saranno una vana parola,
un grido taciuto, un silenzio.
Così li vedi ogni mattina
quando su te sola ti pieghi
nello specchio. O cara speranza,
quel giorno sapremo anche noi
che sei la vita e sei il nulla
Per tutti la morte ha uno sguardo.
Verrà la morte e avrà i tuoi occhi.
Sarà come smettere un vizio,
come vedere nello specchio
riemergere un viso morto,
come ascoltare un labbro chiuso.
Scenderemo nel gorgo muti.
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«Nada mais há a fazer do que olhar para aquela brancura maligna
por baixo da negra canícula e esperar que chova.»
Cesare Pavese. Trabalhar Cansa. Tradução e introdução de Carlos Leite. Edições Cotovia, Lisboa, 1997., p. 131
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«Podemos encontrarmo-nos, querendo.»
Cesare Pavese. Trabalhar Cansa. Tradução e introdução de Carlos Leite. Edições Cotovia, Lisboa, 1997., p. 115
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«Jazíamos cansados na humidade
dos dois corpos, adormecidos um sobre o outro.»
Cesare Pavese. Trabalhar Cansa. Tradução e introdução de Carlos Leite. Edições Cotovia, Lisboa, 1997., p. 113
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«Chove sem ruído no prado do mar.»
Cesare Pavese. Trabalhar Cansa. Tradução e introdução de Carlos Leite. Edições Cotovia, Lisboa, 1997., p. 97
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quarta-feira, 25 de abril de 2012
NOCTURNO
A colina é nocturna, no céu claro.
Nela se enquadra a tua cabeça, que mal se move
e acompanha o céu. És como uma nuvem
entrevista pelos ramos. Ri-se-te nos olhos
a estranheza dum céu que não é o teu.
A colina de terra e folhas encerra
com a sua negra massa o teu olhar vivo,
a tua boca tem a prega duma doce cavidade
no meio das encostas distantes. Pareces brincar
à grande colina e à claridade do céu:
para me dares prazer, repetes a paisagem antiga
e torna-la mais pura.
Mas vives noutro lugar.
O teu terno sangue fez-se noutro lugar.
As palavras que dizes não têm comparação
com a tristeza áspera deste céu.
És apenas uma nuvem dulcíssima, branca,
que uma noite ficou presa nos ramos antigos.
Cesare Pavese. Trabalhar Cansa. Tradução e introdução de Carlos Leite. Edições Cotovia, Lisboa, 1997., p. 81
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''Cada árvore tem o seu próprio suor frio no escuro''
Cesare Pavese. Trabalhar Cansa. Tradução e introdução de Carlos Leite. Edições Cotovia, Lisboa, 1997., p. 63
«Como uma espécie de remorso, há a lembrança de um quarto nu, longe, num país estrangeiro. Lá onde esteve quase a morrer de fome. De solidão. Uma vez acordou de madrugada a gritar. Imaginou, num lampejo terrível, que acabava de enlouquecer. Durante o sono, a solidão passada e presente acumulara-se nele e gerara loucura.»
Herberto Helder. Os Passos Em Volta. Assírio & Alvim, Lisboa, 2006., p. 193
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Assim se perde uma vida
«O homem comprou o seu bilhete e ei-lo a percorrer países como se trouxesse dentro de si, acesa, uma lâmpada - e para ela todo se inclinasse enquanto as cidades, os povos, as línguas, são atravessados, abandonados - eximidos às atenções e tentações da ternura. Assim se perde uma vida, ou serviu ela apenas para este ganho obscuro: a pureza adquirida na desordem, e depois a fusão dos dias múltiplos numa única noite originária. Redil. Volta ao redil, e diz: - tresmalhado - com tal sentimento de extravio redimido que o júbilo mortificado pulsa nele como pura vitalidade, celebração comovida - a grande salvação.»
Herberto Helder. Os Passos Em Volta. Assírio & Alvim, Lisboa, 2006., p. 191
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«Porque somos como as árvores, presos a um lugar, respirando através de uma lei calma e perene.»
Herberto Helder. Os Passos Em Volta. Assírio & Alvim, Lisboa, 2006., p. 190
Herberto Helder. Os Passos Em Volta. Assírio & Alvim, Lisboa, 2006., p. 190
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«Que angustiosa, esta voracidade, esta fusão analfabeta com a instável matéria do mundo!»
..........
«Existo, existe o universo.»
Herberto Helder. Os Passos Em Volta. Assírio & Alvim, Lisboa, 2006., p. 182
..........
«Existo, existe o universo.»
Herberto Helder. Os Passos Em Volta. Assírio & Alvim, Lisboa, 2006., p. 182
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«Tive infância, só isso. Ou seja: falta de jeito, indecisão, uma grande ignorância. Olhava para as coisas: eram fundas, enigmáticas, desorientadoras. Tudo estava cheio, porque o meu coração ávido tudo recebia: era um espaço palpitamente vazio.»
Herberto Helder. Os Passos Em Volta. Assírio & Alvim, Lisboa, 2006., p. 181/2
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«Obscuros somos sempre, mesmo sem pedi-lo.»
Herberto Helder. Os Passos Em Volta. Assírio & Alvim, Lisboa, 2006., p. 170
Herberto Helder. Os Passos Em Volta. Assírio & Alvim, Lisboa, 2006., p. 170
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abstruso
adjetivo
1. | desordenado |
2. | impenetrável; obscuro |
(Do latim abstrūsu-, «idem», particípio passado de abstrudĕre, «ocultar»)
Mas este homem perturba-me.
«Poderia amá-lo, erguê-lo da sua dolorosa confusão, colocá-lo numa dignidade de que, é evidente, perdeu o sentido. Agita-se de um lado para o outro com as grandes mãos bantendo contra as pernas, magro e cheio de uma fome terrível.»
Herberto Helder. Os Passos Em Volta. Assírio & Alvim, Lisboa, 2006., p. 162
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domingo, 22 de abril de 2012
tartufo
nome masculino
indivíduo hipócrita; velhaco; devoto
fingido |
(Do italiano Tartufo, antropónimo, personagem da comédia italiana, aproveitada por Molière, pelo francês Tartufe, «idem»)
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Louis-Ferdinand Céline,
significados
«Hoje, nada sei de quem me amou ou me ama.»
Herberto Helder. Os Passos Em Volta. Assírio & Alvim, Lisboa, 2006., p. 151
Herberto Helder. Os Passos Em Volta. Assírio & Alvim, Lisboa, 2006., p. 151
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A vida solitária forneceu copioso alimento à sua avareza
«A vida solitária forneceu copioso alimento à sua avareza. Esta paixão, como se sabe, possui um apetite de lobo: quanto mais devora menos se sacia. Os sentimentos humanos, que nele nunca tinham sido muito profundos, foram-se desvanecendo a pouco e pouco. Essa ruína ambulante degradava-se de dia para dia.»
Nikolai Gógol. Almas Mortas. Círculo de Leitores, 1ª Edição, 1977, p. 126
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Nikolai Gógol
«No maciço de verde folhagem, inundado de sol, abriam-se às vezes abismos de sombra.»
Nikolai Gógol. Almas Mortas. Círculo de Leitores, 1ª Edição, 1977, p. 120
Nikolai Gógol. Almas Mortas. Círculo de Leitores, 1ª Edição, 1977, p. 120
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