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quinta-feira, 11 de agosto de 2011

«Estás a exagerar, como faz sempre a juventude, vês as coisas mais insignificantes como se fossem grandes excepções.»


Franz Kafka. Carta ao Pai. Trad. João Barrento. 1ª edição. Edições Quasi, 2008., p. 54
«Entre mim e ti não chegou a haver propriamente luta, eu fiquei fora de combate em pouco tempo, e o que restou foi a fuga, a amargura, a tristeza, o debate interior.»



Franz Kafka. Carta ao Pai. Trad. João Barrento. 1ª edição. Edições Quasi, 2008., p. 47

Ottla

«Tu próprio me confessaste que ela só te traz sofrimentos e desgostos, e que o faz de propósito; e enquanto tu sofres por causa dela, ela não se ressente e até se alegra. Uma espécie de diabo, em suma. Um desconhecimento tão grande só pode resultar de um afastamento ainda maior do que existe entre ti e mim. Ela está tão distante de ti que tu quase já não a vês e colocas um fantasma no lugar onde julgas vê-la. Reconheço que a relação com ela foi mais difícil do que qualquer outra.»



Franz Kafka. Carta ao Pai. Trad. João Barrento. 1ª edição. Edições Quasi, 2008., p. 46/7

Chamavas aos empregados «inimigos assalariados»

«Chavamas aos empregados «inimigos assalariados», e eles eram isso mesmo, mas antes de chegarem a sê-lo já tu me parecias ser o inimigo que lhes pagava o salário. Foi aí que aprendi a grande lição, a de que também eras capaz de ser injusto; por mim, não teria reparado nisso tão cedo, havia demasiado sentimento de culpa acumulado e a dar-te razão; mas ali, achava eu, na minha opinião infantil - que mais tarde corrigi, mas não muito -, ali havia gente estranha que trabalhava para nós e vivia num permanente medo de ti. É claro que também nisto exagerava um pouco, porque partia do princípio de que a tua acção sobre essas pessoas era tão terrível como sobre mim próprio.»
 
 
 

Franz Kafka. Carta ao Pai. Trad. João Barrento. 1ª edição. Edições Quasi, 2008., p. 40/1 

insultavas sem pensar no que dizias

Franz Kafka. Carta ao Pai. Trad. João Barrento. 1ª edição. Edições Quasi, 2008., p.27

quarta-feira, 10 de agosto de 2011

«A tua simples presença física já me esmagava. Lembro-me, por exemplo, de quando nos despíamos juntos numa cabine. Eu, magro, fraco, esguio; tu, forte, alto, largo. Logo na cabine, já me sentia uma figura lamentável, não apenas perante ti, mas perante o mundo inteiro, porque tu eras para mim a medida de todas as coisas. E ao sairmos da cabine e enfrentarmos as pessoas, eu pela tua mão, um pequeno esqueleto inseguro e descalço sobre as tábuas, com medo da água, incapaz de imitar os teus movimentos a nadar, que repetias, com as melhor das intenções, mas na verdade para minha profunda humilhação - nessas alturas eu entrava em desespero e todas as minhas piores experiências, em todos os campos, se encontravam em grandiosa convergência. Sentia-me sempre muito melhor quando tu mudavas de roupa em primeiro lugar e eu ficava sozinho na cabine, adiando quanto podia a vergonha de sair, até tu voltares para me arrancares dali. E ficava-te grato por não pareceres dar pela minha aflição, e tinha orgulho do corpo do meu pai. Aliás, estas diferenças entre nós continuam a existir ainda hoje.
    A isto juntava-se ainda a tua supremacia intelectual. Chegaras tão longe à tua própria custa, e por isso tinhas essa confiança sem limites nas tuas opiniões. Em criança não ficava tão fascinado com isso como quando comecei a entrar na adolescência. Tu governavas o mundo a partir da tua poltrona. A tua opinião era a única correcta, todas as outras eram absurdas, exageradas, bizarras, anormais. E a confiança que tinhas em ti era tão grande que nem sequer precisavas de ser coerente, mas nunca deixavas de ter razão. Acontecia até não teres opinião sobre um assunto, e consequentemente consideravas liminarmente falsas todas as opiniões possíveis sobre ele.»





Franz Kafka. Carta ao Pai. Trad. João Barrento. 1ª edição. Edições Quasi, 2008., p.16/7

«Eu era uma criança assustadiça, e apesar disso também teimosa, como são em geral as crianças.»


Franz Kafka. Carta ao Pai. Trad. João Barrento. 1ª edição. Edições Quasi, 2008., p.12
«É bem possível que, se eu tivesse crescido à margem da tua influência, acabasse também por não ser uma pessoa que o teu coração aprovasse.»



Franz Kafka. Carta ao Pai. Trad. João Barrento. 1ª edição. Edições Quasi, 2008., p.10
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