segunda-feira, 15 de março de 2021

''Os seus olhos queimam-me!''

Gustave Flaubert. Salambô. Texto Integral. Tradução de F. da Silva Vieira. Editorial Minerva. Lisboa., p. 32

domingo, 14 de março de 2021

«E depois de tantas misérias lançaram-te ao pescoço um colar de honra, como os de guizos nos peitorais dos asnos, para os atordoar durante o caminho, fazendo com que não sintam a fadiga.»

 Gustave Flaubert. Salambô. Texto Integral. Tradução de F. da Silva Vieira. Editorial Minerva. Lisboa., p. 21


Toni Morrison, was an American novelist, essayist, book editor, and college professor.

 ´´ Eu vejo a escravidão como algo vivo e em movimento.''

Toni Morrison e os Fantasmas da América

''cobria-lhe de sombra o rosto''

 Gustave Flaubert. Salambô. Texto Integral. Tradução de F. da Silva Vieira. Editorial Minerva. Lisboa., p. 17

 « - E perseguia na floresta o monstro fêmea, cuja cauda ondulava sobre as folhas secas, como argênteo ribeiro; e chegou a um campo, onde viu mulheres com corpo de dragão circundando uma grande fogueira, erectas nos extremos das suas caudas. A Lua, cor de sangue, resplandecia no centro de um círculo baço, e as línguas vermelhas dos monstros, fendidas como arpões de pescadores, alongavam-se, recurvando-se até junto das chamas.»

Gustave Flaubert. Salambô. Texto Integral. Tradução de F. da Silva Vieira. Editorial Minerva. Lisboa., p. 16

 “On ne naît pas femme: on le devient.” 

Beauvoir

esmaltar

''genocídio económico''

A febre das flores

Lena d'Água - eu não me entendo


 

Injúrias

David Mourão-Ferreira (1993): António Quadros era um farol na noite escura, e a noite tornou-se mais noite, desde que a morte o levou.
Ó PORTUGAL SER PROFUNDO (excerto)


Ó meu Portugal que foste,
Que foste grande no mundo,
Abre as asas, abre as velas,
Revela o ter ser profundo.


Em cada volta do tempo,
De novo começa o mundo.
Juventude, redescobre
O Portugal mais profundo!

António Quadros
, 10 de Junho de 1980

sábado, 13 de março de 2021

quarta-feira, 10 de março de 2021

John Cage: A Book of Music (1944)

tristeza anímica

"És sábio de saber que nada sabes. Estás a mais no mundo e não existes."

Natália Correia

''poeta grácil de olhos tristes"

 Natália Correia

"sentimento ao ilimite / Dos ecos do mistério"

 Natália Correia

 "angústia de querer sempre mais, /Saudoso endereço de termos imortais. / E ao fim de tanto anseio, a vida pouca."

Natália Correia




 

''Rogando à musa que torne claro o coração obscuro"

 Natália Correia

reflexões metapoéticas

o continuum

 

conteudismo

con.teu.dis.mo
kõtjuˈdiʒmu
nome masculino
tendência artística ou crítica que atribui mais valor ao conteúdo do que à forma

autognose


 

''laço matricial entre poesia e verdade''

Isabel Vaz Ponce de Leão , Entre Eros e Thanatos (em torno de Sonetos Românticos de Natália Correia) in Natália Correira, 10 Anos Depois

''Teu sumo espiritual florido ensina. ''

 Natália Correia

''O itinerário é interior.''

 Natália Correia, em Sonetos Românticos, Lisboa 1990, incluído na edição O Sol nas Noites e o Luar nos Dias, volume 11, Círculo de Leitores, Lisboa 1993, p.327.

 «Vinde fartas e férteis, claras vogais do verbo

 Formosíssimas ânforas de bondade uterina!»

Natália Correia

impunibilidade

 «Devo confessar que me foi penoso confrontar-me com considerações de ordem moral e filosófica na profunda meditação que me impus para tomar uma posição inteiramente consciente neste complexo problema da despenalização do aborto. E nesse combate que se travou na minha consciência tomou forma a ideia de respeitar a opção daqueles que por imperativo de concepções e de fé religiosas interpretam o direito à vida em termos de o incompatibilizarem com a impunibilidade do aborto. Perante estes inclina-se o meu respeito pela coerência com os princípios que, vigorando no seu foro íntimo, orientam a sua conduta. 

 Já aos que, num campo de ideias e de sensibilidade laicas, por posições filosóficas, são adversos à despenalização do aborto provocado, exilando dos seus raciocínios razões dramaticamente ponderosas que o justificam - a própria argumentação filosófica da sua argumentação a torna polemizável -, a estes direi, como Pascal, que toda a filosofia não vale uma hora de dor".

Natália Correia, no exercício de Deputada à Assembleia da República.

''Cristo não veio para nos induzir à vaidade do espírito de nos tornarmos mais morais. Apenas o amor passou a ser mais verdade desde que ele veio.''

Natália Correia


Katrien De Blauwer 

 

"O valor das palavras na poesia é de nos conduzirem ao ponto onde nos esquecemos delas. O ponto onde nos esquecemos delas é onde nunca mais se pode ter repouso"

Natália Correia
(...)

«E como nas melhores graças
Estão verdes prados e amores,
Melhor é irmos descalças
P'ra não pisarmos as flores.»

Natália Correia

 " (...) e, de repente, sob a luminosidade de Abril, os soldados regressam trazendo flores em vez de balas''

Maria do Carmo Castelo Branco de Sequeira, Lugares da Poesia, in Natália Correira, 10 Anos Depois

lirismo camoniano da "Ilha dos Amores"

bailia

(...)

«Namorados que foram inocentes,
Por patrões de holocaustos batalhar,
Juraram no altar de nossos ventres
Carnificinas não lhes devotar.
Se o fizerem não mais suas sementes
Em nossos ventres hão-de frutificar.»

Natália Correia




«(...)
Que à lide levaram os nossos amores.
Vão e vêm as ondas. Pelas mesmas águas
Discorrem idades. Não mudam as dores.»

Natália Correia


Fotógrafo: Théo Gosselin
 

''Húmida e dócil ao coito mineral ''

Natália Correia, Umbrais, Lisboa, Edições Cotovia, 2000, p. 10

sociedade teocrática

"Quando um poeta é um ser que não vem do futuro, torna-se prisioneiro da Literatura"

 Natália Correia

''descrucificação"

regras arquitextuais

"A minha causa é a causa de combater a extinção das causas. É uma causa universal, mesmo cósmica. Mas sobretudo humana. O homem não pode aceitar passivamente ser apenas causado pela criação, ele tem de criar a sua causa que determine a sua acção superior"

Natália Correia, JL n.VO2, 19/4/1988


 

Carmen McRae - Live At Ratso's Vol. 1 ( Full Album )

 aquele "espelho de gelo sobre o qual bóiam inúmeros cadáveres de palavras cintilantes" 

 Eduardo Lourenço

estaticismo

''nómada comerciante''

“O Cigano é antes de tudo um nómada. A sua dispersão no mundo não resulta tanto de necessidades históricas e políticas, mas da sua natureza. (...) Os Ciganos sedentários são em princípio “excluidos” (...) Mas a grande maioria dos verdadeiros Ciganos são ainda puros nómadas”

(Clébert, 1961: 257, tradução livre)

“A verdadeira vida dos ciganos é a viagem em família ou em grandes companhias.” (Vaux de Folêtier, 1983, citado por Fazito, 2006

“O nomadismo é mais um estado de espírito do que um estado de facto, a sua existência e importância são muitas vezes mais de ordem psicológica que de ordem geográfica. O itinerante que perde a esperança e a possibilidade de tornar a partir fica desprovido também de toda a razão de viver.” (Liégeois, 1989)

 ''Somos todos, literalmente, filhos das estrelas e os nossos corpos são feitos da poeira das estrelas.''

Físico Americano Lawrence M. Krauss in Um Universo Vindo do Nada.

terça-feira, 9 de março de 2021

“As Virgens Suicidas”, de John Romão.

''Com Luísa Cruz, a peça traz a palco um grupo de raparigas que lutam pela sobrevivência numa vida rígida e manipulada.

“As Virgens Suicidas”, de John Romão / DR
Com uma linguagem clínica precisa, composta por detalhes misteriosos e eróticos, Virgens Suicidas inspira-se no texto homónimo de Jeffrey Eugenides, adaptado para cinema em 1999 por Sofia Coppola, e na novela Mine-Haha de Frank Wedekind. Interpretado por Luísa Cruz, Vera Mantero, Mariana Tengner Barros e jovens ginastas, o espetáculo retrata a educação de um grupo de raparigas adolescentes dedicadas à educação física, ao teatro e à dança. Vivem num aparente ambiente idílico, embora enclausuradas numa vida rotineira e rígida. Há algo de inquietante entre as paredes deste lugar: para além das raparigas sofrerem de isolamento absoluto, desconectadas do resto do mundo, a sua submissão a uma disciplina física severa desperta em cada uma um estado de exceção e desejos violentos de aniquilação.''

“As Virgens Suicidas”, gravado na Culturgest, pode ser visto aqui.

"carta de admoestação"

 “As melhores fogueiras começam com pequenos ramos”



                                                                                        Katrien De Blauwer 
 

cor do carmim

optótipo

segunda-feira, 8 de março de 2021

policrise

''Se continuas a enforcar todos os descontentes só ficarão as classes privilegiadas. ''

''a ficção historiográfica pós-moderna''

''Uma pátria dividida é uma pátria enfraquecida''

António Ramalho Eanes | Antigo Presidente da República


Povo Maconde: grupo étnico bantu que vive no sudeste da Tanzânia e no nordeste de Moçambique



 

''1. RECONSTITUIÇÃO DA FORÇA DE TRABALHO
Elas são quatro milhões, o dia nasce, elas acendem o lume. Elas cortam o pão e aquecem o café. Elas picam cebolas e descascam batatas. Elas migam sêmeas e restos de comida azeda. Elas chamam ainda escuro os homens e os animais e as crianças. Elas enchem lancheiras e tarros e pastas de escola com latas e buchas e fruta embrulhada num pano limpo. Elas lavam os lençóis e as camisas que hão-de suar-se outra vez. Elas esfregam o chão de joelhos com escova de piaçaba e sabão amarelo e correm com os insectos a que não venham adoecer os seus enquanto dormem. Elas brigam nos mercados e praças por mais barato. Elas contam centavos. Elas costuram e enfiam malhas em agulhas de pau com as lãs que hão-de manter no corpo o calor da comida que elas fazem. Elas vêm com um cântaro de água à cinta e um molho de gravetos na cabeça. Elas limpam as pias e as tinas e as coelheiras e os currais. Elas acendem o lume. Elas migam hortaliça. Elas desencardem o fundo dos tachos. Elas passajam meias e calças e camisas e outra vez meias. Elas areiam o fogão com palha de aço. Elas calcorreiam a cidade a pé e à chuva porque naquele bairro os macacos são caros. Elas correm esbaforidas para não perder o comboio, o barco. Elas pousam o cesto e abrem a porta com a mão vermelha. Elas põem a tranca no palheiro. Elas enterram o dedo mínimo na galinha a ver se tem ovo. Elas acendem o lume. Elas mexem o arroz com um garfo de zinco. Elas lambem a ponta do fio de linha para virar a camisa. Elas enchem os pratos. Elas pousam o alguidar na borda da pia para aguentar. Elas arredam a coberta da cama. Elas abrem-se para um homem cansado. Elas também dormem.



2. REPRODUÇÃO DA FORÇA DE TRABALHO
Elas vão à parteira que lhes diz que já vai adiantado. Elas alargam o cós das saias. Elas choram a vomitar na pia. Elas limpam a pia. Elas talham cueiros. Elas passam fitilhos de seda no melhor babeiro. Elas andam descalças que os pés já não cabem no calçado. Elas urram. Elas untam o mamilo gretado com um dedal de manteiga. Elas cantam baixinho a meio da noite a niná -lo para que o homem não acorde. Elas raspam as fezes das fraldas com uma colher romba. Elas lavam. Elas carregam ao colo. Elas tiram o peito para fora debaixo de um sobreiro. Elas apuram o ouvido no escuro para ver se a gaiata na cama ao lado com os irmãos não dá por aquilo. Elas assoam. Elas lavam joelhos com água morna. Elas cortam calções e bibes de riscado. Elas mordem os beiços e torcem as mãos, a jorna perdida se o febrão não desce. Elas lavam os lençois com urina. Elas abrem a risca do cabelo, elas entrançam. Elas compram a lousa e o lápis e a pasta de cartão. Elas limpam rabos. Elas guardam uma madeixita entre d.ois trapos de gaze. Elas talham um vestido de fioco para uma boneca de papelão escondida debaixo da cama. Elas lavam as cuecas borradas do primeiro sémen, do primeiro salário, da recruta. Elas pedem fiado popeline da melhor para a camisa que hão-de levar para a França, para Lisboa. Elas vão à estação chorosas. Elas vêm trazer uin borrego à primeira barraca e ao primeiro neto. Elas poupam no eléctrico para um carrinho de corda.




3. PRODUÇÃO

Elas sobem para cima de um caixote, que ainda são pequenas para chegar à bancada de descarnar o peixe. Elas mondam, os dedos tolhidos de frieira e urtiga. Elas fazem descer a lâmina de cortar o coiro. Elas sopram nos dedos a aquecê-los, esfregam os olhos, voltam a pôr as mãos por detrás da lente a acertar os fios da matriz do transistor. Elas espremem as tetas da vaca para o balde apertado entre as pernas. Elas fecham num dia as pregas de papel de mil pacotes de bolacha. Elas acertam em duzentos casacos a postura da manga onde cravar o botão. Elas limpam o suor da testa com a manga e a foice rebrilha ao sol por cima da cabeça e da seara. Elas ouvem a matraca de dez teares enquanto a peça cresce diante, o fio amandado de braço a braço aberto. Elas cortam os dedos nas primeiras vinte cinco latas até calejar bem. Elas fazem a agulha passar para cá e lá em cruz na tela do tapete. Elas vigiam a última fieira de garrafas, caladas, à espera da sirene. Elas carregam o cesto de azeitona à cabeça já sem cantar, até que o sol se ponha.



4. SERVIÇOS

Elas carregam no botão da caixa e fazem quinhentos trocos miúdos. Elas metem a cavilha, dizem outro número e passam a vigésima chamada. Elas mexem panelões que lhes chegam à cinta. Elas descem doze caixotes de lixo já noite fechada. Elas fazem todas as camas e despejos de uma família alheia. Elas picam bilhetes metidas numa caixa de vidro. Elas batem à máquina palavras que não entendem. Elas arquivam por ordem alfabética duas mil fichas e vinte e cinco ofícios. Elas vão outra vez buscar a gaveta das luvas para o balcão a ver se há aquele verde. Elas aspiram do pó antes das nove doze assoalhadas, e cento e dez degraus de alcatifa. Elas entram na praça manhã cedo, já vindas do lota ajoujadas com o peixe para as bancadas. Elas acertam as bainhas de joelhos, a boca cheia de alfinetes. Elas põem trinta e duas arrastadeiras e tiram sessenta temperaturas. Elas pintam unhas de homem. Elas guardam sanitas e fazem renda em pequenos cubículos sem janela.



5. TRANSMISSÃO DE IDEOLOGIA

Coisas que elas dizem:

— Se mexes aí, corto-ta.
— Isso não são coisas de menina.
— O meu homem não quer.
— Estuda, que se tiveres um empregozinho sempre é uma ajuda.
— A mulher quer-se é em casa.
— Isto já vai do destino de cada um.
— Deus não quiz.
— Mas o senhor padre disse-me que assim não.
— Dá um beijinho à senhora que é tão boazinha para a gente.
— Você sabe que eu não sou dessas.
— Estás a dar cabo do teu futuro com uns e com outros.
— Deixa-te disso, o que é preciso é sossego e paz de espírito.
— Comprei uns jeans bestiais, pá.
— Sempre dá para uma televisão daquelas novas.
— Cada um no seu lugar.
— Julgas que ele depois casa contigo?
— Sempre há-de haver pobres e ricos.
— Se tu gostasses de mim não andavas com aquela cabra a gastar o nosso.
— Põe o comer ao teu irmão que está a fazer os trabalhos.
— Sempre é homem.



6. PRODUÇÃO DE DESEJO

Elas olham para o espelho muito tempo. Elas choram. Elas suspiram por um rapaz aloirado, por duas travessas para o cabelo cravejadas de pedrinhas, um anel com pérola. Elam limpam com algodão húmido as dobras da vagina da menina pensando, coitadinha. Elas escondem os panos sujos de sangue carregadas de uma grande tristeza sem razão. Elas sonham três noites a fio com um homem que só viram de relance à porta do café. Elas trazem no saco das compras uma pequena caixa de plástico que serve para pintar a borda dos olhos de azul. Elas inventam histórias de comadres como quem aventura. Elas compram às escondidas cadernos de romances em fotografias. Elas namoram muito. Elas namoram pouco. Elas não dormem a pensar em pequenas cortinas com folhos. Elas arrancam os primeiros cabelos brancos com uma pinça comprada na drogaria. Elas gritam a despropósito e agarram-se aos filhos acabados de sovar. Elas andam na vida sem a mãe saber, por mais três vestidos e um par de botas. Elas pagam a letra da moto ao que lhes bate. Elas não falam dessas coisas. Elas chamam de noite nomes que não vêm. Elas ficam absortas com a mola da roupa entre os dentes a olhar o gato sentado no telhado entre as sardinheiras. Elas queriam outra coisa.






7. REVOLUÇÃO

Elas fizeram greves de braços caídos. Elas brigaram em casa para ir ao sindicato e à junta. Elas gritaram à vizinha que era fascista. Elas souberam dizer salário igual e creches e cantinas. Elas vieram para a rua de encarnado. Eles foram pedir para ali uma estrada de alcatrão e canos de água. Elas gritaram muito. Elas encheram as ruas de cravos. Elas disseram à mãe e à sogra que isso era dantes. Elas trouxeram alento e sopa aos quartéis e à rua. Elas foram para as portas de armas com os filhos ao colo. Elas ouviram faltar de uma grande mudança que ia entrar pelas casas. Elas choraram no cais agarradas aos filhos que vinham da guerra. Elas choraram de ver o pai a guerrear com o filho. Elas tiveram medo e foram e não foram. Elas aprenderam a mexer nos livros de contas e nas alfaias das herdades abandonadas. Elas dobraram em quatro um papel que levava dentro urna cruzinha laboriosa. Elas sentaram-se a falar à roda de uma mesa a ver como podia ser sem os patrões. Elas levantaram o braço nas grandes assembleias. Elas costuraram bandeiras e bordaram a fio amarelo pequenas foices e martelos. Elas disseram à mãe, segure-me aqui os cachopos, senhora, que a gente vai de camioneta a Lisboa dizer-lhes como é. Elas vieram dos arrebaldes com o fogão à cabeça ocupar uma parte de casa fechada. Elas estenderam roupa a cantar, com as armas que temos na mão. Elas diziam tu às pessoas com estudos e aos outros homens. Elas iam e não sabiam para aonde, mas que iam. Elas acendem o lume. Elas cortam o pão e aquecem o café esfriado. São elas que acordam pela manhã as bestas, os homens e as crianças adormecidas.''

Dezembro 1975
Maria Velho da Costa, Cravo, Lisboa, Moraes Editores, 1975


 

big brother fiscal

 Senador José de Castro, em 1912, numa longuíssima intervenção sobre o sistema eleitoral defendendo:

Repare V. Exa. no seguinte: enquanto as sufragistas tiverem aquela cara das inglesas, cujas fotografias andam pelos jornais, pode ter a certeza de que não lhes dava o meu voto.

Riso.

O Sr. Artur Costa: — Podem ser feias algumas mulheres e terem inteligência.

O Orador: — Mulher feia a valer de cara é feia em inteligência. Se for extraordinariamente inteligente nem a cara se lhe chega a ver.

E V. Exa. sabe melhor do que eu: a perfeição do corpo dá a perfeição da alma. Já lá vai o tempo em que a psicologia vivia divorciada da fisiologia. Hoje a perfeição intelectual do ser humano é uma resultante da sua perfeição fisiológica. Se os órgãos não forem perfeitos não poderão funcionar com perfeição. A inteligência é uma função do cérebro. Já não estamos no tempo daquela frase: feia de corpo, bonita na alma.”


''A recusa do direito de voto por poder ocasionar discórdias familiares também é invocado, designadamente pelo Deputado Matos Cid, que a 5 de junho entrega uma moção que conclui referindo que se a mulher tivesse voto, havia de introduzir a discórdia no lar, quando professasse ideias opostas às do marido e seria mais uma origem de disputas que ofereceria um espetáculo degradante por ocasião de eleições, quando se tratasse de comícios e reuniões eleitorais.''


Fonte da Publicação, ver aqui.

“bilhete de enterramento”

Mulheres e Revolução

A REVOLTA DA MARIA DA FONTE (1846)

“ordeirismo”

Sans-culottes

taquígrafo

 “ninguém pode escrever o que não ouve”

  Ângelo Ramon Marti, o “Taquígrafo-Mor das Cortes”


tarquigrafia

''a taquigrafia [1] não é capaz de acompanhar o discurso oral, pois “a mão não é composta de articulações da mesma flexibilidade, que as da língua”

Ângelo Ramon Marti, o “Taquígrafo-Mor das Cortes”, 1821


«Anthologie De L'Amour Sublime»

 Benjamin Péret


 

a loucura das coisas sensíveis

mimese

«Violentámos a Natureza quando Matámos as Nossas Feras»

 Natália Correia

«Êxodo», in Poesia Completa: O Sol nus Noites e o Luar nos Dias, ob. cit., p. 147. 

«Socialmente os homens são a pasta de todos os oprimidos que são precisos para fazer um déspota»

Natália Correia, in A Mosca Iluminada

''cultos lunares''

Anaíta

  deusa primitiva da fertilidade e da terra

''a irracionalidade genesíaca do espírito''

Luís Adriano Carlos, A Mátria e o Mal, in Natália Correira, 10 Anos Depois


 

o «instinto da pátria»

  Chateaubriand

opúsculo La Patrie et la Matrie, 1898

  poeta provençal Léon de Berluc-Pérussis

''demiurgos matristas''

Luís Adriano Carlos, A Mátria e o Mal, in Natália Correira, 10 Anos Depois

«Na ressaca da I Guerra Mundial, em artigo de 1923, inspirado pelo filósofo germânico Leopold Ziegler, o espanhol Miguel de Unamuno fundou o termo matriotismo para designar um sentimento alternativo que respondesse à falência do sentimento patriótico. A matriz de derivação morfológica do novo vocábulo era a palavra matria, que Unamuno considerava um neologismo, tradução do germânico Mutterland, terra-mãe associada à Europa, por oposição a Vaterland, pátria ou terra-pai que delimita o território da nossa origem biológica e social. Porém, a conceptualização de Unamuno repousava num vitalismo racionalista que, segundo uma estranha oposição do misógino Schopenhauer, e em contramão com os futuristas do protofascismo, atribuía ao Pai o poder da vontade, e à Mãe, a faculdade da inteligência. Em suma, a inteligência representava «a raiz do matriotismo)), e a Mátria, «o lar colectivo da inteligência)): «A raça é, como a inteligência, mãe. O amor da mãe é o mais racional dos amores e o mais inteligente»; «Só a inteligência pode salvar-nos» *

Luís Adriano Carlos, A Mátria e o Mal, in Natália Correira, 10 Anos Depois

*Miguel de Unamuno, «'Matriotismo'», in Obras Compktas La Raza y ia Lengua, IV, Madrid, Escelier, 1968, pp. 1393-1394 


«De hora negra me enrola a crespa vaga
E atira a endereços desumanos
O dia em que eu nasci por aziaga
Ordem de um 13 que sangra entre os arcanos.»

Natália Correia

''boquilha incendiária''

Maria Teresa Horta, in Natália Correira, 10 Anos Depois

inquebrantável

domingo, 7 de março de 2021


Amália Rodrigues, no filme " Ilhas Encantadas ", 1965

''tecnocracia desumanizante''

 Fernando Dacosta

 "Não, não me mato/ Antes me zango até ficar um  cacto/Quem me tocar, maldito/ Que se pique"

Natália Correia

  "Os grandes criadores acabam por desistir de viver. A inveja, a maldade, o cinismo, a hipocrisia que os cerca amargura-os a tal ponto que Ihes apressa a morte, lhes faz apetecer a morte. O José Régio foi um dos que sucumbiram, tal a campanha de ofensas que lhe moveram. Ele será o primeiro homenageado!"

Natália Correia

Choupal

"Não percas a Rosa"

 Natália Correia

 ''Enjoavam-na os enjoados da Pátria e dos sentimentos, os cínicos e os "yupis", os normalizadores e os burocratas.''

Fernando Dacosta, Natália Correira, 10 Anos Depois


 «"E um esposo-irmão", justificará aos que a interrogam. "O nosso é um casamento casto", acrescentará, sorrindo.»  (Natália Correira sobre o marido Dórdio Guimarães)

Fernando Dacosta, Natália Correira, 10 Anos Depois

Barriga de freira

Katrien De Blauwer 

 

In the Mood for Love - Yumeji’s Theme

 Faa Yeung Nin Wa

Anos como Flores


Filme, Wong Kar-Wai

parrançar

sábado, 6 de março de 2021

‘amalite’

John Cage about silence


 

aquilatar

''O populismo almeja agradar às massas, tenta satisfazer as suas vontades e necessidades imediatas, mesmo que estas não tenham viabilidade no futuro e, sendo paternalista, infantiliza a quem se dirige; além do mais aproveitando-se das carências e insatisfação do povo, o demagogo manipula-o a seu belo-prazer''

 (Galito, 2017)

aparvalhamento

genocidário

«There Is No Alternative»

Natália Correia diz "Romance de Paloma"

apodar

25 de Abril

A investigadora Filipa Raimundo identificou uma “aristocracia democrática” a receber a Ordem da Liberdade “já que cerca de dois terços dos agraciados são profissionais liberais (arquitectos, professores, médicos, engenheiros, advogados e jornalistas), ao passo que os operários e sindicalistas são menos de 10%. Um cenário que contrasta com o perfil da maioria dos presos políticos do Estado Novo, em que mais de metade eram trabalhadores, operários e empregados de serviços”

''tinha como condecoração as suas cicatrizes''

 

hegemonizar

he.ge.mo.ni.zar 

verbo transitivo
dar hegemonia atornar hegemónicocolocar em situação de vantagem ou de domínio

Sindemia

Fotojornalista Newsha Tavakolian


 

Continuidade Psicológica

DIALOGISM

"We don't need psychiatric services, we need mental health care services" 

Mark Hopfenbeck

demopedia

sexta-feira, 5 de março de 2021

amesendar

Natália Correia – Entrevista –

Raso Como o Chão (1977)

Álvaro Lapa,  Pintor-escritor.

''Mulher que assobia, ou capa porcos ou atraiçoa o marido.''

 sexismo ofensivo

''Pobreza menstrual''

''O filósofo esloveno diz não defender o velho comunismo, e sim um novo comunitarismo globalista. Os novos desafios, afirma, são a ecologia, a renovação do Estado do bem-estar e a prevenção da “guerra digital cognitiva”


Slavoj Zizek, entrevista ao Jornal El País 
“As pessoas estão dopadas, adormecidas. É preciso despertá-las”

ego metafísico

quinta-feira, 4 de março de 2021


 



BLACK SABBATH - "Paranoid"

"Os deuses só nos pedem que estejamos na vida com a mesma naturalidade com que as flores estão na haste. Os homens só serão unidos quando acreditarem em todos os deuses. Mais importante do que eles existirem é acreditarmos neles".

Natália Correia

"Sou da Ilha das línguas de fogo. Com elas aprendi a metrificar o Espírito. O indizível. O religioso é uma ideia que anda no ar mesmo para as pessoas que não têm sensibilidade para a ver nem coragem para a agarrar"

Natália Correia

calcinação

mármore negro

''Depressa deixará de se preocupar com o corpo. A beleza, a elegância perdidas não pareciam melancolizá-la. "Uma vez por semana a cabeleireira ia arranjá-la a casa", pormenoriza-me Helena Cantos, sua amiga de juventude. "Não comprava roupas e os vestidos eram feitos pela porteira. Quando morreu houve até dificuldade em escolher um em bom estado, para a amortalharmos. Levou o azul escuro, de veludo, que envergava nas ocasiões de maior cerimónia".

Fernando Dacosta, Natália Correira, 10 Anos Depois


 

''A maior parte das pessoas apenas viam em mim a fêmea, o corpo, só depois percebiam que eu tinha ideias, talento. Isso maçava-me muito, e revoltava-me."

Natália Correia
''Acusavam-me, continuam a acusar-me de tanta coisa, de ser promíscua, de ter relações com homens e mulheres ... o problema é que eu quase não tenho libido. Mesmo em nova, o sexo nunca representou grande coisa para mim. Sempre gostei, por outro lado, de homens mais velhos do que eu... ora nesta altura, com a idade que eles têm, já não funcionam"

Natália Correia

Descobri que era europeia

 Natália Correia

''Os grandes mitos portugueses encontraram em si uma celebrante incomum: o mito do Andrógino (o ser completo, uno e plural), do Desejado (o que contém a resistência, não a desistência), de Pedro e Inês (a paixão, a volúpia pela morte), da Ilha (o espaço da esfinge, da iniciação).''

Fernando Dacosta

                                                                                      Katrien De Blauwer 
 

ideário clássico

produção vidreira

politeísmo

 Frátria - como símbolo de fraternidade, de igualdade, de equidade,

 

vendilhão

ven.di.lhão 
vẽdiˈʎɐ̃w̃
nome masculino
1.
pessoa que vende na rua, sem um ponto fixovendedor ambulante
2.
figurado pessoa que trafica em coisas de ordem moral

mátria

''desatino verbal''

quarta-feira, 3 de março de 2021

Amália Rodrigues " Ilhas Encantadas " 1965


As Ilhas Encantadas (1965)

Les Iles Enchantées

Produção Rodagem: Abr/Jun 1964

M/14

89 min

Drama  

Realização:  ·  Carlos Vilardebó

Argumento:  ·  Carlos Vilardebó  ·  José Cardoso Pires  ·  Raymond Bellour

No passado século XIX, em ilha deserta do Atlântico, dá-se o encontro entre Pierre Duchemin, jovem marinheiro dum barco francês, e Hunila, solitária desde a morte do marido, Filipe, e do irmão, que exploravam os parcos recursos da pesca à tartaruga.
Esta relação paradisíaca terá, porém, um fim e, recolhida por um veleiro português, em 1830, Hunila conta a sua história...
[Fonte: José de Matos-Cruz, O Cais do Olhar, 1999, p.129]


O mar, uma espécie de libertação | «Tenho a mania das flores, das árvores e do mar. Gosto de passear nas árvores. Não sou nada bicho da cidade, o barulho faz-me mal, psicologicamente; começo a perguntar-me onde é que tudo vai ter e sofro. Tenho tendência é para o mar. A primeira vez que fui para o mar já não era muito pequena. Nunca fui para o mar para fazer bem à saúde. Fui daquelas que foi forte… Tive as minhas cicatrizes nos pulmões, os gânglios, asma nervosa… mas curei tudo sem dar por isso. Quando ia para o mar, tinha de passar a noite de véspera a fritar peixe para o farnel. Ia-se carregado, vinha-se carregado, era uma estafa. E o mar era para mim como para as outras crianças, para brincar, fazer covas na areia. Hoje é uma espécie de libertação, um horizonte grande que se tem à frente.
Como aprendeu a gostar do mar?
Foi talvez uma necessidade… Com as flores é diferente, sempre gostei. Agora encho a casa de flores, de todas as qualidades, vou à praça e apetece-me comprar as flores todas. As minhas irmãs até me chamam o “tilim das flores”. Quando me dão uma prenda, um cinzeiro ou uns chinelos de quarto, dizem sempre, “Toma lá isto para pores flores”. Mas a tentação do mar só veio mais tarde, penso que por necessidade. E costumo dizer: “Deus deu-me um lugar bom para morrer”.»

 R&T [Rádio & Televisãoespectáculos, «Amália: “Globetrotter do fado”», 2 de Setembro de 1972, entrevista por Regina Louro, fotografias por Corrêa dos Santos.

 

Fonte da Publicação: ver aqui.

 «O pensamento é triste; o amor, insuficiente;

e eu quero sempre mais do que vem nos milagres.»



Cecília Meireles, Antologia poética, posfácios de José Bento e João Bénard da Costa, Lisboa, Relógio d’Água, 2002, p. 51. Do livro Vaga Música, 1942.

''Malaventurado (Bernardim Ribeiro [1482-1552] / Alain Oulman [1928-1990]), com José Fontes Rocha (guitarra) e Martinho d’Assunção (viola).

Do disco Cantigas Numa Língua Antiga, Abril de 1977.

O original de Bernardim Ribeiro, «Egloga Qvarta chamada Jano», in História de Menina e Moça, reprodução facsimilada da edição de Ferrara, 1554, estudo introdutório por José Vitorino de Pina Martins, Lisboa,Fundação Calouste Gulbenkian, 2002, pp. cix v.º [109 verso] – cx v.º [110 verso]:



Portugal – EMI-Columbia – 8E 072-40477 – Cantigas Numa Língua Antiga, Abril de 1977, capa de Manuel Fortes, fotografias de Augusto Cabrita

Mudei terra mudei vida

mudei paixam em paixam

vi a alma de mim partida

nunca de meu coraçam

vi minha door despedida:

Antre tamanhas mudanças

de hum cabo minha sospeita

e de outro desconfianças

leixanme em grande estreita

e leuanme as esperanças

Cantigas Numa Língua Antiga, contracapa

Nesta triste companhia



ando eu que tam triste ando

jaa nam sam quem ser soía

os dias viuo chorando

as noutes mal as dormia:

Temo descanço tornado

mal que por meu mal ho vi

e eu mal auenturado

mourome andando assi

antre cuidado e cuidado

Portugal – Orlador – 71820 – Cantigas Numa Língua Antiga, edição especial para os sócios do clube Círculo de Leitores, 1979

Por me nada nam ficar

que nam me fosse tentado

prouei darme a trabalhar

mas nunca me achei cançado

para poder descançar:

Quando mais cançado estaua

alli meu mal entam

a meu mal se apresentaua

e o corpo e o coraçam



ambos cançados leuaua





Nam sabendo onde me hiria

que ma mim laa nam leuasse

roguei a Deus nam soo hum dia

que da vida me tirasse

pois me dala nam queria:

Mas com cuidados maiores

cree que Deus se nam cura

ca dos pobres pastores

como que elles por ventura

nam sentem laa suas dores




O quam bem auenturado

fora jaa se me matara

minha door ou meu cuidado

eu morrera e acabara

e meu mal fora acabado:

Nam vira tal perdiçam



de mim e de tanta cousa

perdido tudo em vam

porque hua paixam nam repousa

em outra maior paixam





Adaptação de Alain Oulman para fado:



Mudei terra mudei vida

Mudei paixão em paixão

Vi a alma de mim partida

Nunca de meu coração

Vi minha dor despedida

E eu malavanturado

Morro-me andando assim

Entre cuidado e cuidado



Eu morrera e acabara

E meu mal fora acabado



Não vira tal perdição

De mim e de tanta coisa

Perdido tudo em vão

Porque a paixão não repousa

Em outra maior paixão



O quem bem aventurado

Fora já se me matara

Minha dor e meu cuidado



Fonte da Publicação: ver aqui.

Mal aventurado

 


Paris, Olympia, 1957

«Sou orgulhosa, embora humilde. Nunca estive em venda: tudo o que sou, devo-o a mim mesma. Fui para Paris sem saber uma palavra de francês. Estive em Londres quando não conhecia uma palavra de inglês. Nunca tive professoras, nem dicionários, nem mestres. Sou uma espectadora de mim própria, que, depois de alguns dissabores, aprendeu a não colocar o cotovelo na mesa, não fazer barulho ao comer a sopa, não dizer inconveniências em nenhuma ocasião…»

Antena, Lisboa, 15 de Maio de 1965, «A importância de se chamar Amália», por Neves de Sousa.
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