terça-feira, 27 de setembro de 2016

Poema do beber no antigamente


dobro a esquina da memória
a mais próxima dos amigos de então

e ali fico
sob a luz que no poste
me derrama em mil sombras
que uma a uma reconheço

o que fui        o que sou
o que um dia quiseram que eu fosse
                                                     mas não fui
o que nunca por nada serei
o que tudo fizeram por não ser
                                                    mas fui
o que a esquina da memória dobrou
e no poste     sob a luz                 se inspirou

sou eu       não sou
na dialéctica da vida
fui aquele que nunca foi
sou aquele que sempre será

assim
a beber no antigamente
ficou-me a sede
do eternamente    


(1974)
Silêncio escancarado, 1982


Rui Nogar in 50 Poetas Africanos. Plátano Editora, 1ª Edição, Lisboa., p. 391

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