quinta-feira, 17 de janeiro de 2013

«Haveria, porventura, latente na parvinha uma metade masculina, pelo que suportar o marido significava para ela a destruição da sua própria alma?»



Robert Walser. O Salteador. Tradução de Leopoldina Almeida. Relógio D' Água, Lisboa, 2003., p. 40
«Ela calou-se e assumiu um ar tal como o que paira em volta de uma figura de mulher desenhada por
Dürer, um ar esquivo como o de uma ave nocturna sobrevoando os mares por entre a treva, algo como um gemido reprimido no seu íntimo. Ele nunca mais ouviu falar desse casamento. As parvinhas sabem, melhor do que ninguém, mergulhar num silêncio obstinado, são mestras no prazer que sentem em proceder com o maior dos tactos. Comportam-se, perante a obstinação, com o mesmo tacto com que se comportam perante o desprezo, e vão engolindo a sua dor, pedaço a pedaço, ultrapassando as desilusões que lhes são infligidas, sempre com suave elegância.» 
 
 
 
Robert Walser. O Salteador. Tradução de Leopoldina Almeida. Relógio D' Água, Lisboa, 2003., p. 39
«E ela, então, fora casada com um homem como há milhares deles por aí - e, decerto, muitas outras mulheres teriam sido felizes com um homem assim - só que ela não foi feliz, porque era uma parvinha, assim chamada. Lá no fundo, mesmo no fundo, ela tinha orgulho na parvinha que nela habitava. Achava-se superior com esse seu pequeno toque de parvoíce.»
 
 
Robert Walser. O Salteador. Tradução de Leopoldina Almeida. Relógio D' Água, Lisboa, 2003., p. 38

segunda-feira, 14 de janeiro de 2013

«nuvem sonolenta»

«O cinto da castidade com horríveis dentes eriçados.»


Czeslaw Milosz e Wislawa Szymborska. Alguns gostam de poesia. Selecção, instrodução e tradução do polaco Elzbieta Milewska e Sérgio das Neves. Cavalo de Ferro, Lisboa, 1ª ed. 2004., p. 79

Deitava-me nu junto ao mar
Nas ilhas desertas.

Arrastava-me para o pélago
A baleia branca do mundo.

E agora não sei
O que foi verdade.



Czeslaw Milosz e Wislawa Szymborska. Alguns gostam de poesia. Selecção, instrodução e tradução do polaco Elzbieta Milewska e Sérgio das Neves. Cavalo de Ferro, Lisboa, 1ª ed. 2004., p. 67

A tua voz

Maldiz a morte. É-nos injustamente dada.
Implora aos deuses por uma morte santa.
Quem és tu? Um pouco de ambição, de desejo e de sonhos
que não merece o castigo da agonia prolongada.
Só não sei o que podes fazer sozinho com a morte dos outros:
das crianças envoltas em chamas, das mulheres baleadas,
dos soldados feitos cegos
e que agonizam dias e dias, aqui e agora, ao teu lado.
Sem abrigo é a tua piedade, muda é a tua voz
e temes a sentença porque nada pudeste fazer.



Czeslaw Milosz e Wislawa Szymborska. Alguns gostam de poesia. Selecção, instrodução e tradução do polaco Elzbieta Milewska e Sérgio das Neves. Cavalo de Ferro, Lisboa, 1ª ed. 2004., p. 53

"Die Young"


«às vezes, numa raiva de apetite,
lanço os meus fios de caça, e apanho
algum bicho menor, algum mosquito,»




António Franco Alexandre. Aracne. Assírio & Alvim, Lisboa, 2004, p. 13
«E quem me diz que, belo então que fosse,
conservaria ainda o privilégio
de me sentar no teu joelho, e ver
os exactos mistérios do teu sexo?»



António Franco Alexandre. Aracne. Assírio & Alvim, Lisboa, 2004, p. 11

quarta-feira, 2 de janeiro de 2013

Relieved. They walked a long way together...


''murmúrios melancólicos''


 
«O que certamente não veríeis eram as lágrimas, que humediam a carta, e outras que desciam as faces, e paravam aos cantos dos lábios, como se aí esperassem que um sorriso de esperança outra vez as embebesse no coração.»



Camilo Castelo Branco. Estrelas Propícias. Obras Completas. Publicadas sob a direcção de Justino Mendes de Almeida. Vol. IV Romances/Novelas. Lello & Irmão Editores, Porto, 1985., p. 184/5

terça-feira, 1 de janeiro de 2013


trigo vermelho

«Se tu soubesses», disse Deus,
«como pode ser longa a eternidade

(---)



Alain Bosquet. O Tormento de Deus. Tradução de Jorge Guimarães. Quetzal Editores, Lisboa, 1992., p. 84

«Não tenho língua própria:
eu comunico
sem estar certo que me compreendam.»



Alain Bosquet. O Tormento de Deus. Tradução de Jorge Guimarães. Quetzal Editores, Lisboa, 1992., p. 81
«Pergunto-me quem sou»,
disse Deus, «o espírito, a carne ou o que na carne
se quer espírito;
a noite, o dia ou o que no dia
experimenta pela noite mais ternura.
Talvez que seja eu um compromisso
entre o ser e o não ser,
à custa de mim mesmo:
o vazio e o de mais do vazio,
nada mais que o meu nome,
uma sílaba de sangue
que não se deveria enunciar,
ou um verbo que mata.
Sou a tua vogal, ó música;
ó silêncio, a tua consoante.»


Alain Bosquet. O Tormento de Deus. Tradução de Jorge Guimarães. Quetzal Editores, Lisboa, 1992., p. 77

Ferenc Berko - Bombay, 1942



Deus disse: «Eu sou teu alimento mais saudável,
o trigo, o vinho e a palurda,
o anho, o mel e a amora selvagem.
Para me comeres, lava as mãos e a alma,
veste as melhores roupas
e toma-me depois entre os teus lábios.
Deverás mastigar-me muito tempo,
pois meus sabores são tantos!
Trarei assim a força aos teus pulmões,
aos teus joelhos,
e aos subúrbios do teu cérebro.
Mal te tenha alimentado o coração,
tornar-me-ei teu sangue.
Eu sou a tua química mais pura.»




Alain Bosquet. O Tormento de Deus. Tradução de Jorge Guimarães. Quetzal Editores, Lisboa, 1992., p. 75
«Para crer, é preciso sangrar», disse Deus,
«e que a plenitude provoque o conflito,
e que a eternidade seja intragável.
Para aceder a mim, deve a alma arrastar-se,
como um boi, até esse matadouro
que é a esperança.
Para ser-se digno
de um absoluto que jamais conhecerás,
é preciso nascer e morrer,
três vezes por dia, até à volúpia.»


Alain Bosquet. O Tormento de Deus. Tradução de Jorge Guimarães. Quetzal Editores, Lisboa, 1992., p. 66
«Vai ao deserto», disse Deus,
«e prosterna-te, a fronte sobre a pedra:
três noites depois tornar-te-ás teu duplo.
Vai a um monte,
saúda a neve e as suas lavas,
para mereceres ser monte.
Vai a ti mesmo,
perguntando-te se a tua aorta,
e os teus pulmões, são habitáveis:
tornar-te-ás teu próprio sangue.
Vai além do desconhecido
e dize, lento, a palavra deus:
ou morrerás aí,
ou serei eu a cair morto.»
 
 
 
 
Alain Bosquet. O Tormento de Deus. Tradução de Jorge Guimarães. Quetzal Editores, Lisboa, 1992., p. 61

«Reconhecer-me-ás: sou simples e vulgar.»

Alain Bosquet. O Tormento de Deus. Tradução de Jorge Guimarães. Quetzal Editores, Lisboa, 1992., p. 57

O homem queixa-se:
«Tu deste-me um corpo
mais pequeno que o corpo da montanha.
Deste-me um cérebro
com que não posso compreender-me.
Deste-me um coração
que não serve para me aceitar.
Deste-me palavras
que são um luxo na minha desordem.
deste-me um deus
o qual não sei quem é, se eu, se tu.»


Alain Bosquet. O Tormento de Deus. Tradução de Jorge Guimarães. Quetzal Editores, Lisboa, 1992., p. 56

«tu incomodas-me.»


«Deus decidiu que o homem, tendo razão,
deveria morrer.»



Alain Bosquet. O Tormento de Deus. Tradução de Jorge Guimarães. Quetzal Editores, Lisboa, 1992., p. 52
Deus disse:
«A minha angústia é profunda:
criei este universo, e não sei porquê.
O sol canta, cercado pelas poldras.
O sol saúda-me
com suas ilhas ténues,
e o poeta escreve uma ode
para me explicar quem devo ser.
A minha angústia é profunda e as estrelas
estão longe de mais para consolar-me.»



Alain Bosquet. O Tormento de Deus. Tradução de Jorge Guimarães. Quetzal Editores, Lisboa, 1992., p. 37

«Se eu envelheci», disse Deus, «substituam-me:
não se deve guardar um soberano
que se afunda em incerteza.
Apresentar-vos-ei a deuses competentes,
com três, quatro lições dadas por mim
de tacto e divindade.
Irei só para o hospício,
levando algumas almas,
algumas músicas.
Não me lamentem:
tomei, junto de vós, gosto por ser.»



Alain Bosquet. O Tormento de Deus. Tradução de Jorge Guimarães. Quetzal Editores, Lisboa, 1992., p. 36

Inferno

 
« - O inferno dos vivos não é uma coisa que virá a existir; se houver um, é o que está aqui, o inferno que habitamos todos os dias, que nós formamos ao estarmos juntos. Há dois modos para não o sofrermos. O primeiro torna-se fácil para muita gente: aceitar o inferno e fazer parte dele a ponto de já não o vermos. O segundo é arriscado e exige uma atenção e uma aprendizagem contínuas: tentar e saber reconhecer, no meio do inferno, que e o que não é inferno, e fazê-lo viver, e dar-lhe lugar.»



Italo Calvino. As Cidades Invisíveis.Tradução de José Colaço Barreiros.Editorial Teorema, Lisboa, 1990., p. 166

«,(...) sorriem, um com o outro com a boca suja de amoras.»



Italo Calvino. As Cidades Invisíveis.Tradução de José Colaço Barreiros.Editorial Teorema, Lisboa, 1990., p. 148

segunda-feira, 31 de dezembro de 2012

Kublai

Pensou: «Se todas as cidades forem como um jogo de xadrez, no dia em que eu chegar a conhecer as suas regras possuirei finalmente o meu império, mesmo que nunca consiga conhecer todas as cidades que contém.»
 
 
 
Italo Calvino. As Cidades Invisíveis.Tradução de José Colaço Barreiros.Editorial Teorema, Lisboa, 1990., p. 123

quinquilharias

 
KUBLAI: - Assim demonstrámos que se nós existíssemos, não existiríamos.
POLO: - De facto, aqui estamos.
 
 
 
Italo Calvino. As Cidades Invisíveis.Tradução de José Colaço Barreiros.Editorial Teorema, Lisboa, 1990., p. 120

 
«É claro que são os vivos que pedem para depois de mortos um destino diferente do que lhes calhou»
 
 
Italo Calvino. As Cidades Invisíveis.Tradução de José Colaço Barreiros.Editorial Teorema, Lisboa, 1990., p. 111

domingo, 30 de dezembro de 2012

brocado


nome masculino

 tecido de seda com motivos em relevo, de fio de prata ou ouro

(Do italiano broccato, «fazenda bordada»)

''tábuas cheias de pregos''

''ruas betuminosas''

'' a forma das coisas distingue-se melhor com a distância.»

Italo Calvino. As Cidades Invisíveis.Tradução de José Colaço Barreiros.Editorial Teorema, Lisboa, 1990., p. 102
«Uma vendedeira de hortaliças pesava uma couve na balança e punha-a num cesto pendurado numa corda que uma rapariga deitara de uma varanda. A rapariga era igual a uma da minha terra que enlouquecera por amor e se matara. A vendedeira levantou a cabeça: era a minha avó.»


Italo Calvino. As Cidades Invisíveis.Tradução de José Colaço Barreiros.Editorial Teorema, Lisboa, 1990., p. 97

Nancy L. Safford. Limousin, France. 1977 - 1983.


funâmbulo


nome masculino

 1. equilibrista que anda ou dança em corda bamba
2. figurado o que muda de opinião ou partido; indivíduo inconstante
3. ZOOLOGIA espécie de esquilo indiano

(Do latim funambŭlu-, «funâmbulo»)

«-As imagens da memória, depois de fixadas com as palavras, apagam-se - disse Polo. - Talvez eu tenha medo de perder Veneza toda de uma vez, se falar dela.Ou talvez, ao falar de outras cidades, já venha a perdê-la pouco a pouco.»


Italo Calvino. As Cidades Invisíveis.Tradução de José Colaço Barreiros.Editorial Teorema, Lisboa, 1990., p. 90

motejo

  nome masculino

1. acto ou efeito de motejar; zombaria, troça
2. dito picante ou jocoso; dichote

  (Derivação regressiva de motejar, ou do castelhano motejo, «idem»)

 
   «Ora muitos anos de abundância tinham atulhado os celeiros. Os rios em cheia arrastaram florestas de traves destinadas a suster tectos de bronze de templos e palácios. Caravanas de escravos deslocaram montanhas de mármore serpentino através do continente. O Grão Kan contempla um império recoberto de cidades que têm peso sobre a terra e sobre os homens, a abarrotar de riquezas e de movimento, repleto de ornamentos e de incumbências, complicado de mecanismos e de hierarquias, inchado, largo, pesado.
   «É o seu próprio peso que está a esmagar o império», pensa Kublai, e nos seus sonhos ora surgem cidades leves como papagaios de papel, cidades perfuradas como rendas, cidades transparentes como mosquiteiros, cidades nervuras de folhas, cidades linhas da mão, cidades filigrana para ver através da sua opaca e fictícia espessura.»



Italo Calvino. As Cidades Invisíveis.Tradução de José Colaço Barreiros.Editorial Teorema, Lisboa, 1990., p. 75

contrassenso

«Quando o ar sobre as túlipas é doce,
sou eu», disse Deus.
«Quando o peixe dourado
pede ao lago que se anime
para uma serenata,
sou eu.
Quando o vento do estio adormece sob as pedras
e explode no fundo das antigas torres
arrastando consigo a cabeça das estátuas,
sou eu.
Quando o verbo todo o poderoso
larga os seus lobos, que somam dez mil,
nos oásis, nas florestas, na escuma das vagas,
sou eu.
Quando a dúvida,
como escura ferrugem,
rói a estrela
até ao fim do esqueleto,
eu não sei
se sois vós
se sou eu, se é um outro deus.»


Alain Bosquet. O Tormento de Deus. Tradução de Jorge Guimarães. Quetzal Editores, Lisboa, 1992., p. 30


«Deixem-me só
na minha dificuldade: evoluo dia e noite
condeno-me à metamorfose.»


Alain Bosquet. O Tormento de Deus. Tradução de Jorge Guimarães. Quetzal Editores, Lisboa, 1992., p. 24
Deus disse
«Quero ser um fardo a todo o incréu.»


Alain Bosquet. O Tormento de Deus. Tradução de Jorge Guimarães. Quetzal Editores, Lisboa, 1992., p. 22

«Estou triste», disse Deus,
«por ter nascido adulto.
Jamais tive uma infância
nem alguma vez me permitiram
a descoberta de um mundo
já formado.
Não encontrei ninguém
a quem dizer: 'Bom dia, meu pai',
nem 'Minha mãe, como é que tem passado?'
Não me sinto sem culpa.
Todos eles - o silex, a lava, a peónia,
o mosquito, o homem, o zéfiro,
exigiam que eu fosse activo e responsável.
Estou triste:
falta-me um passado.»


Alain Bosquet. O Tormento de Deus. Tradução de Jorge Guimarães. Quetzal Editores, Lisboa, 1992., p. 14

Bohemian Cigarmakers at Work in Their Tenement


La Belle Dame Sans Merci

Ah, what can ail thee, wretched wight,

Alone and palely loitering;

The sedge is wither'd from the lake,

And no birds sing.



Ah, what can ail thee, wretched wight,

So haggard and so woe-begone?

The squirrel's granary is full,

And the harvest's done.



I see a lily on thy brow,

With anguish moist and fever dew;

And on thy cheek a fading rose

Fast withereth too.



I met a lady in the meads

Full beautiful, a faery's child;

Her hair was long, her foot was light,

And her eyes were wild.



I set her on my pacing steed,

And nothing else saw all day long;

For sideways would she lean, and sing

A faery's song.



I made a garland for her head,

And bracelets too, and fragrant zone;

She look'd at me as she did love,

And made sweet moan.



She found me roots of relish sweet,

And honey wild, and manna dew;

And sure in language strange she said,

I love thee true.



She took me to her elfin grot,

And there she gaz'd and sighed deep,

And there I shut her wild sad eyes—

So kiss'd to sleep.



And there we slumber'd on the moss,

And there I dream'd, ah woe betide,

The latest dream I ever dream'd

On the cold hill side.



I saw pale kings, and princes too,

Pale warriors, death-pale were they all;

Who cry'd — "La belle Dame sans merci

Hath thee in thrall!"



I saw their starv'd lips in the gloam

With horrid warning gaped wide,

And I awoke, and found me here

On the cold hill side.



And this is why I sojourn here

Alone and palely loitering,

Though the sedge is wither'd from the lake,

And no birds sing.
 
 
 
 



La Belle Dame Sans Merci / Valentin Silvestrov: Silent Songs
«Prometo-vos corrigir,
assim que eu possa, tantos erros.»


Alain Bosquet. O Tormento de Deus. Tradução de Jorge Guimarães. Quetzal Editores, Lisboa, 1992., p. 13

''Estoutro deus''


fuligem

«Porque te deténs com melancolias inessenciais?»

Italo Calvino. As Cidades Invisíveis.Tradução de José Colaço Barreiros.Editorial Teorema, Lisboa, 1990., p. 62
«Que hora é esta, que erva cresce na nossa juventude?»
 
Antonio Gamoneda. Descrição da Mentira. Tradução de Vasco Gato. Edições Quasi, 2003., p. 61

sábado, 29 de dezembro de 2012


«Cada distância tem o seu silêncio»

Antonio Gamoneda. Descrição da Mentira. Tradução de Vasco Gato. Edições Quasi, 2003., p. 43
 
«O outono expressa-se como pássaros invisíveis. Que farias tu se a tua memória estivesse cheia de esquecimento, que farias tu num país ao qual não querias chegar?»
 
 
Antonio Gamoneda. Descrição da Mentira. Tradução de Vasco Gato. Edições Quasi, 2003., p. 39
«Que lugar é este, que lugar é este? Como estás ainda no meu coração?»
 
 
Antonio Gamoneda. Descrição da Mentira. Tradução de Vasco Gato. Edições Quasi, 2003., p. 38

armistício

armistício

nome masculino
cessação das hostilidades por comum acordo dos beligerantes por um prazo determinado, a partir de certo dia e hora; trégua ou suspensão de hostilidades
(Do latim diplomático armistitĭu-, «deposição das armas»)


armistício In Infopédia [Em linha]. Porto: Porto Editora, 2003-2012. [Consult. 2012-12-29].
Disponível na www: http://www.infopedia.pt/pesquisa-global/armist%C3%ADcio
armistício
nome masculino
cessação das hostilidades por comum acordo dos beligerantes por um prazo determinado, a partir de certo dia e hora; trégua ou suspensão de hostilidades
(Do latim diplomático armistitĭu-, «deposição das armas


armistício In Infopédia [Em linha]. Porto: Porto Editora, 2003-2012. [Consult. 2012-12-29].
Disponível na www: http://www.infopedia.pt/pesquisa-global/armist%C3%ADcio
nome masculino

 cessação das hostilidades por comum acordo dos beligerantes por um prazo determinado, a partir de certo dia e hora; trégua ou suspensão de hostilidades

(Do latim diplomático armistitĭu-, «deposição das armas»)

terça-feira, 25 de dezembro de 2012

«Muitas vezes, não queremos que percebam o que dizemos e nem sequer queremos perceber-nos a nós próprios.»



Robert Walser. O Salteador. Tradução de Leopoldina Almeida. Relógio D' Água, Lisboa, 2003., p. 32

terça-feira, 18 de dezembro de 2012

''(...), viúva expulsa dos teus lençóis.''

Antonio Gamoneda. Descrição da Mentira. Tradução de Vasco Gato. Edições Quasi, 2003., p. 34

hortênsia

 ou hidrângea

                      ou hortense

''Aquilo que aconteceu não é mais que destruição.''

Antonio Gamoneda. Descrição da Mentira. Tradução de Vasco Gato. Edições Quasi, 2003., p. 30

segunda-feira, 17 de dezembro de 2012


Adão e Eva

Olhámo-nos um dia,
E cada um de nós sonhou que achara
O par que a alma e a cara lhe pedia.

- E cada um de nós sonhou que o achara...

E entre nós dois
Se deu, depois, o caso da maçã e da serpente,
... Se deu, e se dará continuamente:

Na palma da tua mão,
Me ofertaste, e eu mordi, o fruto do pecado.

- Meu nome é Adão...

E em que furor sagrado
Os nossos corpos nus e desejosos
Como serpentes brancas se enroscaram,
Tentando ser um só!

Ó beijos angustiados e raivosos
Que as nossas pobres bocas se atiraram
Sobre um leito de terra, cinza e pó!

Ó abraços que os braços apertaram,
Dedos que se misturaram!

Ó ânsia que sofreste, ó ânsia que sofri,
Sede que nada mata, ânsia sem fim!
- Tu de entrar em mim,
Eu de entrar em ti.

Assim toda te deste,
E assim todo me dei:

Sobre o teu longo corpo agonizante,
Meu inferno celeste,
Cem vezes morri, prostrado...
Cem vezes ressuscitei
Para uma dor mais vibrante
E um prazer mais torturado.

E enquanto as nossas bocas se esmagavam,
E as doces curvas do teu corpo se ajustavam
Às linhas fortes do meu,
Os nossos olhos muito perto, imensos,
No desespero desse abraço mudo,
Confessaram-se tudo!
... Enquanto nós pairávamos, suspensos
Entre a terra e o céu.

Assim as almas se entregaram,
Como os corpos se tinham entregado,
Assim duas metades se amoldaram
Ante as barbas, que tremeram,
Do velho Pai desprezado!

E assim Eva e Adão se conheceram:

Tu conheceste a força dos meus pulsos,
A miséria do meu ser,
Os recantos da minha humanidade,
A grandeza do meu amor cruel,
Os veios de oiro que o meu barro trouxe...

Eu, os teus nervos convulsos,
O teu poder,
A tua fragilidade
Os sinais da tua pele,
O gosto do teu sangue doce...

Depois...

Depois o quê, amor? Depois, mais nada,
- Que Jeová não sabe perdoar!

O Arcanjo entre nós dois abrira a longa espada...

Continuamos a ser dois,
E nunca nos pudemos penetrar!
 
José Régio

O vinho...

 
«O vinho dá-nos o conhecimento dos estados de alma. Tomamos conhecimento de tudo e de nada, ao mesmo tempo. O vinho confere novo brilho à cortesia. Se fores apreciador de vinho és também apreciador de mulheres e um defensor daquilo que lhes é caro. As relações entre homem e mulher, mesmo as mais complexas, revelam-se com toda a simplicidade, desabrochando de dentro de um copo de vinho como se fossem flores. Todas as canções dedicadas ao vinho devem ser reconhecidas como legítimas.»



Robert Walser. O Salteador. Tradução de Leopoldina Almeida. Relógio D' Água, Lisboa, 2003., p. 24

''lava-pés''

 
«Muitas pessoas que se mostram arrogantes sofrem de falta de coragem, muitas que são orgulhosas sofrem de falta de orgulho e muitas, ainda, que são fracas, não possuem força de ânimo para reconhecer a sua fraqueza. Muitas vezes os fracos comportam-se como fortes, os despeitados como satisfeitos, os humilhados como orgulhosos, os vaidosos como modestos; é o que acontece comigo, por exemplo, que nunca me vejo ao espelho, e isso apenas por vaidade, posto que o espelho é para mim insolente e malcriado.»



Robert Walser. O Salteador. Tradução de Leopoldina Almeida. Relógio D' Água, Lisboa, 2003., p. 14

domingo, 16 de dezembro de 2012

 
«Os habitantes de Valdrada sabem que todos os seus actos são ao mesmo tempo esse acto e a imagem especular, q que pertence a especial dignidade das imagens, e esta sua consciência proíbe-os de se abandonarem por um só instante ao acaso e ao esquecimento. Mesmo quando os amantes dão voltas aos corpos nus pele contra pele procurando a maneira de se colocarem para ter um do outro maior prazer, mesmo quando os assassinos empurram a faca para dentro das veias negras do pescoço e quanto mais sangue grumoso jorrar mais afundam a lâmina que desliza entre os tendões, não é tanto o seu unir-se ou trucidar-se que importa quanto o unir-se ou o trucidar-se das suas imagens límpidas e frias no espelho.»



Italo Calvino. As Cidades Invisíveis.Tradução de José Colaço Barreiros.Editorial Teorema, Lisboa, 1990., p. 55

''carrocel das fantasias''

malentendidos

 
«Assim entre os que por acaso se encontram juntos a abrigar-se da chuva debaixo de um pórtico, ou se apinham devaixo dos toldos de um bazar, ou param para ouvir a banda no coreto da praça, consumam-se encontros, seduções, ligações, cópulas, orgias, sem que troquem uma palavra, sem que se toquem com um dedo, quase sem se olharem.»


Italo Calvino. As Cidades Invisíveis.Tradução de José Colaço Barreiros.Editorial Teorema, Lisboa, 1990., p. 53


“I meet you. I remember you. Who are you? You’re destroying me. You’re good for me. How could I know this city was tailor-made for love? How could I know you fit my body like a glove? I like you. How unlikely. I like you. How slow all of a sudden. How sweet. You cannot know. You’re destroying me. You’re good for me. You’re destroying me. You’re good for me. I have time. Please, devour me. Deform me to the point of ugliness. Why not you? Why not you in this city and in this night, so like other cities and other nights you can hardly tell the difference? I beg of you.''

Marguerite Duras, Hiroshima mon amour





Who are you? You’re destroying me. You’re good for me. How could I know this city was tailor-made for love? How could I know you fit my body like a glove? I like you. How unlikely. I like you. How slow all of a sudden. How sweet. You cannot know. You’re destroying me. You’re good for me. You’re destroying me. You’re good for me.

Hiroshima mon amour (Alain Resnais, 1959)
 
«Agora basta que oiça relinchar os cavalos e zunir os chicotes e logo me assalta uma trepidação amorosa: em Hipácia tive de entrar nas cavalariças e nas oficinas dos ferradores para ver as belíssimas mulheres que montam nas selas de coxas nuas e polainas nas pernas, e que mal se aproxima um jovem estrangeiro o deitam sobre montes de feno ou de serradura e o apertam com os rijos mamilos.
    E quando a minha alma não pede outro alimento e estímulo que não seja a música, sei que de procurá-la nos cemitérios: os tocadores escondem-se nos túmulos; de uma cova para outra correspondem-se trinados de flautas e acordes de harpas.»



Italo Calvino. As Cidades Invisíveis.Tradução de José Colaço Barreiros.Editorial Teorema, Lisboa, 1990., p. 50

A minha amizade está sobre ti  e tu não estás debaixo da minha
    amizade. Não sou eu o despojado: a tua beleza é tenaz mais o
    meu cansaço é mais profundo que a sua beleza.
 
 
 
Antonio Gamoneda. Descrição da Mentira. Tradução de Vasco Gato. Edições Quasi, 2003., p. 19
Reconhecei a minha lentidão e o animal que sangra docemente
    dentro da minha alma.
 
 
(...)
 
 
Faríeis melhor residindo em pântanos. Eu já não sou o vosso mestre
    mas sim a vossa profundidade a que talvez não chegareis.
 
(...)
 
 
a minha mãe é fértil na cobardia;
 
o meu coração, temível na doçura.
 
 
 
 
Antonio Gamoneda. Descrição da Mentira. Tradução de Vasco Gato. Edições Quasi, 2003., p. 14/15

''Estou velho de mim mesmo, (...)''

Antonio Gamoneda. Descrição da Mentira. Tradução de Vasco Gato. Edições Quasi, 2003., p.

''viverei cem madrugadas''

AMOR À PORTUGUESA

 
 
(...)
 
«Dá-me os teus lábios. Aperta-me e não penses.
Eu e tu, minha querida, somos fracos
debaixo desta ponte, como de um cenho duro
duas lágrimas que o mundo não vê...»
 
 
 
Yevgeny Yevtushenko. Antologia da Poesia Soviética. Trad. de Manuel Seabra. Editorial Futura, Lisboa, 1973, p. 165

Lágrimas

(Sliózy)
 
Lama no bairro dos subúrbios,
Atrás da mata o bater das rodas...
Há muito que esqueci o que é chorar;
Quem me fala do sabor das lágrimas?
 
Só às vezes de noite,
Não por medo do silêncio,
Por qualquer coisa, correm
Fios de lágrimas doces.
 
Dantes sabiam emocionadamente
Chorar no ombro uns dos outros.
Mas cada época tem as suas leis,
E nós vivemos outros tempos.
 
A cada dia a sua tempestade!
As flores abrem em terrível fosso...
As lágrimas humanas,
Nós conhecemos o vosso preço.
 
 
Konstantin Vanshenkin. Antologia da Poesia Soviética. Trad. de Manuel Seabra. Editorial Futura, Lisboa, 1973, p. 151

''Queremos do homem não a centelha mas o fogo.''

Margarita Aliger. Antologia da Poesia Soviética. Trad. de Manuel Seabra. Editorial Futura, Lisboa, 1973, p. 132

ZOYA

(Zoiá)
 
Nos princípios de Dezembro de 1941, na aldeia de
Petrishchev, perto de Verei, os alemães executaram uma
jovem do Komsomól, conhecida pelo nome de Tatiána.
Verificou-se mais tarde que se tratava de Zoyá
 Kosmogemiánskaia, estudante de Moscovo.
 
(Dos Jornais)
 
 
Guarda para sempre o retrato de Zoyá.
Eu certamente nunca a poderei esquecer.
Este corpo de rapariga
                                 não está morto
                                                        nem vivo.
É Zoyá em mármore
                                calada, deitada na neve.
Impiedoso laço apertou o teu pescoço fino.
Um poder desconhecido no teu rosto torcido.
Assim aguardas os namorados
                                               de belos encantos ocultos,
por dentro iluminada com o secreto fogo feminino.
Só tu não recebeste uma carta dele, noiva da neve.
 
Ele - num capote de soldado,
                                           para ocidente caminha.
Talvez não longe desse lugar terrível,
Onde caíam flocos de neve no teu peito duro de rapariga.
A força e a fraqueza unem-se em ti eternamente.
Tu estás fria, e a mim a tristeza queima-me.
Não rebentes em ti, não se enraiveça em ti a maternidade,
O terno companheiro de infância não tocou no teu ventre
                                                                         frio de criança.
Tu jazes na neve.
                         Oh, como agora voltaste para nós,
Para orgulhosamente inclinarmos os nossos belos rostos puros
Ante a armadura do herói,
                             ante a dura, ferrugenta couraça,
Ante a sagrada beatitude da campa do guerreiro.
A figura da nossa amada, símbolo da verdade e da força.
Para que a nossa felicidade seja alta como a tua morte.
Pela tua campa gravada na neve,
Para Ocidente, para Ocidente! -
                                             marcham,
                                                       resolutas,
                                                                 as tropas.
 

 
 
Margarita Aliger. Antologia da Poesia Soviética. Trad. de Manuel Seabra. Editorial Futura, Lisboa, 1973, p. 130/1

quarta-feira, 12 de dezembro de 2012

domingo, 9 de dezembro de 2012

(...)
 
«Sempre longe da vista é que é feliz,
sempre mais raro e amargo é o ciúme.»
 
 
 
Olga Bergolts. Antologia da Poesia Soviética. Trad. de Manuel Seabra. Editorial Futura, Lisboa, 1973, p. 123

«Os futuros não realizados são apenas ramos do passado: ramos secos.
  - Viajas para reviver o teu passado? - era agora a pergunta do Kan, que também podia ser formulada assim: - Viajas para achar o teu futuro?
  E a resposta de Marco: - O algures é um espelho em negativo. O viajante reconhece o pouco que é seu, descobrindo o muito que não teve nem terá.»



Italo Calvino. As Cidades Invisíveis.Tradução de José Colaço Barreiros.Editorial Teorema, Lisboa, 1990., p. 31
(...)
 
«Nesta altura Kublai Kan interrompia-o ou imaginava interrompê-lo, ou Marco Polo imaginava que era interrompido, com uma pergunta como: - Caminhas sempre de cabeça virada para trás? - ou: - O que vês está sempre nas tuas costas? ou melhor: - A tua viagem só se faz no passado?»



Italo Calvino. As Cidades Invisíveis.Tradução de José Colaço Barreiros.Editorial Teorema, Lisboa, 1990., p. 30

Italo Calvino e Jorge Luis Borges, c. 1970


«A memória é redundante: repete os sinais para que a cidade continue a existir.»



Italo Calvino. As Cidades Invisíveis.Tradução de José Colaço Barreiros.Editorial Teorema, Lisboa, 1990., p. 23

''lenha de cerejeira seca''

As cidades e a memória. 2.

   O homem que cavalga longamente por terrenos bravios sente o desejo de uma cidade. Finalmente chega a Isidora, cidade onde os prédios têm escadas de caracol incrustadas de búzios marinhos, onde se fabricam astísticos óculos e violinos, onde quando o forasteiro está indeciso entre duas mulheres encontra sempre uma terceira, onde as lutas de galos degeneram em brigas sangrentas entre os apostantes. Era em todas estas coisas que ele pensava quando desejava uma cidade. Assim Isidora é a cidade dos seus sonhos: com uma diferença. A vida sonhada continha-o jovem; a Isidora chega em idade tardia. Na praça há o paredão dos velhos que vêem passar a juventude; ele está sentado em fila com eles.
Os desejos são já recordações.



Italo Calvino. As Cidades Invisíveis.Tradução de José Colaço Barreiros.Editorial Teorema, Lisboa, 1990

Dor estival

A morte no verão caminha a meu lado:
nunca a minha dor é tão grande
como quando o verão floresce pleno
nem tão seca a minha melancolia
como quando a beleza do verão se oferece:
orgia mortal
A ausência de Deus não a sinto tão dolorosa
como quando contemplo as borboletas
condenadas a morrer
buscando em ziguezague um sítio onde pousas
a sua morte
nem sinto a presença de Deus tão ameaçadora
como quando retumba o trovão
e relâmpagos iluminam o céu
com seus sinais de fogo
Nunca me sinto tão só
como quando no verão as pessoas
aumentam o júbilo da sua companhia
nem tão supérflua
como quando contemplo a exuberância
do verão
Parecem-me tão distantes
as coisas que amo
Nunca o meu desejo de viver é tão frágil!
como no verão:
preciso de lutar
para não conceder a minha mão à morte
Não sei
quantos verões me faltam:
a todos temo
esperando que me salve
o outono.



Maria Wine. 21 Poetas Suecos. Antologia coord. por Ana Hatherly e Vasco Graça Moura. Vega, Lisboa, p. 159
«A ponte: um grande pássaro de ferro que veleja
                                                                           [pela morte.»



Tomas Tranströmer. 21 Poetas Suecos. Antologia coord. por Ana Hatherly e Vasco Graça Moura. Vega, Lisboa, p. 143

Documentário "Agustina Bessa-Luís - Nasci Adulta e Morrerei Criança"

aqui

As pedras

As pedras que lançámos, ouço-as
cair claras como o vidro pelos anos fora. No vale
voam agitados os gestos do momento
gritando de copa para copa, calando-se
ao fino ar desse momento, deslizando
como andorinhas de cume
para cume até alcançarem
os planaltos extremos
ao longo da fronteira da existência. Aí caem,
claros como o vidro
os nossos actos
ao encontro apenas do chão
que nós próprios somos.



Tomas Tranströmer. 21 Poetas Suecos. Antologia coord. por Ana Hatherly e Vasco Graça Moura. Vega, Lisboa, p. 137

''Su cadáver estaba lleno de mundo''

114


Porque é que as noites não têm nome? Porque metade da vida, exactamente metade da vida, é-nos desconhecida. A qualquer um de nós.

(A.H.)



Göran Palm. 21 Poetas Suecos. Antologia coord. por Ana Hatherly e Vasco Graça Moura. Vega, Lisboa, p. 106

segunda-feira, 3 de dezembro de 2012

''Havia servas virginais''


«Muitos são os pássaros que saem dos bosques invernais
para morrer junto aos homens.»


Artur Lundkvist . 21 Poetas Suecos. Antologia coord. por Ana Hatherly e Vasco Graça Moura. Vega, Lisboa, p. 86

domingo, 2 de dezembro de 2012

Tu e Eu

(Ty so mnói)
 
Tu e eu - e cada instante me é caro.
Talvez haja muitos anos à nossa frente,
Mas chega sempre a separação, da qual
Não é costume haver novos encontros.
 
Só as estrelas a qualquer hora se encontram
Correndo atrás das suas luzes pálidas.
Onde poderei, no universo frio,
Querida amiga, encontrar as tuas pegadas?
 
 
Stepan Shchipachyov. Antologia da Poesia Soviética. Trad. de Manuel Seabra. Editorial Futura, Lisboa, 1973, p. 104

QUE EU MORRA E OS ANOS PASSEM

Que eu morra e os anos passem,
Que eu em cinza seja para sempre.
Que venha pelos campos uma rapariga descalça:
Eu erguer-me-ei, vencendo a mortalidade,
Como poeira quente tocando as suas pernas
Que cheiram a margaridas até aos joelhos.
 
 
Stepan Shchipachyov. Antologia da Poesia Soviética. Trad. de Manuel Seabra. Editorial Futura, Lisboa, 1973, p. 104

SABER APRECIAR O AMOR

Saber apreciar o amor,
Especialmente apreciá-lo com os anos.
O amor não são suspiros num banco
Nem passeios ao luar.
Será tudo: lama e as primeiras neves.
E uma vida que é preciso viver juntos.
O amor é parecido com um bom poema:
Um bom poema não se faz sem sofrimento.
 
 
 
Stepan Shchipachyov. Antologia da Poesia Soviética. Trad. de Manuel Seabra. Editorial Futura, Lisboa, 1973, p. 103
 
 
(...)
 
«E não deves por um só instante
Recuar ou trair o que tu és,
Mas estar vivo, e só vivo,
E só vivo - até ao fim.»
 
 
 Boris Pasternak. Antologia da Poesia Soviética. Trad. de Manuel Seabra. Editorial Futura, Lisboa, 1973, p. 98

A orelha de Van Gogh

Van Gogh corta a orelha
embrulha-a numa toalha
que devagar se tinge de vermelho
e envia-
-ta

(...)


Lars Forssell . 21 Poetas Suecos. Antologia coord. por Ana Hatherly e Vasco Graça Moura. Vega, Lisboa, p. 52

Sofrer é difícil
Sofrer sem amar é difícil
Amar sem sofre é impossível
Amar é dificil.



Gunnar Ekelöf . 21 Poetas Suecos. Antologia coord. por Ana Hatherly e Vasco Graça Moura. Vega, Lisboa, p. 42

Sozinho, sozinho, dizes que estás sozinho -
mas o príncipe de Emghion diz:
Primeiro eu amava Sherazade
e os seus contos
depois Dinarsad, a sua irmã mais nova,
depois a criada dela,
depois o amante da criada, um núbio
e então o seu engraxador
E quando me pus de joelhos
e lambi a graxa dos seus dedos
amei a poeira
e bebi uma golfada de ar tão funda
que tudo para mim enegreceu.




Gunnar Ekelöf . 21 Poetas Suecos. Antologia coord. por Ana Hatherly e Vasco Graça Moura. Vega, Lisboa, p. 37
«(...)

Na minha mão a pedra tornou-se um pássaro vivo e
                                                                          (levantou voo.
Eu fiquei só. Meu pássaro, ido embora
volta por vezes, por dever, por hábito.
Infeliz, canta. E deixa-me de novo.
Canta da sua vida, quer voar e voou!
(Uma luta diplomática pela liberdade)
E eu ficava ligado à pedra, tornava-me uma pedra.
Tudo em mim se revolvia, tudo se transformava.»



Gunnar Ekelöf . 21 Poetas Suecos. Antologia coord. por Ana Hatherly e Vasco Graça Moura. Vega, Lisboa, p. 30

(...)

«Compram areia como farinha.
Vendem pedras como pão.»




Gunnar Ekelöf . 21 Poetas Suecos. Antologia coord. por Ana Hatherly e Vasco Graça Moura. Vega, Lisboa, p. 29

solilóquio

 
fala que alguém dirige a si próprio, monólogo
 
(Do latim soliloquĭu-, «idem»)
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