domingo, 2 de junho de 2013


Tenho aflição por tudo o que morre
Como tenho pavor por cada noite que cai.
Como fui esquecer o caminho para fora?

Infeliz que esqueci as sendas da caça.
Comerei erva? Sol? Comerei estepes e estepes
A arder?

Vou-me pôr à mesa  e esperar.

Tenho aflição por toda a ausência não anunciada
Acendi a luz por toda a casa e electrifiquei a voz
Agora posso ampliar o clarão dos gritos.

Posso abrir trilhos no fogo: sei o ritmo da mão exacta
Que fez o povo atravessar enxuto o interior da água.

Vou-me encostar à mesa. Vou deixar arrefecer a comida.
Fazer de conta que estou a esperar.



Daniel Faria. Poesia. Edição de Vera Vouga. Editora Quasi., p. 40
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