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domingo, 19 de dezembro de 2010

«Olhas juvenil em tua beleza, e não és inda
Por demais magnífico e orgulhoso;
Bem podias correr, pudesse eu,
Divino Vagabundo, ir contigo! Mas tu sorris»



Friedrich Hölderlin. Poemas. Prefácio, Selecção e trad. Paulo Quintela. Relógio D' Água, Lisboa, 1991, p. 139

sábado, 18 de dezembro de 2010

Fantasia do Anoitecer

(...)

«Para onde irei eu? Vivem os mortais
De soldo e trabalho; alternando em fadiga e repouso
Tudo se alegra; porque não dorme então
Nunca em meu peito o espinho?

No céu da tarde floresce toda uma primavera;
Incontáveis florescem as rosas, e tranquilo aparece
O mundo áureo; oh! levai-me pra lá,
Nuvens purpúreas! e que lá em cima

Em luz e ar se dissolvem meu amor e dor! -
Mas, como corrido da súplica louca, foge
O encanto; faz-se escuro, e solitário
Sob o céu, como sempre, me encontro. -

Vem tu agora, sono suave! demasiada cobiça
O coração; mas ao fim, juventude, também tu amorteces,
Sonhadora, inquieta!
Serena e pacífica é então a velhice.



Friedrich Hölderlin. Poemas. Prefácio, Selecção e trad. Paulo Quintela. Relógio D' Água, Lisboa, 1991, p. 133/135

Deuses andaram outrora...

Deuses andaram outrora entre os homens, as Musas
[magníficas
E o jovem Apolo, sarando, inspirando, como tu;
E tu és para mim como eles, como se um dos Venturosos
Me tivesse mandado pra a Vida: se eu ando, anda comigo
A imagem da minha Heroína, quando sofro e crio, com amor
Até à morte; pois isto foi que aprendi dela e dela tenho.

Vivamos, pois, ó tu com quem eu sofro, tu com quem
Íntima - e crente - e fielmente luto por tempo mais belo.
Pois nós somos! E se em anos vindouros ainda soubessem
De nós ambos, quando outra vez o Génio valer,
Diriam: «Estes solitários criaram pra si em amor,
Só sabido dos Deuses, o seu mais secreto mundo.
Pois os que só do que morre cuidaram, a terra os recebe;
Mas mais se aproximam da Luz e do Éter
Os que, fiéis ao íntimo amor e ao divino espírito,
Esperando e sofrendo e com calma o Destino venceram.»


Friedrich Hölderlin. Poemas. Prefácio, Selecção e trad. Paulo Quintela. Relógio D' Água, Lisboa, 1991, p. 119
«Olha, até a mim mesmo rejuvenesceram as palavras da
                                                                       [infância,
E, como outrora, me correm dos olhos as lágrimas;
E em pensamento volto aos dias há muito passados,»
 
  (...)
 
Friedrich Hölderlin. Poemas. Prefácio, Selecção e trad. Paulo Quintela. Relógio D' Água, Lisboa, 1991, p. 117

'Foi nos braços dos deuses que eu cresci.'

Friedrich Hölderlin. Poemas. Prefácio, Selecção e trad. Paulo Quintela. Relógio D' Água, Lisboa, 1991, p. 107

quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

Canção do destino de Hyperion

Andais lá em cima na luz
Em chão macio, génios venturosos!
Ares divinos resplandecentes
Vos tocam de leve,
Como os dedos da artista
Cordas sagradas.

Sem destino, como dormente
Menino, respiram os deuses;
Pudicamente guardado
Em casto botão,
Eternamente
Lhes floresce o Espírito,
E os olhos felizes
Olham em serena
Claridade eterna,

Mas a nós foi-nos dado
Não repousar em parte alguma,
Desfalecem, caem
Os homens sofredores
Às cegas de uma
Hora para a outra,
Como água atirada
De rochedo em rochedo,
Anos a fio para o Incerto.




Friedrich Hölderlin. Poemas. Prefácio, Selecção e trad. Paulo Quintela. Relógio D' Água, Lisboa, 1991, p. 101/2
«Pois mais livres respiram as aves do bosque,
Embora mais magnífico arqueje o peito do Homem,
E ele, que vê o escuro futuro, tem também
De ver a morte, e entre todos sozinho ter-lhe medo.

E contra todos os que respiram usa o Homem
Armas em seu orgulho e medo eternos; no dissídio
Se consome, e a flor da sua paz,
Delicada, é breve e passageira.»



Friedrich Hölderlin. Poemas. Prefácio, Selecção e trad. Paulo Quintela. Relógio D' Água, Lisboa, 1991, p. 99

terça-feira, 14 de dezembro de 2010

VANINI

Blasfemo te chamaram? com maldições
Te carregaram o coração e te amarraram
E te entregaram às chamas,
Santo homem! Oh, porque não voltaste

Em chamas do céu, pra ferir a fronte
Dos ímpios e mandar à tempestade
Que atirasse a cinza dos bárbaros
Pra fora da terra e da pátria?

Mas aquela que em vida amaste, a que te acolheu
Moribundo, a Natureza sagrada esquece
As acções dos homens, e os teus inimigos
Entraram, como tu, na paz antiga.




Friedrich Hölderlin. Poemas. Prefácio, Selecção e trad. Paulo Quintela. Relógio D' Água, Lisboa, 1991, p. 93

Imperdoável

Se vós amigos, esqueceis, se escarneceis o artista,
E entendeis mesquinho e vulgar o espírito mais fundo,
Deus perdoa-vo-lo; mas não perturbeis
Nunca a paz dos que se amam.




Friedrich Hölderlin. Poemas. Prefácio, Selecção e trad. Paulo Quintela. Relógio D' Água, Lisboa, 1991, p. 79

Perdão!

Santa criatura! Tantas vezes em ti perturbei
A dourada paz dos deuses, e das mais secretas,
Das mais fundas dores da vida
Muitas de mim aprendeste.

Oh esquece e perdoa! Como aquelas nuvens
Passam ante a Lua pacífica, eu passarei, e tu
Repousas depois e brilhas de novo
Na tua beleza, ó luz suave!


Friedrich Hölderlin. Poemas. Prefácio, Selecção e trad. Paulo Quintela. Relógio D' Água, Lisboa, 1991, p. 69

Ao Éter

(...)


Pelas zonas da terra, ó Pai Éter! em vão,
Pois a ânsia nos impele de morar em teus jardins.
Na corrente marinha nos lançamos, pra nos saciarmos
Nas planuras mais livres, e a vaga infinita nos rodeia
A quilha, e o peito alegra-se co'as forças do deus do mar.
Mas não lhe basta; pois Oceano mais fundo nos atraí,
Lá onde se agita a onda mais leve - oh quem pudesse
Levar o barco errante àquelas praias de ouro!

Mas enquanto eu anseio ao longe do crepúsculo
Onde co'a vaga azulada abraças 'stranhas praias,
Desces sussurrante da coroa florida da árvore de fruto,
Pai Éter! e suavizas-me até o coração ansioso,
E de bom grado vivo, como dantes, co'as flores da terra.




Friedrich Hölderlin. Poemas. Prefácio, Selecção e trad. Paulo Quintela. Relógio D' Água, Lisboa, 1991, p. 57

segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

As parcas

Concedei-me um só verão, poderosas!
E um só Outono ao meu canto maduro,
Que o meu coração mais pronto, do doce
Jogo farto, então morra!

A alma, que em vida o divino direito
Não alcançou, também não repousa lá baixo no orco;
Mas se uma vez o sagrado, aquilo
Que ao peito me é caro, o poema, atingir,

Bem-vindo então, silêncio do reino das sombras!
Contente estarei, ainda que a lira
Me não acompanhe; uma vez
terei, como os deuses, vivido, e mais além não preciso.


Friedrich Hölderlin. Poemas. Prefácio, Selecção e trad. Paulo Quintela. Relógio D' Água, Lisboa, 1991, p. 49
« Por isso foi […] dada ao homem, a língua, o mais perigoso dos bens […] para que ele dê testemunho de o que ele é […]»


Friedrich Hölderlin. Poemas. Prefácio, Selecção e trad. Paulo Quintela. Relógio D' Água, Lisboa, 1991, p. 30

...«como se conta dos heróis, posso bem dizer que Apolo me feriu».

Friedrich Hölderlin. Poemas. Prefácio, Selecção e trad. Paulo Quintela. Relógio D' Água, Lisboa, 1991, p. 24

Amor de Hölderlin a Susette Gontard a...

grega «perdida num século pobre sem espírito e sem ordem»


(carta a Neuffeer, de 16 de Fev. de 1797)




Friedrich Hölderlin. Poemas. Prefácio, Selecção e trad. Paulo Quintela. Relógio D' Água, Lisboa, 1991, p. 21

domingo, 5 de dezembro de 2010

Hölderlin

Detença, mesmo com as coisas mais íntimas,
não nos é dada; das imagens
cumpridas o espírito arroja-se repentino de mais para as que se
[querem cumprir; lagos
há-os só no eterno. Aqui, é a queda
o mais próprio. Do sentimento sabido
precipitar-nos para baixo para o pressentido, mais além.

A ti, ó magnífico Invocador, a ti toda uma vida
te foi dada a instante imagem, e, quando a exprimias,
o verso fechava-se como um destino, havia uma morte
mesmo no mais suave, e tu entravas nela; mas o deus
que ia à tua frente guiava-te para lá, pra fora dela.

Ó tu espírito errante, o mais errante! Como elas todas
moram no poema quente, agasalhadas, e ficam
longamente na comparação estreita. Partícipes. Só tu
vagueias como a Lua. E em baixo aclara-se e escurece
a tua paisagem nocturna, santamente assustada,
que tu sentes em despedidas. Ninguém
a deu mais sublimemente, a restituiu ao Todo
mais inteira, menos pobre. Assim também
brincaste teu jogo santo por anos já não contados
com a infinita ventura, como se ela não fosse interior, mas jazesse
por aí, pertença de ninguém, na macia
relva da Terra, abandonada por crianças divinas.
Ai, o por que os Altíssimos anseiam, puseste-o tu, sem desejo,
pedra sobre pedra: e ficou. Mas mesmo a sua queda
te não perturbaria.

Se um tal, eterno, houve um dia, porque é que nós
desconfiamos ainda do terrestre? em vez de no transitório
seriamente aprender os sentimentos de qualquer
inclinação, futura no espaço?

(Irschenhausen, Setembro de 1914)


Rainer Maria Rilke


in Friedrich Hölderlin. Poemas. Prefácio, Selecção e trad. Paulo Quintela. Relógio D' Água, Lisboa, 1991, p. 9
[...]vós que dormis, 'stais-me acordados cá dentro do peito,
Na alma parente repousa a vossa imagem que foge.
E mais vivos viveis vós ali, onde a alegria do espírito
Divino a todos os que envelhecem, a todos os mortos rejuvenesce.

Friedrich Hölderlin. Poemas. Prefácio, Selecção e trad. Paulo Quintela. Relógio D' Água, Lisboa, 1991.

segunda-feira, 29 de novembro de 2010

«O prazer da destruição é ao mesmo tempo o prazer da criação.»


Hans Magnus Enzensberger. Mausoléu. Trad. e prefácio de João Barrento. Edições Cotovia, Lisboa, 2004., p. 183

sábado, 27 de novembro de 2010

«Mas da casca nasce uma concha dura
que protege o corpo como uma carapaça.
Por isso não tenho nada a relatar
da minha vida a não ser
as minhas publicações.
 
Resumo diário: quatro horas de trabalho, no máximo,
depois da visita às estufas.
Longa sesta, enrolado num cachecol,
no sofá. Muda de roupa. Depois do jantar
alguém toca uma sonata ao piano.
 
Cedo para a cama. Insónias:
Passava quase sempre mal as noites,
ficava acordado ou sentado na cama.»
 
 
 
 
Hans Magnus Enzensberger. Mausoléu. Trad. e prefácio de João Barrento. Edições Cotovia, Lisboa, 2004., p. 179

quarta-feira, 24 de novembro de 2010

«(...) Todas as suas obras apodreceram e enferrujaram, e ele próprio queimou os seus papéis, desenhos e projectos. Desempenhou um papel importante na história do pão.

IV


Muitas das palavras que utilizou (era construtor de carruagens) desapareceram: lança, tamancos, copa e albas. Teria sido capaz de nos explicar o que é um céu recolhido.

V

...uma espécie que manipula a sua própria evolução por meio de intervenções planificadas nas suas condições de vida e no seu programa genético. A este processo chama-se auto-evolução. (Exemplo: o construtor de carruagens que desaparece enquanto tal ao inventar um carro a vapor. Também o moleiro não se extingue por si próprio.) Desconhece-se o fim último daquela intervenção planificada.

VI

O grão é levado da carrada de taleigos para a moega; daqui passa pelo orifício fundo da moega e corre pelo olho da mó para a caleira; escoa-se da caleira, para ser comprimido entre a mó andadeira e a fixa, cai pelo veio, vai dar ao tremonhado, acaba no limpador, a farinha é levada para a eira, peneirada, passa depois à câmara de mistura, junta-se no silo, passa pela mangueira de enchimento e cai na barrica. O moinho está cheio de moleiros suados; mestres-moleiros, homens com horas de moer, ajudantes; numa roda viva, vão movimentando os carolos, a farinha macia e a áspera, a farinha de primeira, de segunda, de resíduo, a flor-de-farinha, levantam-na e carregam-na, arrumam e transportam.
Depois aparece o inventor e constrói um moinho de onde desaparecem os moleiros. A única agitação no edifício sem vivalma é a das correias transportadoras de alcatruzes, dos monta-cargas, dos alimentadores, dos hélices da moagem: aparelhos pelos quais o grão, ora na horizontal, ora na vertical vai passando de um dispositivo para o outro através da máquina, evitando assim todo o trabalho manual e toda a sujidade.»


Hans Magnus Enzensberger. Mausoléu. Trad. e prefácio de João Barrento. Edições Cotovia, Lisboa, 2004., p. 121/123
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