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domingo, 28 de agosto de 2011

« É a mim que procuras, ou qualquer outra coisa? (Pausa.) Queres afagar o meu rosto...uma vez mais? (Pausa.) É um beijo que procuras, Willie...ou será outra coisa? (Pausa.) Houve um tempo em que eu ainda poderia dar-te uma ajuda. (Pausa.) E um outro tempo, antes desse em que eu te ajudava mesmo. (Pausa.) Tu precisaste sempre muito de ajuda, Willie. (Willie escorrega e vem cair na base de elevação do terreno, de rosto voltado para o solo.) Brumm! (Pausa. Willie volta à posição de gatas e levanta os olhos para ela.) Tenta outra vez, Willie, vamos: dessa maneira! (Pausa. Veemente.) Não olhes para mim dessa maneira! (Pausa. Baixo.) Perdeste a razão, Willie? (Pausa. Idem.) Os teus pobres restos de razão?»



Samuel Beckett. Dias Felizes. Trad. Jaime Salazar Sampaio. 1ª. Edição. Editorial Estampa, Lisboa, 1973., p. 82/3

Os clássicos


«Como se perdem os clássicos! (Pausa.) Oh, nem todos. (Pausa.) Uma parte. (Pausa.) Outra parte fica. (Pausa.) É isso que eu acho maravilhoso: que uma parte dos clássicos fique para nos ajudar a chegar ao fim de cada dia. (Pausa.)»



Samuel Beckett. Dias Felizes. Trad. Jaime Salazar Sampaio. 1ª. Edição. Editorial Estampa, Lisboa, 1973., p. 78
«A tristeza depois do amor essa, é claro, conhecemo-la nós.»



Samuel Beckett. Dias Felizes. Trad. Jaime Salazar Sampaio. 1ª. Edição. Editorial Estampa, Lisboa, 1973., p. 78
«Eu julgava antigamente...(Pausa.)...digo: eu julgava antigamente que ainda havia de aprender a falar sozinha. (Pausa.) Quero dizer: comigo própria, no deserto. (Sorriso.)»


Samuel Beckett. Dias Felizes. Trad. Jaime Salazar Sampaio. 1ª. Edição. Editorial Estampa, Lisboa, 1973., p. 72

quinta-feira, 25 de agosto de 2011

«(...) sentir-te simplesmente aí, ao alcance da minha voz, quem sabe se pronto a intervir, é tudo o que eu peço, nem dizer nada que possa contrariar-te ou causar desgosto, nem estar aqui a falar à toa, por assim dizer, às cegas, enquanto esta coisa me consome. (Pausa. Retomando alento.) A dúvida. (Pousa o índex e o dedo maior na região do coração. Procura o sítio, encontra-o). Aqui. (Move ligeiramente os dedos.) Mais ou menos. (Tira a mão.



Samuel Beckett. Dias Felizes. Trad. Jaime Salazar Sampaio. 1ª. Edição. Editorial Estampa, Lisboa, 1973., p. 50
«As palavras abandonam-nos, há alturas em que as palavras nos abandonam. Até elas...(Voltando-se um tanto para Willie.) Não é verdade, Willie? (Pausa. Voltando-se mais. Mais forte.) E o que havemos nós de fazer, então...até que elas voltem?»



Samuel Beckett. Dias Felizes. Trad. Jaime Salazar Sampaio. 1ª. Edição. Editorial Estampa, Lisboa, 1973., p. 47
«Quantas vezes eu não disse: Winnie põe o chapéu, é o que tens a fazer, tira o chapéu, Winnie, porta-te como uma pessoa crescida, vais ver que te faz bem...e não era capaz. (Pausa.) Não podia.



Samuel Beckett. Dias Felizes. Trad. Jaime Salazar Sampaio. 1ª. Edição. Editorial Estampa, Lisboa, 1973., p. 47

terça-feira, 23 de agosto de 2011

«Tinha sido melhor deixar-te dormir. (Volta-se de frente; puxa distraidamente pela relva. Baixando e levantando a cabeça, anima a fala seguinte.) Pois é...assim eu pudesse suportar a solidão, quero dizer, ficar para aqui a pairar sem ser ouvida por ninguém. (Pausa.) Não é que eu tenha ilusões, Deus me livre. Tu não ouves lá grande coisa, Willie. (Pausa.) Há mesmo dias em que não ouves nada. (Pausa.) Mas também há outros em que me respondes (Pausa.) De maneira que eu posso sempre dizer de mim para mim, mesmo quando não respondes e talvez nem oiças: Winnie, posso eu dizer, há alturas em que alguém te escuta, tu não estás a falar só para ti própria, quero dizer, no deserto, coisas que eu nunca pude suportar - por muito tempo (Pausa.)»



Samuel Beckett. Dias Felizes. Trad. Jaime Salazar Sampaio. 1ª. Edição. Editorial Estampa, Lisboa, 1973., p. 44/5

domingo, 21 de agosto de 2011

«Dias Felizes é um maravilhoso poema de amor, o canto de uma mulher que ainda quer ouvir e ver o homem que ama (...). Quando li a peça pela primeira vez, fiquei perturbada e entusiasmada (...). O que eu estava a ler era tudo o que não ousava pensar desde que (...) me tinha aparecido a primeira ruga de velhice», declarava Madeleine Renaud nas Novelles Littéraires de 24 de Fevereiro de 1966.




Samuel Beckett. Dias Felizes. Trad. Jaime Salazar Sampaio. 1ª. Edição. Editorial Estampa, Lisboa, 1973., p. 22
«Nunca estive aqui», diz Hamm, e perante esta confissão nada mais conta, porque é impossível ouvi-la senão sob a sua forma mais geral: «Nunca ninguém esteve aqui.» Diz Robbe-Grillet referindo-se a À Espera de Godot e a Fim da Festa.»
 
Prefácio
 
 
Samuel Beckett. Dias Felizes. Trad. Jaime Salazar Sampaio. 1ª. Edição. Editorial Estampa, Lisboa, 1973., p. 20
«Winnie seria uma «complexa alma humana» de que Dias Felizes, com diálogos feitos à imagem da linguagem daquela que seria a pessoa «retratada», usando o que seria a expressão das suas dúvidas, dos seus íntimos desejos, das suas desilusões, do que se lembra e do que não se lembra, da sua tristeza ou da sua alegria, faria o «retrato»?


 
Samuel Beckett. Dias Felizes. Trad. Jaime Salazar Sampaio. 1ª. Edição. Editorial Estampa, Lisboa, 1973., p. 10
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