quarta-feira, 6 de maio de 2015

The fall dance


1

                                                      Ao Francisco Stilwell

Porque os caminhos são longos
E os carreiros que a eles vão dar são misteriosos,
A razão atraiçoou-nos.
Pensámos que Deus dera o dever de desprezarmos;
A noite sem estrelas cobriu-nos
Enquanto o Senhor se mostrava a cada esquina,
Misterioso como príncipe encantado.

As noivas vendidas abriram a janela,
Com inocência abriram, e entre si ouviram,
O Senhor das almas,
Mas nós, que no leito vivíamos a sordidez da imagem,
Em sobressalto orámos;
Então o raiar da aurora descobriu-nos a nudez do corpo,
E uma outra espécie de anjos se acolheu  aos nossos braços.

É esta a minha verdade.
E a Verdade aparecerá sem ser sentida
Quando cairmos humilhados.

E aqueles que baptizados, ainda suplicam
Serão longamente atormentados
Até que Deus acabe de falar aos esquecidos
E os erga com ternura ao seu Amor!

Ruy Cinatti. Obra Poética. Organização e prefácio de Fernando Pinto do Amaral. Imprensa  Nacional - Casa da Moeda, Lisboa, 1992., p. 59

«Bebei os soluços, »


Ruy Cinatti. Obra Poética. Organização e prefácio de Fernando Pinto do Amaral. Imprensa  Nacional - Casa da Moeda, Lisboa, 1992., p. 55

«Faz-me sofrer por não saber dar mais.»


Ruy Cinatti. Obra Poética. Organização e prefácio de Fernando Pinto do Amaral. Imprensa  Nacional - Casa da Moeda, Lisboa, 1992., p. 55

«Toda a minha tristeza é feita de carícias.»


Ruy Cinatti. Obra Poética. Organização e prefácio de Fernando Pinto do Amaral. Imprensa  Nacional - Casa da Moeda, Lisboa, 1992., p. 55


«Mas tu não ouves...
Só tu sobrevives e rasgas no abismo
Os véus castos do sonho!»


Ruy Cinatti. Obra Poética. Organização e prefácio de Fernando Pinto do Amaral. Imprensa  Nacional - Casa da Moeda, Lisboa, 1992., p. 54

«À proa, assinalando o meu desejo,
Perigoso no aspecto,
Passeavas, Irmão a quem, um dia,
Raptaram sem deixares de estar presente
A doçura imperturbada.»


Ruy Cinatti. Obra Poética. Organização e prefácio de Fernando Pinto do Amaral. Imprensa  Nacional - Casa da Moeda, Lisboa, 1992., p. 53

«Fechados os caminhos,
Ficamo-nos olhando, indiferentes
Ao túmulo verde,
Pesado até nas flores mais belas,
Silencioso sobre águas dormentes.»


Ruy Cinatti. Obra Poética. Organização e prefácio de Fernando Pinto do Amaral. Imprensa  Nacional - Casa da Moeda, Lisboa, 1992., p. 53

«Aqui começa o reino de Cham:
Florestas e desertos, aragens assassinas
E uma humanidade que se desloca desde o nascer do mundo
Com os mesmos gestos, iguais farsas,
A mesma preguiça pensativa, a mesma despreocupação
E uma alegria feita de sorrisos imperceptíveis;
Tal como sacerdotes que, uma vez sacrificada a vítima,
Monologam com Deus num cântico cerrado, feito mais de sons que de palavras,
E depois repousam sob o céu estrelado
Num grande sono de paz e de assombrado recolhimento;
Tal como as árvores da floresta em perpétuo movimento.
Oh!, ninguém sabe o drama que vai lá por dentro:
Somente a verdura se espalha em largas superfícies
Ondulantes, aveludadas, existentes;
Tal como animais que, refeitos no pasto diário,
Se dirigem ao rio mais próximo.
E aí, bebia a água, levantam o olhar límpido
E aspiram os perfumes da noite
Com a candura de gente surpreendida pelo inevitável
E ainda duvidosa de que o maravilhoso possa descer sobre os seus crimes
Como noite estrelada,
Tal como tu, terra sagrada e nua, e secreta,
Couraçada de desertos e florestas,
De rios e pântanos: nevoeiros frios
Sobre a cálida terra genesíaca.
Tuas estradas estão juncadas de cadáveres:
São mesmo os cadáveres que indicam as estradas
Onde o homem passou sem se encontrar.»


Ruy Cinatti. Obra Poética. Organização e prefácio de Fernando Pinto do Amaral. Imprensa  Nacional - Casa da Moeda, Lisboa, 1992., p. 52

«E o pão não se azedava nas entranhas.»


Ruy Cinatti. Obra Poética. Organização e prefácio de Fernando Pinto do Amaral. Imprensa  Nacional - Casa da Moeda, Lisboa, 1992., p. 51

amurada

POEMAS DA VIAGEM


I

Abro o meu diário de viagem:
«Há cinco anos» - dizia - «há cinco anos...»
-Ah!, quanto o coração e as mãos me tremem -
«Há cinco anos» - diria - «há cinco anos...
Eu viajava».

E eu escuto a ver se as páginas me falam.

Como sonho noutros mundos vida,
Renasce a ilusão e trémulo sinto
Todo aquele abandono e branda aragem
Da partida.

Doce e amarga vida -
Ó navio da aventura!
No livro abrem-se abismos de um segredo
Que eu canto de pé, de olhos em frente.

Há cinco anos seria de alma alevantada.

«Acima, acima gajeiro,
Capitão das águas idas;
Vê se vez o mar inteiro
De lágrimas...
Perdidas...»


Ruy Cinatti. Obra Poética. Organização e prefácio de Fernando Pinto do Amaral. Imprensa  Nacional - Casa da Moeda, Lisboa, 1992., p. 48

Uma angústia suave nas almas nostálgicas.


Ruy Cinatti. Obra Poética. Organização e prefácio de Fernando Pinto do Amaral. Imprensa  Nacional - Casa da Moeda, Lisboa, 1992., p. 46

«Não sejas a morte,
Sê ainda amor!»

Ruy Cinatti. Obra Poética. Organização e prefácio de Fernando Pinto do Amaral. Imprensa  Nacional - Casa da Moeda, Lisboa, 1992., p.43

« - O tempo, era o dos lírios - .»


Ruy Cinatti. Obra Poética. Organização e prefácio de Fernando Pinto do Amaral. Imprensa  Nacional - Casa da Moeda, Lisboa, 1992., p.40

Nós Não Somos Deste Mundo

1941

terça-feira, 5 de maio de 2015

Perto dele, pássaros levantam vôo ruidosamente.

Bernard-Marie Koltès. Cais Oeste. Tradução de Ernesto Sampaio. Centro de Dramaturgias Contemporâneas - Porto. Livros Cotovia., p. 21

DREAMING OF YOU


"De súbito
como do alto do estio
nós estamos no aqui.
Cada coisa que vemos é feliz
e nós somos o seu silêncio
ou o seu nome.
O clamor tornou-se voz
e o silêncio claro
equivalente a um fundo azul liso.
Luz lúcida
excepcional
sobre as errantes raízes
lenta portadora de uma água visível."
-"Horizonte a Ocidente"
- António Ramos Rosa

segunda-feira, 4 de maio de 2015


desejo de matar

«Não tenho vontade de arriscar a pele por causa dos seus caprichos.»


Bernard-Marie Koltès. Cais Oeste. Tradução de Ernesto Sampaio. Centro de Dramaturgias Contemporâneas - Porto. Livros Cotovia.
''Pára. Precisa de se orientar.
De repente olha a seus pés.
Os pés desapareceram.''

VICTOR HUGO

''Veio-me à ideia o fim de toda a carne.''

GÉNESIS
I would like to see the shade and tree
where I can rest my head.

Burning Spear

Na solidão dos campos de algodão, 1987

gratuitidades cosmopolitas

''Captar a variação existente entre cinismo e afectividade, perceber qual é o seu jogo de proporções. Não há nada mais cínico do que os filmes sentimentais; eu prefiro o cinismo manifesto.»

Bernard-Marie Koltès

solilóquio La nuit avant les forêts

A bondade absoluta não existe

«A bondade absoluta não existe, a não ser em algumas criaturas tão excepcionais que não contam para efeitos estatísticos. As relações que os seres humanos vão estabelecendo uns com os outros estão impregnadas da ideologia mortal deste tempo: são cínicas, mas não dispensam, sobretudo nos que ainda não estão de todo desesperados (por razões de sorte ou de fortuna), uns toques de afectividade.»

Bernard-Marie Koltès

Aparição fulminante

“Doublefaced No. 58” by Sebastian Bieniek 30.04.2014.From the serial of photographs “Doublefaced”.


A NOITE QUE ME TRESPASSA O CORAÇÃO
"Meu irmão, tu nada sabes da noite,
nada sabes deste tormento que inteiramente me prostrou,
do mesmo modo que a poesia, que transportou a minha alma,
nada sabes destes mil crepúsculos mil espelhos,
que me hão-de precipitar no abismo.
Meu irmão, tu nada sabes da noite,
que eu tive de vadear como o rio,
cujas almas foram há muito estranguladas pelos mares,
e nada sabes da fórmula de esconjuro
que a nossa Lua me abriu entre os ramos secos
como um fruto da Primavera.
Meu irmão, tu nada sabes da noite,
que me impeliu através das sepulturas do meu pai,
que me impeliu através de florestas maiores do a Terra,
que me ensinou a ver nascer e pôr o Sol
nas trevas doentes do meu trabalho diário."

Thomas Bernhard. Na Terra e no Inferno.

quarta-feira, 29 de abril de 2015


“É que o meu sonho constante, desde a infância, o meu contínuo e único íntimo pensamento foi o ver-me de fora, foi o desdobrar-me em Eu e em Testemunha de mim, em uma Vida estranha, curiosa, interessante, e em o Autor dela”
- Fernando Pessoa, “Uma carta da Argentina”, in A Estrada do Esquecimento e Outros Contos, Lisboa, Assírio & Alvim, 2015, p.42.
LEITURA E RECONHECIMENTO
"Como é que o passado reconhecce o presente? Como é que o presente reconhece o passado? Como é que o reproduzido reconhece o reprodutor? Como é que a mulher reconhece o homem?
Ou, exprimindo-se num tom mais japonês: como é que o Agora se agita com a visitação, a condensação, a capitalização do Outrora no fundo de si mesmo?
Ao reconhecimento excessivo e impossível (do fecundande pelo fecundado) oponho três formas de não reconhecimento: o desconhecimento, o reconhecimento insuficiente ou difícil, o reconhecimento excluído."~
-"Histórias de Amor de Outros Tempos"/ "Retratos Vivos"
- Pascal Quignard

segunda-feira, 27 de abril de 2015

AVENTURA NOS POÇOS DO DESEJO

"Ao olho incendiado que me despe fujo delicadamente ( as grandes oportunidades que por delicadeza se perdem!).
E o amor feito e desfeito como uma cama.."

-"Poemas Com Endereço"
- Alexandre O'Neill
- Moraes Editores, 1962 (Primeira Edição)

sexta-feira, 24 de abril de 2015


LUZ NATURAL
"A luz ficava bem à sua graciosidade e habitava entre
Cegos olhos e sombras que têm formas de homens;
Olhem, vejam como a luz nos derrete num cântico:
A luz do sol quebrada traz ela comom escudo
Que tem o meu coração sob a sua jurisdição.
No bosque selvagem nunca a cria da corça
Andou tão silenciosa; nenhuma teia é tecida
Tão delicada como ela, quando o sol
Afasta as claras esmeraldas das ervas inclinadas
Para que estes não seguem tão depressa, por onde ela passa."
-"Poemas Escolhidos"
- Ezra Pound
« - Procuro descobrir se há uma outra por detrás de ti. Uma outra Clarisse, a verdadeira.
   -Mas por que não há-de ser esta a verdadeira?
   -É o que pergunto em certos momentos.

(...)

  Fui possuído pela sensação de que, na maioria das vezes, eu era para Clarisse um inimigo atento ao mínimo deslize que lhe pudesse trair os defeitos. Tinha de me defender contra isso, tanto como das armadilhas do seu humor instável. »



Fernando Namora. Domingo à Tarde. Editora Arcádia. 4ª Edição. p. 172

''cio das árvores a florir''

''castanho sanguíneo''

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