Natália Correia. Poemas a Rebate. Poesia Século XX. Publicações Dom Quixote, Lisboa, 1975., p. 111
« No topázio mais triste da minha clarividência, apareceu-me o anjo do Ocidente. Tropeçava de sombra em sombra e a espada com que guardava os jardins com buxos de livros da Europa despedaçara-se em números que espavoridos fugiam uns dos outros. Um horizonte de canções blindadas cantava a parábola das cidades brancas cobertas por noites laboriosas de formigas. As estátuas cambaleavam no alto de temerosos pensamentos. As catedrais eram levadas por um vento de elevadores endemoninhados. Mulheres a arder em revistas ilustradas faziam strip-tease para latas de conserva boquiabertas. E a Europa fugia para trás. Fugia parada na louca pulsação do seu movimento estático. E a Europa era a triste viuvinha no meio de uma roda de crianças que eram índios num filme americano.
Desatei então a correr para o sítio onde se chora. O sítio onde se chora é na penumbra pensativa. No quarto de estalactites da alma onde se fazem poemas. Mas notei que no meu pranto faltava uma lágrima e essa lágrima era Portugal. Percebi finalmente que Portugal era eu a chorar trevos de cinza pela Europa.»
Natália Correia. Poemas a Rebate. Poesia Século XX. Publicações Dom Quixote, Lisboa, 1975., p. 107
«Não, não participo nessa exposição de rosas com fins caritativos que tem amortalhado alguns poetas no ilustre cadáver do presidente da república. Se nimiamente me deixo viver pelo tempo que finge crianças rotas e pedintes é porque a todos espero no domingo de prata que coroará a semana de horrorosos trabalhos que a teia do tirano tece com a baba dos oprimidos. É por pura impaciência que me inscrevo na lista de todos os fuzilados por amor.
Natália Correia. Poemas a Rebate. Poesia Século XX. Publicações Dom Quixote, Lisboa, 1975., p. 102
«Os oprimidos são os maiores capitalistas do mundo porque capitalizam a nossa vocação para morrer pelas ideias que vão deixar tudo na mesma.» Natália Correia. Poemas a Rebate. Poesia Século XX. Publicações Dom Quixote, Lisboa, 1975., p. 101
José Agostinho Baptista.Jeremias o louco. Centelha/Poesia. Coimbra, 1978., pp. 53
(...) «cumprindo enfim o ciclo das breves orgias cristãs. foi então que a descobriram, o rosto contraído sob o azul de um céu litoral que a noite escurecia, agora que os vermes a procuravam, sedentos de um corpo triste;»
José Agostinho Baptista.Jeremias o louco. Centelha/Poesia. Coimbra, 1978., pp. 50
«indiferentes ao mundo, aos sonhos do mundo,»
José Agostinho Baptista.Jeremias o louco. Centelha/Poesia. Coimbra, 1978., pp. 48
(...) «marinheiros, sábios, homens do mar que o mar não devolverá. quando ele chegou nada disse. havia uma história de muitas milhas e tanta sede nos lábios gretados.»
José Agostinho Baptista.Jeremias o louco. Centelha/Poesia. Coimbra, 1978., pp. 47
(...) «consultando as profanas escrituras, testamentos e exercícios sobre a loucura, noções de orgia e massacre, pergaminhos que tempo algum destruiria;» José Agostinho Baptista.Jeremias o louco. Centelha/Poesia. Coimbra, 1978., pp. 39
José Agostinho Baptista.Jeremias o louco. Centelha/Poesia. Coimbra, 1978., pp. 36
(...) « o coração esmagado por deus, seduzido pelos frios rostos do passado, pelas visões incontroladas de poentes vermelhos, após as dunas.» José Agostinho Baptista.Jeremias o louco. Centelha/Poesia. Coimbra, 1978., p. 27
«Gente perdida, sem saber para onde vai, sem saber o que quer ou o que os espera. O que podem eles fazer contra o destino? Há um acidente. Um funeral. Um homem que já não é bem-vindo. O seu caminho cruza uma mulher e o seu filho, ambos com medo; um outro homem (marido, ex-marido?), caçador, alguém que cria medo. Andam à volta uns dos outros, como animais enjaulados num zoológico. (E às tantas a mulher é veterinária.) Há algo de malsão a trabalhar em Mariphasa, algo de maligno, de mais assustador do que qualquer filme de terror. Mas há também um conforto estranho: o de sabermos que esta gente é como nós. Talvez sejamos nós — gente perdida, transtornada, que já não sabe mais para onde se virar, gente perdida, assustada, à beira de explodir, à beira de libertar algo. O quê? Não sabemos, Sandro Aguilar não no-lo diz. Prefere deixar-nos ali a boiar neste plasma líquido, neste fluido amniótico de vidas com medo, de pesadelos nocturnos, sempre de noite, sempre às escuras, sob o signo do sangue.»
«Sobre os pés musicais da minha estrutura de pássaros, hei-de cantar-te até que as bocas desterradas no ódio bebam as lágrimas do anjo escondido na prega de uma obtusa consciência homicida.» Natália Correia. Poemas a Rebate. Poesia Século XX. Publicações Dom Quixote, Lisboa, 1975., p. 98
«Porque como todos aqueles que engolem a espada em chamas do amor eu conheço o medo e digo-vos que o democrático é o nosso medo de haver democracia. Ah, creiam-me, o democrático é, no centro da nossa crisólita de feridas abertas para a liberdade, a sufocação que não deixa haver democracias.»
Natália Correia. Poemas a Rebate. Poesia Século XX. Publicações Dom Quixote, Lisboa, 1975., p. 92
« Ó subalimentados do sonho! a poesia é para comer» Natália Correia. Poemas a Rebate. Poesia Século XX. Publicações Dom Quixote, Lisboa, 1975., p. 89
«não apedrejeis meu pássaro sem que ele cante minha defesa»
Natália Correia. Poemas a Rebate. Poesia Século XX. Publicações Dom Quixote, Lisboa, 1975., p. 88
« E eu que me recuso a engendrar verdugos, engolindo-me em vómito de vítima, enriqueci o meu dicionário de heliotrópios com um significado adequado ao curso do sol: camelo - tenaz imobilidade de juiz com o mundo paralítico nas patas.»
Natália Correia. Poemas a Rebate. Poesia Século XX. Publicações Dom Quixote, Lisboa, 1975., p. 85
«Começam a depor as testemunhas: a primeira é uma SOLTEIRONA arreitada de luxúria e escumando pavor. A SOLTEIRONA Fez uma magia Sobre a minha telha Um pénis que ria Entrou-me pela orelha. Em insónias roxas Vigílias de lama Arderam-me as coxas Nas brazas da cama. Deu-me um lírio preto Como um diamante Era um amuleto Para eu ter um amante. (...)» Natália Correia. Poemas a Rebate. Poesia Século XX. Publicações Dom Quixote, Lisboa, 1975., p. 27
«Ficaram mortos sem cemitério Sem se lembrarem de ter morrido»
Natália Correia. Poemas a Rebate. Poesia Século XX. Publicações Dom Quixote, Lisboa, 1975., p. 25
Natércia Freire. Obra Poética. Volume II. Imprensa Nacional - Casa da Moeda., p. 39
«Sem me creio, existo. Não importa a forma. Não importa aonde. Se Te creio existes.» Natércia Freire. Obra Poética. Volume II. Imprensa Nacional - Casa da Moeda., p. 37
«Não fechem mais caixões, à hora clara Em que o dia vai alto. Deixem que a vida seja sempre a Morte. Deixem que a Morte seja sempre a Vida. Que uma e outra, de amor, tão confundidas Nem saibam do mistério que as transporte. Deixem colar-se horror e podridão À nossa pele de vivos verticais. Não nos deixem esquecer as abissais descidas à Paixão. (...)»
Natércia Freire. Obra Poética. Volume II. Imprensa Nacional - Casa da Moeda., p. 29
Natércia Freire. Obra Poética. Volume II. Imprensa Nacional - Casa da Moeda., p. 27
«Mentecapta, cega E taralouca e mouca Tranco-me até aos dentes.»
Natércia Freire. Obra Poética. Volume II. Imprensa Nacional - Casa da Moeda., p. 26
«O rio comovido Os dias sossegados. Após tanta paixão Os ventos apagados.» Natércia Freire. Obra Poética. Volume II. Imprensa Nacional - Casa da Moeda., p. 26
Natércia Freire. Obra Poética. Volume II. Imprensa Nacional - Casa da Moeda., p. 12
«O que eu queria não era bem a Morte, Porque a Morte era eu para além de mim. Eu queria o fim, o fim...» Natércia Freire. Obra Poética. Volume II. Imprensa Nacional - Casa da Moeda., p.11
«Preciso que me esqueçam e me esqueça Para poder ser eu. E me esvaziem olhos e cabeça Até onde o que sou chamei de meu.» Natércia Freire. Obra Poética. Volume II. Imprensa Nacional - Casa da Moeda., P. 11
“Branco é um trabalho desenvolvido a partir do auto-retrato, traçando um percurso que passa pela auto-representação para construir a noção de ficção identitária. Esta, por sua vez, é baseada na expressão “aquilo sou eu”, no sentido em que eu sou as minhas percepções. Refere a inevitabilidade do corpo na criação de espaço. Aborda o conceito de arquivo nas suas formas e propósitos, e assinala a sua importância para a construção da identidade. Reflecte sobre as potencialidades e a finalidade da fotografia no contexto actual”.
Luísa Ferreira
«Se, pelo menos, pudéssemos viver duas vezes; a primeira vez, para cometer todos os inevitáveis erros; a segunda, para lucrar com eles.»
D.H. Lawrence
domingo, 9 de setembro de 2018
«Já visitei muitas vezes o inferno e já cheguei a pensar que se pode morrer de tristeza.»
T.S.ELIOT. A Terra sem Vida. Colecção Poesia. Edições Ática. Lisboa., p. 23
«Tu não sabes dizer nem supor, pois apenas conheces
Um monte de imagens quebradas, onde o sol bate,
E a árvore morta não oferece abrigo, nem o grilo trégua,» T.S.ELIOT. A Terra sem Vida. Colecção Poesia. Edições Ática. Lisboa., p.
sábado, 1 de setembro de 2018
imperceptível, o arado rasga a terra,
o amor dorme,
da árvore pende o mais doce fruto,
a casa é branca, tão branca, penso eu.
que farei deste silêncio e destas feridas,
que profundo desgosto atraiu o olhar,
que ódio mais necessário envolve as mãos?
sou jeremias,
é certo.
o fugitivo, o ermita,
o vagabundo do país de exílio,
da lisboa inerte onde se morre,
sou o louco impossível,
o pastor da noite que nunca chegará,
o avô negro que envelheceu entre as plantações
de algodão no sul,
e através da auto-estrada e do vento da costa,
quando se dirigia para o ocaso,
nas horas de maior calor;
tudo o que amei passou,
como as marés que deixam o
ciclo,
lua cheia e lua nova,
inverno e estio,
tudo o que amei se abandonou,
como náufrago que o mar abandona à praia,
quase morto,
no fim da viagem subitamente interrompida,
agora que o fascínio das noites do sul se perdeu
e o sul se perdeu,
e o cais se perdeu...
José Agostinho Baptista.Jeremias o louco. Centelha/Poesia. Coimbra, 1978., p. 25/6
«A cultura assusta muito. É uma coisa apavorante para os ditadores. Um povo que lê nunca será um povo de escravos.»
António Lobo Antunesin Diário de Notícias (2003)
«entretanto não conheci cidades senão as onde se morre,»
José Agostinho Baptista.Jeremias o louco. Centelha/Poesia. Coimbra, 1978., p. 21
José Agostinho Baptista.Jeremias o louco. Centelha/Poesia. Coimbra, 1978., p. 11
para aqueles cujo coração é o coração da terra e do vento e do mar e por isso são filhos da terra e do vento e do mar, é este livro. para os que regressam um dia e tudo se perdeu enlouquecendo depois pelos caminhos do litoral e da noite, é este livro. para eliot e pound, whitman e pessoa, shelley e algumas gerações, as belas malditas e perdidas gerações é este o livro. para cavalo louco e billy the kid, vagabundos de sempre bêbedos ternos e mestre desaparecidos, cantores dos campos e tocadores antigos, é este livro. para ti filho do norte e do sul de todos os silêncios de todas as casas de todas as tardes, irmão do fogo e da flor ardente, companheiro de setembro e maio e dezembro, é este livro. para aqueles que vão sobre as ondas e no deserto e no azul perseguindo a nuvem e o sol e a ave, derradeiros viajantes de muitas migrações, é este livro, daqui lisboa onde arde e morre o coração. José Agostinho Baptista.Jeremias o louco. Centelha/Poesia. Coimbra, 1978., pp. 7-8
sexta-feira, 31 de agosto de 2018
«Vai, vai, vai, disse a ave:
O género humano não pode suportar mais realidade.»
«A crítica do sujeito tampouco equivale à destruição do poeta ou do artista, mas da noção
burguesa de autor. Para os românticos, a voz do poeta era a de todos; para nós é
rigorosamente a voz de ninguém. Todos e ninguém são equivalentes e estão a igual
distância do autor e de seu eu. O poeta não é “um pequeno deus”, como queria Huidobro.
O poeta desaparece atrás de sua voz, uma voz que é sua porque é a voz da linguagem, a
voz de ninguém e de todos. Seja qual for o nome que demos a essa voz – inspiração,
inconsciente, casualidade, acidente, revelação –, é sempre a voz da outridade. »
Octavio Paz, 2013
''o poeta é um sujeito vazio, “a voz de ninguém”, que se
assume enquanto impessoalidade no momento da criação''
«Escrevemos para ser o que somos ou para ser aquilo que não somos. Em um ou em outro
caso, nos buscamos a nós mesmos. E se temos a sorte de encontrar-nos – sinal de criação –
descobriremos que somos um desconhecido. Sempre o outro, sempre ele, inseparável,
alheio, com teu rosto e o meu, tu sempre comigo e sempre só. »
Octavio Paz, 2012
«(...) como afirma Paz sobre Campos e Barnabooth (“heterônimo” de Valéry Larbaud),
esses poetas “no son Narciso: están fascinados por sus defectos, no por sus
perfecciones”
Octavio Paz, 2003
Os antigos invocavam as Musas.
Nós invocamo-nos a nós mesmos.
Não sei se as Musas apareciam —
Seria sem dúvida conforme o invocado e a invocação.
—
Mas sei que nós não aparecemos.
Quantas vezes me tenho debruçado
Sobre o poço que me suponho
E balido “Ah!” para ouvir um eco,
E não tenho ouvido mais que o visto —
O vago alvor escuro com que a água resplandece
Lá na inutilidade do fundo...
Nenhum eco para mim...
Só vagamente uma cara,
Que deve ser a minha, por não poder ser de outro.
É uma coisa quase invisível,
Exceto como luminosamente vejo
Lá no fundo...
No silêncio e na luz falsa do fundo...
Que Musa!...
Fernando Pessoa, 1972
''A realidade do objeto serve, antes, para
contrastar com a irrealidade do próprio sujeito; ou melhor, o objeto torna-se irreal – .''
«O “Paganismo Absoluto” de Caeiro finca suas raízes em recusas; é a busca de um caminho
contra a corrente, numa direção diversa da que trouxe Fernando Pessoa, da que nos trouxe,
ao que somos: ocidentais acidentados, fraturados entre o objetivismo e o subjetivismo, o
intelectualismo e o sentimentalismo, a ciência e a metafísica. »
PERRONE-MOISÉS, 2001
“O regresso ao tempo do começo, ao tempo anterior à
ruptura, implica uma ruptura. Não há como negar, por mais surpreendente que tal
proposição nos pareça, que só a modernidade pode realizar a operação de volta ao
princípio original, porque só a idade moderna pode negar a si mesma”
Octavio Paz, 2013
“Procuro encostar as palavras à ideia |
E não precisar dum corredor | Do pensamento para as palavras”
Fernando Pessoa, 1972.
“O mais natural e simples dos heterónimos é o menos real. Isto se dá
por excesso de realidade. O homem, sobretudo o homem moderno, não é de todo
real. Não é um ente compacto como a natureza ou as coisas; a consciência de si é
sua realidade insubstancial”
Octavio Paz. (2012b). “O desconhecido de si mesmo: Fernando Pessoa”, in Signos em rotação. Trad. de
Sebastião Uchoa Leite. São Paulo: Perspectiva, 3.ª ed., pp. 211.
“Digo de mim ‘sou eu’. | E não digo mais nada. Que mais há a dizer?”
«Experiência feita do tecido de nossos atos diários, a outridade é antes de mais nada a
percepção de que somos outros sem deixar de ser o que somos e que, sem deixar de estar
onde estamos, nosso verdadeiro ser está em outra parte. Somos outra parte. Em outra parte
quer dizer: aqui, agora mesmo enquanto faço isto ou aquilo. E também: estou só e estou
contigo, em um não sei onde que é sempre aqui. Contigo e aqui: quem és tu, quem sou eu,
onde estamos quando estamos aqui?»
Octavio Paz
“El hombre es
hombre gracias al lenguaje, gracias a la metáfora original que lo hizo ser otro y lo
separó del mundo natural. El hombre es un ser que se ha creado a sí mismo al crear
un lenguaje. Por la palabra, el hombre es una metáfora de sí mismo”
Tu, sol, é que me alegras!
A mim e ao mundo. A mim...
Que eu não sou mais que o mundo,
Nem mais que o céu sem fim...
Nem fecho os olhos baços
Só porque os fere a luz...
Ergo-os acima - e embora
Cegue, recebo-a a flux!
Crepúsculos são sonhos...
E sonhos é morrer...
Sonhar é para a noite:
Mas, para o dia, ver!
Sim, ver com os olhos ambos,
Com ambos devassar
Os astros n’essa altura,
E os deuses sobre o altar!
Ver onde os pés firmamos,
E erguemos nossas mãos!
E quer nos montes altos,
Quer nos terrenos chãos,
É sempre amiga a terra
E é sempre bom viver,
Se a terra à luz da aurora
E a vida ao amor se erguer!
Em toda a parte as ondas
D’esse infinito mar,
Por mais que andemos longe,
Nos podem embalar!
Em toda a parte o peito
Sente brotar a flux,
E sempre e à farta, a vida...
Vida - calor e luz!
Nos seixos d’essas praias,
Se o sol lá lhes bater,
N’um átomo de areia,
Deus pode aparecer!
Bata-lhe o sol de chapa,
E um deus se vê também
No pó, tornado um astro
Como esses que o céu tem!
Desprezos para a terra?!
Também a terra é céu!
Também no céu a impele
O amor que a suspendeu...
E quem lá d’esse espaço
Brilhar ao longe a vir
Dirá que é paraíso
E um éden a sorrir!
Em baixo! O que é em baixo?
Em baixo estar que tem?
Ninguém à eterna sombra
Nos condenou! ninguém!
Se até nos surdos antros,
Nas covas dos chacais,
Penetra o sol, vestindo-os
Com raios triunfais
Se ao céu até se viram
As bocas dos vulcões...
E têm os próprios cegos
Um céu... nos corações!
Não! não há céu e inferno:
Divino é quanto é!
Para que a rocha brilhe,
Basta que o sol lhe dê...
Basta que o sol lhe beije
As chagas que ela tem,
E a morta d’essa altura,
A lua, é sol também!
E as trevas da nossa alma,
A nossa cerração,
Oh! como se desbarata
A aurora da razão!
Mas se a razão, surgindo,
Nossa alma esclareceu,
Também tu, sol, no espaço
Surges, razão do céu...
Por isso é que me alegras,
Ó luz, o coração!
Por isso vos estimo...
Tu, sol, e tu, razão!
Antero de Quental
JORGE, Luísa Neto, Terra Imóvel, Lisboa, Portugália editora, 1964, pp. 87-94.
“ O Portugal deste fim de século já não é o de Amália. Enterrá-la-á segundo
o seu ritual, não o dela. Arrebatá-la-á, com cantos e flores a uma morte sobre
quem ela vogou intrepidamente sob a máscara de nossa senhora da tristeza.
O século não vai para tristezas. Demais as teve”
Eduardo Lourenço In, O Público, A morte de Amália Rodrigues: Portugal despede-se de si mesmo,
Lisboa, 1999, p.3.
«Tornou-se lendário o romance que terá envolvido Maria Severa
Onofriana (1820-1846), que dirigia uma taberna com sua mãe, Ana
Gertrudes Severa, uma célebre prostituta da Mouraria conhecida pelo
sobrenome de ‘Barbuda’, onde se cantava o Fado, e o Conde de Vimioso,
que a levaria pontualmente a cantar em salões de titulares.
Nasceria desta forma o mito da Severa, uma prostituta que por
tanto amar e sofrer, morreu nova. Teria sido este o seu destino, o seu
Fado: morrer de e por amor :
“ (...) Chorai, fadistas, chorai, que a Severa já morreu: e fadista como ela
nunca no mundo apareceu(...) Chorai, fadistas, chorai, que a Severa se finou.
O gosto que tinha o Fado, tudo com ela acabou”.»
NERY,Rui Vieira, Para uma História do Fado, 1ª edição, Lisboa, Público,
Comunicação Social, S.A, e Corda Seca, Edições de Arte, S.A, Outubro de 2004,
pp.64-66.
“ Para nós o Fado tem uma origem marítima (...) O Fado nasceu a bordo, aos
ritmos infinitos do mar...”.
CARVALHO, Pinto de, (Tinop), História do Fado, 1ª edição, Lisboa, Empreza da
História de Portugal, Sociedade editora, 1903.
“ Amália/ quis Deus que fosse o meu nome/ Amália/ Acho-lhe um jeito
engraçado/ Bem nosso e popular/ Quando oiço alguém gritar/ Amália/
Canta-me o Fado...”
Fado AMÁLIA de José Galhardo e de Frederico Valério
Get down, get down, little Henry Lee And stay all night with me You won't find a girl in this damn world That will compare with me And the wind did howl and the wind did blow La la la la la La la la la lee A little bird lit down on Henry Lee I can't get down and I won't get down And stay all night with thee For the girl I have in that merry green land I love far better than thee And the wind did howl and the wind did blow La la la la la La la la la lee A little bird lit down on Henry Lee She leaned herself against a fence Just for a kiss or two And with a little pen-knife held in her hand She plugged him through and through And the wind did roar and the wind did moan La la la la la La la la la lee A little bird lit down on Henry Lee Come take him by his lilly-white hands Come take him by his feet And throw him in this deep deep well Which is more than one hundred feet And the wind did howl and the wind did blow La la la la la La la la la lee A little bird lit down on Henry Lee Lie there, lie there, little Henry Lee Till the flesh drops from your bones For the girl you have in that merry green land Can wait forever for you to come home And the wind did howl and the wind did moan La la la la la La la la la lee A little bird lit down on Henry Lee
Artista: Nick Cave and the Bad Seeds Álbum: Murder Ballads Data de lançamento: 1996