Tu sobreviver-me-ás, meu bom e velho cimento,
como eu sobrevivi, parece, a alguns homens que
me tomaram, também, por uma espécie de arruamento
e citavam a cor dos olhos, ou o semblante.
Por isso, não por inveja, mas porque somos parentes,
gabo o teu inanimado, poroso aspecto
-menos duradouro, padecendo de juntas trementes,
mas mesmo assim grato ao arquitecto.
Aplaudo-te as origens humildes - insignificantes,
melhor dito - o rugido selvagem, o grasnido hiante
que uma finalidade abstracta no entanto combina
perfeitamente e está fora do meu alcance.
Não porque o igual reproduza o igual,
mas porque o futuro prefere acorrer a um
encontro absolutamente imprevisível
e se envolve em longo e petrificante manto.
1995
Iosif Brodskii. Paisagem Com Inundação. Edição Bilingue. Introdução e tradução de Carlos Leite. Edições Cotovia, Lisboa, 2001., p.209
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