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quinta-feira, 16 de setembro de 2010

«Ma se voi avete un qualsiasi bisogno di creazione non sentite che monta intorno a voil’energia primordiale di cui inossare i vostri fantasmi?» (1)

«Mi volevano matto per forza» (2)

Dino Campana


1 «Mas se vós tiverdes uma qualquer necessidade de criação não sentireis que sobe à vossa
volta a energia primordial que dá ossos aos vossos fantasmas?»
2 «Queriam à força que eu fosse louco »

sábado, 5 de dezembro de 2009

Terra vermelha, terra negra
tu vens do mar,
do verde requeimado
onde há palavras
antigas e fadiga sanguínea
e gerânios entre as pedras -
não sabes o que em ti
trazes de mar palavras e fadiga,
tu rica como uma lembrança,
como o campo despido,
tu áspera e dulcíssima
palavra, antiga como o sangue
recolhido nos olhos;
jovem, como um fruto
que é lembrança e estação -
a respiração repousa
sob o céu de agosto,
as azeitonas do teu
olhar suavizam
o mar e tu vives revives
sem surpresa, certa
como a terra, escura
como a terra, moinho
de estações e de sonhos
que ao luar se revela
antiquíssimo, como
as mãos de tua mãe,
a concha da braseira.

Tu és terra e a morte.
A tua estação é a sombra
e o silêncio. Nada
vive mais distante
da aurora que tu.

Quando pareces despertar
és dor apenas,
tem-la nos olhos e no sangue
mas tu não sentes. Vives
como vive uma pedra,
como a terra dura.
Vestem-te sonhos
movimentos soluços
que tu ignoras. Como a água
de um lago a dor
tremula e envolve-te.
Há círculos sobre a água.
Tu deixa-los desvanecer.
Tu és a terra e a morte.

Virá a morte e terá os teus olhos
- esta morte que nos acompanha
de manhã à noite, insone,
surda, como um velho remorso
ou um vício absurdo. Os teus olhos
serão uma palavra vã,
um grito mudo, um silêncio.
Assim os vês todas as manhãs
quando sobre ti mesma no espelho
te inclinas. Ó minha cara esperança,
nesse dia saberemos nós também
que tu és vida e és o nada.

Para todos a morte tem um olhar.
Virá a morte e terá os teus olhos.
Será como abandonar um vício,
como ver surgir no espelho
em rosto morto, como
escutar uns lábios fechados.
Mudos, desceremos no abismo.

Cesare Pavese in Dez Poetas Italianos Contemporâneos em selecção, tradução e notas de Albano Martins. Publicações Dom Quixote, 1992

quinta-feira, 3 de dezembro de 2009

*

Desci, dando-te o braço, pelo menos um milhão de escadas
e agora que não estás aqui há um vazio em cada degrau.
Até nisso foi breve a nossa viagem.
A minha dura ainda, e já não são necessárias
as coincidências, as reservas,
as ciladas, as vergonhas de quem acredita
que a realidade é aquilo que se vê.

Desci milhões de escadas dando-te o braço
e não porque com quatro olhos talvez se veja mais.
Contigo as desci por saber que de nós dois
as únicas pupilas verdadeiras, ainda que tão ensombradas,
eram as tuas.

*
«E o Paraíso? Existe um paraíso?»
«Creio que sim, senhora, mas os vinhos doces
já ninguém os quer».

*

Sinto remorso por ter esmagado
o mosquito na parede, a formiga
no chão.
Sinto remorso mas aqui estou vestido de escuro
para o congresso, para a recepção.
Sinto dor por tudo, até pelo hilota
que me propina conselhos de participação,
dor pelo mendigo a quem não dou esmola,
dor pelo demente que preside ao conselho
de administração.

Eugenio Montale in Dez Poetas Italianos Contemporâneos em selecção, tradução e notas de Albano Martins. Publicações Dom Quixote, 1992

quarta-feira, 2 de dezembro de 2009

Eterno

Entre uma flor colhida e outra dada
o inexprimível nada.


Giuseppe Ungaretti in Dez Poetas Italianos Contemporâneos em selecção, tradução e notas de Albano Martins. Publicações Dom Quixote, 1992

A Cabra

Falei com uma cabra.
Estava sozinha no prado, estava presa.
Saciada de erva, molhada
pela chuva, balia.

Aquele monótono balido era irmão
da minha dor. Eu respondi-lhe, a princípio
por brincadeira, depois porque a dor é eterna,
tem voz e não muda.
Era esta voz que sentia
gemer numa cabra solitária.

Numa cabra de rosto semita
sentia queixarem-se todos os outros males,
todas as outras vidas.

Umberto Saba in Dez Poetas Italianos Contemporâneos em selecção, tradução e notas
de Albano Martins. Publicações Dom Quixote, 1992
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