sábado, 11 de março de 2023
quinta-feira, 9 de março de 2023
''o cabaz dos pêssegos''
Camilo Castelo Branco. O Retrato de ricardina. Publicações Europa América., p. 30
« de rópia e chulice»
Camilo Castelo Branco. O Retrato de ricardina. Publicações Europa América., p. 18
quarta-feira, 8 de março de 2023
Com licença poética
Quando nasci um anjo esbelto,
desses que tocam trombeta, anunciou:
vai carregar bandeira.
Cargo muito pesado pra mulher,
esta espécie ainda envergonhada.
Aceito os subterfúgios que me cabem,
sem precisar mentir.
Não sou tão feia que não possa casar,
acho o Rio de Janeiro uma beleza e
ora sim, ora não, creio em parto sem dor.
Mas o que sinto escrevo. Cumpro a sina.
Inauguro linhagens, fundo reinos
-- dor não é amargura.
Minha tristeza não tem pedigree,
já a minha vontade de alegria,
sua raiz vai ao meu mil avô.
Vai ser coxo na vida é maldição pra homem.
Mulher é desdobrável. Eu sou.
« Ah, que a mulher dê sempre a impressão de que se fechar os olhos
Ao abri-los ela não estará mais presente
Com seu sorriso e suas tramas. Que ela surja, não venha; parta, não vá
E que possua uma certa capacidade de emudecer subitamente e nos
fazer beber
O fel da dúvida. Oh, sobretudo
Que ela não perca nunca, não importa em que mundo
Não importa em que circunstâncias, a sua infinita volubilidade
De pássaro; e que acariciada no fundo de si mesma
Transforme-se em fera sem perder sua graça de ave»
Vinicius de Moraes
domingo, 5 de março de 2023
''repugnâncias do sangue''
Camilo Castelo Branco. O Retrato de ricardina. Publicações Europa América., p. 12
«Toda a obra literária é assim feita de um misto de visão, lembrança e acto, de noções e de informações recebidas, no decorrer de uma vida, através da palavra ou dos livros, e de resquícios da nossa própria existência.»
Marguerite Yourcenar. Posfácios. Posfácio. Um Homem Obscuro. 3ª Edição. Tradução de Luiza Neto Jorge. Difel., p. 222''a inalterável fidelidade do coração''
Marguerite Yourcenar. Posfácios. Como a água que corre. Um Homem Obscuro. 3ª Edição. Tradução de Luiza Neto Jorge. Difel., p. 214
''passiva por sageza e não por fraqueza''
Marguerite Yourcenar. Posfácios. Como a água que corre. Um Homem Obscuro. 3ª Edição. Tradução de Luiza Neto Jorge. Difel., p. 208
''inconsolável luto''
Marguerite Yourcenar. Posfácios. Como a água que corre. Um Homem Obscuro. 3ª Edição. Tradução de Luiza Neto Jorge. Difel., p. 208
''Virgens -das-Sete-Espadas''
Marguerite Yourcenar. Posfácios. Como a água que corre. Um Homem Obscuro. 3ª Edição. Tradução de Luiza Neto Jorge. Difel., p. 207
sábado, 4 de março de 2023
Quanto Mais Amada Mais Desisto
e quanto mais amada mais desisto:
quanto mais tu me despes mais me cubro
e quanto mais me escondo mais me avisto.
E sei que mais te enleio e te deslumbro
porque se mais me ofusco mais existo.
Por dentro me ilumino, sol oculto,
por fora te ajoelho, corpo místico.
Não me acordes. Estou morta na quermesse
dos teus beijos. Etérea, a minha espécie
nem teus zelos amantes a demovem.
Mas quanto mais em nuvem me desfaço
mais de terra e de fogo é o abraço
com que na carne queres reter-me jovem.
Natália Correia, in "O Dilúvio e a Pomba"
Cântico do País Emerso
Os inocentes que têm pressa de voar
Os revoltados fazem de conta fazem de conta...
Os revoltantes fazem as contas de somar.
Embebo-me na solidão como uma esponja
Por becos que me conduzem a hospitais.
O medo é um tenente que faz a ronda
E a ronda abre sepulcros fecha portais;
Os edifícios são malefícios da conjura
Municipal de um desalento e de uma Porta.
Salvo a ranhura para sair o funeral
Não há inquilinos nos edifícios vistos por fora
Que é dos meninos com cataventos na aérea
Arquitetura de gargalhadas em cornucópia?
Almas bovinas acomodadas à matéria
Pastam na erva entre as ruínas da memória,
Homens por dentro abandalhados em unhas sujas
Que desleixaram seu coração num bengaleiro;
Mulheres corujas seriam gregas não fossem as negras
Nódoas deixadas na sua carne pelo dinheiro;
Jovens alheios à pulcritude do corpo em festa
Passam por mim como alamedas de ciprestes
E a flor de cinza da juventude é uma aresta
Que me golpeia abrindo vácuos de flores silvestres
E essa ansidedade de mim mesma me virgula
Paula de pátria entressonhada. É um crisol.
E, o fruto agreste da linfa ardente que em mim circula
Sabe-me a sol. Sabe-me a pássaro. Pássaro ao sol.
Entre mim e a cidade se ateia a perspectiva
De uma angústia florida em narinas frementes.
Apalpo-me estou viva e o tacto subjectiva-me
a galope num sonho com espuma nos dentes.
E invoco-vos, irmãos, Capitães-Mores do Instinto!
Que me acenais do mar com um lenço cor da aurora
E com a tinta azulada desse aceno me pinto.
O cais é a urgência. O embarque é agora.
Cidadania
Buquê de ruídos úteis
do avião sobressai
locomovida rosa pública.
Entre os edifícios a acácia
de antigamente ainda ousa
trazer ao cimo a folhagem
sua dor de apertada coisa.
Um solo de saxofone excresce
mensagem que a morte adia
aflito pássaro que enrouquece
a garganta da telefonia.
Em cada bolso do cimento
uma lenta aranha de gás
manipula o dividendo
de um suicídio lilás.
Natália Correia, in "O Vinho e a Lira"
Balada para um Homem na Multidão
enternece por vezes destacar
é sempre o mesmo aqui ou no japão
a diferença é ele ignorar.
Muitos mortos foram necessários
para formar seus dentes um cabelo
vai movido por pés involuntários
e endoidece ser eu a percebê-lo.
Sentam-no à mesa de um café
num andaime ou sob um pinheiro
tanto faz desde que se esqueça
que é homem à espera que cresça
a árvore que dá dinheiro.
Alimentam-no do ar proibido
de um sonho que não é dele
não tem mais que esse frasco de vidro
para fechar a estrela do norte.
E só o seu corpo abolido
lhe pertence na hora da morte.
Natália Correia, in "O Vinho e a Lira"
« - A minha mãe foi enforcada em público - respondeu com ostentação o garoto, que se vangloriava desse episódio. Parecia-lhe a ele que a mãe (de quem, de resto, se não lembrava, por ser muito pequeno nessa altura) morrera no palco de um grande teatro.»
Marguerite Yourcenar. Como a água que corre. Um Homem Obscuro. 3ª Edição. Tradução de Luiza Neto Jorge. Difel., p. 185segunda-feira, 27 de fevereiro de 2023
'' a ansiedade pesou arrobas sobre o espírito de Huck ''
Mark Twain. As Aventuras de Tom Sawyer. Círculo de Leitores., p.218
'' UMA CARRAÇA CORREDORA E UM DESGOSTO''
Mark Twain. As Aventuras de Tom Sawyer. Círculo de Leitores., p.63
domingo, 26 de fevereiro de 2023
'' a vida que ali estivera, já não estava.''
Marguerite Yourcenar. Como a água que corre. Um Homem Obscuro. 3ª Edição. Tradução de Luiza Neto Jorge. Difel., p. 169
'' para quem viver e morrer é igualmente difícil''
Marguerite Yourcenar. Como a água que corre. Um Homem Obscuro. 3ª Edição. Tradução de Luiza Neto Jorge. Difel., p. 167
'' o incêndio de uma meda de trigo''
Marguerite Yourcenar. Como a água que corre. Um Homem Obscuro. 3ª Edição. Tradução de Luiza Neto Jorge. Difel., p. 156
''madeira roída pelos bichos do mar''
Marguerite Yourcenar. Como a água que corre. Um Homem Obscuro. 3ª Edição. Tradução de Luiza Neto Jorge. Difel., p. 154
''apresentadores de espectáculos''
Marguerite Yourcenar. Como a água que corre. Um Homem Obscuro. 3ª Edição. Tradução de Luiza Neto Jorge. Difel., p. 144
''bastaria cavar em qualquer sítio para se chegar a Deus''
Marguerite Yourcenar. Como a água que corre. Um Homem Obscuro. 3ª Edição. Tradução de Luiza Neto Jorge. Difel., p. 137
«Depois de haver, segundo alguns, homologado o universo, e segundo outros provado Deus, ou pelo contrário, a sua inutilidade ( tais zé-ninguéns devem ser rejeitados a par), eis-me de cu assente na terra nua e, pendurados por cima da minha cabeça, os meus silogismos perfeitos e as minhas incontroversas demonstrações, alto demais, contudo, para que eu, num golpe de rins, me consiga agarrar a eles.»
Marguerite Yourcenar. Como a água que corre. Um Homem Obscuro. 3ª Edição. Tradução de Luiza Neto Jorge. Difel., p. 136/7
« - Eu é que já não penso nada. Até é provável que pense mal.»
Marguerite Yourcenar. Como a água que corre. Um Homem Obscuro. 3ª Edição. Tradução de Luiza Neto Jorge. Difel., p. 134
'' somítico de sentimentos''
Marguerite Yourcenar. Como a água que corre. Um Homem Obscuro. 3ª Edição. Tradução de Luiza Neto Jorge. Difel., p. 134
''livro subversivo''
Marguerite Yourcenar. Como a água que corre. Um Homem Obscuro. 3ª Edição. Tradução de Luiza Neto Jorge. Difel., p. 131
''as exacções e as astúcias''
Marguerite Yourcenar. Como a água que corre. Um Homem Obscuro. 3ª Edição. Tradução de Luiza Neto Jorge. Difel., p. 119
«Não se compreendia porque é que essas gentes se impunham ao nosso espírito, ocupavam a nossa imaginação, e até às vezes nos devoravam o coração, antes de se mostrarem o que eram: fantasmas.»
Marguerite Yourcenar. Como a água que corre. Um Homem Obscuro. 3ª Edição. Tradução de Luiza Neto Jorge. Difel., p. 119
domingo, 19 de fevereiro de 2023
CARNAVAL
A vida é uma tremenda bebedeira.
Eu nunca tiro dela outra impressão.
Passo nas ruas, tenho a sensação
De um carnaval cheio de cor e poeira...
A cada hora tenho a dolorosa
Sensação, agradável todavia,
De ir aos encontrões atrás da alegria
Duma plebe farsante e copiosa...
Cada momento é um carnaval imenso
Em que ando misturado sem querer.
Se penso nisto maça-me viver
E eu, que amo a intensidade, acho isto intenso
De mais... Balbúrdia que entra pela cabeça
Dentro a quem quer parar um só momento
Em ver onde é que tem o pensamento
Antes que o ser e a lucidez lhe esqueça...
Automóveis, veículos, (...)
As ruas cheias, (...)
Fitas de cinema correndo sempre
E nunca tendo um sentido preciso.
Julgo-me bêbado, sinto-me confuso,
Cambaleio nas minhas sensações,
Sinto uma súbita falta de corrimões
No pleno dia da cidade (...)
Uma pândega esta existência toda...
Que embrulhada se mete por mim dentro
E sempre em mim desloca o crente centro
Do meu psiquismo, que anda sempre à roda...
E contudo eu estou como ninguém
De amoroso acordo com isto tudo...
Não encontro em mim, quando me estudo,
Diferença entre mim e isto que tem
Esta balbúrdia de carnaval tolo,
Esta mistura de europeu e zulu
Este batuque tremendo e chulo
E elegantemente em desconsolo...
Que tipos! Que agradáveis e antipáticos!
Como eu sou deles com um nojo a eles!
O mesmo tom europeu em nossas peles
E o mesmo ar conjuga-nos
Tenho às vezes o tédio de ser eu
Com esta forma de hoje e estas maneiras...
Gasto inúteis horas inteiras
A descobrir quem sou; e nunca deu
Resultado a pesquisa... Se há um plano
Que eu forme, na vida que talho para mim
Antes que eu chegue desse plano ao fim
Já estou como antes fora dele. É engano
A gente ter confiança em quem tem ser...
(...)
Olho p'ró tipo como eu que ai vem...
(...)
Como se veste (...) bem
Porque é uma necessidade que ele tem
Sem que ele tenha essa necessidade.
Ah, tudo isto é para dizer apenas
Que não estou bem na vida, e quero ir
Para um lugar mais sossegado, ouvir
Correr os rios e não ter mais penas.
Sim, estou farto do corpo e da alma
Que esse corpo contém, ou é, ou faz-se...
Cada momento é um corpo no que nasce...
Mas o que importa é que não tenho calma.
Não tenciono escrever outro poema
Tenciono só dizer que me aborreço.
A hora a hora minha vida meço
E acho-a um lamentável estratagema
De Deus para com o bocado de matéria
Que resolveu tomar para meu corpo...
Todo o conteúdo de mim é porco
E de uma chatíssima miséria.
Só é decente ser outra pessoa
Mas isso é porque a gente a vê por fora...
Qualquer coisa em mim parece agora
“Carnaval” Álvaro de Campos - Livro de Versos . Fernando Pessoa. (Edição crítica. Introdução, transcrição, organização e notas de Teresa Rita Lopes.) Lisboa: Estampa, 1993.
- 7a.'' A negra melancolia ''
Marguerite Yourcenar. Como a água que corre. Um Homem Obscuro. 3ª Edição. Tradução de Luiza Neto Jorge. Difel., p. 98