«Durmo e desdurmo. Do outro lado de mim, lá para trás onde jazo, o silêncio da casa toca no infinito. Oiço cair o tempo, gota a gota, a nenhuma gota que cai se ouve cair.[...] Sinto a cabeça materialmente colocada na almofada em que a tenho fazendo vale. A pele da fronha tem com a minha pele um contacto de gente na sombra. A própria orelha, sobre a qual me encosto, grava-se matematicamente contra o cérebro. Pestanejo de cansaço, e as minhas pestanas fazem um som pequeníssimo, inaudível, na brancura sensível da almofada erguida. Respiro, suspirando, e a minha respiração acontece - não é minha.»
Fernando Pessoa