Terra vermelha, terra negra
tu vens do mar,
do verde requeimado
onde há palavras
antigas e fadiga sanguínea
e gerânios entre as pedras -
não sabes o que em ti
trazes de mar palavras e fadiga,
tu rica como uma lembrança,
como o campo despido,
tu áspera e dulcíssima
palavra, antiga como o sangue
recolhido nos olhos;
jovem, como um fruto
que é lembrança e estação -
a respiração repousa
sob o céu de agosto,
as azeitonas do teu
olhar suavizam
o mar e tu vives revives
sem surpresa, certa
como a terra, escura
como a terra, moinho
de estações e de sonhos
que ao luar se revela
antiquíssimo, como
as mãos de tua mãe,
a concha da braseira.
Tu és terra e a morte.
A tua estação é a sombra
e o silêncio. Nada
vive mais distante
da aurora que tu.
Quando pareces despertar
és dor apenas,
tem-la nos olhos e no sangue
mas tu não sentes. Vives
como vive uma pedra,
como a terra dura.
Vestem-te sonhos
movimentos soluços
que tu ignoras. Como a água
de um lago a dor
tremula e envolve-te.
Há círculos sobre a água.
Tu deixa-los desvanecer.
Tu és a terra e a morte.
Virá a morte e terá os teus olhos
- esta morte que nos acompanha
de manhã à noite, insone,
surda, como um velho remorso
ou um vício absurdo. Os teus olhos
serão uma palavra vã,
um grito mudo, um silêncio.
Assim os vês todas as manhãs
quando sobre ti mesma no espelho
te inclinas. Ó minha cara esperança,
nesse dia saberemos nós também
que tu és vida e és o nada.
Para todos a morte tem um olhar.
Virá a morte e terá os teus olhos.
Será como abandonar um vício,
como ver surgir no espelho
em rosto morto, como
escutar uns lábios fechados.
Mudos, desceremos no abismo.
Cesare Pavese in Dez Poetas Italianos Contemporâneos em selecção, tradução e notas de Albano Martins. Publicações Dom Quixote, 1992
sábado, 5 de dezembro de 2009
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
Fantástico poema. Gostei imenso do início
ResponderEliminar"terra vermelha, terra negra/tu vens do mar/do verde requeimado /onde há palavras/antigas e fadiga sanguínea/e gerânios entre pedras -" e de alguns versos como "tu rica como uma lembrança,/como um campo despido, tu áspera e dulcíssima", "vestem-te sonhos/movimentos soluços/que tu ignoras. Como a água/de um lago a dor/tremula e envolve-te./Há círculos sobre a água./Tu deixa-los desvanescer./Tu és a terra e a morte.". Muito bom!
;)
ResponderEliminarfoi um dos meus preferidos, deste livro - aqui o partilho.