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quarta-feira, 25 de abril de 2012

Assim se perde uma vida

«O homem comprou o seu bilhete e ei-lo a percorrer países como se trouxesse dentro de si, acesa, uma lâmpada - e para ela todo se inclinasse enquanto as cidades, os povos, as línguas, são atravessados, abandonados - eximidos às atenções e tentações da ternura. Assim se perde uma vida, ou serviu ela apenas para este ganho obscuro: a pureza adquirida na desordem, e depois a fusão dos dias múltiplos numa única noite originária. Redil. Volta ao redil, e diz: - tresmalhado - com tal sentimento de extravio redimido que o júbilo mortificado pulsa nele como pura vitalidade, celebração comovida - a grande salvação.»



Herberto Helder. Os Passos Em Volta. Assírio & Alvim, Lisboa, 2006., p. 191
«Porque somos como as árvores, presos a um lugar, respirando através de uma lei calma e perene.»


Herberto Helder. Os Passos Em Volta. Assírio & Alvim, Lisboa, 2006., p. 190
«Que angustiosa, esta voracidade, esta fusão analfabeta com a instável matéria do mundo!»

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«Existo, existe o universo.»


Herberto Helder. Os Passos Em Volta. Assírio & Alvim, Lisboa, 2006., p. 182
«Tive infância, só isso. Ou seja: falta de jeito, indecisão, uma grande ignorância. Olhava para as coisas: eram fundas, enigmáticas, desorientadoras. Tudo estava cheio, porque o meu coração ávido tudo recebia: era um espaço palpitamente vazio.»



Herberto Helder. Os Passos Em Volta. Assírio & Alvim, Lisboa, 2006., p. 181/2
«Obscuros somos sempre, mesmo sem pedi-lo.»




Herberto Helder. Os Passos Em Volta. Assírio & Alvim, Lisboa, 2006., p. 170

''sensibilidade desordenada''

Mas este homem perturba-me.

«Poderia amá-lo, erguê-lo da sua dolorosa confusão, colocá-lo numa dignidade de que, é evidente, perdeu o sentido. Agita-se de um lado para o outro com as grandes mãos bantendo contra as pernas, magro e cheio de uma fome terrível.»


Herberto Helder. Os Passos Em Volta. Assírio & Alvim, Lisboa, 2006., p. 162

domingo, 22 de abril de 2012

«Hoje, nada sei de quem me amou ou me ama.»



Herberto Helder. Os Passos Em Volta. Assírio & Alvim, Lisboa, 2006., p. 151

O tempo move-se, some-se.

«O tempo move-se, some-se. À janela do quarto, o homem vê esse movimento do tempo a sumir-se. Olha para os arrozais verdes do verão que passam de uns dias para os outros, mudando, amadurecendo; as laranjas que se tornam amarelas quando a terra arrefece devagar, por dentro; os sobreiros de repente em carne viva.»



Herberto Helder. Os Passos Em Volta. Assírio & Alvim, Lisboa, 2006., p. 101

as crianças cresceram todas

«Mas uma delas começou a beber, e depois o coração estoirou, e ficou apenas para os outros como uma memória incómoda. Parece que sim, que tinha demasiada imaginação, e levaram-na ao médico e ele disse: aguente-se, e ela não se aguentou. Era uma criança. Não, não, nessa altura já tinha crescido, bebia pelo menos um litro de brandy por dia. Nada mau, para uma antiga criança. A verdade é que era uma criança, e não se aguentou quando o médico disse: aguente-se. E as ruas  são tão tristes. Precisam de mais luz. Mas nesta, por exemplo, já puseram mais luz, e mesmo assim é triste. É até mais triste que as outras. Estou tão triste. Vamos para férias, para o pequeno paraíso. Contaram-me que ele tinha uma alegria tão grande que não podia agarrar num copo: quebrava-o com a força dos dedos, com a grande força da sua alegria.»




Herberto Helder. Os Passos Em Volta. Assírio & Alvim, Lisboa, 2006., p. 56/7

Lugar Lugares

    « Era uma vez um lugar com um pequeno inferno e um pequeno paraíso, e as pessoas andavam de um lado para o outro, e encontravamo-nos, a eles, ao inferno e ao paraíso, e tomavam-nos como seus, e eles eram seus de verdade. As pessoas eram pequenas, mas faziam muito ruído. E diziam: este é o meu inferno, é o meu paraíso. E não devemos malquerer às mitologias assim, porque são das pessoas, e neste assunto de pessoas, amá-las é que é bom. E então a gente ama as mitologias delas. À parte isso o lugar era execrável. As pessoas chiavam como ratos, e pegavam nas coisas e largavam-nas, e pegavam umas nas outras e largavam-se. Diziam: boa tarde, boa noite. E agarravam-se,  e iam para a cama umas com as outras, e acordavam. Às vezes acordavam no meio da noite e agarravam-se freneticamente. Tenho medo - diziam. E depois amavam-se depressa e lavavam-se, e diziam: boa noite, boa noite. Isto era uma parte da vida delas, e era uma das regiões (comovedoras da sua humanidade, e o que é humano é terrível e possui uma espécie de palpitante e ambígua beleza.»



Herberto Helder. Os Passos Em Volta. Assírio & Alvim, Lisboa, 2006., p. 53/4
«Talvez isso seja a inocência. Talvez só no mar nos seja concedido morrer verdadeiramente, morrer como nenhum homem pode.»


Herberto Helder. Os Passos Em Volta. Assírio & Alvim, Lisboa, 2006., p. 48/9

Annemarie

     «Annemarie sentou-se à minha mesa. Vi logo o tamanho da sua solidão: tinha o tamanho do mundo. Ela era a criatura mais só do mundo. E a sua história apareceu - simples, tenebrosa - entre as nossas duas cervejas. Todas as histórias pessoais são simples e tenebrosas. Não me comovi. Comovido já eu estava: com as coisas, comigo, com a chuva sobre a cidade. Talvez houvesse uma irónica alegoria em nós os dois ali sentados diante dos belos copos frios, compreendendo ambos tão facilmente o que nos acontecia e iria acontecer que não tínhamos pressa. Poderíamos morrer ali mesmo. Esperávamos.»



Herberto Helder. Os Passos Em Volta. Assírio & Alvim, Lisboa, 2006., p. 29

''Calma solidão sem dor.''

«O sangue é negro desde a raiz. Porque ninguém sabe onde a corrupção completa a inocência.»


Herberto Helder. Os Passos Em Volta. Assírio & Alvim, Lisboa, 2006., p. 17
«Uma vez fui ao médico.
- Doutor, estou louco - disse. - Devo estar louco.
- Tem loucos na família? - perguntou o médico. - Alcoólicos, sifilíticos?
- Sim, senhor. O pior. Loucos, alcoólicos, sifilíticos, místicos, prostitutas, homossexuais. Estarei louco?
O médico tinha sentido de humor, e receitou-me barbitúricos.
- Não preciso de remédios - disse eu. - Sei histórias tenebrosas da vida. De que me servem os barbitúricos?»


Herberto Helder. Os Passos Em Volta. Assírio & Alvim, Lisboa, 2006., p. 10
« - Se eu quisesse, enlouquecia. Sei uma quantidade de histórias terríveis. Vi muita coisa, contaram-me casos extraordinários, eu próprio...»


Herberto Helder. Os Passos Em Volta. Assírio & Alvim, Lisboa, 2006

quarta-feira, 30 de novembro de 2011

''Poesia sem perdão ou esquecimento.''




Herberto Helder. A colher na boca. Edições Ática., p. 130

terça-feira, 29 de novembro de 2011

«Eu olho, e a mulher é a palavra.»


Herberto Helder. A colher na boca. Edições Ática., p. 109
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