«-Há casais que têm quartos separados - dizia Stefan. - Eu preciso de um lugar onde possa fechar-me de quando em quando sem que ninguém saiba onde estou.
-...Imaginas que lá, no teu quarto secreto, eu não posso acompanhar-te em espírito...Como se eu não tivesse adivinhado...Como se eu não soubesse que te fechas lá para fazer outra coisa que não seja ler romances!...
Stefan evitava falar de literatura quando estavam sós. Ao entrar em casa, a meio da noite, encontrava-a muitas vezes a ler. Ioana notava às vezes que ele lançava um olhar ao título, mas nunca lhe perguntava o que lia. Em casa, junto dela, Stefan nunca lia romances. E no entanto a sua cultura espantava Ioana. Ela não podia avaliá-la senão por acaso, quando paravam em frente de uma montra ou então quando ela folheava uma revista e lia o título de um livro.
«Não presta», dizia ela, ou então: «Já li. É bastante interessante. Empresto-te, se quiseres.»
«Ele pensa que gosto de romances porque estive noiva de Partenie», pensava ela.
-...Claro! - continuara Ioana - adivinhei há muito tempo o que tu fazes lá no teu quarto secreto...Não devia dizer-to. Mas tu julgas-me mesmo assim muito ingénua. Há muito tempo que adivinhei! Adivinhei, na noite em que tu entraste com um cheiro de terebintina nas nãos. Tens lá um laboratório. Até é possível que não seja um quarto de hotel. Tu trabalhas num laboratório...»
Mircea Eliade. Bosque Proibido. Tradução de Maria Leonor Buescu. Editora Ulisseia, Lisboa, 1963., p. 18-19