domingo, 11 de dezembro de 2011

ORAÇÃO DA NOITE

«Vivo sentado, como um anjo nas mãos de um barbeiro,
Empunhando uma caneca de estrias profundas,
Com o hipogastro e o colarinho arqueados, um gambier
Entre dentes, numa atmosfera prenhe de impalpáveis veleiros.

Como se fossem excrementos quentes de um velho pombal,
Mil Sonhos cavam em mim doces queimaduras:
Logo depois o meu coração triste fica como um alburno
Que o ouro jovem e sombrio das cores ensanguenta.

Em seguida, quando já engoli meus sonhos cuidadosamente,
Volto-me, com trinta ou quarenta cervejas no papo,
E concentro-me para fazer as minhas necessidades ásperas:

Doce como o Senhor do cedro e do hissopo,
mijo para os céus castanhos, muito alto e muito longe,
com a concordância dos grandes heliotrópios.»





Arthur Rimbaud. O Rapaz Raro. Iluminações e poemas. Tradução de Maria Gabriela Llansol. Relógio D' água, Lisboa, 1998., p. 183

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