domingo, 30 de agosto de 2015

[um poema de LEÓN FELIPE]
UIVOS
Passam os dias e os anos, a vida corre
e a gente não sabe por que vive...
Passam os dias e os anos, a morte chega
e a gente não sabe por que morre.
E um dia o homem põe-se a chorar sem mais nem menos,
sem saber por que chora...
e o que significa uma lágrima.
E tão-pouco alguém por si o sabe.
E quando mais tarde a gente abala para sempre,
sem saber quem é
nem o que veio cá fazer...
pensa que talvez tenha vindo apenas chorar
e uivar como um cão...
pelo cão de ontem que se foi,
pelo cão de amanhã que virá
e partirá também sem saber para onde
e por todos os pobres cães mortos do mundo.
Porque: não é o homem um pobre cão perdido e solitário sem dono e sem domicilio conhecido?...
E não pode o Homem chorar e uivar no Vento
sem mais nem menos... porque sim
como uiva o mar... Por que uiva o mar?
Senhor Arcipreste... por que uiva o mar?

(in 'O Sapateiro de Van Gogh', tradução de Rui Caeiro, &etc, 1993 - original de 'El Ciervo y otros poemas', 1982)

sábado, 29 de agosto de 2015

«E pensar eu que foi para o teu rosto
Que eu, homem, inventei a flor do nardo!»

Pedro Homem de Mello. Poesias Escolhidas. Imprensa Nacional-Casa da Moeda, Lisboa, 1983., p. 237
«E uma dança
Nascia de eu falar ao teu ouvido...»

Pedro Homem de Mello. Poesias Escolhidas. Imprensa Nacional-Casa da Moeda, Lisboa, 1983., p. 197

«E um cravo pára a meio da brancura...»

Pedro Homem de Mello. Poesias Escolhidas. Imprensa Nacional-Casa da Moeda, Lisboa, 1983., p. 193

«Caiu-me a noite no peito.
Disse-lhe adeus. Era tarde.
Estava o sonho desfeito!»

Pedro Homem de Mello. Poesias Escolhidas. Imprensa Nacional-Casa da Moeda, Lisboa, 1983., p. 182

«Dizias-me ao partir, chorando: - É cedo.»


Pedro Homem de Mello. Poesias Escolhidas. Imprensa Nacional-Casa da Moeda, Lisboa, 1983., p. 179

«Não dizem nunca roubo, mas, esmola.
Não dizem vício e amor, mas, sofrimento.»

Pedro Homem de Mello. Poesias Escolhidas. Imprensa Nacional-Casa da Moeda, Lisboa, 1983., p. 177

«E as nossas mãos brincavam com o lume
À beira da impaciência
E do ciúme...»

Pedro Homem de Mello. Poesias Escolhidas. Imprensa Nacional-Casa da Moeda, Lisboa, 1983., p. 164

André Kertész, Bathing, Dunaharaszti, Hungary, 1919



«Saudades o que são? São cinzas frias
Que foram fogo e luz no coração;»


Anrique Paço D' Arcos. Poesias Completas. 2.ª Edição. Imprensa Nacional-Casa da Moeda, Lisboa, 2006., p.

«Fui pedir um sonho ao jardim dos mortos.»


Pedro Homem de Mello. Poesias Escolhidas. Imprensa Nacional-Casa da Moeda, Lisboa, 1983., p. 66

«E havia um cristal no vento
E havia um cristal no mar.
E havia no pensamento
Uma flor por esfolhar...»

Pedro Homem de Mello. Poesias Escolhidas. Imprensa Nacional-Casa da Moeda, Lisboa, 1983., p. 56

«Tive presságios de adeus.»


Pedro Homem de Mello. Poesias Escolhidas. Imprensa Nacional-Casa da Moeda, Lisboa, 1983., p. 42

Andrei Tarkovsky, still from Nostalghia, 1983 (Russian house inside an Italian cathedral)


       QUANDO O VENTO
DOBROU TODO O SALGUEIRO...



Quando o vento dobrou todo o salgueiro
E as folhas caíram sobre o tanque
Disseste-me em segredo:
- A vida é como as folhas
E a morte como as águas!

Depois, à nossa frente,
Um pássaro cortou com o seu voo azul
Os caminhos do vento.
E tu disseste ainda:
-O amor é como as aves...

Mas quando aquele pássaro, ferido
Já não sei por que bala,
Veio cair no tanque,
Mais negros e mais fundos os teus olhos
Prenderam-se nos meus!
E não disseste nada...


Pedro Homem de Mello. Poesias Escolhidas. Imprensa Nacional-Casa da Moeda, Lisboa, 1983., p. 35
«De tanto pensar na morte
Mais de cem vezes morri.»


Pedro Homem de Mello. Poesias Escolhidas. Imprensa Nacional-Casa da Moeda, Lisboa, 1983
«...Compreendi então que nunca mais
a poderia deixar quando me beijou
pela primeira vez e a sua boca sabia a
esperma ainda fresco»


Jorge de Sousa Braga. O Poeta Nu. Fenda Edições, 1991., p. 71


A LUA E MARILYN

(...)

«Gostaria de me encontrar depois contigo num dos
     manicómios desta cidade (há vários e vai ser
     difícil escolher)
Talvez nos pudéssemos dedicar aí a cultivar rosas
     amarelas e fragantes
nos jardins da nossa inconsistência.»


Jorge de Sousa Braga. O POETA NU. Fenda Edições, 1991., p. 63

DOUGLAS MORRISON
                   JAMES
                 1943-1971


cogumelos vermelhos com pintas brancas cresciam
       livremente sobre a sepultura
estava inchado mas os seus olhos perdidos algures no
       Pacífico
conservavam o mesmo brilho de sempre


Instalei-me o melhor que pude tinha chovido há
       pouco e a relva estava molhada


Premi o botão do gravador e
      fiz-lhe a primeira pergunta: - Jim
segundo a Agência Noticiosa do Paraíso ocorreram
      incidentes lamentáveis durante o teu último
      concerto
em Jerusalém
que te masturbaste freneticamente para cima da
      assistência enquanto entoavas um salmo do
      Antigo Testamento
-O espectador é um animal agonizante-
     comentou -
foi uma reacção contra o onanismo de Deus
-O que é a loucura Jim?
-É teres-te esquecido da mala de viagem no útero
        da tua mãe
e quereres voltar atrás para a recuperar
ou semeares arroz nas planícies dos teus olhos quando
       já não há lágrimas para chorar
Passei então a explorar
a sua infância em Melbourne na Florida os tempos
       do Whiskey a Go-Go em Los Angeles
as suas ligações mal conhecidas com o profeta Isaías
-Jim a como está o grama de marijuana no Paraíso?
-A um dólar e dez cents - disse ele.
-Jim uma última pergunta
Que sentido faz um poeta depois de morto? ... -
Não cheguei a ouvir a sua resposta porque entretanto
      acordei
estava deitado na minha cama os primeiros raios de
      sol penetravam como que a medo pelas frin-
      chas das persianas
um pássaro cantava no telhado




Jorge de Sousa Braga. O POETA NU. Fenda Edições, 1991., p. 51/2

«Eu sou a má consciência do meu século. Tenho a
cabeça cheia de ratos e não consigo ver-me livre
deles. Nenhum raticida (o trigo roxo inclusive) se
revelou ainda eficaz.»


Jorge de Sousa Braga. O POETA NU. Fenda Edições, 1991., p. 50

«A não ser que se tomem as devidas providências
dentro em breve será celebrada na catedral de S.
Marcos a primeira missa submarina para alguns
cardumes de peixes boquiabertos.»

Jorge de Sousa Braga. O POETA NU. Fenda Edições, 1991., p. 48
«& a visão da primeira bomba no céu de Hiroshima:
fez-me crescer momentâneamente a água na boca
assim como à milhares de apreciadores de cogumelos.»

Jorge de Sousa Braga. O POETA NU. Fenda Edições, 1991., p. 44

«Era quase tão bela como a Vénus de Milo. Um dia,
cortou os braços a sangue frio.

Jorge de Sousa Braga. O Poeta Nu. Fenda Edições, 1991., p. 36
Um tufão chamado Marilyn varreu recentemente uma
das ilhas do Japão, tendo deixado um rasto de inúme-
ros cabelos loiros presos nas árvores.



Jorge de Sousa Braga. O Poeta Nu. Fenda Edições, 1991., p. 32

HOMENAGEM AOS MORTOS DA GRANDE
           GUERRA


Uns caíram porque não tinham pernas
Outros caíram porque foram empurrados
Outros ainda caíram porque tinham que cair
Eu cheguei atrasado como sempre
(quase duas décadas depois)
e só tive tempo para enxugar os olhos


Jorge de Sousa Braga. O Poeta Nu. Fenda Edições, 1991., p. 21
DE MANHÃ VAMOS TODOS ACORDAR COM
         UMA PÉROLA NO CU


Jorge de Sousa Braga. O Poeta Nu. Fenda Edições, 1991.,

«Nunca nada tive,
Menos tenho ao fim.»


José Régio. Música Ligeira. Volume Póstumo. Portugália Editora. 1ª edição: 1970. p. 55


    «Nem a tristeza
       Me pesa
Se te encontras a meu lado.»


José Régio. Música Ligeira. Volume Póstumo. Portugália Editora. 1ª edição: 1970. p. 55

tela

Calam-se as vozes, pensam-se saudades.

José Manuel Capêlo. corpo-terra. Trelivro, Lisboa, 1982., p. 75



«Não precisavas de mais nada
a não ser
os necessários comprimidos
que te aguentavam o coração
ou, todos os amigos
de que precisavas e não vinham
ou, o grande amor que há dentro
da tua alma refugiada no pano de pó.»


José Manuel Capêlo. corpo-terra. Trelivro, Lisboa, 1982., p. 61


em times square


Rasgaram-se as rosas
no encadeado dos dedos
bem como o apetite
de quem tem raiva nos olhos...
Parti à procura da luz
que vinha do sexo
(por onde me debruçava)
acabando por encontrar a
tua face
enamorada de outras rugas!
Times Square
não tinha mudado de sítio
nem tão pouco
as mãos dos pobres
que se estendiam a cada canto.
Quando plenamente te ris-te
compreendi que tinha
outro céu
à minha frente...

22.Outubro.1981
Lisboa/Portugal


José Manuel Capêlo. corpo-terra. Trelivro, Lisboa, 1982., p. 56
«Puxo de vários cigarros e fumo-os avidamente.
No meio deles, reparo
há metade do meu vazio
como no choro de uma criança
que não tivesse lágrimas
como nas badaladas dum sino
que não tivesse horas.»


José Manuel Capêlo. corpo-terra. Trelivro, Lisboa, 1982., p. 20

Não te imagino só
Imagino-te ausente

Raul de Carvalho

«Se me dói o ventre de não amar.»

Ana Maria Botelho. Céu de Linho. Sociedade de Expansão Cultural,  Lisboa, 1972.p 89

     FOI UM BURBURINHO NA CIDADE
NINGUÉM TINHA PÃO PARA A CRIANÇA
    QUE QUERIA MAIS PÃO


    O jornal dias depois
    divulgou a notícia:

«Encontradas misteriosamente mortas, uma mulher e uma criança num quarto alugado de um terceiro andar da Avenida Almirante Reis.  Estavam trancadas as portas. A Senhora Fulana de Tal  moradora no segundo andar do mesmo prédio, deu pelo triste sucesso, ao atender de manhã no patamar da escada o padeiro, por sentir um cheiro nauseoso que vinha  de cima. Preveniu imediatamente a esquadra. O Chefe Tal está procedendo a investigação para esclarecer a origem deste acto tão desumano e tresloucado.»


Ana Maria Botelho. Céu de Linho. Sociedade de Expansão Cultural,  Lisboa, 1972., p. 83
«Gemer não vale a pena
traz saudades»

Ana Maria Botelho. Céu de Linho. Sociedade de Expansão Cultural,  Lisboa, 1972.p. 67

«Hoje não senti
O frio da minha alma.»

Ana Maria Botelho. Céu de Linho. Sociedade de Expansão Cultural,  Lisboa, 1972.p 33

A MINHA POEIRA AO VENTO

 Ana Maria Botelho. Céu de Linho. Sociedade de Expansão Cultural,  Lisboa, 1972.

sexta-feira, 28 de agosto de 2015

«Olhou por cima do ombro para a hóstia branca da Lua que vogava na poeira revolvida pelo vento.»

John Steinbeck. A um deus desconhecido. Tradução de Manuel do Carmo. Publicações Europa-América., p. 220
«A Lua, duma frialdade de pedra, subiu ao céu e seguiu Joseph.»

John Steinbeck. A um deus desconhecido. Tradução de Manuel do Carmo. Publicações Europa-América., p. 219

''noite enluarada''

«O seu espírito era como uma estrada poeirenta»

John Steinbeck. A um deus desconhecido. Tradução de Manuel do Carmo. Publicações Europa-América., p. 202
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