«Olhaste-me e, mal me tinhas visto, senti que este mundo é uma nuvem carregada de trovada e de ventos, que a alma do homem está carregada de trovoada e de ventos, que Deus sopra sobre ela e que não há salvação.
Ergui os olhos, fitei-te. Ia dizer-te:
- Avô, é verdade que não há salvação? - Mas a língua prendeu-se-me. E quando tentei aproximar-me de ti, os joelhos fraquejaram.
Então, estendeste a mão, como se eu me afogasse e quisesses salvar-me. Agarrei-me àvidamente: ela estava salpicada de manchas multicolores; queimava. Toquei-lhe, ela deu-me força, um impulso, e pude falar.
-Avô - disse -, dá-me as tuas ordens.
Tu sorriste, puseste a mão sobre a minha cabeça. Não era mão, era um fogo multicolor. E esse fogo derramou-se até às raízes do meu espírito.
-Vai até onde puderes, meu filho...»
Nikos Kazantzakis. Carta a Greco. Trad. Armando Pereira da Silva e Armando da Silva Carvalho. Editora Ulisseia, Lisboa, p. 15
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