Hoje ninguém veio perguntar alguma coisa;
nem nesta tarde ninguém me pediu nada,
Não vi sequer uma flor de cemitério
em tão alegre procissão de luzes.
Perdoa-me Senhor: morri tão pouco!
Nesta tarde todos, todos passam
sem nada me perguntar nem pedir nada.
E não sei o que esquecem e que fica
e minhas mãos tão mal, qual coisa alheia.
Saí até à porta,
tenho vontade de gritar a todos:
Se alguma coisa vos falta, ela está aqui!
Porque em todas as tardes desta vida,
não sei que portas nos atiram na cara
e algo estranho se apodera da minha alma.
Não veio ninguém hoje;
e que pouco hoje nesta tarde morri!
César Vallejo. Antologia Poética. Selecção, tradução, prólogo e notas de José Bento. Relógio D' Água, Lisboa, 1992., p. 32