«Olhei mecanicamente para a rapariga que entrara e vislumbrei uma face fresca, jovem, algo pálida, com sobrancelhas direitas e escuras e com olhos sérios, interrogativos, que me atraíram de imediato; tê-la-ia odiado se estivesse a sorrir. Comecei a olhar para ela com mais atenção e, por assim dizer, esforçadamente. Ainda não tinha conseguido pôr ordem nos meus pensamentos. Havia algo de simples e de boa índole nas feições dela, mas também algo estranhamente sério. Tenho a certeza que isso a prejudicava naquele lugar e que nenhum dos outros tolos havia reparado nela. Contudo, não se podia dizer que era uma beldade, embora fosse alta, aparentemente forte e com boa estatura. Estava vestida de forma simples. Alguma coisa detestável se agitou dentro de mim. Fui logo ter com ela.
Por acaso olhei para o espelho. Achei que o meu rosto perturbado era extremamente repugnante, pálido, irado, abjecto, com o cabelo desalinhado.
«Não importa, fico contente», pensei. «Fico contente por parecer repulsivo aos olhos dela. Isso agrada-me.»
Fiódor Dostoiévski. Notas do Submundo. Trad. Rosário Morais da Silva. Publicações Europa-América, Lisboa, 2007., p. 78/9
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