terça-feira, 13 de abril de 2010

Dois Sonetos Morais à Crítica Lusitana de Poesia e à Mesma Poesia em Relação com aquela Crítica, e referentes ao ano de 1970 da Salvação do Mundo

1

Surdos a versos, só do tururum
da banza pinicada vos sentis
molhados entre as pernas. Ou fingis
que imagens e metáforas zunzuns


sem pés e sem cabeça ou piço algum
vos dão na verborreia o que o nariz
de música não saber ser juiz.
E delicados logo uivais se algum

verso mais limpo do que as vossas cuecas,
mais nu de inventos do que de existência,
mais nobre que cantiga de pilecas,

se encrava abrupto na flatulência
de vossas tão francesas bibliotecas.
Ou vos descobre o horror de haver consciência.


2

De cu pró ar contando os sons concretos,
ou co'a mão esquerda em realistas pívias,
ou de tutu e em pontas académicas,
ou boca aberta língua e lábios prontos

a provocar na goela surrealista
toda a tesão dos deuses palavrosos,
os lusos da poesia se preparam
sob as visitas simpáticas da PIDE

que já PIDE não é no nome apenas.
E porque os prelos como putas abrem
a quem lhes paga mesmo mal, as pernas,

às vezes parem livros que os Gaspões
e os outros muitos à semana lambem,
buscando com ardor a esporra seca neles.


Dezembro de 1970


Jorge de Sena in Dedicácias. Guerra e Paz, Editores, 2010; pp. 71/2

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