"Quem quer que se decida a falar da estupidez corre hoje o risco de ser insultado: podem acusá-lo de pretensiosismo ou de querer perturbar o curso da evolução histórica.
Eu próprio escrevi já há alguns anos:«Se a estupidez não se assemelhasse, a ponto de se confundir, com o progreso, o talento, a esperança ou o aperfeiçoamento, ninguém desejaria ser estúpido.» Isso foi em 1931; e não há quem se atreva a negar que o mundo conheceu, desde então, inúmeros progressos e aperfeiçoamentos! Assim tornou-se pouco a pouco impossível adiar a questão:«O que é. exactamente a estupidez?»"
-"Da Estupidez"
- Robert Musil
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sábado, 14 de novembro de 2015
quarta-feira, 28 de novembro de 2012
«Considerava inevitável que uma pessoa com vida interior movimentada e rica tivesse segredos e lembranças ocultas nas suas gavetas íntimas. Apenas exigia dessa pessoa que mais tarde soubesse usar isso com elevação.
Certa ocasião, quando alguém a quem contara esse episódio da sua adolescência perguntou se essa lembrança não o envergonhava, respondeu sorrindo:
-Não nego que era uma degradação. Porque não? Ela passou. Mas algo dela permaneceu para sempre: aquela mínima porção de veneno necessária para que a alma não fique excessivamente confiante e tranquila, conferindo-lhe qualidades mais refinadas, aguçadas e sábias.
«De qualquer modo, contaríamos as horas de degradação que todas as grandes paixões gravam com fogo a nossa alma?»
Robert Musil. O Jovem Törless. Edição «Livros do Brasil» Lisboa, 1987., p. 195
domingo, 25 de novembro de 2012
«Era um pensamento....
«Era um pensamento rodeado de emoções como se o cercassem mulheres lascivas em longos vestidos de golas altas, usando máscaras. Törless não conhecia nenhum nome para essas emoções; não sabia o que ocultavam; nisso residia toda a fascinação.»
Robert Musil. O Jovem Törless. Edição «Livros do Brasil» Lisboa, 1987., p. 193
« A experiência que Törless tivera constituíra essa ocasião. Por uma surpresa, um mal-entendido, a interpretação errada de uma sensação, aqueles esconderijos secretos em que se reunira tudo o que a alma de Törless tinha de oculto, proibido, sufocante, inseguro e solitário - rebentou tudo e ele derramou sobre Basini os seus mais obscuros impulsos. Pois aí, estes depararam-se de súbito, com algo quente, que respirava, algo perfumado, algo que era carne, na qual os sonhos indecisos de Törless assumiam forma e tornavam-se parte da beleza, em lugar da ácida fealdade com que Bozena os maculava na solidão. Isso abrira-lhes repentinamente uma porta para a vida, e na penumbra tudo se misturava, desejo e realidade, loucas fantasias e impressões que traziam ainda os rastos ardentes da vida, sensações exteriores que as recebiam no seu interior, envolvendo-as e tornando-as irreconhecíveis.
Em Törless tudo isso era indistinto, formava uma só emoção, imprecisa e compacta, que, no choque inicial, se podia tomar por amor.
Robert Musil. O Jovem Törless. Edição «Livros do Brasil» Lisboa, 1987., p. 190
«Sussurrava: na solidão tudo é permitido.»
Robert Musil. O Jovem Törless. Edição «Livros do Brasil» Lisboa, 1987., p. 187
sábado, 10 de novembro de 2012
«Sinto», anotou, «algo em mim, e não sei ao certo o que é».
Depois riscou depressa a frase e em seu lugar escreveu:
«Devo estar doente...insano!»
Sentiu um calafrio, pois essa palavra era agradavelmente patética. «Insano - o que me faz estranhar mais as coisas que são normais para os outros? E porque é que esta estranheza me atormenta? E porque é que esta estranheza provoca em mim uma sensualidade carnal?»
Robert Musil. O Jovem Törless. Edição «Livros do Brasil» Lisboa, 1987., p. 153
domingo, 4 de novembro de 2012
«Aquela tarde foi maravilhosa.»
«Törless tirou da gaveta todas as suas tentativas poéticas. Sentou-se com elas junto do fogão e permaneceu sozinho e despercebido atrás da chaminé. Folheou um caderno após outro, depois rasgou-os bem devagar, em mil pedacinhos, jogando-os no fogo, saboreando de cada vez a doce emoção da despedida.
Com isso queria lançar fora de si toda a bagagem antiga, como se agora - sem nenhum impedimento - devesse dar toda a atenção ao futuro.»
Robert Musil. O Jovem Törless. Edição «Livros do Brasil» Lisboa, 1987., p. 135
Törless sonhava mais que pensava.
Robert Musil. O Jovem Törless. Edição «Livros do Brasil» Lisboa, 1987., p. 103
Vira imagens que não eram imagens
«Sempre existira alguma coisa de que os seus pensamentos não conseguiam dar conta. Algo simples e estranho. Vira imagens que não eram imagens.»
Robert Musil. O Jovem Törless. Edição «Livros do Brasil» Lisboa, 1987., p. 102
«As coisas cruéis que acontecem servem unicamente para matar os desejos miseráveis que se dirigem para fora, e que, seja vaidade, fome, alegria ou piedade, apenas nos afastam do fogo que cada pessoa é capaz de acender dentro de si.»
Robert Musil. O Jovem Törless. Edição «Livros do Brasil» Lisboa, 1987., p. 99/100
«Num ser humano, ela coloca essa dureza na personalidade, na consciência, na responsabilidade que ele sente por ser parte da alma universal. Se uma pessoa perde essa noção, perde-se a si mesma. E quando um ser humano se perdeu a si mesmo, renunciou a si, perdeu também aquela coisa especial, singular, para qual a Natureza o criou como ser humano. E em nenhum outro caso como neste poderíamos estar tão seguros de que estamos a lidar com algo inútil, com uma forma vazia, algo há muito abandonado pela alma universal.»
Robert Musil. O Jovem Törless. Edição «Livros do Brasil» Lisboa, 1987., p. 93
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