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Assentemos em poucas linhas como Maldoror foi bom nos seus primeiros anos, em que viveu feliz; está dito. Reparou depois que tinha nascido mau: fatalidade extraordinária! Ocultou o seu carácter enquanto pôde, durante um grande número de anos; mas, por fim, por causa desta concentração que lhe não era natural, todos os dias o sangue lhe subia à cabeça; até que, não podendo mais suportar tal vida, se atirou resolutantemente para a carreira do mal...doce atmosfera! Quem diria que, ao beijar uma criança de rosadas faces, gostaria de lhe arrancar as bochechas à navalha, e que muitas vezes o teria feito, se a Justiça, com o seu longo cortejo de castigos, o não tivesse impedido sempre! Não era mentiroso, ele, confessava a verdade e dizia-se cruel. Humanos, ouvis? Ele ousa repeti-lo com esta pena que treme!»
Conde de Lautréamont. Cantos de Maldoror. Trad. Pedro TamemPrefácio Jorge de Sena, 2ª edição, Moraes Editores,Lisboa, 1979, p. 17