sábado, 21 de dezembro de 2013

writing


 
   «A mais louca e desprezível das gentes é a classe dos comerciantes, que exercem uma profissão sórdida por processos desonestos. Mentem, perjuram, defraudam, enganam, roubam e, apesar disso, julgam-se com direito à consideração dos outros, porque trazem nos dedos grossos anéis de ouro. Eles têm, aliás, a admiração de certos basbaques aduladores, que lhes dão em público títulos honrosos, provavelmente para apanhar umas migalhas dos bens adquiridos por processos vergonhosos. Vêem-se ainda certos Pitagóricos, tão convencidos de que todos os bens são comuns, que se apoderam dos bens dos outros tão tranquilamente como se de uma herança se tratasse. Há ainda outros que não são ricos senão de esperanças. Os seus sonhos agradáveis bastam para os tornar felizes. Alguns contentam-se em passar por ricos em público, embora em casa morram de fome. Este apressa-se a dissipar tudo quanto tem e aquele outro entesoura sem escrúpulos. Um deles afadiga-se a conseguir as honras populares, enquanto outro só se sente feliz enrodilhado ao canto da chaminé. Numerosos são os que sustentam pleitos sem fim e a sua teimosia aproveita apenas aos juízes, que arrastam o processo, e aos advogados, que os enganam. Há pessoas que se entusiasmam com as novidades, outros são apenas impressionados por empresas gigantescas. Alguns deixam a casa, a mulher e os filhos para ir a Jerusalém, a Roma ou a Santiago, onde nada têm que fazer.
     Em resumo, se pudésseis observar, instalados na Lua, como Menipo, as infinitas agitações dos homens, julgaríeis ver um turbilhão de moscas ou de moscardos a bater-se, a lutar, a tecer emboscadas, pilhando, folgando, nascendo, caindo e morrendo. Não se poderia imaginar que movimentos, que tragédias, produz animal tão mesquinho e destinado a morrer em breve. Frequentemente, pela guerra, ainda que breve, ou por uma simples epidemia, milhares de homens desaparecem da face da Terra.»



Erasmo. O Elogio da Loucura. Tradução, prefácio e notas de Maria Isabel Gonçalves Tomás. Livros de bolso Europa-América., p. 88/9

quarta-feira, 18 de dezembro de 2013

''Fiquei muito triste

           durante muito tempo.''

segunda-feira, 16 de dezembro de 2013

dogmático


adjetivo
1. relativo ao dogma
2. que pretende impor-se, não admitindo discussão
3. sentencioso; imperativo
4. autoritário; perentório; categórico

em tom dogmático 
 de forma que não admite contradição, perentoriamente

(Do grego dogmatikós, «idem», pelo latim dogmatĭcu-, «idem»)

domingo, 15 de dezembro de 2013


«(...); dá-me
tua mão e passeemos.
Pelos campos desta minha terra,
bordados de poeirentos olivais,
vou caminhando só,
triste, cansado, pensativo e velho.»



António Machado. Antologia Poética. Selecção, tradução, prólogo e notas de José Bento.2ª Edição, Edições Cotovia, 1999., p. 127

''olival florido''


A felicidade só nos toca fugazmente.


Ernst Jünger. O Problema de Aladino. Tradução de Ana Cristina Pontes. Edições Cotovia, Lisboa, 1989., p. 119
«Deve-se distinguir entre as imagens externas e internas, que nós tomamos por ilusões, podendo, no entanto, assumir por fim uma forma convincente. Nos desertos, a transição era conseguida através de flagelações. Em mim ela era involuntária, e tinha perdido desde há muito o apetite. Que vivemos num deserto para cuja extensão de monotonia a técnica contribui de forma crescente, é a minha convicção de há longa data. Convém referir que a imaginação é estimulada pela monotonia.
   À noite, depois de escrever no escritório da «Terrestra», ou melhor, ainda em casa, fechava os olhos e a imagem da folha com os seus carecteres aparecia ao meu olhar interior. Isso correspondia à experiência comum, a escrita não era mais legível, tinha antes um efeito ornamental.
     Contudo a mim surgiam-me frases legíveis e mesmo aquelas que não estavam de acordo com o meu texto - comunicações como se fossem ditadas pela escrita automática. Na sua maioria eram desagradáveis «Tens as mãos sujas» ou «Os cães chamam-te» e também «Pensa em Liegnitz» e «Não conheceste Bertha bem». Frequentemente não sabia se as ouvia ou se as lia.»


Ernst Jünger. O Problema de Aladino. Tradução de Ana Cristina Pontes. Edições Cotovia, Lisboa, 1989., p. 118

Adão

«Adão  é um ser humano perfeito - nem homem, nem mulher, mas andrógeno como os anjos - a mulher saiu dele como a imagem de um sonho. O nosso desejo é apenas a percepção da perda, uma sombra desse primeiro grande desejo que criou.»


Ernst Jünger. O Problema de Aladino. Tradução de Ana Cristina Pontes. Edições Cotovia, Lisboa, 1989., p. 116
«Na alteração inquietante do nosso mundo, praticamente todos deviam conhecer este estado de espírito em que se começa a duvidar da razão. Talvez o todo não passe de um sono cheio de espectros.»


Ernst Jünger. O Problema de Aladino. Tradução de Ana Cristina Pontes. Edições Cotovia, Lisboa, 1989., p. 111

Closing In (2008)


O meu sofrimento

«O meu sofrimento tinha origens corporais ou então, pelo menos, tinha a ver com o corpo. Não conseguia dormir, embora em casa e no escritório passasse o tempo a sonhar. Quando sentia dores de cabeça não conseguia comer e, por isso, bebia ainda mais. Era como se tivesse saído de mim próprio e, apenas à noite, quando me via ao espelho com a vela na mão esquerda, completamente bêbado, é que reconhecia a minha identidade. Nessa altura parecia-me que me tornara forte demais para mim mesmo.
   Agora só muito raramente é que estava com Bertha. Receava que ela ouvisse os meus monólogos. Ela queria que eu procurasse um médico, mais precisamente um psiquiatra. Este considerar-me-ia uma presa e enviar-me-ia de um colega para outro, até acabar num asilo de loucos. Para isso não precisava de ajuda.»




Ernst Jünger. O Problema de Aladino. Tradução de Ana Cristina Pontes. Edições Cotovia, Lisboa, 1989., p. 106/107

O meu niilismo contribuía para a minha indisposição.

Ernst Jünger. O Problema de Aladino. Tradução de Ana Cristina Pontes. Edições Cotovia, Lisboa, 1989., p. 106
«Para os letrados, os livros constituem o vestuário pelo qual eles se avaliam. Hume, Maquiavel, Flávio Josefo, Ranke, em longas filas de castanho dourado - existe um estado de espírito em que os livros irradiam imediatamente substância.»
 



Ernst Jünger. O Problema de Aladino. Tradução de Ana Cristina Pontes. Edições Cotovia, Lisboa, 1989., p. 83

caliça


nome feminino

1. fragmentos de argamassa soltos das paredes e tectos velhos
2. coloquial dinheiro miúdo

''baldio amarelento''

rapace


adjetivo de dois géneros

 1. que se atira sobre a presa
2. que ataca rapidamente
3. que arrebata com violência
4. que rouba, que rapina
5. que caracteriza os animais predadores
6. ávido de lucro

«Nada vos devo; deveis-me o que vos deixo escrito.»

António Machado. Antologia Poética. Selecção, tradução, prólogo e notas de José Bento.2ª Edição, Edições Cotovia, 1999., p. 99

tresnoitar

1. passar a noite sem dormir
2. recolher-se tarde

verbo transitivo privar do sono

LXXXVI

  Eram ontem minhas dores
tais como bichos-da-seda
que iam tecendo casulos;
hoje, mariposas negras.
   De quantas flores amargas
eu extraí branca cera!
   Oh, tempo em que meus pesares
trabalhavam como abelhas!
  Hoje são avenas loucas
ou joio na sementeira,
como morrão numa espiga,
como caruncho em madeira.
  Oh, tempo em que minhas dores
tinham lágrimas serenas,
e eram como água da nora,
para a horta boa rega!
  Hoje são uma torrente
que arranca o limo da terra.
  Dores que fizeram ontem
de meu coração colmeia,
tratam-me hoje o coração
como uma muralha velha:
querem derrubá-lo, e já,
a golpes de picareta.
 
 
 
António Machado. Antologia Poética. Selecção, tradução, prólogo e notas de José Bento.2ª Edição, Edições Cotovia, 1999., p. 83

maldisse

sábado, 14 de dezembro de 2013

...Meu coração sangrava...

António Machado. Antologia Poética. Selecção, tradução, prólogo e notas de José Bento.2ª Edição, Edições Cotovia, 1999., p. 73

LXIV


 Do limiar de um sonho me chamaram...
Era a serena voz, a voz querida.
- Diz-me: virás comigo ver a alma?
Chegou-me ao coração uma carícia.
-Contigo sempre...E avancei no sonho
por uma longa e livre galeria,
sentindo o roçar da veste pura
e o suave palpitar da mão amiga.»



António Machado. Antologia Poética. Selecção, tradução, prólogo e notas de José Bento.2ª Edição, Edições Cotovia, 1999., p. 71
« - Virás comigo? - Não, jamais; os túmulos
e os mortos assustam-me.»


António Machado. Antologia Poética. Selecção, tradução, prólogo e notas de José Bento.2ª Edição, Edições Cotovia, 1999., p. 71

'' el demonio de mi sueño''

''E tudo na memória se perdia''

António Machado. Antologia Poética. Selecção, tradução, prólogo e notas de José Bento.2ª Edição, Edições Cotovia, 1999., p. 69




You must leave now, take what you need, you think will last
But whatever you wish to keep, you better grab it fast
Yonder stands your orphan with his gun
Crying like a fire in the sun
Look out the saints are comin’ through
And it’s all... over now, Baby Blue

The highway is for gamblers, better use your sense
Take what you have gathered from coincidence
The empty-handed painter from your streets
Is drawing crazy patterns on your sheets
This sky, too, is folding under you
And it’s all over now, Baby Blue

All your seasick sailors, they are rowing home
All your reindeer armies, are all going home
The lover who just walked out your door
Has taken all his blankets from the floor
The carpet, too, is moving under you
And it’s all over now, Baby Blue

Leave your stepping stones behind, something calls for you
Forget the dead you’ve left, they will not follow you
The vagabond who’s rapping at your door
Is standing in the clothes that you once wore
Strike another match, go start anew
And it’s all over now, Baby Blue

domingo, 8 de dezembro de 2013

XXXVII

  Oh diz-me, noite amiga, amada velha,
que me trazes o retábulo de meus sonhos
sempre deserto e desolado, e só
com meu fantasma dentro,
minha pobre sombra triste
sobre a estepe e sob o sol de fogo,
ou sonhando amarguras
nas vozes de todos os mistérios,
diz-me, se sabes, velha amiga, diz-me
se são minhas as lágrimas que verto.
E respondeu-me a noite:
Nunca me revelaste teu segredo.
Não soube nunca, amado,
se eras tu esse fantasma do teu sonho
nem descobri se era sua voz a tua
ou era a voz de um histrião grotesco.
  Disse eu à noite: Amada mentirosa,
tu sabes meu segredo;
tu viste a funda gruta
onde fabrica seu cristal meu sonho,
e sabes que minhas lágrimas são minhas,
e sabes minha dor, minha dor velha.
   Oh! Eu não sei, amado, disse a noite,
eu não sei teu segredo,
ainda que tenha visto vaguear esse que chamas
desolado fantasma, por teu sonho.
Debruço-me sobre as almas, quando choram
e escuto a sua reza,
humilde e solitária,
a que chamas um salmo verdadeiro;
mas nas profundas abóbadas da alma
não sei se o pranto é uma voz ou um eco.
  Para escutar a queixa de teus lábios
busquei-te no teu sonho,
e vi-te ali a vaguear num conturbado
labirinto de espelhos.



António Machado. Antologia Poética. Selecção, tradução, prólogo e notas de José Bento.2ª Edição, Edições Cotovia, 1999., p. 45

'' não sei se está meu coração florido.''

'' eis o encontro de um amor amargo.''

XXIX

   Arde em teus olhos um mistério, virgem
esquiva e companheira.
  Não sei se é ódio ou é amor o lume
inesgotável da tua aljava negra.
   Comigo irás enquanto sombra der
meu corpo e a minhas sandálias reste areia.
  -És a sede ou a água em meu caminho?
Diz-me, virgem esquiva e companheira.


António Machado. Antologia Poética. Selecção, tradução, prólogo e notas de José Bento.2ª Edição, Edições Cotovia, 1999., p. 37

sábado, 7 de dezembro de 2013

Reflectia

Reflectia: « E, no entanto, algo ficou. Descobre-se ao arranhar o verniz: uma tristeza como em Novembro, quando as folhas caem, a terra, por seu lado, começa já a germinar. Acredite em mim, sente-se aqui uma perda, uma necessidade adormecida que tudo move.»



Ernst Jünger. O Problema de Aladino. Tradução de Ana Cristina Pontes. Edições Cotovia, Lisboa, 1989., p. 80
«O homem sem história não conhece nenhuma paz, nenhum descanso eterno sobretudo.»



Ernst Jünger. O Problema de Aladino. Tradução de Ana Cristina Pontes. Edições Cotovia, Lisboa, 1989., p. 80

a hóstia extinta

«Sou favorável a uma tirania, mas é evidente que não o posso dizer em voz alta.»

Ernst Jünger. O Problema de Aladino. Tradução de Ana Cristina Pontes. Edições Cotovia, Lisboa, 1989., p. 68
«O espírito do homem é feito de maneira que lhe agrada muito mais a mentira do que a verdade. Fazei a experiência: ide à igreja, quando aí estão a pregar. Se o pregador trata de assuntos sérios, o auditório dormita, boceja e enfada-se, mas se, de repente, o zurrador (perdão, o pregador), como aliás é frequente, começa a contar uma história de comadres, toda a gente desperta e presta a maior das atenções.»


Erasmo. O Elogio da Loucura. Tradução, prefácio e notas de Maria Isabel Gonçalves Tomás. Livros de bolso Europa-América., p. 81

sexta-feira, 6 de dezembro de 2013

Madiba: o prisioneiro 46664



«A adulação faz parte da tão honrada Eloquência, e mais ainda da Medicina, e participa, em alto grau, na Poesia. Ela é o mel e o tempero de todas as relações entre os homens.»


Erasmo. O Elogio da Loucura. Tradução, prefácio e notas de Maria Isabel Gonçalves Tomás. Livros de bolso Europa-América., p. 80/1
«Quanto menos talento têm, mais pretensões e impertinências ostentam, mais se envaidecem e vangloriam. E todos conseguem vender as suas obras, porque é sempre o mais inábil que mais admiradores encontra. O pior agrada necessariamente à maioria, porque esta é dominada pela loucura. É também o mais inábil o mais contente consigo próprio e o mais admirado. Por isso, para quê preferir a verdadeira erudição, difícil de conseguir, enfadonha e prudente e que a tão poucos agrada?»


Erasmo. O Elogio da Loucura. Tradução, prefácio e notas de Maria Isabel Gonçalves Tomás. Livros de bolso Europa-América., p. 78

«O louco só diz loucuras.»

filáucia (AMOR-PRÓPRIO)

«a dura necessidade da morte»

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