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quinta-feira, 5 de novembro de 2015

«Os gritos a meio da noite
das amantes a meio da loucura voavam
como facas para o meu peito.»



Fernando Assis Pacheco. A Musa Irregular. Edições Asa. Lisboa, 1991., p. 11

sábado, 24 de outubro de 2015

"há frutos profundos à superfície
já despidos na base de uma árvore
prontos a ser amados trago a trago
lapidam à nossa fonte amor em bruto
devolvem o diamante à pedra dentro
sabem que vão podando à nossa frente
a amizade como uma arte por instinto
e há ainda uma terra por enquanto"


-"Há"
- Joaquim Castro Caldas

domingo, 18 de outubro de 2015

"O Actor" de Herberto Hélder:


O actor acende a boca. Depois os cabelos.
Finge as suas caras nas poças interiores.
O actor pôe e tira a cabeça
de búfalo.
De veado.
De rinoceronte.
Põe flores nos cornos.
Ninguém ama tão desalmadamente
como o actor.
O actor acende os pés e as mãos.
Fala devagar.
Parece que se difunde aos bocados.
Bocado estrela.
Bocado janela para fora.
Outro bocado gruta para dentro.
O actor toma as coisas para deitar fogo
ao pequeno talento humano.
O actor estala como sal queimado.
O que rutila, o que arde destacadamente
na noite, é o actor, com
uma voz pura monotonamente batida
pela solidão universal.
O espantoso actor que tira e coloca
e retira
o adjectivo da coisa, a subtileza
da forma,
e precipita a verdade.
De um lado extrai a maçã com sua
divagação de maçã.
Fabrica peixes mergulhados na própria
labareda de peixes.
Porque o actor está como a maçã.
O actor é um peixe.
Sorri assim o actor contra a face de Deus.
Ornamenta Deus com simplicidades silvestres.
O actor que subtrai Deus de Deus, e
dá velocidade aos lugares aéreos.
Porque o actor é uma astronave que atravessa
a distância de Deus.
Embrulha. Desvela.
O actor diz uma palavra inaudível.
Reduz a humidade e o calor da terra
à confusão dessa palavra.
Recita o livro. Amplifica o livro.
O actor acende o livro.
Levita pelos campos como a dura água do dia.
O actor é tremendo.
Ninguém ama tão rebarbativamente como o actor.
Como a unidade do actor.
O actor é um advérbio que ramificou
de um substantivo.
E o substantivo retorna e gira,
e o actor é um adjectivo.
É um nome que provém ultimamente
do Nome.
Nome que se murmura em si, e agita,
e enlouquece.
O actor é o grande Nome cheio de holofotes.
O nome que cega.
Que sangra.
Que é o sangue.
Assim o actor levanta o corpo,
enche o corpo com melodia.
Corpo que treme de melodia.
Ninguém ama tão corporalmente como o actor.
Como o corpo do actor.
Porque o talento é transformação.
O actor transforma a própria acção
da transformação.
Solidifica-se. Gaseifica-se. Complica-se.
O actor cresce no seu acto.
Faz crescer o acto.
O actor actifica-se.
É enorme o actor com sua ossada de base,
com suas tantas janelas,
as ruas -
o actor com a emotiva publicidade.
Ninguém ama tão publicamente como o actor.
Como o secreto actor.
Em estado de graça. Em compacto
estado de pureza.
O actor ama em acção de estrela.
Acção de mímica.
O actor é um tenebroso recolhimento
de onde brota a pantomina.
O actor vê aparecer a manhã sobre a cama.
Vê a cobra entre as pernas.
O actor vê fulminantemente
como é puro.
Ninguém ama o teatro essencial como o actor.
Como a essência do amor do actor.
O teatro geral.
O actor em estado geral de graça.

Herberto Hélder

sábado, 17 de outubro de 2015


«Em mim, também; coisa nenhuma
pudera até então ser entendida.»


Pedro TamenRetábulo das Matérias (1956-2001). Gótica, 2000, Lisboa., p. 149

«Se dia, porque dia, como dia,
se agora, mas ainda, com que foi,
palavras, cumprimento, anoitecia,
mas nada, porque nada, porque dói.»



Pedro TamenRetábulo das Matérias (1956-2001). Gótica, 2000, Lisboa., p. 134

quinta-feira, 15 de outubro de 2015

(...)

«condena os nossos pés, esmaga-nos, acaba.»


Pedro TamenRetábulo das Matérias (1956-2001). Gótica, 2000, Lisboa., p. 115

«                                               É nas unhas mais sujas
que o espelho nos reflecte e nos abate o medo.»


Pedro TamenRetábulo das Matérias (1956-2001). Gótica, 2000, Lisboa., p. 113

«(...)
no verde-mar dos dedos,
na loucura dos medos,
na perfeição do ramo está a pedra.»

Pedro TamenRetábulo das Matérias (1956-2001). Gótica, 2000, Lisboa., p. 96

I

Agora muitos montes; e o rio
se levanta e corre nos intervalos
dos gestos. Saber sentir o frio
de todos os ribeiros é amá-los.

Agora é ir correndo os dedos
pela pele; abrir o peito
a todos os cuidados e segredos,
amar-me já refeito.

Agora perder tudo; ter aberta 
a carne de aventura naufragada.
Agora receber e estar alerta,

agora ter razão na mão molhada.
Agora desnudar a lama certa
e esperar vê-la escorrida e bafejada.


Pedro TamenRetábulo das Matérias (1956-2001). Gótica, 2000, Lisboa., p. 95

«Não há montanhas se não há palavras.»


Pedro TamenRetábulo das Matérias (1956-2001). Gótica, 2000, Lisboa., p. 83

quarta-feira, 7 de outubro de 2015

"Esta manhã deste século
entre anjos caídos
a lava da voz humana
podem ouvir neste local da terra
de nome de animal de patas obscenas
como um búzio da cabeça ao sexo
e do sexo à flor do espasmo
vem do murmúrio do caos
e rebenta em sílabas de abelhas nos ouvidos
agora atravessa mil novecentos e oitenta e sete
e todos os meus anos bêbados
vai de um pólo ao outro da memória
e regressa como um tiro no tempo"



António José Forte.
Uma Faca nos Dentes.

terça-feira, 6 de outubro de 2015

|| do esquecimento ||

"esqueço-te com a terna complacência do silêncio
habitual das horas no seu movimento
e no entanto restou um perfume quase imperceptível
do olhar por uma vez aceite
em mim, um olhar que julguei
fosse o meu amor, a ilusão
de um gesto que olhamos como
se nos pertencesse e no entanto
nos é alheio.
Eu havia contribuído integralmente.
A terra foi por um instante pura
através do teu corpo elástico e pausado."


Manuel de Castro.
"Bonsoir, Madame"

quinta-feira, 1 de outubro de 2015

(...)

«A memória dos rios rasava a nossa espera
em minutos de carne.
                        Ao longe o céu, em vão a paz...»


Pedro TamenRetábulo das Matérias (1956-2001). Gótica, 2000, Lisboa., p. 31

«Depois gritámos adeus e perdemo-nos de novo.»


Pedro TamenRetábulo das Matérias (1956-2001). Gótica, 2000, Lisboa., p. 21
«Agora eu sabia que em cada manhã
nasceria o sol atrás dos teus ombros.»

Pedro Tamen. Retábulo das Matérias (1956-2001). Gótica, 2000, Lisboa., p. 13

segunda-feira, 28 de setembro de 2015

OS NOSSOS GOVERNOS

Numa coisa os nossos governos têm sido escrupulosamente
cristãos: mantêm a agricultura pobre para cumprir a profecia de
Cristo que diz: pobres sempre os tereis convosco.


António Cabral 

quarta-feira, 23 de setembro de 2015

NÓS NÃO SOMOS DESTE MUNDO


Luís Filipe Castro MendesPoesia Reunida (1985-1999) com o livro inédito OS AMANTES OBSCUROS. Quetzal Editores, Lisboa, 1999., p. 427

(...)

«Só aqui eu posso amar,
luz escura da paixão:
seja o verso o nosso mar
contra as praias da razão.»


Luís Filipe Castro MendesPoesia Reunida (1985-1999) com o livro inédito OS AMANTES OBSCUROS. Quetzal Editores, Lisboa, 1999., p. 409

''a crueldade das flores acesas''


Luís Filipe Castro MendesPoesia Reunida (1985-1999) com o livro inédito OS AMANTES OBSCUROS. Quetzal Editores, Lisboa, 1999., p. 403
De mim a ti, de ti a mim,
quem de tão longe alguma vez regressa?

(Jorge de Sena)
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