terça-feira, 4 de março de 2025

Retrato

 Cruel como os Assírios,
Lânguido como os Persas,
Entre estrelas e círios
Cristão só nas conversas.

Árabe no sossego,
Africano no ardor;
No corpo, Grego, Grego!
Homem seja onde for.

Romano na ambição,
Oriental no ardil,
Latino na paixão,
Europeu por subtil:

Homem sou, homem só
(Pascal: «nem anjo nem bruto»):
Cristãmente, do pó
Me levanto impoluto.


Vitorino Nemésio, Nem Toda a Noite a Vida, Edições Ática, 1952

E a loucura com asas do seu povo.



Terra


Quanto a palavra der, e nada mais.

(…)

Se o mar é fundo e ao fim deixa passar…

Uma antena da Europa a receber

A voz do longe que lhe quer falar…

(…)

Terra nua e tamanha

Que nela coube o Velho-Mundo e o Novo…

Que nela cabem Portugal e a Espanha

E a loucura com asas do seu povo.



Miguel Torga

Goldfrapp - Clowns


Sylvia Plath
with typewriter in Yorkshire, September 1956Photograph: Elinor Friedman Klein/Mortimer Rare Book Room, Smith College, Northampton, Massachusetts

 Não tenho pressa. Pressa de quê?
Não têm pressa o sol e a lua: certos.
Ter pressa é crer que a gente adiante das pernas,
Ou que, dando um pulo, salta por cima da sombra.
Não: não tenho pressa.
Se estendo o braço, chego exactamente onde o meu braço chega -
Nem um centímetro mais longe.
Toco só onde toco, não onde penso.
Só me posso sentar onde estou.
E isto faz rir como todas as verdades absolutamente verdadeiras.
Mas o que faz rir a valer é que nós pensamos sempre noutra
                                                                                       cousa,
E somos vadios do nosso corpo.


Alberto Caeiro/Fernando Pessoa

 ESTADOS FASCISTAS DA MENTE E A SUA CONDIÇÃO ADESIVA

''Por vezes é necessário tirar umas horas ao dia para meditar, olhar, contemplar. E é no cruzamento das circunstâncias com a vontade que o faço, lendo as pequenas e grandes tempestades da História da Literatura na forma como o vento incide e mexe nas ideias, incomodando uns, despenteando outros, empurrando alguns para o conforto doméstico. Com os séculos tudo se torna indiferente, a história repete-se, e a consciência acaba por fornecer, por si própria, a sua medida e objecto.
De há uns anos para cá desisti do Diogo Vaz Pinto, de ler os seus textos, pelo racional prático de ser difícil captar a qualidade do seu pensamento crítico que foi desmaiando para uma desproporção emocionalizada dos conflitos de consciência que o perturbam e desfiguram; também por ser misterioso aquilo que o move. A sua prosa passou de curiosa e estimulante, a confusa e ociosa, num obsessivo fervor persecutório às liberdades fundamentais de um colectivo, com recorrentes ataques identitários à alteridade, pluralidade e liberdade de expressão e pensamento. O autor desapareceu sob o manto do seu próprio arsenal, escancarando a traição a si mesmo, naquilo que o guiava e que, agora de luzes apagadas, o mantém ocupado no esforço de nos persuadir com o seu choro de agonia. O autor que dá pontapés na sua própria ferida, desorientou-se na sua dor, saboreando os extremos de uma fantasia higienizadora da literatura, onde há muito decaído, e na sua existência ventríloqua do ódio, se recusa a brincar sozinho, demandando que brinquemos à força, para que ele sinta existir. Mas o autor existe sozinho e, na esperança de se ver nascer, a sua existência vai diminuindo. Não é, pois, de admirar que as preocupações ofegantes o reservem de prosseguir a paranoica indagação de encontrar o primeiro e último poeta, que com a sua verdade lhe mostre o caminho para o rosto de Deus, a coisa-em-si, a arché, o uno, a mónada, o fenómeno, o númeno, o sagrado vento de Paracleto. Também não é surpreendente ao espírito de quem, conhecendo-lhe os temas, se questione que experiências e vivências terão a capacidade de arrancar ao seu real a categoria insofismável do sentido da vida, para que um dia o autor didacta, apagado nas suas próprias teorias e apertado na sua batina inteiramente branca com filetes violáceos, se canse de cavalgar bêbedo e zonzo, encimado na sua férula, num tempo onde vemos a retirada da humanidade às mãos da própria humanidade.
É que se nem a vida está no seu próprio lugar, a perturbação da sua vitalidade vem enunciada nos estados fascistas da mente.''

Raquel Nobre Guerra
 Os amantes 
fazem-se reféns
um do outro

andam às voltas 
como animais cativos
arrastando consigo
a sua armadilha

Anise Koltz. Uma Morte Passageira. Tradução Regina Guimarães. Edição Exclamação.

“Life’s a bitch, then you die”



“The Physical Impossibility of Death in the Mind of Someone Living” (1991)

“Black Sheep with Golden Horns” (2009)


Damien Hirst

“A Idade da Maturidade” (1898)

obra de Camille Claudel

''arquitetura intelectual''

PODERIA FALAR-TE DO AMOR, ESSA COISA

«Poderia falar-te do amor, essa coisa
cinzenta e tenebrosa que faz sorrir
as criancinhas - mas não,
prefiro falar-te dum campo com erva
verde, muita erva muito
verde e com árvores
azuis onde à noite vai morrer

o vento. (...)»

Adolfo Luxúria Canibal. No rasto dos duendes eléctricos (Poesia 1978-2018). Porto Editora, 2019., p. 53

''As flores por vós assim trazidas irão ser sacrificadas.''

Adolfo Luxúria Canibal. No rasto dos duendes eléctricos (Poesia 1978-2018). Porto Editora, 2019., p. 42

 Assim as lágrimas que aos nossos olhos aflorarem

                                                                                 feridas; 

Adolfo Luxúria Canibal. No rasto dos duendes eléctricos (Poesia 1978-2018). Porto Editora, 2019., p. 42

 DOS GATOS BRANCOS QUE

   JAZEM MORTOS NA BERMA

               DO CAMINHO-DE-FERRO


1983

Adolfo Luxúria Canibal. No rasto dos duendes eléctricos (Poesia 1978-2018). Porto Editora, 2019

É TÃO CURTA A VIDA, MEU AMOR

 é tão curta a vida, meu amor
e tão infinita a morte,

Adolfo Luxúria Canibal. No rasto dos duendes eléctricos (Poesia 1978-2018). Porto Editora, 2019., p. 33

Under Stars

              e seios e braços e mãos e ventre e ancas

              e vulva e rabo e coxas e pés e sexo e tudo

                                                                             mas  tudo

                                                                                             BELO

No fim, virão os bichos

                                     lagartos

                                                     comer-nos!...

Adolfo Luxúria Canibal. No rasto dos duendes eléctricos (Poesia 1978-2018). Porto Editora, 2019., p. 31
 Ama-me
Inflama-me este sofrer
Que provoca tão estranho prazer 

Adolfo Luxúria Canibal. No rasto dos duendes eléctricos (Poesia 1978-2018). Porto Editora, 2019., p. 28

 Eu sou irmão da solidão

                  e com ela mantenho incestuosa relação.


Adolfo Luxúria Canibal. No rasto dos duendes eléctricos (Poesia 1978-2018). Porto Editora, 2019., p. 18
Em cada pedra
uma casa 
sonha existir

 Anise Koltz, UMA MORTE PASSAGEIRA, tradução de Regina Guimarães, edição Exclamação.

SANGUE NO ASFALTO

           Sangue no asfalto

Atravesso a azul noite da solidão
Envolto em ténues irradiações de pura emoção
Corpos desprendem gemidos mutilados
Em excêntricas posições espalhados
Pedaços de chapa vidros escacados
E um mundo de sensações medo horror
Fundem-se num sensual cheiro a morte e a dor

 
           Sangue no asfalto

Percorro ansioso os destroços no alcatrão
Abrasado em palpitações de pura paixão
Segurando um crânio já estilhaçado
No escuro de dois chorões agachado
Nutre-se de miolos o deus desnudado
Solto algumas imprecações contra o ladrão
E procuro outra azul noite - solidão

          Sangue no asfalto

Adolfo Luxúria Canibal. No rasto dos duendes eléctricos (Poesia 1978-2018). Porto Editora, 2019., p. 17

Venus In Furs

EU AMEI-TE...

 Eu amei-te; mesmo agora devo confessar.
Algumas horas desse amor estão ainda a arder;
Mas não deixes que isso te faça sofrer,
Não quero que nada te possa inquietar.
O meu amor por ti era um amor desesperado,
Tímido, por vezes, e ciumento por fim.
Tão terna, tão sinceramente te amei,
Que peço a Deus que outro te ame assim.


Aleksandr Púshkin. QUAL É A MINHA OU A TUA LÍNGUA? Cem poemas de amor de outras línguas. Organização de Jorge Sousa Braga. Edição Assírio& Alvim


 
vem pousar-me 
nos olhos.

Aida.

Eugénio de Andrade, in matéria solar, edições Assírio & Alvim

 Teu rosto.

Uma tintura de fogo

Na planície dos dedos.


Hilda Hilst, excerto, in Cantares

 162.


       tenho trinta e nove anos
       a lua está quase cheia
       e sou ainda uma criança


Matsuo Bashô, in O Eremita Viajante. Joaquim M. Palma, Edições Assírio&Alvim

domingo, 2 de março de 2025

 REGRESSAREI

Eu regressarei ao poema como à pátria à casa
Como à antiga infância que perdi por descuido
Para buscar obstinada a substância de tudo
E gritar de paixão sob mil luzes acesas
Sophia de Mello Breyner Andresen
In “O Nome das Coisas”

 


Béla Tarr's The Turin Horse 20111



 "Naquele carnaval, pois, pela primeira vez na vida eu teria o que sempre quisera: ia ser outra que não eu mesma."

Clarice Lispector . Felicidade clandestina. Rio de Janeiro: Rocco, 1998.

 ''a forma como a gente fala da forma como a gente sofre, muda a forma como a gente sofre.''

Christian Dunker

Chinfrins

''Ninguém termina na ponta dos dedos.''

''altas flores venenosas''

Noite transfigurada

 «Bebo-te toda assim, bruta, como em sonhos
           e deixo-me levar/vagar por ti
           feito sonâmbulo»

Adolfo Luxúria Canibal. No rasto dos duendes eléctricos (Poesia 1978-2018). Porto Editora, 2019., p. 16
(...)

«não sei o que seja esta coisa que me está a roer, a roer
se é saudade se é amor
        sei que rói e rói e me deixa a doer


Adolfo Luxúria Canibal. No rasto dos duendes eléctricos (Poesia 1978-2018). Porto Editora, 2019., p. 14

 «Longos anos de infelicidade levam o Homem à degradação, mais do que uma doença fatal.»

 Olga Tokarczuk. Conduz o teu arado sobre os ossos dos mortos. Tradução do polaco Teresa Fernandes Swiatkiewicz. Edição Cavalo de Ferro. 1ª Edição, 2019., p. 16

imprecações

 


Gina Pane

«(...), tive de me consolar a mim própria em pensamento.»

 Olga Tokarczuk. Conduz o teu arado sobre os ossos dos mortos. Tradução do polaco Teresa Fernandes Swiatkiewicz. Edição Cavalo de Ferro. 1ª Edição, 2019., p. 11

 «Todos seremos, um dia, nada mais do que apenas um corpo morto.»

Olga Tokarczuk. Conduz o teu arado sobre os ossos dos mortos. Tradução do polaco Teresa Fernandes Swiatkiewicz. Edição Cavalo de Ferro. 1ª Edição, 2019., p. 11

 « Se, naquela noite, tivesse consultado as Efemérides para saber o que se passava no céu, não teria mesmo ido para a cama. Mas, em vez disso, caí num sono profundo, com a ajuda de um chá de lúpulo, que acompanhei com dois comprimidos de valeriana. »

Olga Tokarczuk. Conduz o teu arado sobre os ossos dos mortos. Tradução do polaco Teresa Fernandes Swiatkiewicz. Edição Cavalo de Ferro. 1ª Edição, 2019., p. 5

 1.

E, AGORA, TENDE CUIDADO!


Certa vez, tendo escolhido um Caminho perigoso,
       um homem justo caminhou com Humildade
                                              pelo Vale da Morte.


Olga Tokarczuk. Conduz o teu arado sobre os ossos dos mortos. Tradução do polaco Teresa Fernandes Swiatkiewicz. Edição Cavalo de Ferro. 1ª Edição, 2019., p. 5

Todos são o outro e ninguém é o próprio.



Raquel Serejo Martins, VALSA A VAU, edição Poética Edições

''paixão enciclopédica''

domingo, 23 de fevereiro de 2025

Cansaço

 


Last Tango in Paris | 1972
dir. Bernardo Bertolucci

''amarelo nicotina''

Sylvia PlathA Campânula de Vidro. Relógio D'Água. Tradução e Posfácio de Mário Avelar, 2016., p. 12

 « Ora, eu não conquistara absolutamente nada, nem tão-pouco me conquistara a mim própria.»

Sylvia Plath. A Campânula de Vidro. Relógio D'Água. Tradução e Posfácio de Mário Avelar, 2016., p. 10

quarta-feira, 12 de fevereiro de 2025

“I could not live in any of the worlds offered to me — the world of my parents, the world of war, the world of politics. I had to create a world of my own, like a climate, a country, an atmosphere in which I could breathe, reign, and recreate myself when destroyed by living. That, I believe, is the reason for every work of art. The artist is the only one who knows the world is a subjective creation, that there is a choice to be made, a selection of elements. It is a materialization, an incarnation of his inner world. Then he hopes to attract others into it, he hopes to impose this particular vision and share it with others. When the second stage is not reached, the brave artist continues nevertheless. The few moments of communion with the world are worth the pain, for it is a world for others, an inheritance for others, a gift to others, in the end. When you make a world tolerable for yourself, you make a world tolerable for others.”

Anaïs Nin


"Three films a day, three books a week and records of great music would be enough to make me happy to the day I die".

François Truffaut, BOTD in (1932).


Katia Berestova



«(...) O indivíduo pode vislumbrar numerosos objetivos pessoais, finalidades, esperanças, perspectivas, que lhe deem impulso para grandes esforços e elevadas atividades; mas, quando o elemento impessoal que o rodeia, quando o próprio tempo, não obstante toda a agitação exterior, carece de esperanças e perspectivas fundamentais e se lhe revela como desesperador, desorientado e falto de saída, e quando responde com um silêncio vazio à pergunta que de qualquer modo se faz, consciente ou inconscientemente, acerca do sentido supremo, ultrapessoal e absoluto, acerca de toda atividade e de todo esforço — então se tornará inevitável, justamente entre as naturezas mais retas, o efeito paralisador desse estado de coisas, e esse efeito será capaz de ir além do domínio da alma e da moral, e de afetar a própria parte física e orgânica do indivíduo.

Thomas Mann, no livro “A Montanha Mágica”

 nobody can save you but

yourself.
you will be put again and again
into nearly impossible
situations.
they will attempt again and again
through subterfuge, guise and
force
to make you submit, quit and /or die quietly
inside.
nobody can save you but
yourself
and it will be easy enough to fail
so very easily
but don’t, don’t, don’t.
just watch them.
listen to them.
do you want to be like that?
a faceless, mindless, heartless
being?
do you want to experience
death before death?
nobody can save you but
yourself
and you’re worth saving.
it’s a war not easily won
but if anything is worth winning then
this is it.
think about it.
think about saving your self.
your spiritual self.
your gut self.
your singing magical self and
your beautiful self.
save it.
don’t join the dead-in-spirit.
maintain your self
with humor and grace
and finally
if necessary
wager your self as you struggle,
damn the odds, damn
the price.
only you can save your
self.
do it! do it!
then you’ll know exactly what
I am talking about.

Charles Bukowski

 “I think of you, but no longer speak of it.”

Hiroshima mon amour, Twenty-Four Hour Love Affair, written by Marguerite Duras and directed by Alain Resnais in 1959

Rostislav Kostal


 

O analfabeto político


O pior analfabeto é o analfabeto político.
Ele não ouve, não fala, não participa
dos acontecimentos políticos.
Ele não sabe que o custo de vida,
o preço do feijão, do peixe, da farinha
do aluguel, do sapato e do remédio
depende das decisões políticas.
O analfabeto político é tão burro que se orgulha e estufa o peito dizendo que odeia política.
Não sabe o imbecil que da sua ignorância
nasce a prostituta, o menor abandonado,
o assaltante e o pior de todos os bandidos
que é o político vigarista, pilantra, corrupto
e lacaio dos exploradores do povo.
–– extraído de “O analfabeto político”, poema de Bertolt Brecht (1898-1956)

 “Believe me, if you’ve been shut up for a year and a half, it can get to be too much for you sometimes. But feelings can’t be ignored, no matter how unjust or ungrateful they seem. I long to ride a bike, dance, whistle, look at the world, feel young and know that I’m free, and yet I can’t let it show.”

Anne Frank in her diary December 24, 1943

 Segredo
Não contes do meu
vestido
que tiro pela cabeça
nem que corro os
cortinados
para uma sombra mais espessa
Deixa que feche o
anel
em redor do teu pescoço
com as minhas longas
pernas
e a sombra do meu poço
Não contes do meu
novelo
nem da roca de fiar
nem o que faço
com eles
a fim de te ouvir gritar

Maria Teresa Horta

 



Rostislav Košťál , 1943
 Não posso dar-te mais nada
O resto é o mesmo silêncio.
Ainda que a melancolia seja a flor de neve
derretida nos dedos
Ainda que os dedos sejam coroa de vento
atirada do alto da montanha.
Beijo-lhe o rosto e os veios que são veias
Para atravessar a última Alegria.
A indiferença de tudo
É a flor mais voraz
É em nós que deus mora ou se ausenta
Para dizer ao coração que a pedra
É o lugar onde começa o mar.

Maria Sarmento

terça-feira, 11 de fevereiro de 2025

 "Há um tipo de tristeza que vem de saber demais, de ver o mundo como ele realmente é. É a tristeza de entender que a vida não é uma grande aventura, mas uma série de pequenos momentos insignificantes, que o amor não é um conto de fadas, mas uma emoção frágil e passageira, que a felicidade não é um estado permanente, mas um vislumbre raro e fugaz de algo que nunca poderemos segurar em cima. E nesse entendimento, há uma profunda solidão, um sentimento de ser separado do mundo, das outras pessoas, de si mesmo. "

Virgínia Woolf

 ANTÓNIO RAMOS ROSA

ALBERTO BURRI
Vestuário ou pele
a ferida e a faca
a cicatriz na parede
um saco que se rasga um campo
uma costura um caminho de poeira
Entre o trabalho e o encanto
sem veemência
a carne da escrita
o vestuário remendado
sobre o corpo vermelho
Uma cor de ferrugem nas palavras
a terra a noite o fogo
Uma velha idade adormecida
um ardor subtil e violento
a incisão que rasga a pele antiga
para restaurar a integridade viva

António Ramos Rosa, 'A Nuvem sobre a Página', Lisboa, Publicações Dom Quixote, 1978.

Emma Ruth Rundle - "Fever Dreams"

 


Pier Paolo Pasolini & Maria Callas
January 1970
''The aim of the dreamer, after all, is merely to go on dreaming and not to be molested by the world. His dreams are his protection against the world. But the aims of life are antithetical to those of the dreamer, and the teeth of the world are sharp.''

James Baldwin,
Another Country


“The dead are always with us, holding us in their sway.
We, the living,
are the exuberant and temporary anima of their departure.”

Nick Cave


''Almost anybody can learn to think or believe or know, but not a single human being can be taught to feel. Why?
Because whenever you think or you believe or you know, you’re a lot of other people: but the moment you feel, you’re nobody-but-yourself.
To be nobody-but-yourself — in a world which is doing its best, night and day, to make you everybody else — means to fight the hardest battle which any human being can fight; and never stop fighting.''

E.E. Cummings

Sede e morte

 I like darkness and confusion and absurdity, but I like to know that there could be a little door that you could go out into a safe life area of happiness.

David Lynch



 “No one will ever know
that we lived,
that we touched the streets with our feet
that we danced joyfully,
No one will ever know
that we gazed at the sea
from the train windows,
that we breathed
the air that settles
on the café chairs,
No one will ever know
that we stood
on the terrace of life
until the others arrived.”


Nino Pedretti, "Nobody Will Know"


Primo Levi, A UMA HORA INCERTA, tradução e posfácio de Rui Miguel Ribeiro, edição Edições do Saguão

 “Para ser sonhador falta-me o dinheiro.”

“Livro do Desassossego”, de Bernardo Soares (Fernando Pessoa).

 “After you died I could not hold a funeral,

And so my life became a funeral.”
After you died I couldn’t hold a funeral,
So these eyes that once beheld you became a shrine.
These ears that once heard your voice became a shrine.
These lungs that once inhaled your breath became a shrine.

― Han Kang, Human Acts

"Depois que você morreu, eu não pude realizar um funeral,
E assim a minha vida tornou-se num funeral. ”
Depois que você morreu, eu não consegui realizar um funeral.
Então estes olhos que um dia te viram tornaram-se um santuário.
Estes ouvidos que um dia ouviram a tua voz tornaram-se um santuário.
Estes pulmões que uma vez inalaram a tua respiração tornaram-se um santuário.
― Han Kang, Atos Humanos

You're No Good



“To love. To be loved. To never forget your own insignificance. To never get used to the unspeakable violence and the vulgar disparity of life around you. To seek joy in the saddest places. To pursue beauty to its lair. To never simplify what is complicated or complicate what is simple. To respect strength, never power.
Above all, to watch. To try and understand. To never look away. And never, never to forget.”


Arundhati Roy, ‘The Cost of Living’

segunda-feira, 10 de fevereiro de 2025

''una aceleración de la pobreza a edades avanzadas''

''paisagens sonoras inaudíveis – infrassons''


 Rostislav Kostal


Porque É Proibido Pisar Na Grama



Poema sobre a recusa
Maria Teresa Horta

 
Como é possível perder-te
sem nunca te ter achado
nem na polpa dos meus dedos
se ter formado o afago
sem termos sido a cidade
nem termos rasgado pedras
sem descobrirmos a cor
nem o interior da erva.
Como é possível perder-te
sem nunca te ter achado
minha raiva de ternura
meu ódio de conhecer-te
minha alegria profunda.

 Fomos ausentes


A ternura também tem marés.


Ana Hatherly

 Preciso pontualmente do teu abraço,
assim que acerta o relógio
e nunca te esqueças de mim, 
pois estou sempre à tua espera,
no mesmo banco do jardim,
à hora dos pássaros.

Raquel Serejo Martins. Subúrbios de Veneza, Poética Edições.

engole-vento

Labiadas

No One Can Hear You Cry In Space


Lee Miller by Man Ray, 1929.



 

 ''Eu tinha fome e frio.
Mandaram-me correr,
como a um cão vadio.''


Alves Redol. Fanga. 12ª edição. Editorial Caminho, 1995., p. 71

 Quero deixar-te e não posso,
podes amar-me e não queres.
Há muito amor como o nosso,
como tu poucas mulheres.


Alves Redol. Fanga. 12ª edição. Editorial Caminho, 1995., p. 69

 « - Eu não sou nada, dizia ele. Os outros e mais eu é que somos alguma coisa.»

Alves Redol. Fanga. 12ª edição. Editorial Caminho, 1995., p. 69

''Ladraram-nos cães e ralharam-nos homens,''

Alves Redol. Fanga. 12ª edição. Editorial Caminho, 1995., p. 66


 

 ...De dia tudo são velhos
de noite cães a ladrar.


Alves Redol. Fanga. 12ª edição. Editorial Caminho, 1995., p. 66

 «(...), onde muitos mexem a sopa sai estragada.»

Alves Redol. Fanga. 12ª edição. Editorial Caminho, 1995., p. 65

''Fiquei triste como a noite.''

Alves Redol. Fanga. 12ª edição. Editorial Caminho, 1995., p. 48

I Can't See You


Ana Mendieta

 

Bloody Pleasures : Ana Mendieta’s Violent Tableaux .

Texte Angélique Szymanek

Les morts d’Ana Mendieta : suicide et meurtre

 ''Le 8 septembre 1985, l’artiste d’origine cubaine chute de la fenêtre du 34ème étage de l’appartement new-yorkais qu’elle partageait avec son mari, l’artiste Carl André. Lui seul était présent lors des événements. Dès lors, le récit s’appuie sur son appel au 911 :

Ma femme est une artiste et je suis un artiste, et nous avons eu une querelle sur le fait que j’étais, eh, plus exposé au public qu’elle ne l’était. Elle s’est rendue dans la chambre, je l’ai suivie et elle s’est jetée par la fenêtre[8].

Lorsque les policiers arrivent sur les lieux, la chambre du couple est en désordre et ils remarquent des traces de griffures sur le nez et les bras d’André. Il est inculpé pour meurtre (O’Hagan, 2013). Après trois années de procès, l’artiste est acquitté par manque de preuves.''


Ana Mendieta: la violence, le choc, la mort | Esthétique du choc

Ana Mendieta: la violence, le choc, la mort

Cette connexion entre la violence et la mort est l’élément essentiel de son œuvre Untitled (Rape scene) créée en réaction au viol et au meurtre d’une étudiante de 20 ans de l’Université d’Iowa, Sarah Ottens, en 1973. Comme le précise Ana Mendieta : « Lorsqu’une jeune étudiante de l’Université de l’Iowa a été retrouvée assassiné après avoir été brutalement violé… J’ai commencé à faire des performances et à placer des objets et des installations dans des lieux publics afin d’attirer l’attention sur ce crime et toutes les violences sexuelles[3] ».
 Bem, vejamos um pouco como floresces,
como te abres, de que cor tens as pétalas,
quantos pistilos tens, que truques usas
para espalhar o teu pólen e te repetires,
se a tua floração é lânguida ou violenta,
que porte tens, para onde inclinas,
se ao morrer apodreces ou murchas,
vamos então, eu olho, e tu floresces.

De Patrizia Cavalli
Tradução de Tomás Sottomayor

sexta-feira, 7 de fevereiro de 2025

 Não me exijam
que diga
o que não digo
não queiram
que escreva
o meu avesso
não ordenem
que eu acene
o que recuso
não esperem
que me cale
e obedeça

Maria Teresa Horta, a Poeta desobediente

 "A minha voz é feminina, a minha escrita é de mulher."

Maria Teresa Horta, 20 de Maio de 1937 - 4 de Fevereiro de 2025
 “Nada mais de mim
haverá memória
-sei-
só os poemas darão conta
da minha avidez
da minha passagem
Da minha limpidez
sem vassalagem”

 


dissidente

“Em tons planos, mas grosseiramente escovados em total impasto, as paredes lilás-claro, o chão num vermelho quebrado e desbotado, as cadeiras e a cama amarelo-cromo, as almofadas e o lençol verde-limão muito claro, a colcha vermelho-sangue, o toucador laranja, o lavatório azul, a janela verde”, disse. “Queria expressar um repouso total com todos estes tons tão diferentes.”

Van Gogh
''Atrás da tua cabeça, em vez de pintar a parede comum deste apartamento miserável, pintarei o infinito”

Van Gogh

“Poets and Lovers”

Exposição “Poets and Lovers” da National Gallery de Londres, dedicada ao pintor pós-impressionista,Van Gogh , é “Starry Night” (1889).

idées fixes

''o defeito perfeito''

Powered By Blogger