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domingo, 16 de junho de 2013
O sol declinara no horizonte. As ilhas de nuvens haviam-se feito mais densas e deslizavam diante do sol. Os rochedos tornavam-se subitamente sombrios. O trémulo cardo marinho passava de azul a prateado e sombras impelidas pelo vento deslizavam sobe o mar como pedaços de tecido cinzento. As ondas já não atingiam as poças mais distantes, nem alcançavam a linha negra que estendia o seu traçado irregular sobre a praia. A areia tinha uma cor de pérola, suave e brilhante.
Os pássaros volteavam em pleno céu. Alguns deslizavam velozmente nos corredores de vento, giravam e separavam-se como se fossem mil fragmentos de um mesmo corpo. Tombavam do cimo das árvores como uma rede. Um deles voou solitariamente em direcção aos campos e pousou numa estaca branca, abrindo e fechando as asas.
No jardim, algumas pétalas tinham caído. Repousavam sobre a terra como conchas. A folha morta já não jazia na beirada; o vento apoderara-se dela, elevando-a e deixando-a cair e tinha-a largado junto dum silvado. Em todas as flores passava a mesma onda de luz, num repentino frémito e esplendor, como se uma barbatana fendesse o verde cristal de um lago. Às vezes uma forte rajada de vento fazia balouçar simultaneamente as inumeráveis folhas; depois, quando o vento passava, cada folha recuperava a sua identidade. Os claros discos das flores brilhavam ao sol; afastavam-se da luz ao serem agitadas pelo vento e algumas cabeças demasiado pesadas para voltarem a erguer-se ficavam ligeiramente inclinadas.
O sol da tarde aquecia os campos, azulava as sombras. avermelhava o trigo. Os campos brilhavam ao sol como se tivessem sido envernizados. Uma carroça , um cavalo, um bando de gralhas, tudo o que se movia sob a luz do sol parecia banhado a ouro. Ao moverem as patas, as vacas provocavam ondulações de ouro avermelhado e os seus chifres pareciam revestidos de luz. Feixes de trigo louro jaziam nas sebes, perdidos pelos carros baixos e primitivos que chegavam dos campos. As nuvens arredondadas no céu sem perderem sequer o átomo da sua forma. Ao passarem numa aldeia colhiam-na por inteiro na sua rede de sombras e ao afastarem-se deixavam-na de novo livre. Longe, muito longe no horizonte, entre milhões de grãos de poeira de um azul-cinza, via-se arder um vidro ou destacar-se uma silhueta solitária de um campanário ou de uma árvore.
As cortinas vermelhas e as persianas brancas agitavam-se embatendo no rebordo da janela e a luz que entrava em convulsões irregulares tinha um tom acastanhado e um certo ar de abandono ao passar pelas cortinas atormentadas pelo vento. Dava um tom acastanhado a um armário, avermelhava uma cadeira e fazia a janela ondular no flanco do jarro verde.
Por um instante tudo vacilou, tudo mergulhou numa atmosfera de ambígua incerteza, como se uma grande mariposa flutuando no quarto tivesse ensombrecido com as suas asas trementes a imensa solidez das cadeiras e das mesas.
Virginia Woolf. As ondas. Tradução de Francisco Vale. Relógio D'Água., p.146/7
«É um grande alívio ter alguém a quem podemos chamar a atenção para qualquer coisa. Ou então com que se possa estar em silêncio. Ou com ele seguir as obscuras veredas da mente e penetrar no passado, visitar livros, afastar os seus ramos e colher os frutos.»
Virginia Woolf. As ondas. Tradução de Francisco Vale. Relógio D'Água., p.144
''um pôr do sol invernal na extensão dos campos''
Virginia Woolf. As ondas. Tradução de Francisco Vale. Relógio D'Água., p.144
quarta-feira, 1 de maio de 2013
domingo, 28 de abril de 2013
«Não andes mais. Tudo o resto é dor e mentira. O fim é aqui.»
Virginia Woolf. As ondas. Tradução de Francisco Vale. Relógio D'Água., p. 111
« - Estas águas rumorejantes, disse Neville, sobre as quais construímos as nossas loucas plataformas, são, apesar de tudo, mais estáveis que os gritos selvagens, inconsequentes e frágeis que soltamos quando tentamos falar, quando raciocinamos e pronunciamos do género «eu sou isto...eu sou aquilo». A linguagem mente.
Virginia Woolf. As ondas. Tradução de Francisco Vale. Relógio D'Água., p. 110
segunda-feira, 8 de abril de 2013
«Nestes momentos eu não sou eu.»
Virginia Woolf. As ondas. Tradução de Francisco Vale. Relógio D'Água., p. 93
«Devo estender-lhe a mão; responder. Mas que resposta dar? Retrocedo com violência, sentindo escaldar o corpo desajeitado e exposto à indiferença e ao desdém dos homens, eu que imagino colunas de mármore e lagos onde as andorinhas molham as asas de ouro do outro lado do mundo.»
Virginia Woolf. As ondas. Tradução de Francisco Vale. Relógio D'Água., p. 86
«Sou sucessivamente travessa, alegre, lânguida e melancólica. Tenho raízes mas flutuo.»
Virginia Woolf. As ondas. Tradução de Francisco Vale. Relógio D'Água., p. 83
«É cruel o que tenho oferecer. Não posso flutuar suavemente misturando-me com as outras pessoas. Prefiro o olhar fixo dos pastores que encontro na estrada; ou o olhar das ciganas sentadas na berma da estrada, ao lado da carroça, amamentando os filhos como eu hei-de amamentar os meus. Pois em breve, no ardente meio-dia em que as abelhas zumbem à volta das malvas, o meu amor chegará. Estará parado sob o cedro. Dirá apenas uma palavra a que responderei com uma só palavra. Ofertar-lhe-ei o que cresceu dentro de mim. Terei filhos, criadas de avental, caseiros com forquilhas. Terei uma cozinha para onde vão trazer os cordeiros doentes para serem aquecidos em cestos e haverá presuntos pendurados e cebolas brilhando. Serei silenciosa como a minha mãe e de avental azul andarei pela casa fechando à chave os armários.» p. 80/1
Virginia Woolf. As ondas. Tradução de Francisco Vale. Relógio D'Água., p. 80/1
«Não estou sempre a entregar-me a emoções duvidosas? Sim, quando me debruço à janela e deixo cair o meu cigarro de modo a que rodopie ligeiramente até ao chão, sinto os olhos de Louis que vigiam até a queda do meu cigarro. E Louis diz: «Tudo isto tem um significado. Mas qual?»
Virginia Woolf. As ondas. Tradução de Francisco Vale. Relógio D'Água., p. 75/6
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