quarta-feira, 29 de março de 2023

terça-feira, 28 de março de 2023


 

 «Rios que vão dar ao mar

Deixem meus olhos secar »


José Afonso. Textos e Canções. Organização Elfriede Engelmayer. 3ª edição revista. Relógio D'Água Editores, Outubro de 2000., p. 194

 «Ninguém diga o que não sabe

Nem afirme o que não viu»


José Afonso. Textos e Canções. Organização Elfriede Engelmayer. 3ª edição revista. Relógio D'Água Editores, Outubro de 2000., p. 183

«Dormindo debaixo de um laranjal»

José Afonso. Textos e Canções. Organização Elfriede Engelmayer. 3ª edição revista. Relógio D'Água Editores, Outubro de 2000., p. 182

 «Maria

Sol de madrugada

Flor de tangerina»


José Afonso. Textos e Canções. Organização Elfriede Engelmayer. 3ª edição revista. Relógio D'Água Editores, Outubro de 2000., p. 180

«Onde não há pão

Não há sossego.»

José Afonso. Textos e Canções. Organização Elfriede Engelmayer. 3ª edição revista. Relógio D'Água Editores, Outubro de 2000., p. 178


 

 «É inútil chorar

O combate é preciso »


José Afonso. Textos e Canções. Organização Elfriede Engelmayer. 3ª edição revista. Relógio D'Água Editores, Outubro de 2000., p. 165

TU MORRES TODOS OS DIAS


Tu morres todos os dias

libertando telefonemas

diante da minha mágoa

exposta à ira dos dias

levo-te cravos vermelhos

flores recentes da estação

Morres e vais caminhando

sobre uma estrada de fumo

o lume que nos sustenta

Já não cheira não tem vida

Às vezes vens-me à lembrança

descalça ao longo da praia

Vivo terrores de madraço

Com dívidas acumuladas

Seguindo de perto o tráfego

Saberei um dia amar-te

Tu morres tu pontificas

eu respiro a tua sombra

Ai repouso de guerreiro

Sobre o abismo repousas


Azeitão, 31 de Março de 1981

José Afonso. Textos e Canções. Organização Elfriede Engelmayer. 3ª edição revista. Relógio D'Água Editores, Outubro de 2000., p. 162

«Virá a tia defunta

Recordar mais uma trança?»

José Afonso. Textos e Canções. Organização Elfriede Engelmayer. 3ª edição revista. Relógio D'Água Editores, Outubro de 2000., p. 161

 

ganhão raso
ganhão que trabalhava de forma sazonal numa herdade (nas sementeiras, nas colheitas, etc.)

potestade

''chora-se a agonia''

José Afonso. Textos e Canções. Organização Elfriede Engelmayer. 3ª edição revista. Relógio D'Água Editores, Outubro de 2000., p. 156


 

 (...)

«Corre o veneno pelas paredes brancas

o mar vomita peixes e serpentes

caem meninos mortos das varandas

as Parcas estão contentes


Tranquilizar o coração humano

É tão difícil como ser ribeiro

As águas essas correm todo o ano

Não voltam em Janeiro »


José Afonso. Textos e Canções. Organização Elfriede Engelmayer. 3ª edição revista. Relógio D'Água Editores, Outubro de 2000., p. 154

«Olham-se o olvido e o medo»

José Afonso. Textos e Canções. Organização Elfriede Engelmayer. 3ª edição revista. Relógio D'Água Editores, Outubro de 2000., p. 147

 «No tempo da penúria

ninguém morre de pasmo»


José Afonso. Textos e Canções. Organização Elfriede Engelmayer. 3ª edição revista. Relógio D'Água Editores, Outubro de 2000., p. 140

'' A dor-inverno''

José Afonso. Textos e Canções. Organização Elfriede Engelmayer. 3ª edição revista. Relógio D'Água Editores, Outubro de 2000., p. 133

 «As cordas desta harpa já não soam

e o gelo queima as ervas da montanha»


José Afonso. Textos e Canções. Organização Elfriede Engelmayer. 3ª edição revista. Relógio D'Água Editores, Outubro de 2000., p. 133

 «Tenho saudades da espuma»

José Afonso. Textos e Canções. Organização Elfriede Engelmayer. 3ª edição revista. Relógio D'Água Editores, Outubro de 2000., p. 125

 

nome feminino
1.
pequeno instrumento, em forma de parafuso e de ponta aguda, destinado a abrir furos na madeira
2.
broca para abrir buracos em pedra
3.
figurado pessoa maçadora e impertinente


 

Tomorrow Is My Turn

« Só nos pinhais é possível parar sem arrependimentos tardios»

« Só nos pinhais é possível parar sem arrependimentos tardios

e penso muito naquela tarde vazia»


José Afonso. Textos e Canções. Organização Elfriede Engelmayer. 3ª edição revista. Relógio D'Água Editores, Outubro de 2000., p. 124

«as horas mastigadas pela lepra

o mosquiteiro, a noite, a trovoada

«Esta é a ditosa pátria minha amada.»

José Afonso. Textos e Canções. Organização Elfriede Engelmayer. 3ª edição revista. Relógio D'Água Editores, Outubro de 2000., p. 123

«dentro da asa o delírio»

José Afonso. Textos e Canções. Organização Elfriede Engelmayer. 3ª edição revista. Relógio D'Água Editores, Outubro de 2000., p. 122

domingo, 26 de março de 2023

«O mundo ecrã deslocou. dessincronizou e desregulou o espaço-tempo da cultura.» 


Gilles Lipovetsky/Jean Serroy , La cultura-mundo.

op. cit in Mario Vargas Llosa. A civilização do Espectáculo. Tradução de Cristina Rodriguez e Artur Guerra. 2.ª Edição.  Quetzal. 2012., p. 25


 

Debussy - Images I/II • Estampes • L'île Joyeuse - Yuji Takahashi (高橋悠治)

NOCTURNO

         Uma noite,
uma noite toda cheia de perfumes, de murmúrios e de músicas de asas,
         uma noite,
em que ardiam na sombra nupcial e húmida, pirilampos fantásticos,
ao meu lado, lentamente, a mim toda cingida,

           muda e pálida

Como se um pressentimento de amarguras infinitas,

até ao fundo mais secreto das tuas fibras te agitasse,

pelo atalho que atravessa a campina em flor

           caminhavas

          e a lua cheia

pelos céus azúleos, infinitos e profundos espargia a sua luz branca,

         e a tua sombra

         fina e lânguida,

         e a minha sombra

pelos raios da lua projectadas,

sobre as areias tristes

da vereda se juntavam

         e eram uma

         e eram uma

E eram uma única longa sombra!

E eram uma única longa sombra!

E eram uma única longa sombra!

            Esta noite

            sozinho, a alma

cheia das infinitas amarguras e agonias da tua morte,

separado de ti mesma, pela sombra, pelo tempo e a distância,

            pelo infinito negro,

            que a nossa voz não alcança

            só e mudo

           pelo atalho caminhava,

e ouvia-se o ladrar dos cães à lua,

            à lua pálida,

             e o coaxar

            das rãs…

Tive frio, era o frio que sentiam no quarto

As tuas faces e a tua testa e as tuas mãos adoradas,

            entre as brancuras níveas

            das brancas mortalhas!

Era o frio do sepulcro, era o frio da morte

             era o frio do nada…

             e a minha sombra

pelos raios da lua projectada,

             ia sozinha,

             ia sozinha,

ia sozinha pela estepe solitária!

            e a tua sombra esbelta e ágil

            fina e lânguida,

como nessa noite morta da morta primavera

como nessa noite cheia de perfumes, de murmúrios e de músicas de

                                                                                                              asas

               abeirou-se e caminhou com ela,

               abeirou-se e caminhou com ela,

abeirou-se e caminhou com ela…Oh as sombras enlaçadas!

Oh as sombras que se procuram e se juntam nas noites de negruras e

                                                                                                       de lágrimas!...


José Asunción Silva. Um País que Sonha cem anos de poesia columbiana (1865-1965). Selecção e prólogo Lauren Mendinueta. Tradução Nuno Júdice. Assírio &Alvim, 2012., p. 21-22


« Nas antípodas das vanguardas herméticas e elitistas, a cultura de massas quer oferecer novidades acessíveis para o público mais amplo possível e que distraiam a maior quantidade possível de consumidores. A sua intenção é divertir, dar prazer, possibilitar uma evasão fácil e acessível para todos, sem necessidade de qualquer formação, sem referentes culturais concretos e eruditos. O que as indústrias culturais inventam não é mais do que uma cultura transformada em artigos de consumo de massas.»


Gilles Lipovetsky/Jean Serroy , La cultura-mundo.

op. cit in Mario Vargas Llosa. A civilização do Espectáculo. Tradução de Cristina Rodriguez e Artur Guerra. 2.ª Edição.  Quetzal. 2012., p. 20

''futilização''

sábado, 25 de março de 2023

 «O consumidor real torna-se um consumidor de ilusões.»

Guy Debord, La Societé du spectacle


 

''coisificação'' do indivíduo

''jargões herméticos''

Mario Vargas Llosa. A civilização do Espectáculo. Tradução de Cristina Rodriguez e Artur Guerra. 2.ª Edição.  Quetzal. 2012., p. 20

''deterioração progressiva da palavra''

Mario Vargas Llosa. A civilização do Espectáculo. Tradução de Cristina Rodriguez e Artur Guerra. 2.ª Edição.  Quetzal. 2012., p. 20

 « Num indivíduo, tal como na sociedade, chegam às vezes a coexistir na alta cultura, a sensibilidade, a inteligência e o fanatismos do torturador e o assassino.»

Mario Vargas Llosa. A civilização do Espectáculo. Tradução de Cristina Rodriguez e Artur Guerra. 2.ª Edição.  Quetzal. 2012., p. 18

 « A pós-modernidade destruiu o mito de que as humanidades humanizam.»

Mario Vargas Llosa. A civilização do Espectáculo. Tradução de Cristina Rodriguez e Artur Guerra. 2.ª Edição.  Quetzal. 2012., p. 18

Kulturpessimismus

 novo realismo estoico

monoteísmo

 «(...), isto é, a concepção de um deus único, invisível, inconcebível, todo-poderoso e inalcançável à compreensão e até à imaginação humana. O deus mosaico veio substituir aquele politeísmo de deuses e deusas acessíveis à multiplicidade humana, com os quais a diversidade existente de homens e mulheres poderia acomodar-se e sobreviver.»


Mario Vargas Llosa. A civilização do Espectáculo. Tradução de Cristina Rodriguez e Artur Guerra. 2.ª Edição.  Quetzal. 2012, p. 17.

 « O que quer dizer civilização do espectáculo? A de um mundo onde o primeiro lugar na tabela de valores vigente é ocupado pelo entretenimento e onde divertir-se, fugir ao aborrecimento, é a paixão universal. Este ideal de vida é perfeitamente legítimo, sem dúvida. Só um puritano fanático poderá censurar os membros de uma sociedade que queira dar consolo, descontração, humor e diversão a umas vidas geralmente enquadradas em rotinas deprimentes e às vezes embrutecedoras. Mas converter essa propensão natural para passar uns bons momentos num valor supremo tem consequências inesperadas »


Mario Vargas Llosa. A civilização do Espectáculo. Tradução de Cristina Rodriguez e Artur Guerra. 2.ª Edição.  Quetzal. 2012.  


 

inapetência

sexta-feira, 24 de março de 2023

"Se não disseres nada, compreenderei melhor. [...] Há ocasiões em que as palavras não servem de nada".

José Saramago

quinta-feira, 23 de março de 2023

« A gente só sentencia»

José Afonso. Textos e Canções. Organização Elfriede Engelmayer. 3ª edição revista. Relógio D'Água Editores, Outubro de 2000., p. 115

desvario



«Por ti lutei sem saber por que lutava
Culpava-me de tanta fome tanta mágoa
na palavra me encosto sem saber a que me encosto»

(...)

José Afonso. Textos e Canções. Organização Elfriede Engelmayer. 3ª edição revista. Relógio D'Água Editores, Outubro de 2000., p. 113

«Confiemos nos homens essas mudas

vítimas do degelo Universal mas sempre vivos.»


José Afonso. Textos e Canções. Organização Elfriede Engelmayer. 3ª edição revista. Relógio D'Água Editores, Outubro de 2000., p. 113

INSISTO NÃO SER TRISTEZA



Insisto não ser tristeza
Soluçar sobre uma mesa

E mais não ser deste mundo
Meter navios no fundo

Num caminho de esqueletos
Sempre se plantam gravetos

E se a velhice for tua
Senta-a no meio da rua.


José Afonso. Textos e Canções. Organização Elfriede Engelmayer. 3ª edição revista. Relógio D'Água Editores, Outubro de 2000., p. 112


 

The Black Keys - Lonely Boy

ÁSPRO ÁSPERO ROMANCEIRO



Áspro áspero romanceiro
voltado para Meca ou Miragaia
serva da verve fútil
desta província domingueira.
Quero-te muda
bem despojada de limos mas assumida.
Quero-te vendada vendida
para que ao menos te sirva de remédio
a nossa obscura forma de ser tédio.

José Afonso. Textos e Canções. Organização Elfriede Engelmayer. 3ª edição revista. Relógio D'Água Editores, Outubro de 2000., p. 111 

 «Existe uma caverna íntima

na total escuridade do sangue.»


José Afonso. Textos e Canções. Organização Elfriede Engelmayer. 3ª edição revista. Relógio D'Água Editores, Outubro de 2000., p. 109

terça-feira, 21 de março de 2023

''canoas de veludo''

Hélia Correia. Acidentes. Relógio D'Água, novembro, 2020., p. 61

« essa , a abandonada, a que, por vezes,
é percorrida pelo arrepio,
pela frialdade da separação,
a que enlouquece na procura,
a nua, a que perdeu,
a que não sabe segurar-se e oscila,
fora do equilíbrio, decepada,
em si mesma contida, única, pobre,
sobrevivente das primeiras coisas,

ela, a deixada para sempre só,
a que corre nos charcos, em demanda
da pertença maior, a que estremece,
atravessada pelos elementps,
a água, o fogo, o vento, até as pedras,
ela que é fácil de dilacerar,
fácil de espezinhar, uma ligeira 
superfície dançante,
cheia de morte, ornamentada pela morte
com dourados objectos musicais,»


Hélia Correia. Acidentes. Relógio D'Água, novembro, 2020., p. 55/6


Dentro de mim
Inside me, 2000

 Helena-Almeida


 « a que não pára de sangrar,

como também sangram ainda as rochas,»


Hélia Correia. Acidentes. Relógio D'Água, novembro, 2020., p. 55

'' os politicamente corrigidos''

Hélia Correia. Acidentes. Relógio D'Água, novembro, 2020., p. 48

 “É preciso diminuir a distância entre o que se diz e o que se faz, até que, num dado momento, a tua fala seja a tua prática. “ 

 Paulo Freire

'' Dance, dance, otherwise we´re lost''

« (...) E não lhe chamo
nem cabra nem cadela, esses abusos
vocabulares das imprecações.»

Hélia Correia. Acidentes. Relógio D'Água, novembro, 2020., p. 47

Marianna e Chamilly



Quando partires
se partires
terei saudades
e quando ficares
se ficares
terei saudades

Terei
sempre saudades
e gosto assim

Adília Lopes, in 'Caderno'

Canção de primavera

 

Eu, dar flor, já não dou. Mas vós, ó flores,

Pois que Maio chegou,
Revesti-o de clâmides de cores!
Que eu, dar, flor, já não dou.

Eu, cantar, já não canto. Mas vós, aves,
Acordai desse azul, calado há tanto,
As infinitas naves!
Que eu, cantar, já não canto.

Eu, invernos e outonos recalcados
Regelaram meu ser neste arrepio...
Aquece tu, ó sol, jardins e prados!
Que eu, é de mim o frio.

Eu, Maio, já não tenho. Mas tu, Maio,
Vem com tua paixão,
Prostrar a terra em cálido desmaio!
Que eu, ter Maio, já não.

Que eu, dar flor, já não dou; cantar, não canto;
Ter sol, não tenho; e amar...
Mas, se não amo,
Como é que, Maio em flor, te chamo tanto,
E não por mim assim te chamo?

domingo, 19 de março de 2023

Margot Fonteyn


 

Nobody but You

«Quando a tristeza me cravar as unhas, hei-de sacudi-la.»

Camilo Castelo Branco. O Retrato de ricardina. Publicações Europa América., p. 88

 « - Não sei qual das mortes é mais suave, se a da pólvora quente se a da água fria...»

Camilo Castelo Branco. O Retrato de ricardina. Publicações Europa América., p. 86

 

neste comenos
neste instante, entretanto

«(...) tentou-lhe o espírito com as belezas da linguagem e da fantasia»

Camilo Castelo Branco. O Retrato de ricardina. Publicações Europa América., p. 74

ensoberbecer-se

 




 

 (Tu descias amor uma alameda)


José Afonso. Textos e Canções. Organização Elfriede Engelmayer. 3ª edição revista. Relógio D'Água Editores, Outubro de 2000., p. 102

«Cria-se a morte no teu leite aberto.»

José Afonso. Textos e Canções. Organização Elfriede Engelmayer. 3ª edição revista. Relógio D'Água Editores, Outubro de 2000., p. 97

« Hoje não saio. Sinto-me perdido.»

José Afonso. Textos e Canções. Organização Elfriede Engelmayer. 3ª edição revista. Relógio D'Água Editores, Outubro de 2000., p. 93

«O país conhece a autópsia do dia.»

José Afonso. Textos e Canções. Organização Elfriede Engelmayer. 3ª edição revista. Relógio D'Água Editores, Outubro de 2000., p. 93


 

 «Levanta-se o vento

Levanta-se a mágoa.»


José Afonso. Textos e Canções. Organização Elfriede Engelmayer. 3ª edição revista. Relógio D'Água Editores, Outubro de 2000., p. 92
«Rasgas um véu de carne
à tua frente
para poderes ver quem te oprime.»

José Afonso. Textos e Canções. Organização Elfriede Engelmayer. 3ª edição revista. Relógio D'Água Editores, Outubro de 2000., p. 88


«Cantaria a toutinegra
Se o fumo não a matara
E a rola não acabara
Como no ano passado»

 
José Afonso. Textos e Canções. Organização Elfriede Engelmayer. 3ª edição revista. Relógio D'Água Editores, Outubro de 2000., p. 87

«E tu silêncio, sempre vinhas.»

José Afonso. Textos e Canções. Organização Elfriede Engelmayer. 3ª edição revista. Relógio D'Água Editores, Outubro de 2000., p.83

''seareiros da fome''

José Afonso. Textos e Canções. Organização Elfriede Engelmayer. 3ª edição revista. Relógio D'Água Editores, Outubro de 2000., p. 79



« Se guardião-centauro de crespas unhas
Pronto ao disparo da saliva
Em vez de balas.»

José Afonso. Textos e Canções. Organização Elfriede Engelmayer. 3ª edição revista. Relógio D'Água Editores, Outubro de 2000., p. 78

sexta-feira, 17 de março de 2023

 (...)

«Se. se quiser enlouquecer, já que é

necessário um final,

que veja como

se enlouquece melhor quando se cai,

quando nós nos tornamos

o despojo.»


Hélia Correia. Acidentes. Relógio D'Água, novembro, 2020., p. 39

quarta-feira, 15 de março de 2023


                                                                                                 Anne Brigman
 



Entre os martelos subsiste o coração

Rainer Maria Rilke
Elegias de Duíno

 II

Ó pequena Cleis, emudeceu
a tua mãe e puxa-te para dentro
com brusquidão porque a visão do fogo
e os gritos, e as corridas dessa gente 
sempre enlutada, sempre envelhecida
dentro dos panos negros, tudo aquilo
que irrompe pela noite deve ser
escondido das crianças, sobretudo
dessas crianças louras que tão raras
são nas ilhas do Leste.
Emudeceu a tua mãe. Esqueceu-se, aliás,
há muito de si mesma,
da nudez
e da glória dos seus versos,
das celebrações altas,
dos bons usos
da hospitalidade que também
continha a sua carga de erotismo,
sendo tudo um encontro, havendo em tudo
aquilo que gera e aquilo que devora.
E, enquanto os astros, como doces frutos,
se atiravam do céu para o horizonte,
para os recém-chegados acendiam-se
os fogos olorosos.
E o vinho, e a saliva, e as histórias
de antigos reis e venhas crueldades,
iam cobrindo a pele dos forasteiros
como a língua da mãe percorre as crias.

III

Ó, pequena Cleis, os forasteiros
causam-te susto, agora, e pouco falta
para que os apedrejem e os atirem 
de novo para o mar.
Pois ficou suja,
ficou cheia, a ilha,
e como que deserta do seu espírito,
correm nela miasmas como quando
o desfavor dos deuses se exercia
e tudo se tornava feio e vil.
Não te debruces, Cleis, na varanda
que deita sobre a praça, sobre a linha
dourada do pinhal.
Nem te levantarei eu mais, criança,
nos braços estendidos, como alguém
que, grato, te mostrasse à natureza.
Pois, Cleis, não existe natureza
nem existe cidade.
Só os troncos
diamantinos de Eressos,
indiferentes, duros,
permanecem.


Hélia Correia. Acidentes. Relógio D'Água, novembro, 2020., p. 34/5

terça-feira, 14 de março de 2023

« Se nos matarem, não será por fome,»

Hélia Correia. Acidentes. Relógio D'Água, novembro, 2020., p. 15



«assinalámos certas armadilhas,
certos abatimentos da beleza,»

Hélia Correia. Acidentes. Relógio D'Água, novembro, 2020., p. 11


« como crianças, vemos os detalhes
sem suspeitarmos do que neles se oculta,»

Hélia Correia. Acidentes. Relógio D'Água, novembro, 2020., p. 10

domingo, 12 de março de 2023


Anne Brigman

 



«(...)

sendo eu menos do que um bicho
com fome:
sendo a fome.»

Hélia Correia. Acidentes. Relógio D'Água, novembro, 2020., p. 9

ESMOLA

 I

Lançai-me uma palavra, como alguns
atiram côdea aos cães.
Uma palavra
que, embrulhada nesse cuspo
que vos escorre pelos queixos,
brilha
e desconcerta a própria
repugnância.
Sacudi-a de vós, tal como alguém
sacode a lama seca do sapato
sem perceber sequer que lama é
porque não tira os pés
do alcatrão.
Essa palavra abandonada à porta,
eu a recolherei, como se houvesse
nela um pedido,
a súplica de um órfão,
de uma cria deixada para
morrer.
Eu pegarei nessa palavra ao colo
e, não sabendo onde encontrar abrigo
nem alimento,
dormirei com ela,
ouvindo-a murmurar,
enquanto os bosques
vão crepitando e a cinza
nos recobre.

Hélia Correia. Acidentes. Relógio D'Água, novembro, 2020., p. 7

´´pontapés semi-suportáveis''

 «as aves não cantam quando o céu está em luto»

Camilo Castelo Branco. O Retrato de ricardina. Publicações Europa América., p. 61

«(...) a sua fé não é senão cobardia, medo de sofrer.»

Camilo Castelo Branco. O Retrato de ricardina. Publicações Europa América., p. 56

                                                                  Dorothy Wilding


 

«A mim não me conta os segredos da sua alma.»

Camilo Castelo Branco. O Retrato de ricardina. Publicações Europa América., p. 52

''o mal possível prevê-se e remedeia-se''

Camilo Castelo Branco. O Retrato de ricardina. Publicações Europa América., p. 45

 « (...) Os Mortos não envergonham os vivos...

- Despedaçam-nos com saudades - atalhou D. Clementina.

-Quando os vivos têm poucos brios.»


Camilo Castelo Branco. O Retrato de ricardina. Publicações Europa América., p. 45

«(...) seria preciso que ela já não tivesse luz nos olhos, nem coração para mais esta dor.»

Camilo Castelo Branco. O Retrato de ricardina. Publicações Europa América., p. 43

«(...), a felicidade alcançam-na os que mais sacrificam as suas inclinações. Verás como tudo esquece, tudo de desfaz, menos o remorso de uma ação condenada primeiro pela sociedade e depois pela consciência...»

Camilo Castelo Branco. O Retrato de ricardina. Publicações Europa América., p. 37

''olhos orvalhados''

Camilo Castelo Branco. O Retrato de ricardina. Publicações Europa América., p. 36

Lisa Lerkenfeldt - Glass Braid

Gerda Taro. The Girl with the Leica

 


'' queria morrer, amando-o''

Camilo Castelo Branco. O Retrato de ricardina. Publicações Europa América., p. 34

« A lei encolhia-se de medo;»

Camilo Castelo Branco. O Retrato de ricardina. Publicações Europa América., p. 34

''olhos indulgentes''

Camilo Castelo Branco. O Retrato de ricardina. Publicações Europa América., p. 31

« Como nasce o amor? Apenas sabemos como ele morre.»

Camilo Castelo Branco. O Retrato de ricardina. Publicações Europa América., p. 31

 


adjetivo
tolonéscioestúpidodisparatado

 “A minha mãe foi o meu primeiro país. O primeiro lugar em que vivi.” 

Nayyairah Waheed 

«Há homens que apodrecem aos rebanhos»

José Afonso. Textos e Canções. Organização Elfriede Engelmayer. 3ª edição revista. Relógio D'Água Editores, Outubro de 2000., p. 76


 

«Barata minha barata

Não me deixes à deriva»

José Afonso. Textos e Canções. Organização Elfriede Engelmayer. 3ª edição revista. Relógio D'Água Editores, Outubro de 2000., p. 75

«Que dizer do meu inferno?»

José Afonso. Textos e Canções. Organização Elfriede Engelmayer. 3ª edição revista. Relógio D'Água Editores, Outubro de 2000., p. 74

SEM MANEJOS DE TROPOS FERRAMENTAS

Sem manejos de tropos ferramentas
Morremos à míngua de vitórias 
Um rio sem memória e eis-nos mortos
Sem léxico. Sem poema. Dor apenas
Pairam as águas na maré vazia
E nem um gesto de ave se ouve ao longe
Há ainda labor mas ao perdê-las
É como se fugissem as estrelas



Escrito na prisão de Caxias.


José Afonso. Textos e Canções. Organização Elfriede Engelmayer. 3ª edição revista. Relógio D'Água Editores, Outubro de 2000., p. 73

«Quisera ser rio ou ave»

José Afonso. Textos e Canções. Organização Elfriede Engelmayer. 3ª edição revista. Relógio D'Água Editores, Outubro de 2000., p. 64


 

 


nome feminino
regionalismo coloquial discurso com que se tenta convencer, cativar ou enganarlábiapaleio

 «Mais vale um bom desengano

Que andar enganado sempre»


José Afonso. Textos e Canções. Organização Elfriede Engelmayer. 3ª edição revista. Relógio D'Água Editores, Outubro de 2000., p. 48
«Menina triste
Venha p´rà neve
Que o vente leve
O teu sonho triste»

José Afonso. Textos e Canções. Organização Elfriede Engelmayer. 3ª edição revista. Relógio D'Água Editores, Outubro de 2000., p. 46

sábado, 11 de março de 2023

SOPRA O SONHO

Sopra o sonho por dentro
Das pálpebras em viagem
Enceta o curso habitual nocturno
Num corredor sombrio de pestanas

Antes porém cumprimenta
Toda a matéria viva em que tropeça
Sabe o segredo do corpo tem uma pátria
Bioquímica extremamente embrionária

A morte já habita os seus tecidos
Quando os outros de guarda se abastecem
Pronta ao assalto das células 
Como se dormisse

A que fins se destina e a que estranhos
bulícios suas últimas vontades?

Não o sabemos

Só mesmo o oceano o incomoda


José Afonso. Textos e Canções. Organização Elfriede Engelmayer. 3ª edição revista. Relógio D'Água Editores, Outubro de 2000., p. 43


Jeanne Dielman in the bath, her skin matching the color of the walls.  Jeanne Dielman, 23 Commerce Quay, 1080 Bruxelles (Chantal Akerman, 1975)

 

«FUI AO ENTERRO DE UM LEÃO»

José Afonso. Textos e Canções. Organização Elfriede Engelmayer. 3ª edição revista. Relógio D'Água Editores, Outubro de 2000., p. 42

 «Se às vezes me pedem contas

Não tenho contas a dar.»


José Afonso. Textos e Canções. Organização Elfriede Engelmayer. 3ª edição revista. Relógio D'Água Editores, Outubro de 2000., p. 39

''Sem pedais para a morte''

José Afonso. Textos e Canções. Organização Elfriede Engelmayer. 3ª edição revista. Relógio D'Água Editores, Outubro de 2000., p. 33

 XIII

Marujar movediço

nas represas,

é poeira de milhos

e sol de palha acesa


p'ròs meus olhos vazios

de tristeza.


José Afonso. Textos e Canções. Organização Elfriede Engelmayer. 3ª edição revista. Relógio D'Água Editores, Outubro de 2000., p. 32

 

XI

Menino de calção

que vais correndo!

- Deixa o rio

que os peixes vão morrendo!


José Afonso. Textos e Canções. Organização Elfriede Engelmayer. 3ª edição revista. Relógio D'Água Editores, Outubro de 2000., p. 31

 «Nada perturba o silêncio posto nas tuas pálpebras.»

José Afonso. Textos e Canções. Organização Elfriede Engelmayer. 3ª edição revista. Relógio D'Água Editores, Outubro de 2000., p. 26

 


nome feminino
designação dos pequenos fragmentos ou do pó que se desprende de um corpo metálico quando se raspa com uma lima
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