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domingo, 29 de novembro de 2020
sábado, 14 de setembro de 2019
'' apenas me preocupa atingir o coração do coração e iluminar tudo.''
''Colóquio Internacional apenas me preocupa atingir o coração do coração e iluminar tudo. António Lobo Antunes: 40 Anos de Vida Literária que terá lugar no dia 28 de setembro, entre as 10h00 e as 19h30, no Auditório 2 da Fundação Calouste Gulbenkian.''
sábado, 19 de janeiro de 2019
"Compreendi que a casa estava morta quando os mortos principiaram a morrer. O meu filho Carlos, em criança, julgava que o relógio de parede era o coração do mundo e tive vontade de sorrir por saber há muito que o coração do mundo não estava ali connosco, mas além do pátio e do bosque de sequóias, no cemitério onde no tempo do meu pai enterravam lado a lado os pretos e os brancos do mesmo modo que antes do meu pai, na época do primeiro dono do girassol e do algodão, sepultaram os brancos que passeavam a cavalo e davam ordens e os pretos que trabalharam as lavras neste século e no anterior e no anterior ainda, um rectângulo vedado por muros de cal, o portão aberto à nossa espera com um crucifixo em cima, lousas e lousas sem nenhuma ordem nem datas nem relevos nem nomes no meio do capim, salgueiros que não cresciam, ciprestes secos, um plinto para as despedidas em que os gatos do mato dormiam, enfurecendo-se para nós a proibir-nos a entrada. O autêntico coração das casas eram as ervas sobre as campas ao fim da tarde ou no princípio da noite, dizendo palavras que eu entendia mal por medo de entender, não o vento, não as folhas, vozes que contavam uma história sem sentido de gente e bichos e assassínios e guerra como se segredassem se parar a nossa culpa, nos acusarem, refutando mentiras, que a minha família e a família antes da minha tinham chegado como salteadores e destruído África, o meu pai aconselhava.
- Não ouças".
domingo, 28 de outubro de 2018
«Ainda não falámos de O Arquipélago da Insónia (2008).
Não me lembro nada disso. Trata de quê?
Vou-lhe ler uma frase: “Começamos por uma casa, pelo sentimento, uma força em exercício, um poder que vem de há muito tempo, quando essa casa era igual mas era uma herdade, um latifúndio, quando nada faltava — a família, as empregadas na cozinha, o feitor, os campos, a vila ao fundo, e a voz do avô a comandar o mundo. Agora há fotografias no Alentejo em vez de pessoas.”
É bom!
Não se lembrava?
Não.
J.L. — É uma frase muito antuniana.»
Não me lembro nada disso. Trata de quê?
Vou-lhe ler uma frase: “Começamos por uma casa, pelo sentimento, uma força em exercício, um poder que vem de há muito tempo, quando essa casa era igual mas era uma herdade, um latifúndio, quando nada faltava — a família, as empregadas na cozinha, o feitor, os campos, a vila ao fundo, e a voz do avô a comandar o mundo. Agora há fotografias no Alentejo em vez de pessoas.”
É bom!
Não se lembrava?
Não.
J.L. — É uma frase muito antuniana.»
Excerto da Entrevista, António Lobo Antunes no Ípsilon, Jornal Público
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«E logo depois Explicação dos Pássaros (1981)...
Eu escrevia muito. Não ia a lado nenhum. Tinha uma vida sentimental tormentosa que de sentimentos não tinha nada, porque... porque eu era muito bonito, nem tinha de me mexer. E era estúpido, porque isso depois fazia-me sofrer.
Sofria?
Sofria — porque não estava a ser justo. Estava a usar as mulheres. Não estava a ser honesto.»
Eu escrevia muito. Não ia a lado nenhum. Tinha uma vida sentimental tormentosa que de sentimentos não tinha nada, porque... porque eu era muito bonito, nem tinha de me mexer. E era estúpido, porque isso depois fazia-me sofrer.
Sofria?
Sofria — porque não estava a ser justo. Estava a usar as mulheres. Não estava a ser honesto.»
Excerto da Entrevista, António Lobo Antunes no Ípsilon, Jornal Público
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«Rasgava cartas, destruía romances. Porquê?
Porque rasgo sempre tudo.
Há algum remorso?
Não. Andei dez anos a fazer um romance, antes de ir para África, durante África e depois de África. Foi para o lixo. Não prestava e os outros não prestavam.
Não destruiu Memória de Elefante.
Não. Queria publicar. Era, de certo modo, a celebração de um... Pertenço à classe dos eternos culpabilizados.
Porque diz isso?
Porque tive muitos privilégios e tinha consciência deles. E sempre me censurei atitudes de toda a ordem. Talvez tenha remorso por ter vivido mal e de uma maneira estúpida muitas vezes.
Porquê?
Não sei se era autopunição — porque tive muita sorte, nasci com muitos dons.»
Porque rasgo sempre tudo.
Há algum remorso?
Não. Andei dez anos a fazer um romance, antes de ir para África, durante África e depois de África. Foi para o lixo. Não prestava e os outros não prestavam.
Não destruiu Memória de Elefante.
Não. Queria publicar. Era, de certo modo, a celebração de um... Pertenço à classe dos eternos culpabilizados.
Porque diz isso?
Porque tive muitos privilégios e tinha consciência deles. E sempre me censurei atitudes de toda a ordem. Talvez tenha remorso por ter vivido mal e de uma maneira estúpida muitas vezes.
Porquê?
Não sei se era autopunição — porque tive muita sorte, nasci com muitos dons.»
Excerto da Entrevista, António Lobo Antunes no Ípsilon, Jornal Público
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A Última Porta antes da Noite
António Lobo Antunes
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sábado, 1 de setembro de 2018
«A cultura assusta muito. É uma coisa apavorante para os ditadores. Um povo que lê nunca será um povo de escravos.»
António Lobo Antunes in Diário de Notícias (2003)
António Lobo Antunes in Diário de Notícias (2003)
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citações
sábado, 20 de janeiro de 2018
“É fácil falar de Literatura porque me estou borrifando para a opinião dos críticos encartados e dos escritores encartados”
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domingo, 19 de fevereiro de 2017
''É mau entrar numa casa e ouvir o eco da nossa tosse.''
António Lobo Antunes, entrevista ao Jornal Expresso, 19-02-2017
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''Um homem sozinho não pode ser feliz.''
António Lobo Antunes, entrevista ao Jornal Expresso, 19-02-2017
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“Até Que as Pedras Sejam Mais Leves Que a Água”
António Lobo Antunes
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«Todos os livros são autobiográficos. Acabamos por só falar daquilo que, no fundo, conhecemos.»
António Lobo Antunes, entrevista ao Jornal Expresso, 19-02-2017
António Lobo Antunes, entrevista ao Jornal Expresso, 19-02-2017
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entrevistas
«As mulheres da idade da minha mãe metiam conversa comigo na rua. Era um assédio! Agora sou um monstro.»
António Lobo Antunes, entrevista ao Jornal Expresso, 19-02-2017
António Lobo Antunes, entrevista ao Jornal Expresso, 19-02-2017
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terça-feira, 1 de setembro de 2015
segunda-feira, 15 de junho de 2015
quinta-feira, 20 de novembro de 2014
António Lobo Antunes: "Não tenho muito jeito para viver"
Não gosta de conversas, de entrevistas então ainda menos. "A única coisa a que os leitores têm direito são os livros", costuma afirmar António Lobo Antunes, 72 anos. Com isto, o escritor quer dizer que o que importa é a literatura. E também que não se esperem grandes revelações sobre a sua vida privada: "Tenho relações de intimidade com duas ou três pessoas." Do dia a dia de Lobo Antunes há apenas algumas coisas que perpassam nas crónicas que publica na VISÃO, sobretudo nas que se aproximam mais do género diário pessoal.
"Eu só sou o António Lobo Antunes com o papel na mão. Sem o papel na mão, sou um chato."
Não, não é um chato. Apesar de todas as angústias, António Lobo Antunes mantém um sentido de humor de que vale a pena falar. Adora uma pequena história, um diálogo sem nexo, uma incongruência divertida. É capaz de se rir até às lágrimas de uma frase possidónia proferida por alguém, não importa quem. E de voltar a contá-la, acrescentando-lhe uma graça que nem todos poderão gabar-se de possuir. Lobo Antunes tem, isso sim, uma vida rotineira, uma vida de dedicação total à escrita. E, ao mesmo tempo que diz escrever porque não sabe fazer mais nada, também é capaz de dizer que está cansado de tudo.
"No princípio só vinha para aqui escrever. Já estou farto, apetece-me mudar de sítio. Nunca aguento muito tempo numa casa. Passado uns tempos, começo a ficar cansado. Não sei o que é e, sobretudo, não sei até que ponto é que quando estou a dizer que estou farto desta casa, não posso estar a dizer 'estou farto de mim'."
Vem aí uma daquelas alturas. António Lobo Antunes já acabou de escrever a primeira versão do livro (o terceiro depois deste que agora chega às livrarias, Caminho Como uma Casa em Chamas, sendo que, pelo meio, ainda terminou outro, que sairá no próximo ano) e tem em cima da sua mesa de trabalho um monte de folhas A4 que é preciso rever e cortar, cortar e rever. Anda às voltas com uma personagem, uma surda-muda que lá aparece. E lembra-se dela, a propósito de nada, antes de, na Avenida de Roma, entrar para o dentista onde há meses passa duas tardes por semana.
"- Não tenho muito tempo livre.
- E o que faz nos intervalos dos livros, quando não está a escrever?
- Coisas inconfessáveis [risos]."
Os dias estão mais frios e, às quintas-feiras, já não há jantar em casa dos pais, em Benfica. A mãe, Margarida, morreu quase há dois meses; um dos irmãos, Pedro, vai fazer um ano. Na semana passada, pela primeira vez depois da morte da mãe, o seu irmão João, o neurocirurgião, convidou os manos para jantar. Da casa da infância, António Lobo Antunes só quis trazer uma fotografia da mãe. Tem-na, emoldurada, nova, bem vestida e elegante, rodeada de estantes com livros até ao teto, de frases escritas na parede, de quadros pintados por Júlio Pomar.
"Nos hospitais, vi muita gente morrer, mas nunca vi ninguém chamar pelo pai. Agora olho para aquele retrato e penso: é a minha mãe. Só com a morte dela é que me dei conta da sua importância. Há aquela frase de Conrad tão dramaticamente verdadeira: tudo o que a vida nos pode dar é um certo conhecimento sobre ela que chega tarde demais."
Impressiona qualquer um, a quantidade de frases que António Lobo Antunes sabe de cor. Poemas, bocados de livros, diálogos, histórias. Sim, memória de elefante. As suas entrevistas estão cheias de citações, como se houvesse sempre uma à medida de cada pergunta jornalística. Já se disse aqui que não gosta de entrevistas, "uma espécie de interrogatório policial" (acha o próprio) durante as quais o alegado suspeito não larga a sua personagem (acrescentamos nós). E este, em concreto, diz apenas o que quer. Nos últimos tempos, por exemplo, tem-lhe apetecido dizer mal do Governo.
"Os portugueses merecem muito melhor, merecem muito mais do que o Governo que têm, muito mais do que a maneira como os obrigam a viver. Já ouviu um discurso do primeiro-ministro? A quantidade de erros de português que ele dá... Como é que podemos ser governados por pessoas que nem sequer sabem falar português? Não posso com esta mediocridade, com este vazio de ideias, com esta mentira constante. 'Decisão irrevogável'? O meu pai nunca admitiria que um filho seu voltasse atrás com a palavra. E isto passa-se no mundo inteiro. Há pouco tempo, George Steiner comentou comigo que nenhum dos bons alunos de Cambridge ia para a política: só os medíocres vão para a política."
António Lobo Antunes sobreviveu a mais um cancro. A dois, um em cada pulmão. O médico que o assistiu disse que o curava - e curou. Faz exames regulares, come rebuçados de mentol para ver se consegue reduzir o número de cigarros que ainda fuma. Fica com a boca impregnada de mentol. E continua a fumar. "Dá-me prazer." Tirando as viagens ao estrangeiro, sempre por causa dos livros, pouco sai de casa. Não vai de férias, nem de fim de semana (houve um tempo em que, como os magalas, tirava as tardes de sábado).
"Não tenho muito jeito para viver. E acho que os livros são a minha redenção."
Escreve dez horas por dia, sete dias por semana, com uma disciplina que poucos escritores no mundo devem ter. E a vida só existe assim. Umas vezes, os livros são tudo. Outras vezes, são "só papéis": "O que é isto comparado com a pavorosa realidade de, daqui a nada, estar no dentista?". É capaz de fazer, de enfiada, seis crónicas, "prosinhas", para depois regressar ao livro sem interrupções (o galope é outro, já explicou várias vezes). Almoça num dos cafés do bairro onde vive, o Conde Redondo. O prato do dia e, muitas vezes, uma sobremesa (tem gostos de garoto, pede leite-creme ou mousse de chocolate). Recebe visitas de meia dúzia de pessoas, três filhas, amigos, a editora Maria da Piedade Ferreira. E telefona a outra meia dúzia. De resto, está sempre ali, a escrever. Contabilidade bibliográfica: 25 livros (não quer que lhes chamem romances), mais cinco volumes de crónicas.
"A presença das pessoas não me incomoda nada. Desde que não falem comigo, escrevo em qualquer sítio. A Agustina dizia que, se fosse preciso, até escrevia numa cabina telefónica."
Conta-se que, quando terminava um livro, Iris Murdoch dava uma volta ao quarteirão e começava logo a escrever outro. No caso de António Lobo Antunes, os intervalos entre os livros duram três ou quatro longos meses. Nessas alturas, lê tudo o que apanha. Romance, ensaio, poesia. O que quer voltar a ler, o que gosta muito de ler (Tolstoi e Dostoievski, ditos com a bonita pronúncia que um amigo, professor de literatura russa, lhe ensinou), o que vai saindo, o que lhe mandam. É um grande leitor.
"Quando uma pessoa tem talento, percebe-se logo. Às vezes até na cara se percebe. As pessoas com talento têm uma certa aura. Marlon Brando pode estar metido num cantinho da tela, mas nós só reparamos nele quando olhamos para lá. Uma vez, vi Chagall a pintar os tetos da ópera de Nova Iorque. Era um homem de 80 e tal anos, pequenino, feiíssimo, estava sentado no chão a trabalhar e, no entanto, eu não consegui tirar os olhos dele."
Depois, há um dia em que marca uma data no calendário, para se obrigar a si próprio a começar. Não faz concessões de espécie nenhuma. As personagens não têm nome, os livros não obedecem a um plano organizado, têm o número de páginas que precisam de ter. Nas entrevistas, fala pouco ("Não tenho nada para dizer") e quase nada sobre o livro que é suposto ser promovido. Tem por hábito citar D. Francisco Manuel de Melo: "De que trata o livro? O livro trata do que vai escrito dentro."
"Gosto das pessoas que têm cara de quem vive. E isso não tem a ver com beleza. Normalmente, as pessoas que eu acho atraentes não são bonitas, têm um charme lento, que eu não sei explicar. Acontece-me o mesmo com as cidades. Não gostei nada de Paris nas primeiras vezes que lá fui, mas depois, a pouco e pouco, aquilo vai entrando dentro de nós. Não há nada a fazer, o talento é como um berlinde na mão, ou se nasce com ele ou não se nasce. O grande Curro Romero (conhece Curro Romero, o imortal toureiro?) tinha uma frase que explicava isto: o que não se pode não se pode e, além disso, é impossível."
Lobo Antunes mudou-se para o Conde Redondo há meia dúzia de anos. Começou por escrever num rés do chão transformado em ateliê de design que pertencia a um primo bastante mais novo (José Maria Nolasco, que, entretanto, morreu). Era um sítio escuro e frio, no inverno chegava a escrever de luvas e casaco. Depois, Tereza Coelho, a sua antiga editora, que também já morreu, descobriu a casa onde hoje vive ("onde estou", prefere dizer) e insistiu em que ele viesse para aqui.
"Comprei esta casa com o dinheiro de uma tradução de um livro que vendi para Espanha."
A casa - num prédio recuperado, com grandes janelas a toda a largura da fachada - não fica longe do Hospital Miguel Bombarda, onde, quando ainda exercia psiquiatria, passava muito do seu tempo. Isso, agora, já não lhe diz nada. Entra e sai da garagem e, quando sai a pé, não passa do virar da esquina (isto não se devia divulgar, mas atravessa a estrada fora da passadeira, quase sem olhar). Quando alguém, seu leitor, se aproxima, fica satisfeito.
"É agradável as pessoas gostarem do nosso trabalho. Temos uma sede infinita de amor. E de reconhecimento. Por muito certos que estejamos do nosso talento e da nossa capacidade de escrever."
E agora que - graças a um superaparelho que lhe "ressuscitou" um ouvido quase morto - ouve melhor, já nem tem a desculpa da surdez para fingir que não ouve.
Ler mais: http://visao.sapo.pt/antonio-lobo-antunes-nao-tenho-muito-jeito-para-viver=f802105#ixzz3JeTtu46R
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