«Não te tomam a sério porque nunca andaste de braço dado com eles pelos sol-e-dós da política nem juraste morte ao padre no altar da deusa Razão. A tua insistência em querer abrir uma porta que te está fechada toca as raias da paranóia. Queres dar cabo de ti, dize, tomando semelhante tóxico?...Coitado, podias adoptar melhor processo! Mas se é assim, se andas realmente insatisfeito com a vida, se é possível caber tal absurdo no espírito dum homem dotado de tudo quanto pode gerar a felicidade, vale mais suicidares-te. Porque não te suicidas? É mais elegante, maças menos os teus amigos, incomodas por uma vez a família. Olha, Ricardo, não leves a mal - e se levas, pouco importa - mas permite que, em nome daquela correcção fraterna de que nos falavam os padres de S.Fiel, te aconselhe a reflectir, a reflectir e dar volta ao miolo de modo a trazeres para a vida activa, quer dizer, para a vida quotidiana, o resto do juízo que ainda possas conservar.»
Aquilino Ribeiro. O Arcanjo Negro. Livraria Bertrand, 1960., p.103
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