segunda-feira, 20 de janeiro de 2014

«Era como se as entranhas da terra viessem até ali, de rastos, famintas, para serem possuídas. A planície tinha a ondulação, a profundidade e a largueza de um mar. Tudo nela era imenso, insondável e simultaneamente dádiva e fuga. Era o mesmo sortilégio que, havia muito, se tinha apossado do Loas. A campina de tão lânguida, amolengava os músculos dos homens, e o Loas, amando a terra, desejando-a como se deseja fecundar um corpo de uma mulher, era no entanto impotente para traduzir tudo isso em acção. Erguia a enxada em meia dúzia de vezes e parava, embevecido, esperando que a gleba, sob esse breve estímulo, se multiplicasse em alvoroço e fertilidade. Como se o esforço físico o impedisse de assistir à solenidade dessa procriação. No seu apelo à terra havia o desejo fanático de nela deixar uma cicatriz, mas uma cicatriz de amor e não de suor.»



Fernando NamoraO Trigo e o Joio, Círculo de Leitores., p. 18-19
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