«Mas porque é que os alentejanos se matam com tanta facilidade? Quando se faz esta pergunta, a maioria dos alentejanos (repito: alentejanos) invoca três respostas: solidão, pobreza e o duo paisagem/calor. Eu estava disponível para aceitar a validade das três hipóteses, mas nenhuma sobrevive à realidade. Não, a causa não é a solidão. As pessoas não se matam só porque estão sozinhas. Até há estudos que indicam que o suicídio aumenta nos períodos de maior contacto humano (meses de verão). O reencontro das famílias pode ser um fenómeno penoso. Neste caso, o reencontro traumático ocorre quando regressam à aldeia os irmãos que migraram para Lisboa; os irmãos que ficaram olham para os irmãos lisboetas e sentem que também podiam ter tido aquela roupa fina e aquela mulher decotada. A ascensão social pode ser dolorosa.
A causa não é a pobreza, porque muita gente bem na vida marca um encontro com a corda, a caçadeira, o veneno (605 forte) ou o poço. O tio Jacintinho, o grande detonador deste livro, vivia bem, era seareiro; no dia em que andei por Fornalhas e Vale de Santiago, matou-se um homem nos Foros da Casa Nova que tinha andado na escola com a minha mãe – vivia bem, fazia arroz. »
Alentejo Prometido (da coleção Retratos da Fundação, editada pela Fundação Francisco Manuel dos Santos). Henrique Raposo .
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