sábado, 28 de dezembro de 2024

sexta-feira, 27 de dezembro de 2024

 ''How beautiful it is to have a trembling, sensitive, and selective heart?''

Robert Walser, Der Spaziergang (The Walk), 1917

 

a seu talante
a seu bel-prazer

bambúrrio

Gal Costa - Da maior importância

 



Photograph of Dylan and Caitlin Thomas by Nora Summers

CHAMAMENTO

Como podes tirar de mim
o chamamento
um minuto que seja
apagares a chama?

Por ti eu tiro tudo
o enrodilho
queimando tudo depois à cabeceira.

Devagar convoco a tempestade aberta
e no meu peito
o coração tropeça

E não há nada que eu queira
imaginar
que entre nós depois
não aconteça


Maria Teresa HortaEu Sou a Minha Poesia. Antologia Pessoal. Publicações Dom Quixote, 2019., p. 139

 CAPITU: É preciso ter tudo em ordem, tudo em ordem sempre. Sobretudo não procrastinar. Sempre que procrastinei, me arrependi.

Maria Velho da Costa. Madame. Sociedade Portuguesa de Autores Publicações Dom Quixote. Lisboa, 1999 p. 21

 “I know we're not saints or virgins or lunatics; we know all the lust and lavatory jokes, and most of the dirty people; we can catch buses and count our change and cross the roads and talk real sentences. But our innocence goes awfully deep, and our discreditable secret is that we don't know anything at all, and our horrid inner secret is that we don't care that we don't.”


Dylan Thomas

mordacidade



"Quero nada querer para me querer a mim
tão mais ao alto
para chegar sempre no preciso instante em
que caem as pontes
Onde estão os Poetas que morrem a cada verso?
Hei-de morrer como um todo, nunca por partes.
Mas antes quero o amanhecer na boca e a
Humanidade limpa
Antes, quero caminhar erguida como uma
árvore cheia de pássaros
Antes, quero amar,
se possível em ricochete."

 

Yasujiro Ozu Cinematography

I Had a Talk with My Woman

BRASA

 Deito-me no tojo
da paixão desavinda

Em brasa ardendo
até ao fim
                            da vida.

Maria Teresa HortaEu Sou a Minha Poesia. Antologia Pessoal. Publicações Dom Quixote, 2019., p. 136

Quem escuta a sua dor não desatada?

 Maria Teresa HortaEu Sou a Minha Poesia. Antologia Pessoal. Publicações Dom Quixote, 2019., p. 134

 Que não querendo um coração desfeito
trocou por desapego
o desamor desperto?


Maria Teresa HortaEu Sou a Minha Poesia. Antologia Pessoal. Publicações Dom Quixote, 2019., p. 130

DESORDEM

Tapas os caminhos que vão dar a casa
Cobres os vidros das janelas
Recolhes os cães para a cozinha
Soltas os lobos que saltam as cancelas

Pões guardas atentos espiando no jardim 
Madrastas nas histórias inventadas
Anjos do mal voando sem ter fim
Destróis todas as pistas que nos salvam

Depois secas a água
E deitas fora o pão
Tiras a esperança
Rejeitas a matriz

E quando já só restam os sinais
Convocas devagar os vendavais

Maria Teresa HortaEu Sou a Minha Poesia. Antologia Pessoal. Publicações Dom Quixote, 2019., p. 121



Marianne Faithfull

 quanto é contraditória
esta prisão

que me faz ficar livre no que sinto
e logo envenenada à tua mão


Maria Teresa HortaEu Sou a Minha Poesia. Antologia Pessoal. Publicações Dom Quixote, 2019., p. 120
 Contar quanto dói
a dor no peito


Maria Teresa HortaEu Sou a Minha Poesia. Antologia Pessoal. Publicações Dom Quixote, 2019., p. 119
 descansando as asas
dos teus ombros 
a meu lado
em cima da almofada

Maria Teresa HortaEu Sou a Minha Poesia. Antologia Pessoal. Publicações Dom Quixote, 2019., p. 105
 O vidro do desejo
o vinho dos teus olhos

Maria Teresa HortaEu Sou a Minha Poesia. Antologia Pessoal. Publicações Dom Quixote, 2019., p. 100
 A laranja 
das coxas

Maria Teresa HortaEu Sou a Minha Poesia. Antologia Pessoal. Publicações Dom Quixote, 2019., p. 99


 

Call Me Anything - But Call Me

 É raiva
então ciúme
a tua boca


Maria Teresa HortaEu Sou a Minha Poesia. Antologia Pessoal. Publicações Dom Quixote, 2019., p. 84

que água mais domada e mais amarga

Maria Teresa HortaEu Sou a Minha Poesia. Antologia Pessoal. Publicações Dom Quixote, 2019., p. 82

Ó ódio de bem te querer

Maria Teresa HortaEu Sou a Minha Poesia. Antologia Pessoal. Publicações Dom Quixote, 2019., p. 81

 ''neste vício de enredar
o meu espasmo em teu orgasmo''

Maria Teresa HortaEu Sou a Minha Poesia. Antologia Pessoal. Publicações Dom Quixote, 2019., p. 80

POEMA AO DESEJO

 Empurra a tua espada
no meu ventre
enterra-a devagar até ao cimo

Que eu sinta de ti
a queimadura 
e a tua mordedura nos meus rins

Deixa depois que a tua boca
desça
e me contorne as pernas com doçura

Ó meu amor a tua língua
prende 
aquilo que desprende de loura

Maria Teresa HortaEu Sou a Minha Poesia. Antologia Pessoal. Publicações Dom Quixote, 2019., p. 79
 Existem pedras nas mãos
mas não as uses 
comigo


Maria Teresa HortaEu Sou a Minha Poesia. Antologia Pessoal. Publicações Dom Quixote, 2019., p. 76

quinta-feira, 26 de dezembro de 2024


"não me convidem para mais nada / se não para a queda do muro que divide / a política e o homem / em dois lobos experimentais / dois lobos famintos domados / pela náusea de uma floresta"


Augusto António Cabrita in Desconstrução

quarta-feira, 25 de dezembro de 2024

16.

Mãe, sinto a clarividência a queimar-me, o fogo de ver como os cegos o miolo das coisas, a violência do mundo de dentro. Chama-me para fora. Só não quero morrer às escuras.

Quinto homem. Quinto dia


Daniel Faria.
 Sétimo Dia. Edição de Francisco Saraiva Filho. Assírio & Alvim, 2021., p. 144

15.

Acordo de madrugada sem saber para onde vou. A lua entra-me nos vidros, no quarto, no sangue minguante.


Quinto homem. Quinto dia


Daniel Faria.
 Sétimo Dia. Edição de Francisco Saraiva Filho. Assírio & Alvim, 2021., p. 143


KATIA BERESTOVA

 

 13.

Mãe, sinto a carne a tremer. Arrancam-ma. Sou despedaçado por todos os que amo. Sou desmembrado. Tu coses sempre, tu continuas a coser.

Quinto homem. Quinto dia


Daniel Faria.
 Sétimo Dia. Edição de Francisco Saraiva Filho. Assírio & Alvim, 2021., p. 141

9.

Sinto os ferros do cérebro oxidando.


Quinto homem. Quinto dia



Daniel Faria.
 Sétimo Dia. Edição de Francisco Saraiva Filho. Assírio & Alvim, 2021., p. 137

 11.

Bato à porta do teu quarto mesmo quando sei que não estás. Descobri agora quanto custa aos mendigos, não digo a fome, mas não haver ninguém.

Quarto homem. Quarto dia


Daniel Faria.
 Sétimo Dia. Edição de Francisco Saraiva Filho. Assírio & Alvim, 2021., p. 121

«Quem nos dera engolir o que foi dito.»

Daniel Faria. Sétimo Dia. Edição de Francisco Saraiva Filho. Assírio & Alvim, 2021., p. 113

 24.

Nunca cumpras todas as promessas. É um modo muito triste de morrer.


Terceiro homem. Terceiro dia


Daniel Faria.
 Sétimo Dia. Edição de Francisco Saraiva Filho. Assírio & Alvim, 2021., p. 108

Préludes: La colombe (The Dove)

«Na decisão de nunca mais adoecer sozinho.»


Daniel Faria.
 Sétimo Dia. Edição de Francisco Saraiva Filho. Assírio & Alvim, 2021., p. 99

 14.

Sonho com a chaga do peito, a chaga por onde entram os rebanhos. Eu fico longe dele como os arbustos nos penhascos onde a ovelha perdida se tresmalha.

Terceiro homem. Terceiro dia


Daniel Faria.
 Sétimo Dia. Edição de Francisco Saraiva Filho. Assírio & Alvim, 2021., p. 98

 2.

Pus o despertador a despertar de hora em hora. De hora em hora vejo a febre. Mantém-se estável. Amanhã levanto-me.
  De três em três horas telefono a um amigo diferente. Normalmente ninguém atende. Às vezes deixo mensagem. Deixo a promessa de ligar de novo. Gosto muito de prometer.

Terceiro homem. Terceiro dia


Daniel Faria.
 Sétimo Dia. Edição de Francisco Saraiva Filho. Assírio & Alvim, 2021., p. 86

15.

Ponho a minha mão esquerda diante do espelho. Agora já medito se não há do outro lado outra mão que se possa tocar.

Segundo homem. Segundo dia


Daniel Faria.
 Sétimo Dia. Edição de Francisco Saraiva Filho. Assírio & Alvim, 2021., p. 73

 


KATIA BERESTOVA


Visions de l'Amen: No. 1, Amen de la Création

 «Escrevo o ruído dos bichos da madeira como Messiaen a transcrever a melodia dos pássaros.»


Daniel Faria.
 Sétimo Dia. Edição de Francisco Saraiva Filho. Assírio & Alvim, 2021., p. 66

« O pensamento pode manter-nos de pé mesmo quando estamos no chão.»


Daniel Faria. Sétimo Dia. Edição de Francisco Saraiva Filho. Assírio & Alvim, 2021., p. 64

2. 

Podem cortar-me o coração que eu vivo.


Segundo homem. Segundo dia

Daniel Faria.
 Sétimo Dia. Edição de Francisco Saraiva Filho. Assírio & Alvim, 2021., p. 60

 24.

  Nunca atirei a pedra exacta para o lugar certo. E abri feridas em todas as direções.


Daniel Faria. Sétimo Dia. Edição de Francisco Saraiva Filho. Assírio & Alvim, 2021., p. 56

É preciso alguém que nos livre da ceguez.

 Daniel Faria. Sétimo Dia. Edição de Francisco Saraiva Filho. Assírio & Alvim, 2021., p. 49

Morrissey - Black Cloud



 8.

  Não me tenho esquecido de ti. Tenho-me esquecido de muitas coisas. Acontece-me parar no meio de uma escada e depois não me lembrar se estou a subir ou a descer. Mas lembra-me de te perguntar se estarei a morrer.

Daniel Faria. Sétimo Dia. Edição de Francisco Saraiva Filho. Assírio & Alvim, 2021., p. 40

«Devia dizer-te ainda bem que vieste, dizer-te não calculas como te tenho esquecido.»

Daniel Faria. Sétimo Dia. Edição de Francisco Saraiva Filho. Assírio & Alvim, 2021., p. 39

 5.

(...)

A viuvez e o luto são mais do que sofrimento. A tarefa da vida é o deserto de te gastares. Ganhaste a transparência. Aproximas o que divides e separas. E chamam-te a libertar.

Daniel Faria. Sétimo Dia. Edição de Francisco Saraiva Filho. Assírio & Alvim, 2021., p. 37

 3.

Aproxima-te. Preciso dos teus olhos acesos para não me despenhar no vazio. Para não ter frio.

Daniel Faria. Sétimo Dia. Edição de Francisco Saraiva Filho. Assírio & Alvim, 2021., p. 35

 1.

A minha maneira de curar-me é perdoar as ofensas.
Sei que começo a despropósito, mas não sei como dizer-te o que me trouxe aqui. Tenho de dizê-lo agora, mais tarde seria uma doença. Ter-te diante de mim e adiar a confissão de que vim para te ver.

Daniel Faria. Sétimo Dia. Edição de Francisco Saraiva Filho. Assírio & Alvim, 2021., p. 33

 


KATIA BERESTOVA

«24 pássaros contra todas as ausências »

 Daniel Faria

''literatura patrística''

 Que é o homem, Senhor, para que te ocupes dele,
E o filho do homem para que penses nele?

Sl 144(143), 3-4

 A tarefa da vida é o deserto de te gastares.

Daniel Faria

 e não quero anéis
de aceite
para enfeitar os meus olhos

Maria Teresa HortaEu Sou a Minha Poesia. Antologia Pessoal. Publicações Dom Quixote, 2019., p. 75


 

mulher doente de afagos

Maria Teresa HortaEu Sou a Minha Poesia. Antologia Pessoal. Publicações Dom Quixote, 2019., p. 74

MINHA SENHORA DE MIM

 sem ser dor ou ser cansaço

nem o corpo que disfarço


Maria Teresa HortaEu Sou a Minha Poesia. Antologia Pessoal. Publicações Dom Quixote, 2019., p. 73

 V

Não há pranto que se ajuste
à fome da espingarda

Nem porcelana que parta
os olhos da sua água

A mulher na sua casa
põe a frescura no cântaro

E o poente dobrado
depõe-no ela a um canto

Maria Teresa HortaEu Sou a Minha Poesia. Antologia Pessoal. Publicações Dom Quixote, 2019., p. 61

 IV

Acolhe a mulher

o cântaro


Na água acolhe

os joelhos


Maria Teresa HortaEu Sou a Minha Poesia. Antologia Pessoal. Publicações Dom Quixote, 2019., p. 60

my bloody valentine - when you sleep

 The First Snow

Kazan
1970
foto
Vladimir Zotov



PEQUENOS DIZERES SOBRE A MULHER

 I

Não come da
fome
nem come do medo

Nem guarda na 
arca
com a roupa o segredo

Maria Teresa HortaEu Sou a Minha Poesia. Antologia Pessoal. Publicações Dom Quixote, 2019., p. 59
 e toda a dor nos olhos
só em água


Não        não é apenas
aquilo que pensamos 
que nos devora enquanto 
demoramos


Maria Teresa HortaEu Sou a Minha Poesia. Antologia Pessoal. Publicações Dom Quixote, 2019., p. 56
 quantas insónias 
cansamos por de dentro

Maria Teresa HortaEu Sou a Minha Poesia. Antologia Pessoal. Publicações Dom Quixote, 2019., p. 54

Quando um Homem Quiser


Tu que dormes à noite na calçada do relento
numa cama de chuva com lençóis feitos de vento
tu que tens o Natal da solidão, do sofrimento
és meu irmão, amigo, és meu irmão
E tu que dormes só o pesadelo do ciúme
numa cama de raiva com lençóis feitos de lume
e sofres o Natal da solidão sem um queixume
és meu irmão, amigo, és meu irmão
Natal é em Dezembro
mas em Maio pode ser
Natal é em Setembro
é quando um homem quiser
Natal é quando nasce
uma vida a amanhecer
Natal é sempre o fruto
que há no ventre da mulher
Tu que inventas ternura e brinquedos para dar
tu que inventas bonecas e comboios de luar
e mentes ao teu filho por não os poderes comprar
és meu irmão, amigo, és meu irmão

José Carlos Ary Dos Santos
 sentir 
ou dar a boca

a ti só
dar-te a boca

Maria Teresa HortaEu Sou a Minha Poesia. Antologia Pessoal. Publicações Dom Quixote, 2019., p. 49

Babx - La mort des amants

 


 Direi dos olhos verdes
os teus olhos
e do verde dos teus olhos direi vício

Maria Teresa HortaEu Sou a Minha Poesia. Antologia Pessoal. Publicações Dom Quixote, 2019., p. 44
amor já saudade
já instinto

Maria Teresa HortaEu Sou a Minha Poesia. Antologia Pessoal. Publicações Dom Quixote, 2019., p. 37

reentrâncias

suicídio sem cadáver

Maria Teresa HortaEu Sou a Minha Poesia. Antologia Pessoal. Publicações Dom Quixote, 2019., p. 33

 a corroer nos buracos
o homem que a trabalhar 
desanima e não renasce

Maria Teresa HortaEu Sou a Minha Poesia. Antologia Pessoal. Publicações Dom Quixote, 2019., p. 31

Vareira

 « Mas as pedras são pedras ou são vento?»

David Mourão-Ferreira

                                         Konstantin Kalynovych - Madonna under the Cloud


 

INVOCAÇÃO DO AMOR

 Pedir-te a sensação
a água
o travo

aquele odor antigo
de uma parede
branca

Pedir-te da vertigem
a certeza 
que tens nos olhos 
quando me desejas

Pedir-te sobre a mão
a boca inchada
um rasto de saliva
na garganta

pedir-te que me dispas
e me deites
de borco e os meus seios
na tua cara

Pedir-te que me olhes
e me aceites
me percorras
me invadas
me pressintas

Pedir-te que me peças
que te queira
no separar das horas
sobre a língua

Maria Teresa HortaEu Sou a Minha Poesia. Antologia Pessoal. Publicações Dom Quixote, 2019., p. 26
 É o tempo grande
de estar cansada
fria
de estar convosco e ter concessões
nos olhos

É o tempo dia
de inventar paisagens
quentes
e ter um carnaval vestido 
pelos seios


Maria Teresa HortaEu Sou a Minha Poesia. Antologia Pessoal. Publicações Dom Quixote, 2019., p. 23
 É o tempo exacto
de estar exacta e nua

Maria Teresa HortaEu Sou a Minha Poesia. Antologia Pessoal. Publicações Dom Quixote, 2019., p. 23

Dedos habitados pelo útero

Maria Teresa HortaEu Sou a Minha Poesia. Antologia Pessoal. Publicações Dom Quixote, 2019., p. 14

 « e nas minhas mãos incompletas
trouxe-te
um naufrágio
de flores cansadas
e o único jardim de amor 
que cultivei »

Maria Teresa Horta. Eu Sou a Minha Poesia. Antologia Pessoal. Publicações Dom Quixote, 2019


Porto - Lavadeiras (Década de 1970)
Foto: Artur Pastor

“ as melhoras da morte “

Altares da Crucificação e da Morte de São José

segunda-feira, 23 de dezembro de 2024

impetuosidade

 Mulheres na História: Camille Claudel, a musa de Auguste Rodin

''Camille Claudel, nome artístico de Camille Athanaïse Cécile Cerveaux Prosper, nasceu a 8 de Dezembro de 1864 na cidade de Aisne e cresceu na aldeia de Villeneuve-sur-Fère, em França. O seu pai, maravilhado com o talento precoce de Camille, proporcionava-lhe todos os meios de desenvolver as suas potencialidades. Já a mãe de Camille não via com bons olhos a vocação artística da filha.
A vida de Camille Claudel foi sempre alvo de especulações e a razão de tal facto deve-se à sua relação amorosa com o seu professor, mentor intelectual e amante - o também escultor Auguste Rodin.
Dotada de enorme talento que pode ser claramente visto no seu trabalho, desde jovem, Camile demonstrava mestria na utilização do barro. Ela preferia a sensação de tocar o material à de desenhar. Quando a familia de Camille mudou de casa passou a morar no bairro "Nogent-sur-Seine" e tornaram-se praticamente vizinhos de Alfred Boucher, importante escultor do século XIX. O pai de Camille levou os seus trabalhos para a apreciação de Boucher que, impressionado com o talento da jovem, levou esses mesmos trabalhos para a apreciação de outro famoso escultor Paul Dubois. Após a aprovação desses dois nomes destacados da escultura foi fácil para Camille entrar para a "Académie Colarossi" uma das raras academias abertas também para mulheres.
Em seguida, juntou-se a um grupo de três outras escultoras e começaram a ter aulas informais com Boucher. Quando em 1883 Boucher se mudou para Itália, Rodin assumiu a responsabilidade perante os estudantes de Boucher. O deslumbramento pelo enorme talento da artista e os encontros sucessivos entre Rodin, 43 anos e Camille, 19 anos, levou-os a uma relação que durou quinze anos, relacionamento que influenciou toda a técnica utilizada por Camille nos seus trabalhos até então.
O período em que a escultora esteve no estúdio de Rodin como sua assistente foi considerado o mais produtivo da vida do famoso escultor e para Camille, a pior fase para a sua afirmação como escultora, independente dele.
Camille esculpiu o busto de Rodin e fez transparecer um homem rude e forte. Rodin, modelava Camille raramente como uma vencedora (escultura A França). A obra mais famosa de Camille, A Valsa, marca o coroamento da relação de ambos e da sua realização como escultora.
O romance com Rodin terminou em 1898. Camille resolve afastar-se dele, tanto pelo facto de Rodin ainda manter uma relação com outra mulher mas também porque a escultora queria continuar o seu trabalho sozinha. Longe dele começou a ter problemas financeiros e a demonstrar sinais de distúrbios mentais. Em 1906, ela destrói grande parte de seu próprio trabalho sendo internada num hospital para doentes mentais.
A eclosão da Primeira Guerra Mundial levou-a a ser transferida para Villeneuve-lès-Avignon, onde passou os últimos trinta anos de sua vida e lá morreu, em 1943, sem nunca ter recebido a visita da sua mãe.''



sábado, 21 de dezembro de 2024

Teresa Paula Brito - A solidão da mulher | 🇵🇹, 1974

 nossa vida é nossa primeira ficção

Eliane Brum

"Para Ser Eterno Basta Ser Um Livro"

 Meus desacontecimentos 

 «Lembro que, quando tudo começou, era escuro. E hoje, depois de todos esses anos de labirinto, todos esses anos em que avanço pela neblina empunhando a caneta adiante do meu peito, percebo que o escuro era uma ausência. Uma ausência de palavras. Essa escuridão é minha pré-história. Eu antes da história, eu antes das palavras. Eu caos.»

Eliane Brum



KATIA BERESTOVA

 

Honey Man



«Hoje tudo é (ou parece/pretende ser) importante, urgente e incrível, sendo recorrente uma amplificação acrítica, hiperbólica e distorcida de pessoas, situações, contextos.»

Artigo de Opinião de Paulo Pires
Diário do Sul


«E a chamada “motricidade fina”, é mesmo o quê? Ainda sabemos escrever manualmente, de forma legível e escorreita? Nas mãos, derivado da híper-demanda digital, parece haver agora uma prazerosa ditadura rotativa com apenas três protagonistas, que sabe a pouco: o polegar, o indicador e o médio. E apenas duas tarefas básicas: clicar e deslizar, deslizar e clicar, em incessante loop. Sobram quatro dedos, dois exilados em cada mão – condenados à dormência física, ao atrofiamento motor, ao analfabetismo sensitivo?»

Artigo de Opinião de Paulo Pires
Diário do Sul


''(...) Dostoievski escreveu que, um dia, a tolerância chegará a tal ponto que as pessoas inteligentes serão proibidas de fazer qualquer reflexão simplesmente para não ofender os imbecis.''

Artigo de Opinião de Paulo Pires
Diário do Sul

falibilidade

 «Representava um corvo solitário no alto de uma árvore despida e tinha a seguinte legenda: « Um corvo obstinado ao amanhecer: as chuvas de junho. Kazan.»

 Yasunari Kawabata. O Som da Montanha. Tradução de Francisco Agarez. D. Quixote., p. 202

 «Os seios dela eram de uma mulher que nunca tivera filhos, mas Shingo não achou que fosse virgem. Ficou espantado quando encontrou vestígios da pureza dela no seu dedo. Sentiu-se desconcertado, mas não culpado.»

 Yasunari Kawabata. O Som da Montanha. Tradução de Francisco Agarez. D. Quixote., p. 200

''electrificação doméstica''

Yasunari Kawabata. O Som da Montanha. Tradução de Francisco Agarez. D. Quixote., p. 198


KATIA BERESTOVA

 

 «Costuma-se dizer que as tempestades fortalecem a raiz das árvores.» 

 Yasunari Kawabata. O Som da Montanha. Tradução de Francisco Agarez. D. Quixote., p. 194
 «Posso falar? Estou a ferver por dentro e posso descontrolar-me um bocadinho.»
«Fala.»
«É sobre a jovem senhora.» Engasgou-se com as palavras. «Penso que ela fez um aborto.»

 Yasunari Kawabata. O Som da Montanha. Tradução de Francisco Agarez. D. Quixote., p. 188

Tulipeiro

terça-feira, 17 de dezembro de 2024

''pruridos teus''

 Yasunari Kawabata. O Som da Montanha. Tradução de Francisco Agarez. D. Quixote., p. 170

«Se nos tivesses contado, não terias precisado de sofrer tanto.»

Yasunari Kawabata. O Som da Montanha. Tradução de Francisco Agarez. D. Quixote., p. 170

Tyler, The Creator - Like Him (Lyrics Video) ft. Lola Young

 


                                                                                             KATIA BERESTOVA

''Um pano bordado pendia sobre as gavetas.''

 Yasunari Kawabata. O Som da Montanha. Tradução de Francisco Agarez. D. Quixote., p. 170

 «(...), caíram-lhe os olhos num título surpreendente:

«Lótus com dois mil anos dá flor.»


 Yasunari Kawabata. O Som da Montanha. Tradução de Francisco Agarez. D. Quixote., p. 169

domingo, 15 de dezembro de 2024

A cicatriz das tuas derrotas

José Tolentino Mendonça. A Noite Abre Meus Olhos. 4ª Edição, Assírio&Alvim, Porto, 2021. p. 486

Fennesz & Ryuichi Sakamoto - Abyss

 


Herberto Helder, no livro “Ofício Cantante”. (Ed. Assírio & Alvim; 1.ª edição [2009]).

 as mãos vazias são selvagens na sua beleza
duras mesmo se vulneráveis
são o esconderijo ideal para guardares relâmpagos
e verdades ferozmente concisas


José Tolentino Mendonça. A Noite Abre Meus Olhos. 4ª Edição, Assírio&Alvim, Porto, 2021. p. 483
 volta com o balde ao poço
mas desce tu nele com a água até à cintura


José Tolentino Mendonça. A Noite Abre Meus Olhos. 4ª Edição, Assírio&Alvim, Porto, 2021. p. 481
 (...)

mas no fundo acinzentado do desejo
entre pragas cosidas umas às outras
uma pedra atirada há mil anos
agita ainda as águas


José Tolentino Mendonça. A Noite Abre Meus Olhos. 4ª Edição, Assírio&Alvim, Porto, 2021. p. 465

ALÇAPÃO

 O tempo é um alçapão mas não te fies
o que omites acaba por ressurgir
como intruso escava uma saída
rasteja por vias desconhecidas
na distância do que pensavas perdido
e chega a tua casa antes de ti


José Tolentino Mendonça. A Noite Abre Meus Olhos. 4ª Edição, Assírio&Alvim, Porto, 2021. p. 456

TRISTEZA

 Nas noites lentas que nos fazem guerra
não há pensamento que possa mudar
a tristeza, essa música minúscula
nem precisamos morrer para nos sentirmos mortos
quando a sua cabeleira varre a terra
e nos recolhe como flores
de uma coroa deposta

rogamos à vida que responda
mas a vida só se expressa na agulha dos fogos
em línguas desconhecidas
no soprar ora longínquo
ora próximo do vento

e quando abrimos a garganta
em busca de um fio de voz
ela tornou-se inaudível
como se jamais nos tivesse pertencido

José Tolentino Mendonça. A Noite Abre Meus Olhos. 4ª Edição, Assírio&Alvim, Porto, 2021. p. 455


KATIA BERESTOVA
 

O silêncio é também visual

José Tolentino Mendonça. A Noite Abre Meus Olhos. 4ª Edição, Assírio&Alvim, Porto, 2021. p. 454

o solitário ladrar de um cão

 José Tolentino Mendonça. A Noite Abre Meus Olhos. 4ª Edição, Assírio&Alvim, Porto, 2021. p. 452

CRONOMETRIAS

 Nos dias de Heródoto usavam-se
modos mais exactos de medir o tempo
o gotejar da água para a ânfora
o escorrer da areia, grão a grão
a viagem da sombra, como se não fosse

José Tolentino Mendonça. A Noite Abre Meus Olhos. 4ª Edição, Assírio&Alvim, Porto, 2021. p. 449
 sentirás o que sente um sonâmbulo
às voltas da noite interminável

José Tolentino Mendonça. A Noite Abre Meus Olhos. 4ª Edição, Assírio&Alvim, Porto, 2021. p. 448

A vida exige de ti ainda mais escuro

José Tolentino Mendonça. A Noite Abre Meus Olhos. 4ª Edição, Assírio&Alvim, Porto, 2021. p. 448

PARTIR SEM CHEGAR

 Precisarás de tempo para alcançar a margem
o ramo do tamarindo onde te espera
o assobio do barqueiro
não é o primeiro
deverás tactear a escuridão da folhagem
e enganares-te tantas vezes
que te convenças que não sabes

estreita é a corrente invisível que nos conduz 
por corredores, registos, águas em queda
àquele momento talvez involuntário
onde palavra dita e palavra calada 
se tocam


 José Tolentino Mendonça. A Noite Abre Meus Olhos. 4ª Edição, Assírio&Alvim, Porto, 2021. p. 441

MUDAR DE VIDA de Paulo Rocha (1966) - excerto

Porte de Saint-Cloud, Paris, 1950
Sabine Weiss



 

If He Had Changed My Name

Música de Nina Simone

I told Jesus it would be alright if He changed my name
I told Jesus it would be alright if He changed my name
I told Jesus it would be alright if He changed my name

And He told me that I would go hungry if He changed my name
And He told me that I would go hungry if He changed my name
Yes, He told me that I would go hungry if He changed my name

But I told Jesus it would be alright if He changed my name
I told Jesus it would be alright if He changed my name
So I told Him it would be alright and the world would hate me
That I would go hungry if He changed my name

Compositores: Robert Mac Gimsey






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