Eu não tenho a alma covarde
Eu não tenho a alma covarde,
Pois frente aos vendavais, eu nunca tremo:
O Paraíso brilha, arde,
Como a fé, pela qual eu nada temo.
Deus, meu peito Te abrigou.
Deidade poderosa e onipresente!
Vida – que em mim repousou.
Como eu – Vida Imortal – em Ti, potente!
Movem-nos o peito em vão
Mil credos que não são mais do que enganos;
Sem valor, brotos malsãos,
Ou a ociosa espuma do Oceano,
A pôr dúvidas num ente
Pego assim pela Tua infinidade;
Preso tão seguramente
Na firme Rocha da imortalidade!
Com o amor de um grande enleio
Teu espírito o tempo eterno anima,
Para cima e de permeio,
Muda, apoia, dissolve, cria e ensina.
Se a Terra e a lua findassem,
Se não houvesse sóis nem universos,
E se, só, Te abandonassem,
Haveria existência em Ti, por certo.
A Morte não tem lugar,
Nem pode um único átomo abater:
És o Sopro mais o Ser
Nada pode jamais Te exterminar.
Solidariedade
Não deves ter desesperança,
Cada estrela incendeia;
O silente orvalho se lança
E o sol tudo clareia.
Não à desesperança, embora
O pranto vá jorrar:
Mas os áureos anos de outrora
No peito hão de ficar.
Todos choram, como se deve,
O ar, qual nós, dá seus ais,
O pesar fica sob a neve,
Vêm folhas outonais,
Que revivem; pelo seu fado
O teu nunca é rompido:
Vai, mesmo que desanimado.
E jamais dolorido!
O velho estóico
Eu desprezo o Amor e a quem me ama,
Dos ricos, sei zombar;
É sonho a luxúria da Fama,
Que acaba ao despertar -
E se oro, a única Oração
Que a boca me devora
É - "Larga este meu coração
Deixa-me livre agora."
Quais dias de missão cumprida,
Estou eu a implorar -
Alma livre na morte ou vida,
Coragem pra aguentar.
•
Emily Brontë nasceu a 30 de julho de 1818, em Thornton, na Inglaterra. A obra sempre lembrada da escritora é o romance O morro dos ventos uivantes, publicado em 1847 e transformado em grande sucesso literário. Com as irmãs, Charlotte e Anne, publicou um ano antes uma coletânea de poemas assinada com os pseudônimos Ellis, Currer e Acton Bell, respectivamente. A poeta morreu no dia 19 de dezembro de 1848, em Haworth.
* Traduções de Renata Cordeiro publicadas primeiramente em Cadernos de Literatura em Tradução.