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quarta-feira, 29 de março de 2017

"Acendo a luz. A luz vive de um
disfarce de uma antiguidade
atómica.
E cada brilho tem um vento atento
o sopro um vento especial a morte:
desmancha-se a luz toda
(o feto dela) de um só corte."

-"Poesia"
- Luíza Neto Jorge

terça-feira, 5 de janeiro de 2016


Um poema de Ana Duarte


A Minha Saia


A minha saia é debruada de
dentes brancos
— saia rodada com pregas
e esconderijos que se abrem
sobre os precipícios da infância


É uma saia alta como janelas
remendada pelas mãos cuidadosas dos amantes


Debaixo da minha saia há
uma caixa com botões e olhos
que encontrei no leito seco dos caminhos
há um girassol que me aquece
o farelo e o sal dos ossos
há uma colmeia e o crescente negro
da sombra a roçar os joelhos


Há o riso dos velhos


Som de cordas, velas de moinho,
fábulas e exércitos balançam
dentro da minha saia
quando danço


Debaixo da minha saia há também casas
onde recolho o vento, e delas se avista
o pescoço curvo de dois bois mansos
alisando o pasto


Rodo o corpo e a minha saia aponta para o sul
baixo-a para desenhar círculos na poeira
ergo-a para atravessar o rio
na hora em que
a maré sobe
sobe
sobe
sobe


em Criatura, nº 6, Lisboa: Núcleo Autónomo Calíope da Associação Académica da Faculdade de Direito de Lisboa, Novembro de 2011, pp. 9-10.

quinta-feira, 6 de março de 2014

SAFO

«Safo ao mar se precipita
Por impulso da paixão,
Vinga em si o alheio crime
Da pérfida ingratidão.»



Catarina de LencastreAntologia da Poesia Feminina Portuguesa - António Salvado., p. 84

terça-feira, 4 de março de 2014

«Filha: tendes escutado
quanto deixo convencido
esse tão tirano estado
de viver com um marido
cruel e mal inclinado.
   Não vos fieis de propostas
nem das suas aparências.
Por não darmos más respostas,
nos propõem mil conveniências:
depois quebram-nos as costas.
   Sempre foi o mais perfeito
o estado de celibato.»


Paula da GraçaAntologia da Poesia Feminina Portuguesa - António Salvado., p. 76

«SE POR DAR LUSTRE...»

Se por dar lustre aos pesares
Vossas lágrimas teimosas
Correm por margens de rosas,

Porque não cabem nos mares,
A submergir esses ares
Subiram rios crescendo,
E certo o naufrágio sendo,
A fineza deslustrais,
Porque podendo amar mais,
Deixareis de amar morrendo.

Deixai que o mar se dilate,
Que o rio se precipite,
Que o vento se fortifique,
Que em água a nuvem desate,
Sem que vós neste combate
Balas de neve esgrimindo,
Que as estrelas vão ferindo,
De neve e fogo tomeis
As armas com que ofendeis,
De amor os raios cobrindo.


Soror Madalena da GlóriaAntologia da Poesia Feminina Portuguesa - António Salvado., p. 63-64

Tenho amor, sem ter amores.


Soror Madalena da GlóriaAntologia da Poesia Feminina Portuguesa - António Salvado., p. 59
«Ó morte, aonde estás? Tu me socorre,
Que um infeliz descansa quando morre.»


Soror Madalena da GlóriaAntologia da Poesia Feminina Portuguesa - António Salvado., p. 57

Que a dor só vive em mim, que eu já não vivo.


Soror Madalena da GlóriaAntologia da Poesia Feminina Portuguesa - António Salvado., p. 57

Quero morrer de esquecida.


Soror Violante do CéuAntologia da Poesia Feminina Portuguesa - António Salvado., p. 39
«Encubro e calo o que sinto,
por meu mal dissimular,
e o rosto vai-o mostrar.»


Joana da Gama. Antologia da Poesia Feminina Portuguesa - António Salvado., p. 23

Razão

Se achásseis paciência
teríeis consolação;
deitai fora a paixão,
agasalhai a prudência:
muitas voltas dá o tempo
no que impossível parece:
dar-vos-á contentamento
no que vos entristece.


Joana da Gama. Antologia da Poesia Feminina Portuguesa - António Salvado., p. 23
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