domingo, 28 de abril de 2013

«- A morte está entrelaçada de violetas, disse Louis. A morte, sempre a morte.»


Virginia Woolf. As ondas. Tradução de Francisco Vale. Relógio D'Água., p. 113

«Não andes mais. Tudo o resto é dor e mentira. O fim é aqui.»

Virginia Woolf. As ondas. Tradução de Francisco Vale. Relógio D'Água., p. 111
« - Estas águas rumorejantes, disse Neville, sobre as quais construímos as nossas loucas plataformas, são, apesar de tudo, mais estáveis que os gritos selvagens, inconsequentes e frágeis que soltamos quando tentamos falar, quando raciocinamos e pronunciamos do género «eu sou isto...eu sou aquilo». A linguagem mente.



Virginia Woolf. As ondas. Tradução de Francisco Vale. Relógio D'Água., p. 110


«Em que pegadas
hei-de eu buscar a poesia do teu  sangue?»




Nelly Sachs. Poesias. Tradução de Paulo Quintela. Editora Opera Mundi, Rio de Janeiro, 1975,. p. 136

«Prontas a levar na mala o último
peso de melancolia, este casulo de borboleta,
em cujas asas um dia levarão
a viagem ao fim.»  




Nelly Sachs. Poesias. Tradução de Paulo Quintela. Editora Opera Mundi, Rio de Janeiro, 1975,. p. 129



''e a pedra dançando transforma
em música o seu pó.''



Nelly Sachs. Poesias. Tradução de Paulo Quintela. Editora Opera Mundi, Rio de Janeiro, 1975,. p. 127

Quem sabe onde as estrelas estão
na ordem da magnificiência do Criador
e onde a paz começa
e se na tragédia da Terra
a guelra rasgada e sangrenta do peixe
está destinada
a completar o seu vermelho-rubi
a constelação Martírio,
a escrever a primeira
letra da língua sem palavras -



Por certo possui o amor olhar
que repassa ossadas como um relâmpago
e acompanha os mortos
para além do alento -



mas onde os rendidos
depõem a sua riqueza,
é desconhecido.



As framboesas traem-se no mais negro bosque
pelo seu perfume,
mas a carga-de-alma deposta dos mortos
não se trai a nenhuma busca -
e bem pode alada
entre cimento ou átomos tremer



ou sempre ali
onde ficou esquecido
um lugar pra o pulsar de um coração.

 
Nelly Sachs. Poesias. Tradução de Paulo Quintela. Editora Opera Mundi, Rio de Janeiro, 1975,. p. 122/3
«O verdugo
na escuridão carregada de culpa
escondeu o dedo fundo
no cabelo do recém-nascido
que deita rebentos já há anos-luz
pra céus não sonhados.»





Nelly Sachs. Poesias. Tradução de Paulo Quintela. Editora Opera Mundi, Rio de Janeiro, 1975,. p. 120
(...)

Povos da Terra
vós, que com a força dos desconhecidos
astros vos envolveis como carrinhos de linhas,
que coseis e de novo descoseis o que cosestes,
que entrais na confusão das línguas
como em cortiços de abelhas,
para no doce picardes
e serdes picados -

Povos da Terra,
não destruais o Universo das Palavras,
não corteis com as facas do ódio
o som que nasceu ao mesmo tempo que o hálito.

Povos da Terra,
Oh, que ninguém queira dizer Morte quando diz Vida -
e ninguém Sangue, quando diz Berço -

Povos da Terra,
deixai as palavras ao pé da sua fonte,
pois são elas que podem levar
os horizontes até aos céus verdadeiros
e desviadas de lado
como uma máscara atrás da qual boceja a noite
ajudar as estrelas a parir -

Já hoje exercitamos a morte de manhã
quando ainda o morrer velho murcha em nós -
O medo da humanidade de não resistir -

Ó habituação da morte até adentro de sonhos
onde andaime de noite cai em cacos negros
e lua de osso brilha nas ruínas -

Õ medo da humanidade de não resistir -

Que é dos suaves açoitados
Anjos-calma, que a fonte oculta
nos tocaram, que do cansaço
corre pra o morrer?






Nelly Sachs. Poesias. Tradução de Paulo Quintela. Editora Opera Mundi, Rio de Janeiro, 1975,. p. 114/5

'' as luas da morte''


''despidas as asas da noite de todos os mistérios...''


Nelly Sachs. Poesias. Tradução de Paulo Quintela. Editora Opera Mundi, Rio de Janeiro, 1975,. p. 110

''idade nocturna''

destrinçar


«se Deus não existe, tudo é permitido»

«Se o sentimento religioso morre, fazendo desaparecer a via mística do conhecimento, se a razão abre falência, na crise do positivismo, do idealismo germânico e, de um modo geral, das conglomerações de ideias tendentes e eternizar e a universalizar os conceitos, o homem vê-se então perdido num universo onde tudo lhe é estranho e cuja linguagem não entende. O homem é um estrangeiro em terra alheia e, ignorando o código por que deve comportar-se, não pode senão comportar-se sem código ou por um código interior. É o tema de O Estrangeiro.»



In Prefácio, António Quadros



Albert Camus. Os Justos. Prefácio António Quadros. Edição Livros do Brasil, Lisboa., p. 18/9

«Sísifo é maior do que o seu rochedo.»

Albert Camus

Albert Camus

 
«Albert Camus impôs-se-me antes de mais nada como um dos poucos escritores sérios da nossa época (não são tantos, os escritores sérios, como o dá a entender a «bibliografia da fama literária»...) Escritor sério porque, para ele, a literatura não era um jogo, um pretexto para a afirmação pessoal, um meio de atingir a glória, uma actividade gratuita e sem responsabilidade no próprio destino do mundo ou ainda uma forma de enfeudamento às suspeitas forças de uma sociedade egolátrica ou desviada do seu mais fundo sentido criador. É este o ponto culminante do parentesco que me sinto com Albert Camus.»
 


In Prefácio, António Quadros



Albert Camus. Os Justos. Prefácio António Quadros. Edição Livros do Brasil, Lisboa., p. 14
« A única reforma subsistente será a reforma espiritual, que volte a colocar a Verdade no vértice da hierarquia dos valores.»


In Prefácio, António Quadros



Albert Camus. Os Justos. Prefácio António Quadros. Edição Livros do Brasil, Lisboa., p. 12-13

sábado, 27 de abril de 2013

'' (...) e a noite desfez-se em lágrimas''

Nelly Sachs. Poesias. Tradução de Paulo Quintela. Editora Opera Mundi, Rio de Janeiro, 1975,. p. 108

''o amor - entre em ti e a morte -''



Nelly Sachs. Poesias. Tradução de Paulo Quintela. Editora Opera Mundi, Rio de Janeiro, 1975,. p. 108

''então a humildade fez-te emudecer''


Nelly Sachs. Poesias. Tradução de Paulo Quintela. Editora Opera Mundi, Rio de Janeiro, 1975,. p. 108

EM SEGREDO

Ó minha mãe,
nós, que moramos numa estrela órfã -
acabamos de suspirar o suspiro
dos que foram atirados para a morte -
quantas vezes cede sob os teus passos e areia
e te deixa sozinha -

Deitada nos meus braços
saboreias o mistério
que Elias andou -
onde o silêncio fala
nascer e morrer acontecem
e os elementos de outro modo se misturam -

Os meus braços seguram-te
como um carro de madeira os que viajam para o céu -
madeira que chora, arrancada
das suas muitas metamorfoses -

Ó minha regressante,
o mistério concrescido c'o esquecimento -
eu bem ouço coisas novas
no teu amor crescente!


Estás sentada à janela
e neva -
e o teu cabelo é branco
e as tuas mãos -
mas nos dois espelhos
da tua face branca
conservou-se o Verão:
Terra para os prados erguidos para o Invisível -
Bebedouro para as corças de sombra à noite.

Mas queixosa mergulho na tua brancura,
na tua neve -
donde a vida tão de manso se afasta
como depois numa reza dita até ao fim -

Oh, adormecer na tua neve
com toda a dor no hálito de fogo do mundo.

Enquanto as linhas suaves do teu rosto
mergulham já em noite marinha
pra novo nascimento

Quando o dia se esvazia
no crepúsculo,
quando o tempo sem imagens começa,
as vozes solitárias se unem -
os bichos nada são senão caçadores
ou caçados -
as flores só ainda odor -
vais tu para entre as catacumbas do tempo
quando tudo é sem nome como no princípio -
vais tu para entre as catacumbas do tempo
que se abrem para aqueles que estão perto do fim -
ali onde crescem os germes de coração -
na escura intimidade
te afundas -
já para lá da Morte
que é apenas um desfiladeiro ventoso -
e com frio da saída abres
os olhos
nos quais já uma nova estrela
deixou o seu reflexo -»

(...)



Nelly Sachs. Poesias. Tradução de Paulo Quintela. Editora Opera Mundi, Rio de Janeiro, 1975,. p. 105-107

caducidades

MÃE DE LUTO

(...)

«Despedida -
palavra a sangrar de duas feridas.
Ontem ainda palavra de mar
com o navio a afundar-se
como espada no meio -
Ontem ainda palavra trespassada
de morte de estrelas cadentes -
Garganta beijada da meia-noite
dos rouxinóis -

Hoje - dois trapos pendentes
e cabelo humano numa mão em garra
que rasgava -

E nós a sangrar depois -
a esvair-nos de sangue em ti -
mantemos a tua fonte nas nossas mãos.
Nós exércitos dos que se despedem
que construímos a tua escuridão -
até que a Morte diga: cala-te -
mas aqui é: continuar a sangrar!



Nelly Sachs. Poesias. Tradução de Paulo Quintela. Editora Opera Mundi, Rio de Janeiro, 1975,. p. 99

''mares de sono''

quinta-feira, 25 de abril de 2013


JOB


Ó tu rosa-dos-ventos dos martírios!
Por tempestades de tempos primevos
Arrastada sempre noutras direcções dos temporais;
O teu Sul chama-se ainda Solidão.
Onde tu estás, é o umbigo das dores.

Os teus olhos estão encovados fundo no teu crânio
como pombos de cavernas na noite
que o caçador às cegas tira cá para fora.
À tua voz fez-se muda,
pois ela perguntou vezes demais porquê.

Para os vermes e peixes se foi a tua voz.
Job, a chorar passaste todas as vigias da noite
mas um dia a constelação do teu sangue
fará empalidecer todos os sóis nascentes.





Nelly Sachs. Poesias. Tradução de Paulo Quintela. Editora Opera Mundi, Rio de Janeiro, 1975,. p. 84

VOZ DA TERRA SANTA

Ó meus filhos,
A morte passou pelos vossos corações
Como por uma vinha -
Pintou Israel a vermelho em todas as paredes da Terra.

Para onde há-de ir a pequena santidade
Que ainda mora na minha areia?
Através dos canais da solidão
Falam as vozes dos mortos:

Deponde sobre o campo as armas da vingança
Pra que elas falem baixo -
Pois também o ferro e o trigo são irmãos
No seio da Terra -

Pra onde há-de ir a pequena santidade
Que ainda mora na minha areia?

A criança no sono assassinada
Levanta-se; torce pra baixo a árvore dos milénios
E prende a estrela branca anelante
Que outrora se chamou Israel
Na sua coroa.

Reergue-te de novo, diz ela
Pra lá. onde lágrimas significam Eternidade.


Nelly Sachs. Poesias. Tradução de Paulo Quintela. Editora Opera Mundi, Rio de Janeiro, 1975,. p. 78

«Terra, Terra, fizeste-te cega
Ante os olhos de irmãs das Plêiades
Ou do olhar perscrutador da Balança?

Mãos assassinas deram a Israel um espelho
Para nele ver ao morrer o seu morrer -

Terra, ó Terra
Estrela de todas as Estrelas
Um dia há-de haver uma constelação chamada Espelho.
Então ó Cega tornarás tu a ver.»


Nelly Sachs. Poesias. Tradução de Paulo Quintela. Editora Opera Mundi, Rio de Janeiro, 1975,. p. 71

empedernir



verbo transitivo, intransitivo e pronominal

1. converter(-se) em pedra; petrificar
2. tornar ou ficar duro como pedra; endurecer
3. figurado tornar(-se) insensível

(Do latim *impetrinīre, «empedernir», de petrīnu-, «de pedra»)
(...)

«Quando alguém nos toca
Toca um muro de lamentações.
Como o diamante o vosso lamento corta a nossa dureza
Até que ela cai e se faz coração brando -
Enquanto vós emperdenis.
Quando alguém nos toca
Toca as encruzilhadas da meia-noite
Ressonantes de nascimento e morte.

Quando alguém nos atira -
Atira ao Jardim do Éden -
O vinho das estrelas -
Os olhos dos amantes e toda a traição -

Quando alguém nos atira com ira
Atira leões de corações partidos
E de borboletas de seda.

Cuidado, cuidado
Não atireis com uma pedra em ira -
A nossa mistura está repassada do espírito.
Endureceu no mistério
Mas pode acordar com um beijo.»





Nelly Sachs. Poesias. Tradução de Paulo Quintela. Editora Opera Mundi, Rio de Janeiro, 1975,. p. 69

CORO DAS SOMBRAS

Nós sombras, oh, nós sombras!
Sombras de algozes
Agarrados ao pó dos vossos crimes -
Sombras de vítimas
A desenhar o drama do vosso sangue numa parede.
Oh, nós desvalidas borboletas do luto
Presas numa estrela que continua a arder tranquila
Enquanto nós temos de dançar em infernos.
Os nossos titeriteiros já só sabem a morte.

Áurea ama que nos alimentas
Para tal desespero,
Ó sol, desvia a tua face
Pra também nós nos afundarmos -
Ou deixa que sejamos o espelho dos dedos erguidos
Duma criança exultante
E da leve ventura duma libélula
Sobre o beiral dum poço.



Nelly Sachs. Poesias. Tradução de Paulo Quintela. Editora Opera Mundi, Rio de Janeiro, 1975,. p. 67


Eu vi que ele via.
 
JEHUDA ZWI



Os teus olhos, ó meu Amado,
Eram olhos da corça,
C'os longos arcos-íris das pupilas
Como depois de passadas tempestades de Deus -
Como abelhas tinham os milénios
Juntando neles o mel das noites de Deus,
Últimas centelhas dos fogos do Sinai -
Ó portas transparentes
Para os reinos íntimos,
Sobre os quais jaz tanta areia dos desertos,
Tantas milhas de martírios para oh chegar a Ele -
Ó olhos apagados,
Cuja força de vidente agora caiu
Nas surpresas áureas do Senhor,
Das quais nós apenas sabemos os sonhos.





Nelly Sachs. Poesias. Tradução de Paulo Quintela. Editora Opera Mundi, Rio de Janeiro, 1975,. p. 61
Se eu ao menos soubesse
Sobre o que é que pousou o teu últimos olhar.
Foi uma pedra, que já muitos olhares
Tinha bebido, até que eles em cegueira
Caíram sobre a cega?

Ou foi terra,
Bastante para encher um sapato,
E já negra
De tanta despedida
E de preparar tanta morte?

Ou foi o teu último caminho,
Que te trouxe o adeus de todos os caminhos
Que tu tinhas andado?

Uma poça de água, um pedaço de metal luzente,
Talvez a fivela do cinto do teu inimigo,
Ou qualquer outro, pequeno adivinho
Do céu?

Ou mandou-te esta terra,
Que não deixa partir ninguém sem ser amado,
Um sinal de pássaro pelo ar,
Acordando lembranças na tua alma, e ela estremeceu
No seu corpo queimado de martírio?



Nelly Sachs. Poesias. Tradução de Paulo Quintela. Editora Opera Mundi, Rio de Janeiro, 1975,. p. 60

algoz


nome masculino

 1. executor da pena de morte; carrasco; verdugo
2. figurado pessoa cruel
(Do turco gozz, pelo árabe al-gozz, nome de uma tribo onde se iam geralmente buscar os carrascos)

«O eco nada devolve, saímos da Sociedade. O medo não diz sim nem não. Ele, o medo, retém tudo quanto se diz, tudo quanto se pensa, tudo.»
 
 
 
Louis-Ferdinand Céline. Viagem ao Fim da Noite. Tradução, apresentação e notas Aníbal Fernandes, Edição Babel, 2010, Lisboa p. 314

''Estarmos apaixonados não é nada, mantermo-nos os dois juntos é que é difícil.''

Louis-Ferdinand Céline. Viagem ao Fim da Noite. Tradução, apresentação e notas Aníbal Fernandes, Edição Babel, 2010, Lisboa p. 312

''velhos hábitos''

Não falávamos muito, não tínhamos grande coisa a dizer.

«Não falávamos muito, não tínhamos grande coisa a dizer. De resto, para que servem as palavras quando temos ideias fixas? Para nos insultarmos e nada mais.»
 
 
Louis-Ferdinand Céline. Viagem ao Fim da Noite. Tradução, apresentação e notas Aníbal Fernandes, Edição Babel, 2010, Lisboa p. 277

amor-próprio

''supuração das pálpebras''

vindicta


nome feminino

1. vingança; represália
2. perseguição
3. castigo; punição


(Do latim vindicta-, «castigo»)

segunda-feira, 8 de abril de 2013

 
 
«Tudo tem um fim. Nem sempre é a morte, muitas vezes é qualquer coisa diferente e bastante pior, sobretudo quando se trata de crianças.»
 
 
Louis-Ferdinand Céline. Viagem ao Fim da Noite. Tradução, apresentação e notas Aníbal Fernandes, Edição Babel, 2010, Lisboa p. 252

«Nestes momentos eu não sou eu.»


Virginia Woolf. As ondas. Tradução de Francisco Vale. Relógio D'Água., p. 93

«A superfície do meu espírito desliza como um pálido ribeiro reflectindo os objectos que passam.»


Virginia Woolf. As ondas. Tradução de Francisco Vale. Relógio D'Água., p. 91

«Devo estender-lhe a mão; responder. Mas que resposta dar? Retrocedo com violência, sentindo escaldar o corpo desajeitado e exposto à indiferença e ao desdém dos homens, eu que imagino colunas de mármore e lagos onde as andorinhas molham as asas de ouro do outro lado do mundo.»


Virginia Woolf. As ondas. Tradução de Francisco Vale. Relógio D'Água., p. 86

«Sou sucessivamente travessa, alegre, lânguida e melancólica. Tenho raízes mas flutuo.»


Virginia Woolf. As ondas. Tradução de Francisco Vale. Relógio D'Água., p. 83

«É cruel o que tenho oferecer. Não posso flutuar suavemente misturando-me com as outras pessoas. Prefiro o olhar fixo dos pastores que encontro na estrada; ou o olhar das ciganas sentadas na berma da estrada, ao lado da carroça, amamentando os filhos como eu hei-de amamentar os meus. Pois em breve, no ardente meio-dia em que as abelhas zumbem à volta das malvas, o meu amor chegará. Estará parado sob o cedro. Dirá apenas uma palavra a que responderei com uma só palavra. Ofertar-lhe-ei o que cresceu dentro de mim. Terei filhos, criadas de avental, caseiros com forquilhas. Terei uma cozinha para onde vão trazer os cordeiros doentes para serem aquecidos em cestos e haverá presuntos pendurados e cebolas brilhando. Serei silenciosa como a minha mãe e de avental azul andarei pela casa fechando à chave os armários.» p. 80/1

Virginia Woolf. As ondas. Tradução de Francisco Vale. Relógio D'Água., p. 80/1

pó-de-arroz

incêndio nocturno


 
«Não estou sempre a entregar-me a emoções duvidosas? Sim, quando me debruço à janela e deixo cair o meu cigarro de modo a que rodopie ligeiramente até ao chão, sinto os olhos de Louis que vigiam até a queda do meu cigarro. E Louis diz: «Tudo isto tem um significado. Mas qual?» 




Virginia Woolf. As ondas. Tradução de Francisco Vale. Relógio D'Água., p. 75/6

«(servimo-nos dos nossos amigos para nos avaliarmos a nós próprios).»



Virginia Woolf. As ondas. Tradução de Francisco Vale. Relógio D'Água., p. 74

«Não somos simples, como os nossos amigos gostariam que fôssemos para irmos de encontro da necessidade que têm de nós. E, no entanto, o amor é simples.» 


Virginia Woolf. As ondas. Tradução de Francisco Vale. Relógio D'Água., p. 73



«Graças a eles sou Bernard, mas também Byron, sou isto, aquilo e outra coisa.» 



Virginia Woolf. As ondas. Tradução de Francisco Vale. Relógio D'Água., p. 73


«Peço-te (no momento em que estou de costas voltado para ti) que tomes a minha vida nas tuas mãos e me digas se estou para sempre condenado a ser repelido por aqueles a quem amo.»



Virginia Woolf. As ondas. Tradução de Francisco Vale. Relógio D'Água., p. 72



«Mas quem despejou a areia dos vossos sapatos
Quando tivestes de erguer-vos pra morrer?
A areia, que Israel trouxe para casa,
A areia de peregrinar?
Areia ardente do Sinai,
Misturada co'as gargantas dos rouxinóis,
Misturadas co'as asas de borboleta,
Misturada c'o pó da saudade das serpentes,
Misturada com tudo o que caiu da Sabedoria de Salomão,
Misturada c'o amargor do mistério do vermute -


Ó vós dedos
Que despejastes a areia dos sapatos de mortos.
Amanhã já sereis pó
Nos sapatos vindouros!



Nelly Sachs. Poesias. Tradução de Paulo Quintela. Editora Opera Mundi, Rio de Janeiro, 1975,. p. 48


«Há pedras como almas.»


RABI NACHMAN

bichanar


«Isto ofende-te  e eu sou sensível ao teu descontentamento.»


Virginia Woolf. As ondas. Tradução de Francisco Vale. Relógio D'Água., p. 69

sábado, 30 de março de 2013


«Se não sou amado, tanto pior - amarei outra!»


Anton Tchekhov. O Selvagem. Tradução de Carlos Grifo. Editorial Presença, Lisboa, 1968., p 163
 
 
SEREBRIAKOV
 
«Nestes últimos dias sofri tanto, Miguel Lvovitch, reflecti tanto que me parece que podia escrever um tratado completo sobre a melhor forma de viver, para edificação da posteridade. Enquanto se vive, aprende-se - e o melhor mestre é a infelicidade.»



Anton Tchekhov. O Selvagem. Tradução de Carlos Grifo. Editorial Presença, Lisboa, 1968., p 149

Se pareço mais corajoso que vocês é porque eu sou o mais infeliz.


 
SEREBRIAKOV

«(...) Não nos calemos, meus amigos, falemos, falemos. É o melhor que há a fazer na nossa presente situação. Devemos encarar a  desgraça de frente, sem temor. Se pareço mais corajoso que vocês é porque eu sou o mais infeliz.»

Anton Tchekhov. O Selvagem. Tradução de Carlos Grifo. Editorial Presença, Lisboa, 1968., p 148

«E quando esta minha pele estiver desfeita,
eu verei Deus sem a minha carne,
                           
                                                      JOB

«Amava-a bastante, é certo, mas ainda amava mais o meu vício, esse desejo de fugir de todos os lados à procura sei lá de quê, por estúpido orgulho, sem dúvida, por estar convencido de uma espécie de superioridade.»
 
 
Louis-Ferdinand Céline. Viagem ao Fim da Noite. Tradução, apresentação e notas Aníbal Fernandes, Edição Babel, 2010, Lisboa p. 220
 
«Tornamo-nos rapidamente velhos, e de forma irremediável. Apercebemos-nos disso pelo jeito que apanhamos de amar a nossa própria desgraça, mesmo sem querer. É que a natureza tem mais força que nós, aí está. Treina-nos um género, e depois já não vamos poder sair dele. Eu, por exemplo, tinha tomado o rumo da intranquilidade. A pouco e pouco vamos tomando o nosso papel e o nosso destino a sério, sem repararmos nisso, e depois, quando caímos em nós é demasiado tarde para mudar.
Fizemo-nos pessoas muito inquietas e, claro está. para sempre.»
 
 
Louis-Ferdinand Céline. Viagem ao Fim da Noite. Tradução, apresentação e notas Aníbal Fernandes, Edição Babel, 2010, Lisboa p. 220

verde-mar

assim-assim


Molly


«Por Molly, uma das lindas raparigas dessa casa, não tardou que eu sentisse o excepcional sentimento de confiança que entre  os seres amedrontados substitui o amor.» 
 
 
 
Louis-Ferdinand Céline. Viagem ao Fim da Noite. Tradução, apresentação e notas Aníbal Fernandes, Edição Babel, 2010, Lisboa p. 219

«Só existíamos por uma espécie de hesitação entre o idiotismo e o delírio.»

 
Louis-Ferdinand Céline. Viagem ao Fim da Noite. Tradução, apresentação e notas Aníbal Fernandes, Edição Babel, 2010, Lisboa p. 217
 
«A coragem não consiste em perdoar, acho que se perdoa sempre de mais! E não serve de nada, está mais que provado.»
 
 
Louis-Ferdinand Céline. Viagem ao Fim da Noite. Tradução, apresentação e notas Aníbal Fernandes, Edição Babel, 2010, Lisboa p. 205
 
«Todos os dias temos de nos resignar a conhecer um pouco mais de nós, desde que nos falte coragem para acabar de uma vez para sempre com as nossas próprias choraminguices.»
 
 
Louis-Ferdinand Céline. Viagem ao Fim da Noite. Tradução, apresentação e notas Aníbal Fernandes, Edição Babel, 2010, Lisboa p. 198

«Por natureza somos tão fúteis, que só as distracções conseguem impedir-nos realmente de morrer.»
 
 
Louis-Ferdinand Céline. Viagem ao Fim da Noite. Tradução, apresentação e notas Aníbal Fernandes, Edição Babel, 2010, Lisboa p. 197

''incurável melancolia''

Eu sempre receara ficar mais ou menos vazio

 

«Eu sempre receara ficar mais ou menos vazio; não ter, em suma, qualquer razão séria para existir. Naquele momento, perante factos estava bastante ciente do meu zero individual. Num meio tão diferente daquele onde tinha hábitos mesquinhos, foi como se me dissolvesse instantaneamente. Sentia-me perto de já não existir, muito simplesmente. Por isso, mal me tinham deixado de falar das coisas familiares, eu descobria que nada me impediria de afundar numa espécie de irresistível tédio, numa espécie de adocicada, de assustadora catástrofe de alma. Uma aversão.»
 
 
 
 
Louis-Ferdinand Céline. Viagem ao Fim da Noite. Tradução, apresentação e notas Aníbal Fernandes, Edição Babel, 2010, Lisboa p. 197
 
«Não se julgue que é fácil adormecer quando nos pomos a duvidar de tudo; por causa daqueles tantos medos que nos meteram, principalmente.»
 
 
 
Louis-Ferdinand Céline. Viagem ao Fim da Noite. Tradução, apresentação e notas Aníbal Fernandes, Edição Babel, 2010, Lisboa p. 195

déspota


adjetivo e nome de 2 géneros
 que ou pessoa que exerce a autoridade de modo absoluto e arbitrário; tirano; opressor; autocrata

(Do grego despótes, «senhor da casa»)


A verdade deste mundo é a morte.

 
«E o pior é pensar como vamos arranjar forças bastantes para continuar a fazer no dia seguinte o que fizemos na véspera e em tantos outros dias já passados, onde encontraremos forças para as diligências imbecis, para mil e um projectos que não conduzem a nada, essas tentativas de vencer a  pesada necessidade, tentativas que abortam sempre e todas destinadas a convencer-nos, uma vez mais, de que o destino é insuperável, que todas as noites temos de cair da muralha com a angústia de ser sempre mais precário, mais sórdido, esse dia seguinte.
   Talvez seja a idade que surge, traidora,  e nos ameaça com o pior. Em nós já não temos música suficiente para fazer dançar a vida, ora aí está. Toda a juventude foi morrer no fim do mundo, num silêncio de verdade. Para onde havemos de sair, pergunto eu, se em nós já não há uma suficiente soma de delírio? A verdade é uma agonia sem fim. A verdade deste mundo é a morte. Temos de escolher: mentir ou morrer. Eu  cá nunca pude matar-me.»
 
 
 
 
Louis-Ferdinand Céline. Viagem ao Fim da Noite. Tradução, apresentação e notas Aníbal Fernandes, Edição Babel, 2010, Lisboa p. 194/5
«Só terias como certo morrer muito estupidamente, disse a mim mesmo, como toda a gente, quero eu dizer.E ter confiança nos homens já é meia morte.»
 
 
Louis-Ferdinand Céline. Viagem ao Fim da Noite. Tradução, apresentação e notas Aníbal Fernandes, Edição Babel, 2010, Lisboa p. 174

''trovoada de folhas''

Au Coucher Du Soleil


terça-feira, 26 de março de 2013

cleptocracia

cleptocracia
nome feminino
POLÍTICA sistema em que se permitem ou aprovam atos corruptos, sobretudo no que se refere à utilização de dinheiro público

cleptocracia In Infopédia [Em linha]. Porto: Porto Editora, 2003-2013. [Consult. 2013-03-26].
Disponível na www: http://www.infopedia.pt/lingua-portuguesa/cleptocracia
>.
nome feminino

POLÍTICA sistema em que se permitem ou aprovam atos corruptos, sobretudo no que se refere à utilização de dinheiro público

O destino do canário


«O destino do canário é ficar na gaiola e assistir à felicidade dos outros, - pois bem, só lhe resta ficar lá toda a vida.»



Anton Tchekhov. O Selvagem. Tradução de Carlos Grifo. Editorial Presença, Lisboa, 1968., p 132

morrão-dos-fogueteiros

escolástica


nome feminino
 
1. FILOSOFIA o sistema filosófico da «Escola», isto é, ensinado nas escolas da Idade Média, sobretudo a partir de S. Tomás de Aquino (1225-1274), que, confiante na possibilidade de harmonizar a razão e a fé, a filosofia e a teologia, procurou integrar num sistema coerente a filosofia aristotélica e o dogma cristão

2. pejorativo atitude intelectual caracterizada pelo verbalismo, pelas subtilezas puramente formais, pelo conformismo e pelo culto da autoridade intelectual
 
(Do grego skholastiké, «da escola», pelo latim scholastĭca, «declamações») escolástica


HELENA
Que quer dizer com isso?

FEDOR
Quero dizer que quando eu lanço as minhas vistas sobre uma mulher, é-lhe impossível escapar-me.


HELENA
Não, não quer dizer isso. Quer dizer que o senhor é estúpido e insolente.



Anton Tchekhov. O Selvagem. Tradução de Carlos Grifo. Editorial Presença, Lisboa, 1968., p 108

VOINITZKI

«Acho que ainda acabarei por desprezar esta mulher!É tímida como uma garota e gosta de filosofar como um velho diácono paramentado com todas as virtudes! Azeda como uvas verdes! Ou leite coalhado.»


Anton Tchekhov. O Selvagem. Tradução de Carlos Grifo. Editorial Presença, Lisboa, 1968.,

(com esse olhar cheio de desconfiança e manha nunca amará ninguém)


«Você não tem ainda vinte anos mas é já uma velha, uma argumentadora como o seu pai ou o seu tio Jorge, e não ficaria nada espantado se me mandassem chamar para lhe tratar da gota. Mas não vê que não se pode viver assim! Que importa o homem que eu sou? O que é preciso é olhar-me nos olhos, sem pensamentos reservados, sem programa. É preciso primeiro que tudo procurar em mim o ser humano - se não, nunca chegará a ter relações de amizade com os outros. Adeus! E acredite no que lhe digo: com esse olhar cheio de desconfiança e manha nunca amará ninguém.»


Anton Tchekhov. O Selvagem. Tradução de Carlos Grifo. Editorial Presença, Lisboa, 1968., p 81/2

segunda-feira, 25 de março de 2013



«(...), luto contra aqueles que não me compreendem, acontece-me sofrer de modo intolerável...»


Anton Tchekhov. O Selvagem. Tradução de Carlos Grifo. Editorial Presença, Lisboa, 1968., p 79

«Porque terei eu este desgraçado feitio?»



Anton Tchekhov. O Selvagem. Tradução de Carlos Grifo. Editorial Presença, Lisboa, 1968., p 71

Que filosofia maldita é essa que a retém?


«(...) Que espera? Que filosofia maldita é essa que a retém? Quando conseguirá compreender
que ter aprisionado a sua juventude, amordaçado a sua vontade de viver, não é moral nenhuma?»


Anton Tchekhov. O Selvagem. Tradução de Carlos Grifo. Editorial Presença, Lisboa, 1968., p 69

«Não tenho passado. Dissipei-o estupidamente em coisas fúteis. E o presente é de um absurdo horrível. Eis a minha vida e o meu amor. Para que servem? Que hei-de fazer deles? O meu amor inútil morre como um raio de sol dentro de um fosso e eu morro com ele.»


Anton Tchekhov. O Selvagem. Tradução de Carlos Grifo. Editorial Presença, Lisboa, 1968., p 69


SEREBRIAKOV

  Dizem que a gota de Turgueniev se acabou
por transformar em angina do peito. Tenho
muito medo que me aconteça a mesma coisa.
Maldita velhice! É uma coisa odiosa, diabos
a levem! Desde que envelheci que me aborreço
a mim próprio e dá-me a impressão de que vocês
estão fartos de mim.

HELENA

 Quando te ouvimos falar da tua velhice dá
a impressão que nós é que somos responsáveis
por ela.


SEREBRIAKOV

 E tu estás ainda mais farta que todos os
outros.

HELENA

Que aborrecimento! (Levanta-se e vai sentar-se
longe dele)




Anton Tchekhov. O Selvagem. Tradução de Carlos Grifo. Editorial Presença, Lisboa, 1968., p 59

O selvagem


«O selvagem, como é simpático! Vem muitas vezes a nossa casa, mas sou tímida e nunca soube falar-lhe nem acolhê-lo amavelmente. Deve pensar que sou má ou demasiadamente orgulhosa.»



Anton Tchekhov. O Selvagem. Tradução de Carlos Grifo. Editorial Presença, Lisboa, 1968., p 53

por artes de berliques e berloques

por artes diabólicas, como por magia

Hurrah!

''Quem sabe demais envelhece depressa.''

Anton Tchekhov. O Selvagem. Tradução de Carlos Grifo. Editorial Presença, Lisboa, 1968., p 39

''não sei usar as flores da retórica''


Anton Tchekhov. O Selvagem. Tradução de Carlos Grifo. Editorial Presença, Lisboa, 1968., p 21

féerie

féerie [feRi]
nome feminino
1. mundo das fadas
2. história de fadas
3. fantasmagoria
4. encantamento; universo poético

féeries In Infopédia [Em linha]. Porto: Porto Editora, 2003-2013. [Consult. 2013-03-25].
Disponível na www: http://www.infopedia.pt/pesquisa-global/f%C3%A9eries
>.nome feminino

1. mundo das fadas
2. história de fadas
3. fantasmagoria
4. encantamento; universo poético

«(quando se escreve nada há de mais importante que o ritmo.)»

 
Virginia Woolf. As ondas. Tradução de Francisco Vale. Relógio D'Água., p. 65
«O sol ergue-se. Raios verdes e amarelos tombaram sobre a praia dourando os flancos de barco carcomido e arrancando reflexos azul de aço aos cardos marinhos de folhas couraçadas. A luz quase trespassa as frágeis ondas que correm em leque pela praia. A jovem que ao sacudir a cabeça fizera dançar o topázio, a água-marinha, todas as jóias cor de água com cintilações de fogo, afastou os cabelos da fronte e de olhos muito abertos traçou um caminho a direito sobre as ondas.O seu brilho fremente escureceu; as ondas confundiram-se; os seus verdes abismos aprofundaram-se e escureceram, atravessados talvez por cardumes de peixes errantes. Ao recuarem depois de se desfazerem na areia, as ondas deixam na praia uma linha escura de gravetos e pedaços de cortiça, ciscos de palha e pequenos ramos, como se uma frágil chalupa tivesse naufragado e rompido o casco e o seu marinheiro houvesse nadado para a praia e escalado a falésia deixando a sua leve carga ser arrastada pela corrente.
  
     No jardim, os pássaros que na madrugada cantaram ao acaso, espasmodicamente na penumbra de uma árvore, de um silvado,cantavam agora em coro, em sons nítidos e estridentes, ora juntos como se estivessem conscientes da presença dos seus companheiros, ora solitários, como se se dirigissem ao pálido azul do céu. Voaram todos ao mesmo tempo quando o gato preto se movimentou ao longo dos arbustos e a cozinheira os assustou lançando mais cinzas para o monte. Havia medo no seu canto e suspeita de dor e também a alegria que tem de ser arrancada a cada instante. Depois cantaram todos ao desafio no ar límpido da manhã, voando muito por sobre os olmos, perseguindo-se, escapando-se, bicando-se, volteando no espaço. Em seguida, cansados de se perseguirem, cansados de voar, desceram graciosamenre, baixaram delicadamente, pousaram silenciosos nas árvores, nos muros, com os olhos brilhantes à espreita, as cabeças voltando-se para aqui e para acolá, atentos, despertos, intensamente conscientes de qualquer coisa, de um objecto particular.
    Talvez fosse uma casca de caracol erguida na relva como uma catedral cinzenta, um edifício incendiado marcado por círculos escuros na sombra verde da relva. Ou talvez  vissem o esplendor das flores formando um clarão vermelho sobre os canteiros, enquanto os espaços abertos entre os caules formavam uma série de túneis avermelhados e sombrios. Ou então fitavam as pequenas folhas brilhantes da macieira, dançando de modo contido, cintilando hirtas por entre as flores salpicadas de cor-de-rosa. Ou então viam uma gota de chuva  cair sobre a sebe e aí ficar suspensa, com a imagem de uma casa inteira contida dentro dela e olmos tão altos como torres. Ou então contemplavam o sol de frente e os seus olhos tornavam-se grãos de ouro.
   De olhos voltados para um e outro lado, desciam mais para baixo entre os ramos, nas sombrias áleas desse universo onde as folhas apodrecem e as flores caem. Depois, um deles desceu como uma flecha, num voo certeiro e bicou o corpo mole e monstruoso de um verme indefeso, bicou-o uma e outra vez e deixou-o a apodrecer. Lá em baixo,entre as raízes onde as flores sucumbem, há odores de morte e gotas no flanco intumescido das coisas inchadas. A pele dos frutos apodrecidos estala deixando escapar uma substância demasiado espessa para escorrer. As lesmas deixam atrás de si secreções amarelas e às vezes, aqui e ali, um corpo informe, como uma cabeça em cada extremidade, oscila lentamente de um lado para o outro. Os pássaros de olhos de ouro, saltando entre as folhas, observam ironicamente essa húmida podridão. De vez em quando mergulham selvaticamente a ponta do bico na mistura pegajosa.
   O sol atingiu finalmente a altura da janela, aflorou a cortina bordada a vermelho e revelou círculos e linhas. A claridade da luz nascente instalou-se no fundo do prato e o seu brilho concentrou-se no gume de uma faca. Cadeiras e armários surgiram em segundo plano, mas apesar de separados uns dos outros parecem inexplicavelmente entrelaçados.Tornaram-se mais brancas as águas do espelho na parede. No peitoril da janela a flor real recebeu a companhia de uma flor fantasma. E, no entanto, o fantasma fazia parte da flor verdadeira pois quando um botão abria, um outro botão semelhante desabrochava também na flor mais pálida do espelho.
   O vento soprou. As ondas ressoaram na praia, como guerreiros com turbantes, como homens de turbante brandindo azagaias envenenadas sobre as cabeças e precipitando-se ao encontro de rebanhos de ovelhas brancas.»
 
 
Virginia Woolf. As ondas. Tradução de Francisco Vale. Relógio D'Água., p. 60-62
«Quero também aumentar a minha valiosa colecção de observações sobre a verdadeira natureza da vida humana»



Virginia Woolf. As ondas. Tradução de Francisco Vale. Relógio D'Água., p. 56

erva-cidreira

domingo, 24 de março de 2013

Louis Destouches et Edith Follet lors de leur mariage à Quintin le 19 août 1919

 

«É mais difícil renunciar ao amor do que à vida.»

Louis-Ferdinand Céline. Viagem ao Fim da Noite. Tradução, apresentação e notas Aníbal Fernandes, Edição Babel, 2010, Lisboa p. 78

«As árvores cresciam na sombra e subiam ao céu para se juntarem à noite.»

Louis-Ferdinand Céline. Viagem ao Fim da Noite. Tradução, apresentação e notas Aníbal Fernandes, Edição Babel, 2010, Lisboa p. 78
«Digo-vos, simplórios, vencidos da vida, escorraçados, espoliados, transpirados de sempre, previno-vos: quando os grandes deste mundo resolverem amar-vos é porque vão transformar-vos em carne para canhão.»
 
 
 
 
Louis-Ferdinand Céline. Viagem ao Fim da Noite. Tradução, apresentação e notas Aníbal Fernandes, Edição Babel, 2010, Lisboa p. 75/6

O roubo do pobre

«O roubo do pobre faz-se uma maliciosa recuperação do poder individual, está a compreender...Aonde iríamos parar? Por isso, repare bem, a repressão dos delitos insignificantes é exercida em todos os climas e com rigor extremo, não só como meio de defesa social, mas também, e acima de tudo, como aviso severo a todos os infelizes para continuarem no seu lugar e na sua casta, mansos, resignadamente satisfeitos por morrer ao longo dos séculos, e indefinidamente, de miséria e de fome...»
 
 
 
Louis-Ferdinand Céline. Viagem ao Fim da Noite. Tradução, apresentação e notas Aníbal Fernandes, Edição Babel, 2010, Lisboa p. 75

«(...) as suas perversidades são consagradas pelas leis.»

Louis-Ferdinand Céline. Viagem ao Fim da Noite. Tradução, apresentação e notas Aníbal Fernandes, Edição Babel, 2010, Lisboa p. 74

«A maior parte das pessoas só morre no último momento; outras começam a fazê-lo e a agarrar-se a isso com vinte anos de antecedência e às vezes mais. São os felizes do mundo.»



Louis-Ferdinand Céline. Viagem ao Fim da Noite. Tradução, apresentação e notas Aníbal Fernandes, Edição Babel, 2010, Lisboa p. 46

Nesta profissão de sermos mortos


«Nesta profissão de sermos mortos não devemos mostrar-nos difíceis; temos de proceder como se a vida vá continuar, o mais duro é isto, esta mentira.»



Louis-Ferdinand Céline. Viagem ao Fim da Noite. Tradução, apresentação e notas Aníbal Fernandes, Edição Babel, 2010, Lisboa p. 45

«Eu próprio cheguei a ver quatro homens, rabo incluído, a dormitar em plena água mortos de sono, até ao pescoço.»



Louis-Ferdinand Céline. Viagem ao Fim da Noite. Tradução, apresentação e notas Aníbal Fernandes, Edição Babel, 2010, Lisboa p. 45

«Mas a partir de Outubro acabaram-se de vez as pequenas abertas e a geada tornou-se cada vez mais espessa, densa, mais tuberosa, recheada de granadas e balas. Depressa entrámos em plena borrasca, e aquilo que procurávamos não ver, a nossa própria morte, surgia em cheio à frente e já não conseguíamos ver mais nada.»



Louis-Ferdinand Céline. Viagem ao Fim da Noite. Tradução, apresentação e notas Aníbal Fernandes, Edição Babel, 2010, Lisboa p. 43/44

«Fazia-se bicha para ir morrer. O próprio general já não encontrava acampamentos sem soldados. Acabávamos por nos deitar em pleno campo, generais ou não. Os que ainda tinham um resto de sentimento, perderam-no.»



Louis-Ferdinand Céline. Viagem ao Fim da Noite. Tradução, apresentação e notas Aníbal Fernandes, Edição Babel, 2010, Lisboa p. 41

rio caudaloso


Miosótis

«Flor Miosótis significa recordação, fidelidade e amor verdadeiro. É também conhecida como “Não-me-esqueças.»
 
(...)
 
 
«Segundo a lenda europeia, o jovem apaixonado era um cavaleiro que ao tentar apanhar a flor Miosótis para oferecer à sua amada, caiu no rio e se afogou devido ao peso da armadura que usava. Desde então, a flor simboliza o amor sincero e desesperado.
 
       A explicação do nome "não-me-esqueças" da flor pode ser explicada por algumas lendas. Uma delas diz que num belo dia de Primavera, dois jovens apaixonados se encontravam à margem de um rio. Nas águas turbulentas, a jovem avistou um ramo de miosótis flutuando e ficou maravilhada pela beleza da flor. O seu amado, mergulhou então para apanhar as flores e oferecê-las à sua namorada. No entanto, quando tentou voltar para a margem, foi arrastado pela forte correnteza. Esta lenda conta que pouco antes de desaparecer ele gritou para a sua amada: "Não me esqueça, me ame para sempre!". A partir desse dia a flor miosótis passou a crescer nas margens dos rios, para que mais ninguém tivesse que morrer por sua causa.
         Uma outra lenda conta que Adão, quando estava no Jardim do Éden dando nome às plantas, esqueceu-se de uma planta muito pequenina, que interpelou Adão para saber qual seria o seu nome. Adão então disse que seria “Não-me-esqueças”, para que ele nunca mais a esquecesse.
 
  A flor Miosótis (Não-me-esqueças) é conhecida também em outras línguas como: “Forget-me-not” (Inglês), “Vergissmeinnicht” (Alemão), “Nomeolvides” (Espanhol), “Nontiscordardimé” (Italiano).
 
      A flor Miosótis foi utilizada como emblema secreto da Maçonaria, para que os maçons pudessem se identificar durante as perseguições às lojas maçônicas na Alemanha.
É uma flor que simboliza a caridade e a fraternidade.
Dizem que as lágrimas derramadas nas pétalas pela Virgem Maria deram a cor azul à flor. Existem Miosótis também nas cores branca e rosada. São plantas rasteiras que se dão bem em baixas temperaturas e surgem na primavera.»
 

vidoeiro-prateado

trouxe-mouxe


elemento da locução adverbial

a trouxe-mouxe a torto e a direito, confusamente, a esmo, atabalhoadamente

sábado, 23 de março de 2013

Balkan Epic, (Skira, 2006).


Um minuto de silêncio
 
"Nos anos 70, Marina Abramovic viveu uma intensa história de amor com Ulay. Durante 5 anos viveram num furgão realizando todo tipo de performances. Quando sentiram que a relação já não valia aos dois, decidiram percorrer a Grande Muralha da China; cada um começou a caminhar de um lado, para se encontrarem no meio, dar um último grande abraço um no outro, e nunca mais se ver.

23 anos depois, em 2010, quando Marina já era uma artista consagrada, o MoMa de Nova Iorque dedicou uma retrospectiva a sua obra. Nessa retrospectiva, Marina compartilhava um minuto de silêncio com cada estranho que sentasse a sua frente. Ulay chegou sem que ela soubesse e... Foi assim."

(Traduzido por Rodrigo Robleño)
 
 
 

sexta-feira, 22 de março de 2013

''cabelos entrançados''


«As flores inclinam a cabeça contra a janela. Vejo pássaros selvagens. E instintos mais selvagens que o mais selvagem dos pássaros vibram no meu coração.» 


Virginia Woolf. As ondas. Tradução de Francisco Vale. Relógio D'Água., p. 49

insinceridade


''Durante toda a minha vida - queira Deus que não seja longa - realizarei a gigantesca amálgama dessas contradições tão cruelmente evidentes em mim.»




Virginia Woolf. As ondas. Tradução de Francisco Vale. Relógio D'Água.,

erva-toira

gostar do penacho

 procurar ou gostar de lugares de representação

AVES CLANDESTINAS


Há aves de quem nos queremos lembrar
ou que nunca vimos, aves desempossadas
cobertas por campanários de literatura

Aves clandestinas numa curva adjacente
imponderadas pelo desgaste das palavras
como veias carregadas de tinta subversiva

Aves que espalhavam ideias como sangue
e escondiam tipografias por turnos
na encenação decisiva dos incêndios


Tiago Patrício. O Livro das Aves. Edições Quasi, 2009,.p. 42



«O que dizes só é verdadeiro aqui, só é verdadeiro agora.»


Virginia Woolf. As ondas. Tradução de Francisco Vale. Relógio D'Água., p. 20

«Odeio coisas instáveis, coisas nevoentas. Odeio andar por aí a confundir as coisas.»




Virginia Woolf. As ondas. Tradução de Francisco Vale. Relógio D'Água., p. 17

«O sol não nascera. O mar apenas se distinguia do céu pelo leve preguear das águas, semelhantes a um tecido finamente enrugado. Lentamente, à medida que o céu clareava, uma barra de sombra desceu no horizonte, separando o céu do mar, e o grande tecido cinzento ficou marcado por grossas linhas que se agitavam sob a superfície, perseguindo-se num ritmo infindável.
  Ao aproximarem-se da praia as ondas erguiam-se, tomavam forma e desfaziam-se arrastando pela areia um ténue véu de espuma branca. A ondulação detinha-se, partia de novo, suspirando como alguém que dorme e cujo sopro vai e vem sem que a sua consciência o saiba. Pouco a pouco, a barra escura do horizonte clareou como as impurezas de um vinho antigo que se depositassem numa garrafa, deixando transparecer o seu vidro. Lá ao fundo, também o céu se tornou translúcido, como se nele se houvesse desprendido um sedimento branco, ou o braço de uma mulher reclinada no horizonte erguesse ao alto uma lâmpada. Faixas de branco, amarelo e verde alongaram-se sob o céu como longas folhas de um leque. Depois a mulher ergueu a lâmpada ainda mais alto: o ar inflamado pareceu cindir-se em fibras vermelhas e amarelas, elevando-se da superfície verde num frémito ardente, como as chamas envoltas em fumo de uma fogueira. Pouco a pouco, todas as fibras se fundiram numa única massa incandescente e o cinzento do céu transformou-se num milhão de átomos de um suave azul. A superfície do mar tornou-se transparente e as grandes linhas escuras quase desapareceram no ondular das águas e na sua cintilação. O braço que sustinha a lâmpada continuou a subir devagar até que uma grande labareda surgiu.
  Um disco de fogo ardeu no rebordo do horizonte e o mar à sua volta tornou-se um esplendor de ouro.
  A luz feriu as árvores no jardim, e as folhas agora transparentes iluminaram-se uma a uma. Um pássaro cantou alto. Houve uma pausa. Depois outro pássaro retomou, mais baixo, o mesmo canto. O Sol deu contornos às paredes da casa e poisou como a ponta de um leque numa persiana branca, deixando uma dedada de sombra azul sob a folhagem próxima da janela de um quarto. A persiana estremeceu ao de leve, mas dentro de casa tudo permaneceu vago e sem substância. Lá fora, os pássaros cantavam as suas melodias vazias.»
 
 
Virginia Woolf. As ondas. Tradução de Francisco Vale. Relógio D'Água., p. 7/8

quinta-feira, 21 de março de 2013

'' o enterro das ribeiras''

OS PINTASSILGOS DE MIRANDELA

Nasci numa casa com gaiolas brancas
espalhadas pelo Verão
Era o meu pai vivo e o meu avô estival
entrava pela hora mais terna
enquanto encarregado das gaiolas
e a minha infância inteira decrescia
no canto da casa dos pássaros

O alpendre era de uma inclinação natural
com avô e pássaros encostados à sombra dos álamos
e as gaiolas casas que os abrigavam
do frio, da fome e dos gatos bravos
A minha alegria era quente como a terra
e contava ensinar ao meu filho bisneto
a tracção pelos grilos, caracóis
e pintassilgos na doçura das borboletas
Em Mirandela havia um vale junto a um rio
com pomares e o cheiro de figos fáceis
Os pintassilgos divididos na abundância
eram como crianças atrás das amoras
que inspiram as flores de uma música sucessiva

O Pintassilgo é a mais bela ave silvestre
e se não pudesse manter as gaiolas em casa
era como se não houvesse onde permanecer
Eles amotinavam-se nas minhas barbas
desalojam corvos e os dragões dos poemas
fazem a tarde parecer tão antiga e adormecer
como a infanta primavera em que o meu avô
era o estio e os bisnetos existiam mesmo
e os nossos olhos acariciavam os pássaros,
que é tão tarde agora para dizer aqueles que morriam
exaustos a contar os meses atrás das grades



Tiago Patrício. O Livro das Aves. Edições Quasi, 2009,.p. 33/4

[Frances Benjamin Johnston, full-length self-portrait dressed as a man with false moustache, posed with bicycle, facing left]


cabotino


nome masculino


 1. cómico ambulante
2. actor pouco competente na sua profissão
3. figurado indivíduo que alardeia qualidades que não tem

(Do francês cabotin, «idem»)

«Os caçadores são os mais ferozes amantes das aves» 



Tiago Patrício. O Livro das Aves. Edições Quasi, 2009,.p. 17

colar negro

serpente-pássaro


«(...)»
Mas por vezes o travesso vento primaveril,
Ou a combinação das palavras num livro de acaso,
Ou o sorriso de alguém puxavam-me de repente
Para a vida que não se realizou.
Nesse ano teria acontecido isso e aquilo,
Nessoutro - isto: viajar, ver, pensar
E lembrar, e em novo amor
Entrar, como num espelho, com a consciência obtusa
Da traição e com, ainda ontem não a tinha,
Uma pequena ruga...




Anna Akhmatova. Poemas. Edição Bilingue. Tradução do russo, selecção e notas de Joaquim Manuel Magalhães e Vadim Dmitrier. Edições Cotovia, Lisboa, 1992.

3


Anoitece, e no céu azul muito escuro
Onde há pouco a igreja de Jerusalém
Resplandecia com misteriosa magnificiência,
Apenas duas estrelas sobre a confusão dos ramos,
E a neve esvoaça de algures sem ser do alto,
Mas como se da terra se erguesse,
Preguiçosa, terna, com cautela.
O meu passeio foi-me estranho nesse dia.
Quando saí, ofuscou-me
O limpo reflexo sobre coisas e rostos,
como se por todo o lado as pétalas pousadas
Dessas rosas pouco grandes amarelo-rosadas,
Cujo nome eu esqueci.
O frio ar seco e sem vento de Inverno
De tal modo acariciava e guardava cada som
Que me parecia: o silêncio não existe.
E na ponte, pela balaustrada ferrugenta
Enfiavam as mãos com pequenas luvas
As crianças, para alimentar patos sôfregos e matizados
Que mergulhavam na brecha cor de tinta.
E eu pensei: não pode ser
Que um dia eu esqueça isto.
E se um caminho difícil está à minha frente,
Eis um leve peso, que posso
Carregar comigo para na velhice, na doença,
Quem sabe, na miséria - recordar
O pôr do sol exaltado, e a plenitude
Das forças da alma, e o fascínio da vida querida.


1914-1916

Anna Akhmatova. Poemas. Edição Bilingue. Tradução do russo, selecção e notas de Joaquim Manuel Magalhães e Vadim Dmitrier. Edições Cotovia, Lisboa, 1992., p. 47

«Há sempre um chinelo velho para um pé doente.»


Nikos Kazantzaki. Liberdade ou Morte. Estúdios Cor., p. 484

carpideira

nome feminino

 1. pessoa a quem se paga para chorar os defuntos durante os funerais
2. figurado mulher que anda sempre a lastimar-se
3. figurado lamúria; choradeira

«Desgraçados dos que possuem o juízo todo.»



Nikos Kazantzaki. Liberdade ou Morte. Estúdios Cor., p. 477


«(...) aflorava o assunto, mas com muitos rodeios a fim de ver se conseguia levar a águia ao seu moinho.»




Nikos Kazantzaki. Liberdade ou Morte. Estúdios Cor., p. 466


«Os últimos cartuchos, ó minha perdiz,
Desperdicei-os com as cotovias.
E agora cheio de despeito
Só me resta olhar para ti.»








Nikos Kazantzaki. Liberdade ou Morte. Estúdios Cor., p. 444

deferência


nome feminino

1. atenção respeitosa
2. condescendência respeitosa
3. acatamento




«     Senhora do sangue do meu altar
Sangue do sacrifício no monte sagrado
O do nosso filho - o sangue do cordeiro - corre no monte
                                                sagrado:
              sangue do teu ventre...sangue do sacrifício...!»


Turcsány Péter.Novíssima Poesia Húngara. Tradução de Ernesto José Rodrigues. Bico d'Obra,.p. 63



«depois de vós, não é permitido ter frio.»



Tóth Erzsébet.Novíssima Poesia Húngara. Tradução de Ernesto José Rodrigues. Bico d'Obra,.p. 61

COMO SE



meia-noite no quarto a luz pisca
abro esta janela para mim
o sonho bruxuleia quase extinto
faço como se não tivesse frio

faço tudo como se fosse amanhã
porquê acreditar quando se discursa
porquê acreditar que aqui agora é Verão
a palavra esquarteja-se na minha boca

juntam-se estorninhos por cima de mim
-céus o que eu também estou a dizer -
só aranha caça moscas de Outono
será que alcanço uma morte digna


1974


Pátkai Tivadar.Novíssima Poesia Húngara. Tradução de Ernesto José Rodrigues. Bico d'Obra,.p. 47

Luto Branco


a Cskonai Attila

Acumula-se, como nos lábios fria
nicotina, nos arbustos o amarelo de morte,
em roto casaco as árvores envoltas:
nevoeiro: - luto branco do nosso parque!


Os lagos são máscaras de prata geladas,
como a calma no rosto de minha mãe!
Distintivos - murchar das folhas, das equimoses
na folhagem do bosque, no meu rosto.


Unha escavadora, a Lua sob os olhos nossos;
flores do Dia dos Mortos:
caem-nos crisântemos nos braços
-consoladores!- na neve dos nossos ossos!


Troncos em fila para um Deus severidade,
pensamentos desarmados
-deforma-se a máscara de prata do lago:
degelo - soluça síroco.


Calma severa no rosto de minha mãe;
planta árvores de folha-distintivo
na colina sagrada de crisântemos:
que eles se elevem aos país-ave.


E acumula-se ainda, como nos lábios fria
nicotina, nos arbustos o amarelo de morte,
e em roto casaco as árvores envoltas
-nevoeiro! - luto branco do nosso parque!

Géczi János.Novíssima Poesia Húngara. Tradução de Ernesto José Rodrigues. Bico d'Obra,.p.23

quarta-feira, 20 de março de 2013



«-A pobreza precisa de alegria, meu filho - disse a velha. - A dor necessita de distracção, senão devora-nos. Mais vale nós a devorarmos.- Enquanto falava, batia com o punho numa pedra. - A mim, que estou a divertir-me, a Morte já me fez sobrer bem. Como vingar-me daquele miserável?
já não posso conceber filhos, senão ela havia de ver.» 


Nikos Kazantzaki. Liberdade ou Morte. Estúdios Cor., p. 437



«Morremos por ser homens sem lenda, sem grandeza, sem mistério», dirá por sua vez o próprio Céline. E talvez seja esta a fonte das desgraças do homem moderno.



Louis-Ferdinand Céline. Viagem ao Fim da Noite. Tradução, apresentação e notas Aníbal Fernandes, Edição Babel, 2010, Lisboa p. 13

bípedes em busca de uma côdea

 
«Céline fala pelos não-judeus e faz-se vítima: « Nada tenho de especial contra os Judeus enquanto judeus, ou seja, galfarros como os outros bípedes em busca de uma côdea...Não me incomodam nada. Um judeu vale tanto como um bretão, assim em bloco, em igualdade de circunstâncias, como um tipo de Auvergne, um franco-monhé, um 'filho de Maria''...É possível...Contra o racismo judaico é que me revolto, é que sou mau e fervo até às profundezas das cuecas!...Vocifero! Faço estrondo! parêntesis  Para o Judeu, lembrem-se disto...quem não for judeu é animal!»  



Louis-Ferdinand Céline. Viagem ao Fim da Noite. Tradução, apresentação e notas Aníbal Fernandes, Edição Babel, 2010, Lisboa p. 10

Louis-Ferdinand Céline


«Mas em Céline, homem de obcecações e ódios irreprimíveis, nunca existiu meio termo. Céline não hesitou em mostrar-se desabrido e fanático.»

Aníbal Fernandes


Louis-Ferdinand Céline. Viagem ao Fim da Noite. Tradução, apresentação e notas Aníbal Fernandes, Edição Babel, 2010, Lisboa p. 10

tartufo

tartufo
nome masculino
indivíduo hipócrita; velhaco; devoto fingido
(Do italiano Tartufo, antropónimo, personagem da comédia italiana, aproveitada por Molière, pelo francês Tartufe, «idem»)

tartufo In Infopédia [Em linha]. Porto: Porto Editora, 2003-2013. [Consult. 2013-03-20].
Disponível na www: http://www.infopedia.pt/lingua-portuguesa/tartufo
>.
tartufo
nome masculino
indivíduo hipócrita; velhaco; devoto fingido
(Do italiano Tartufo, antropónimo, personagem da comédia italiana, aproveitada por Molière, pelo francês Tartufe, «idem»)

tartufo In Infopédia [Em linha]. Porto: Porto Editora, 2003-2013. [Consult. 2013-03-20].
Disponível na www: http://www.infopedia.pt/lingua-portuguesa/tartufo
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nome masculino

 indivíduo hipócrita; velhaco; devoto fingido

(Do italiano Tartufo, antropónimo, personagem da comédia italiana, aproveitada por Molière, pelo francês Tartufe, «idem»)
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