segunda-feira, 31 de dezembro de 2012
Kublai
Pensou: «Se todas as cidades forem como um jogo de xadrez, no dia em que eu chegar a conhecer as suas regras possuirei finalmente o meu império, mesmo que nunca consiga conhecer todas as cidades que contém.»
Italo Calvino. As Cidades Invisíveis.Tradução de José Colaço Barreiros.Editorial Teorema, Lisboa, 1990., p. 123
domingo, 30 de dezembro de 2012
brocado
nome masculino
tecido de seda com motivos em relevo, de fio de prata ou ouro
(Do italiano broccato, «fazenda bordada»)
'' a forma das coisas distingue-se melhor com a distância.»
Italo Calvino. As Cidades Invisíveis.Tradução de José Colaço Barreiros.Editorial Teorema, Lisboa, 1990., p. 102
«Uma vendedeira de hortaliças pesava uma couve na balança e punha-a num cesto pendurado numa corda que uma rapariga deitara de uma varanda. A rapariga era igual a uma da minha terra que enlouquecera por amor e se matara. A vendedeira levantou a cabeça: era a minha avó.»
Italo Calvino. As Cidades Invisíveis.Tradução de José Colaço Barreiros.Editorial Teorema, Lisboa, 1990., p. 97
funâmbulo
nome masculino
1. equilibrista que anda ou dança em corda bamba
2. figurado o que muda de opinião ou partido; indivíduo inconstante
3. ZOOLOGIA espécie de esquilo indiano
(Do latim funambŭlu-, «funâmbulo»)
«-As imagens da memória, depois de fixadas com as palavras, apagam-se - disse Polo. - Talvez eu tenha medo de perder Veneza toda de uma vez, se falar dela.Ou talvez, ao falar de outras cidades, já venha a perdê-la pouco a pouco.»
Italo Calvino. As Cidades Invisíveis.Tradução de José Colaço Barreiros.Editorial Teorema, Lisboa, 1990., p. 90
motejo
nome masculino
1. acto ou efeito de motejar; zombaria, troça
2. dito picante ou jocoso; dichote
(Derivação regressiva de motejar, ou do castelhano motejo, «idem»)
1. acto ou efeito de motejar; zombaria, troça
2. dito picante ou jocoso; dichote
(Derivação regressiva de motejar, ou do castelhano motejo, «idem»)
«Ora muitos anos de abundância tinham atulhado os celeiros. Os rios em cheia arrastaram florestas de traves destinadas a suster tectos de bronze de templos e palácios. Caravanas de escravos deslocaram montanhas de mármore serpentino através do continente. O Grão Kan contempla um império recoberto de cidades que têm peso sobre a terra e sobre os homens, a abarrotar de riquezas e de movimento, repleto de ornamentos e de incumbências, complicado de mecanismos e de hierarquias, inchado, largo, pesado.
«É o seu próprio peso que está a esmagar o império», pensa Kublai, e nos seus sonhos ora surgem cidades leves como papagaios de papel, cidades perfuradas como rendas, cidades transparentes como mosquiteiros, cidades nervuras de folhas, cidades linhas da mão, cidades filigrana para ver através da sua opaca e fictícia espessura.»
Italo Calvino. As Cidades Invisíveis.Tradução de José Colaço Barreiros.Editorial Teorema, Lisboa, 1990., p. 75
«Quando o ar sobre as túlipas é doce,
sou eu», disse Deus.
«Quando o peixe dourado
pede ao lago que se anime
para uma serenata,
sou eu.
Quando o vento do estio adormece sob as pedras
e explode no fundo das antigas torres
arrastando consigo a cabeça das estátuas,
sou eu.
Quando o verbo todo o poderoso
larga os seus lobos, que somam dez mil,
nos oásis, nas florestas, na escuma das vagas,
sou eu.
Quando a dúvida,
como escura ferrugem,
rói a estrela
até ao fim do esqueleto,
eu não sei
se sois vós
se sou eu, se é um outro deus.»
Alain Bosquet. O Tormento de Deus. Tradução de Jorge Guimarães. Quetzal Editores, Lisboa, 1992., p. 30
sou eu», disse Deus.
«Quando o peixe dourado
pede ao lago que se anime
para uma serenata,
sou eu.
Quando o vento do estio adormece sob as pedras
e explode no fundo das antigas torres
arrastando consigo a cabeça das estátuas,
sou eu.
Quando o verbo todo o poderoso
larga os seus lobos, que somam dez mil,
nos oásis, nas florestas, na escuma das vagas,
sou eu.
Quando a dúvida,
como escura ferrugem,
rói a estrela
até ao fim do esqueleto,
eu não sei
se sois vós
se sou eu, se é um outro deus.»
Alain Bosquet. O Tormento de Deus. Tradução de Jorge Guimarães. Quetzal Editores, Lisboa, 1992., p. 30
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«Deixem-me só
na minha dificuldade: evoluo dia e noite
condeno-me à metamorfose.»
Alain Bosquet. O Tormento de Deus. Tradução de Jorge Guimarães. Quetzal Editores, Lisboa, 1992., p. 24
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Deus disse
«Quero ser um fardo a todo o incréu.»
Alain Bosquet. O Tormento de Deus. Tradução de Jorge Guimarães. Quetzal Editores, Lisboa, 1992., p. 22
«Quero ser um fardo a todo o incréu.»
Alain Bosquet. O Tormento de Deus. Tradução de Jorge Guimarães. Quetzal Editores, Lisboa, 1992., p. 22
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versos soltos
«Estou triste», disse Deus,
«por ter nascido adulto.
Jamais tive uma infância
nem alguma vez me permitiram
a descoberta de um mundo
já formado.
Não encontrei ninguém
a quem dizer: 'Bom dia, meu pai',
nem 'Minha mãe, como é que tem passado?'
Não me sinto sem culpa.
Todos eles - o silex, a lava, a peónia,
o mosquito, o homem, o zéfiro,
exigiam que eu fosse activo e responsável.
Estou triste:
falta-me um passado.»
Alain Bosquet. O Tormento de Deus. Tradução de Jorge Guimarães. Quetzal Editores, Lisboa, 1992., p. 14
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La Belle Dame Sans Merci
Ah, what can ail thee, wretched wight,
Alone and palely loitering;
The sedge is wither'd from the lake,
And no birds sing.
Ah, what can ail thee, wretched wight,
So haggard and so woe-begone?
The squirrel's granary is full,
And the harvest's done.
I see a lily on thy brow,
With anguish moist and fever dew;
And on thy cheek a fading rose
Fast withereth too.
I met a lady in the meads
Full beautiful, a faery's child;
Her hair was long, her foot was light,
And her eyes were wild.
I set her on my pacing steed,
And nothing else saw all day long;
For sideways would she lean, and sing
A faery's song.
I made a garland for her head,
And bracelets too, and fragrant zone;
She look'd at me as she did love,
And made sweet moan.
She found me roots of relish sweet,
And honey wild, and manna dew;
And sure in language strange she said,
I love thee true.
She took me to her elfin grot,
And there she gaz'd and sighed deep,
And there I shut her wild sad eyes—
So kiss'd to sleep.
And there we slumber'd on the moss,
And there I dream'd, ah woe betide,
The latest dream I ever dream'd
On the cold hill side.
I saw pale kings, and princes too,
Pale warriors, death-pale were they all;
Who cry'd — "La belle Dame sans merci
Hath thee in thrall!"
I saw their starv'd lips in the gloam
With horrid warning gaped wide,
And I awoke, and found me here
On the cold hill side.
And this is why I sojourn here
Alone and palely loitering,
Though the sedge is wither'd from the lake,
And no birds sing.
La Belle Dame Sans Merci / Valentin Silvestrov: Silent Songs
«Prometo-vos corrigir,
assim que eu possa, tantos erros.»
Alain Bosquet. O Tormento de Deus. Tradução de Jorge Guimarães. Quetzal Editores, Lisboa, 1992., p. 13
assim que eu possa, tantos erros.»
Alain Bosquet. O Tormento de Deus. Tradução de Jorge Guimarães. Quetzal Editores, Lisboa, 1992., p. 13
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«Porque te deténs com melancolias inessenciais?»
Italo Calvino. As Cidades Invisíveis.Tradução de José Colaço Barreiros.Editorial Teorema, Lisboa, 1990., p. 62
sábado, 29 de dezembro de 2012
«Cada distância tem o seu silêncio»
Antonio Gamoneda. Descrição da Mentira. Tradução de Vasco Gato. Edições Quasi, 2003., p. 43
armistício
armistício
armistício In Infopédia [Em linha]. Porto: Porto Editora, 2003-2012. [Consult. 2012-12-29].
Disponível na www:http://www.infopedia.pt/pesquisa-global/armist%C3%ADcio
nome masculino
cessação das hostilidades por comum acordo dos beligerantes por um prazo determinado, a partir de certo dia e hora; trégua ou suspensão de hostilidades |
(Do latim diplomático armistitĭu-, «deposição das armas»)
armistício In Infopédia [Em linha]. Porto: Porto Editora, 2003-2012. [Consult. 2012-12-29].
Disponível na www:
armistício
armistício In Infopédia [Em linha]. Porto: Porto Editora, 2003-2012. [Consult. 2012-12-29].
Disponível na www:http://www.infopedia.pt/pesquisa-global/armist%C3%ADcio
nome masculino
nome masculino
cessação das hostilidades por comum acordo dos beligerantes por um prazo determinado, a partir de certo dia e hora; trégua ou suspensão de hostilidades |
(Do latim diplomático armistitĭu-, «deposição das armas
armistício In Infopédia [Em linha]. Porto: Porto Editora, 2003-2012. [Consult. 2012-12-29].
Disponível na www:
cessação das hostilidades por comum acordo dos beligerantes por um prazo determinado, a partir de certo dia e hora; trégua ou suspensão de hostilidades
(Do latim diplomático armistitĭu-, «deposição das armas»)
terça-feira, 25 de dezembro de 2012
terça-feira, 18 de dezembro de 2012
''(...), viúva expulsa dos teus lençóis.''
Antonio Gamoneda. Descrição da Mentira. Tradução de Vasco Gato. Edições Quasi, 2003., p. 34
''Aquilo que aconteceu não é mais que destruição.''
Antonio Gamoneda. Descrição da Mentira. Tradução de Vasco Gato. Edições Quasi, 2003., p. 30
segunda-feira, 17 de dezembro de 2012
Adão e Eva
Olhámo-nos um dia,
E cada um de nós sonhou que achara
O par que a alma e a cara lhe pedia.
- E cada um de nós sonhou que o achara...
E entre nós dois
Se deu, depois, o caso da maçã e da serpente,
... Se deu, e se dará continuamente:
Na palma da tua mão,
Me ofertaste, e eu mordi, o fruto do pecado.
- Meu nome é Adão...
E em que furor sagrado
Os nossos corpos nus e desejosos
Como serpentes brancas se enroscaram,
Tentando ser um só!
Ó beijos angustiados e raivosos
Que as nossas pobres bocas se atiraram
Sobre um leito de terra, cinza e pó!
Ó abraços que os braços apertaram,
Dedos que se misturaram!
Ó ânsia que sofreste, ó ânsia que sofri,
Sede que nada mata, ânsia sem fim!
- Tu de entrar em mim,
Eu de entrar em ti.
Assim toda te deste,
E assim todo me dei:
Sobre o teu longo corpo agonizante,
Meu inferno celeste,
Cem vezes morri, prostrado...
Cem vezes ressuscitei
Para uma dor mais vibrante
E um prazer mais torturado.
E enquanto as nossas bocas se esmagavam,
E as doces curvas do teu corpo se ajustavam
Às linhas fortes do meu,
Os nossos olhos muito perto, imensos,
No desespero desse abraço mudo,
Confessaram-se tudo!
... Enquanto nós pairávamos, suspensos
Entre a terra e o céu.
Assim as almas se entregaram,
Como os corpos se tinham entregado,
Assim duas metades se amoldaram
Ante as barbas, que tremeram,
Do velho Pai desprezado!
E assim Eva e Adão se conheceram:
Tu conheceste a força dos meus pulsos,
A miséria do meu ser,
Os recantos da minha humanidade,
A grandeza do meu amor cruel,
Os veios de oiro que o meu barro trouxe...
Eu, os teus nervos convulsos,
O teu poder,
A tua fragilidade
Os sinais da tua pele,
O gosto do teu sangue doce...
Depois...
Depois o quê, amor? Depois, mais nada,
- Que Jeová não sabe perdoar!
O Arcanjo entre nós dois abrira a longa espada...
Continuamos a ser dois,
E nunca nos pudemos penetrar!
E cada um de nós sonhou que achara
O par que a alma e a cara lhe pedia.
- E cada um de nós sonhou que o achara...
E entre nós dois
Se deu, depois, o caso da maçã e da serpente,
... Se deu, e se dará continuamente:
Na palma da tua mão,
Me ofertaste, e eu mordi, o fruto do pecado.
- Meu nome é Adão...
E em que furor sagrado
Os nossos corpos nus e desejosos
Como serpentes brancas se enroscaram,
Tentando ser um só!
Ó beijos angustiados e raivosos
Que as nossas pobres bocas se atiraram
Sobre um leito de terra, cinza e pó!
Ó abraços que os braços apertaram,
Dedos que se misturaram!
Ó ânsia que sofreste, ó ânsia que sofri,
Sede que nada mata, ânsia sem fim!
- Tu de entrar em mim,
Eu de entrar em ti.
Assim toda te deste,
E assim todo me dei:
Sobre o teu longo corpo agonizante,
Meu inferno celeste,
Cem vezes morri, prostrado...
Cem vezes ressuscitei
Para uma dor mais vibrante
E um prazer mais torturado.
E enquanto as nossas bocas se esmagavam,
E as doces curvas do teu corpo se ajustavam
Às linhas fortes do meu,
Os nossos olhos muito perto, imensos,
No desespero desse abraço mudo,
Confessaram-se tudo!
... Enquanto nós pairávamos, suspensos
Entre a terra e o céu.
Assim as almas se entregaram,
Como os corpos se tinham entregado,
Assim duas metades se amoldaram
Ante as barbas, que tremeram,
Do velho Pai desprezado!
E assim Eva e Adão se conheceram:
Tu conheceste a força dos meus pulsos,
A miséria do meu ser,
Os recantos da minha humanidade,
A grandeza do meu amor cruel,
Os veios de oiro que o meu barro trouxe...
Eu, os teus nervos convulsos,
O teu poder,
A tua fragilidade
Os sinais da tua pele,
O gosto do teu sangue doce...
Depois...
Depois o quê, amor? Depois, mais nada,
- Que Jeová não sabe perdoar!
O Arcanjo entre nós dois abrira a longa espada...
Continuamos a ser dois,
E nunca nos pudemos penetrar!
José Régio
O vinho...
«O vinho dá-nos o conhecimento dos estados de alma. Tomamos conhecimento de tudo e de nada, ao mesmo tempo. O vinho confere novo brilho à cortesia. Se fores apreciador de vinho és também apreciador de mulheres e um defensor daquilo que lhes é caro. As relações entre homem e mulher, mesmo as mais complexas, revelam-se com toda a simplicidade, desabrochando de dentro de um copo de vinho como se fossem flores. Todas as canções dedicadas ao vinho devem ser reconhecidas como legítimas.»
Robert Walser. O Salteador. Tradução de Leopoldina Almeida. Relógio D' Água, Lisboa, 2003., p. 24
«Muitas pessoas que se mostram arrogantes sofrem de falta de coragem, muitas que são orgulhosas sofrem de falta de orgulho e muitas, ainda, que são fracas, não possuem força de ânimo para reconhecer a sua fraqueza. Muitas vezes os fracos comportam-se como fortes, os despeitados como satisfeitos, os humilhados como orgulhosos, os vaidosos como modestos; é o que acontece comigo, por exemplo, que nunca me vejo ao espelho, e isso apenas por vaidade, posto que o espelho é para mim insolente e malcriado.»
Robert Walser. O Salteador. Tradução de Leopoldina Almeida. Relógio D' Água, Lisboa, 2003., p. 14
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