domingo, 26 de junho de 2011

O Poço

      O poço...! Platero, que palavra tão funda, tão verde-negra, tão fresca, tão sonora! Parece que é a palavra que perfura, girando, a terra escura, até chegar à água fria.
     Olha; a figueira adorna e destroça-lhe o parapeito. Dentro, ao alcance da mão, abriu-se, entre os ladrilhos limosos, uma flor azul de cheiro penetrante. Uma andorinha tem, mais abaixo, o ninho. E depois, para lá de um pórtico de sombra gelada, há um palácio de esmeralda, e um lago, que, ao atirar-se uma pedra para a sua placidez, se zanga e grunhe. E o céu, por fim.
   (Entra a noite, e a lua inflama-se lá no fundo, ornada de volúveis estrelas. Silêncio! Pelos caminhos, a vida partiu para longe. Pelo poço escapa-se a alma para o fundo. Vê-se através dele como que o outro lado do crepúsculo. E parece que da sua boca vai sair o gigante da noite, senhor de todos os segredos do mundo. Ó labirinto quieto e mágico, parque sombrio e fragrante, magnético salão encantado!)
    - Platero, se algum dia me deitar a este poço, não será para me matar, acredita, mas para alcançar mais depressa as estrelas.
    Platero zurra, sedento e anelante. Do poço sai, assustada, inquieta e silenciosa, uma andorinha.




Juan Ramón Jiménez. Platero E Eu. Tradução de Luís Lima Barreto. Edições Cotovia, Lisboa, 2007, p.73

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