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segunda-feira, 16 de setembro de 2024

 ''Não há mortos que morram tanto como os nossos''

Gonçalo M. Tavares

quinta-feira, 2 de fevereiro de 2023

O livro, de Gonçalo M.Tavares


De manhã, quando passei à frente da loja
o cão ladrou
e só não me atacou com raiva porque a corrente de ferro
o impediu.
Ao fim da tarde,
depois de ler em voz baixa poemas numa cadeira preguiçosa do
jardim
regressei pelo mesmo caminho
e o cão não me ladrou porque estava morto,
e as moscas e o ar já haviam percebido
a diferença entre um cadáver e o sono.
Ensinam-me a piedade e a compaixão
mas que posso fazer se tenho um corpo?
A minha primeira imagem foi pensar em
pontapeá-lo, a ele e às moscas, e gritar:
Venci-te.
Continuei o caminho,
o livro de poesia debaixo do braço.
Só mais tarde pensei ao entrar em casa:
não deve ser bom ter ainda a corrente
de ferro em redor do pescoço
depois de morto.
E ao sentir a minha memória lembrar-se do coração,
esbocei um sorriso, satisfeito.
Esta alegria foi momentânea,
olhei à volta:
tinha perdido o livro de poesia.

sábado, 5 de dezembro de 2020

  Gonçalo M. Tavares 

 "A Mulher-Sem-Cabeça e o Homem-do-Mau-Olhado"

quarta-feira, 24 de junho de 2015

"O mundo é circular: ninguém morre senão nos funerais, e por
instantes, para não assustar os vivos"

Gonçalo M. Tavares, 1, 2011, p.58.

segunda-feira, 2 de fevereiro de 2015


«Também matou; e fez ainda outras coisas piores que não contou a ninguém.»



Gonçalo M. Tavares. Short Movies. 2.ª Edição. Editorial Caminho, 2011., p. 79

O NÚMERO 76


«Uma vaca, com o número 76 na orelha, está morta, o corpo caído sobre a neve. O excessivo frio súbito, matou vários animais - dezenas, centenas, milhares de animais. Mas nenhum animal era igual àquela vaca com o número 76 desenhado numa placa amarela agarrada à orelha. Esse número, sabe-se lá porquê, assusta.»




Gonçalo M. Tavares. Short Movies. 2.ª Edição. Editorial Caminho, 2011., p. 75

«Uma mulher muito magra mede a sua cintura com uma fita métrica amarela.»


Gonçalo M. Tavares. Short Movies. 2.ª Edição. Editorial Caminho, 2011., p. 65

«como um cão à espera no lado de fora da porta de uma casa»

Gonçalo M. Tavares. Short Movies. 2.ª Edição. Editorial Caminho, 2011., p. 56
«Mas o vento tem razão, e o vento faz coisas que nos anunciam momentos trágicos, muito antes de a nossa inteligência perceber.»


Gonçalo M. Tavares.
 Short Movies. 2.ª Edição. Editorial Caminho, 2011., p. 54

«(...) meninos brincam debaixo de pedaços de roupa que devem estar a secar.»


Gonçalo M. Tavares. Short Movies. 2.ª Edição. Editorial Caminho, 2011., p. 53

sábado, 31 de janeiro de 2015

O CAVALO


« Um cavalo parado; presa a ele uma carroça parada. Na carroça, dois corpos com uma corda ao pescoço e mãos amarradas atrás das costas. Estão mortos.
    Voltamos ao cavalo. Está parado. Aguarda qualquer coisa. Uma ordem, talvez. Mas o cavalo não percebe nada. É muito estúpido.»



Gonçalo M. Tavares. Short Movies. 2.ª Edição. Editorial Caminho, 2011., p. 31

quarta-feira, 23 de outubro de 2013

37.

psicanálise do Movimento: quem é louco e em que parte do Corpo.
qual o órgão louco?
o espaço louco?

de Livro da Dança




Gonçalo M. Tavares. Anos 90 E Agora. Uma antologia da nova poesia portuguesa. Selecção e organização Jorge Reis-Sá. Edições Quasi. 3ª Edição., p. 301

14.

A história da dança não é, não pode ser, o Percurso dos Movimentos
traçado no chão.
É, tem de ser, o Percurso dos Movimentos Traçados no ar.
Acreditar que os Pássaros são restos de COREOGRAFIAS. Imagens
do corpo que ficam atrás, suspensas.
(As nuvens ainda, tudo o que é alto, o céu.)
Os pássaros são restos de COREOGRAFIAS.

de Livro da Dança


 Gonçalo M. Tavares. Anos 90 E Agora. Uma antologia da nova poesia portuguesa. Selecção e organização Jorge Reis-Sá. Edições Quasi. 3ª Edição., p. 299

domingo, 2 de junho de 2013

 
«Lembra-se - continuou Ernst - do que nos dizia muitas vezes: que a saúde mental de uma pessoa não estava no que ela fazia, mas sim naquilo em que ela pensava? Lembra-se de perguntar a cada um de nós: em que tens pensado? Lembra-se dessa pergunta, que nos metia medo? Se agora me fizesse de novo essa pergunta, agora que me sinto equilibrado, sabe o que lhe respondia? Que nos últimos dias tenho pensado em matá-lo.»
 


Gonçalo M.Tavares. Jerusalém. Editorial Caminho, 7ª edição, 2005., p. 139

domingo, 26 de maio de 2013

O sobrevivente de um campo de concentração disse:

«Os homens normais não sabem que tudo é possível.»


Gonçalo M.Tavares. Jerusalém. Editorial Caminho, 7ª edição, 2005., p. 139

«Não precisavam um do outro, pareciam pois preparados, se necessário, para o ódio.»



Gonçalo M.Tavares. Jerusalém. Editorial Caminho, 7ª edição, 2005., p. 108

curado de

«Estar curado não era apenas deixar de ter determinados comportamentos, era ainda esquecer o trajecto que de novo os poderia recuperar.»




Gonçalo M.Tavares. Jerusalém. Editorial Caminho, 7ª edição, 2005., p. 104

«Wisliz traz uma ligadura na cabeça.
  Fui operado à cabeça, diz Wisliz.
  Tiraram-me a inteligência.
  Dizem que sou estúpido, que não percebo.
  Eu fico cansado, não me consigo concentrar.
  Preciso de dormir muito, diz Wisliz.»


Gonçalo M.Tavares. Jerusalém. Editorial Caminho, 7ª edição, 2005., p. 85/6

quarta-feira, 15 de maio de 2013


»(...): sabia que perceber os hábitos de pensamento do louco é normalizá-lo, é prever o seu comportamento, é, enfim, controlá-lo enquanto indivíduo.»


Gonçalo M.Tavares. Jerusalém. Editorial Caminho, 7ª edição, 2005., p. 59
 
 
«Dois tipos de educação recebera Mylia: a educação para ver e a educação para ouvir. Por ela, ou talvez pela sua doença,havia aprendido a tocar. Não se toca assim nas pessoas - escutava uma e outra vez. E assustava-se. Não se toca assim nas pessoas? Ela não o repetiria.»



Gonçalo M.Tavares. Jerusalém. Editorial Caminho, 7ª edição, 2005., p. 44
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