couraçado


adjectivo
1. revestido de couraça
2.figurado protegido
3. figurado endurecido
4. figurado que não se deixa comover; endurecido

quarta-feira, 28 de dezembro de 2011

«Perante o seu olhar, de onde a minha própria alma parecia contemplar-me, toda a verdade se desmoronou, mesmo a verdade do desejo carnal que tinha por ela. Enfeitiçados, olhavamo-nos; a minha alma pobre e pequena olhava-me.»


Hermann Hesse. O Lobo das Estepes. Tradução de Sara Seruya. Edições Afrontamento. 3.ª edição., p. 179

terça-feira, 27 de dezembro de 2011

Razão tem-la tu toda, Lobo das Estepes

«Razão tem-la tu toda, Lobo das Estepes, mil vezes razão, mas mesmo assim tens de desaparecer. És demasiado exigente e esfomeado para um mundo como o de hoje, simples, cómodo e contente com tão pouco, é esse mundo que te vomita para fora, tens para ele uma dimensão a mais.»

Hermann Hesse. O Lobo das Estepes. Tradução de Sara Seruya. Edições Afrontamento. 3.ª edição., p. 156/7

«Tenho sede de um sofrimento que me dê disposição e vontade de morrer»

Hermann Hesse. O Lobo das Estepes. Tradução de Sara Seruya. Edições Afrontamento. 3.ª edição., p. 155

segunda-feira, 26 de dezembro de 2011

«De um momento para o outro ressurgiam coisas que me tocavam de perto, em que eu podia pensar com alegria, preocupação, excitação! De um momento para o outro abria-se uma porta através da qual a vida irrompia e vinha até mim! Talvez eu pudesse voltar a viver, talvez pudesse voltar a ser um homem...A minha alma, entorpecida pelo frio, quase gelada, voltava a respirar, batia sonolenta, as suas asas miúdas e débeis.»


Hermann Hesse. O Lobo das Estepes. Tradução de Sara Seruya. Edições Afrontamento. 3.ª edição., p. 107
«Pães deitados nos vales de cinza!»


Arthur Rimbaud. O Rapaz Raro. Iluminações e poemas. Tradução de Maria Gabriela Llansol. Relógio D' água, Lisboa, 1998., p. 233
«Não há nada que me cause ilusões;»


Arthur Rimbaud. O Rapaz Raro. Iluminações e poemas. Tradução de Maria Gabriela Llansol. Relógio D' água, Lisboa, 1998., p. 219
«A estrela choveu rosa no coração da tua escuta,
O infinito rolou alvo no teu corpo, da nuca aos rins,
O mar orvalhou ruivo os teus seios de rubro cobre
E o homem sangrou negro no teu flanco sem fim.»




Arthur Rimbaud. O Rapaz Raro. Iluminações e poemas. Tradução de Maria Gabriela Llansol. Relógio D' água, Lisboa, 1998., p. 207

ORAÇÃO DA NOITE

«Vivo sentado, como um anjo nas mãos de um barbeiro,
Empunhando uma caneca de estrias profundas,
Com o hipogastro e o colarinho arqueados, um gambier
Entre dentes, numa atmosfera prenhe de impalpáveis veleiros.

Como se fossem excrementos quentes de um velho pombal,
Mil Sonhos cavam em mim doces queimaduras:
Logo depois o meu coração triste fica como um alburno
Que o ouro jovem e sombrio das cores ensanguenta.

Em seguida, quando já engoli meus sonhos cuidadosamente,
Volto-me, com trinta ou quarenta cervejas no papo,
E concentro-me para fazer as minhas necessidades ásperas:

Doce como o Senhor do cedro e do hissopo,
mijo para os céus castanhos, muito alto e muito longe,
com a concordância dos grandes heliotrópios.»





Arthur Rimbaud. O Rapaz Raro. Iluminações e poemas. Tradução de Maria Gabriela Llansol. Relógio D' água, Lisboa, 1998., p. 183
«As minhas estrelas tinham um doce sussurrar de seda.»


Arthur Rimbaud. O Rapaz Raro. Iluminações e poemas. Tradução de Maria Gabriela Llansol. Relógio D' água, Lisboa, 1998., p. 181

O QUE DORMIA NO VALE

É uma cova de verdura onde canta uma ribeira
Prendendo loucamente às ervas farrapos
De prata; nele brilha o sol, do alto da montanha
Orgulhosa: é um pequeno valado que espuma farpas.

Um soldado jovem, de boca aberta, cabeça nua,
E a nuca mergulhando nos frescos agriões azuis,
Dorme; está estendido na relva, a céu aberto,
Pálido no seu leito verde onde chove a luz.

Com os pés nos gladíolos, dorme. Sorrindo como
Sorriria uma criança doente, dorme um sono:
Natura, embala-o junto ao peito: ele está com frio.

Não há perfume que faça estremecer suas narinas;
Dorme ao sol, a mão sobre o peito
Tranquilo. No seu lado direito, tem dois buracos vermelhos.

Outubro de 1870.




Arthur Rimbaud. O Rapaz Raro. Iluminações e poemas. Tradução de Maria Gabriela Llansol. Relógio D' água, Lisboa, 1998., p. 173

«Que coisas não veremos nós, minha querida,
            Nesses casebres,
Quando a luz lhes alumia, clara,
          As vidraças cinzentas!...»



Arthur Rimbaud. O Rapaz Raro. Iluminações e poemas. Tradução de Maria Gabriela Llansol. Relógio D' água, Lisboa, 1998., p. 159

«Falaria contigo na tua própria boca»

«Falaria contigo na tua própria boca:
               Caminharia, apertando-te
O corpo como uma criança que se deita,
               Louco com o sangue

Que corre, azul, sob a tua pele branca
          Rosácea:
E falando-te com a língua livre....
    Ora!...tu sabes como é...»





Arthur Rimbaud. O Rapaz Raro. Iluminações e poemas. Tradução de Maria Gabriela Llansol. Relógio D' água, Lisboa, 1998., p. 155-157
« - Eu olhava, cor de cera,
Para um raio de luz bravio
A borboletear no seu sorrir
E sobre o seu seio - mosca na roseira. »



-----


«O riso fingia que punia!»




Arthur Rimbaud. O Rapaz Raro. Iluminações e poemas. Tradução de Maria Gabriela Llansol. Relógio D' água, Lisboa, 1998., p. 149
(...)

«Quanto a mim, desleixado como um estudante à sombra
Dos castanheiros, não tiro os olhos das miúdas de olho vivo:
Sabem-no elas tão bem; e voltam para mim, rindo,
Aqueles olhos transbordantes de coisas indiscretas.

Deixo-me estar calado; não paro de olhar continuamente
Aqueles pescoços brancos bordados de madeixas loucas:
Sigo, sob o corpete e os frágeis atavios, a divina
Colina que desponta a seguir à curva dos ombros redondos.

Não tarda nada, já descobri onde se esconde a botina, a meia...
-Reconstruo-lhes o corpo, ateado por uma febre das antigas.
Elas acham-me graça, e entrefalam-se baixinho...
E meus desejos brutais agarram-se aos lábios delas...»



Arthur Rimbaud. O Rapaz Raro. Iluminações e poemas. Tradução de Maria Gabriela Llansol. Redógio D' água, Lisboa, 1998., p. 145


«Doença do espírito - do eu - o desespero pode, enquanto tal,
   tomar três formas: o desespero inconsciente de ter um eu
         - o que é um verdadeiro desespero - ;
         o desesperado que não quer, e o
         desesperado que quer ser ele próprio.»


Kierkegaard. Desespero A Doença Mortal. Tradução de Ana keil. RÉS-Editora, Porto, p. 11
«Porque será que os espíritos que já não admitem quaisquer valores persistem em levantar, pelo seu lado, exigências? Alimentam-se do facto de um dia terem existido deuses, pais, poetas. A existência das palavras dilui-se em títulos ocos.
    Há no reino animal parasitas que pela calada desenterram uma lagarta. Por fim, apenas se esgueira para fora do ovo uma vespa, no lugar da borboleta. Assim manuseiam eles a herança, e sobretudo a língua, falsários de moedas como são; é por isso que prefiro casbah, mesmo atrás do balcão do bar.»



Ernst Jünger. Eumeswil. Tradução de Sara Seruka com a colaboração de João Barrento para a Tradução dos Poemas. Editora Ulisseia., p. 60/1

«Alguns anos depois, tinham desaparecido todos os vestígios da ferida.»


Ernst Jünger. Eumeswil. Tradução de Sara Seruka com a colaboração de João Barrento para a Tradução dos Poemas. Editora Ulisseia., p. 59

o sentimentalismo vergava-o, contra a sua vontade

« (...), mas saboreei, como um cão esfaimado, a migalha de calor, o gole de afeição, o naco de apreço. Enternecido, o Lobo das Estepes, Harry, mostrava os dentes num sorriso, escorrendo-lhe a baba pela goela ressequida; o sentimentalismo vergava-o, contra a sua vontade.»




Hermann Hesse. O Lobo das Estepes. Tradução de Sara Seruya. Edições Afrontamento. 3.ª edição., p. 81
«Como se tinha apoderado de mim, assim tão lenta e sorrateiramente, aquela paralisia, aquele ódio contra mim e contra todos, aquele bloqueamento de todos os sentimentos, aquele humor agreste profundo e despeitoso, aquele antro de imundície do coração esvaziado e do desespero?»


Hermann Hesse. O Lobo das Estepes. Tradução de Sara Seruya. Edições Afrontamento. 3.ª edição., p. 80

QUADROS

   «A antiga Comédia continua as suas afinações, e reparte os seis Idílios.
     Avenidas de palcos.
     Um longo dique em madeira, de uma ponta a outra de um campo pedregoso, onde a multidão incivilizada se passeia sob as árvores nuas.
     Em corredores de gaze negra, seguindo o ritmo dos passeantes, ornados de lanternas e de folhas.
      Aves dos mistérios descem a pique sobre um pontão de alvenaria movido pelo arquipélago atulhado pelas embarcações dos espectadores.
     Cenas líricas acompanhadas a flauta e tambor debruçam-se em recantos arranjados sob os tectos, em redor dos salões de clubes modernos, ou das salas do antigo Oriente.
     O maravilhoso manobra no topo de um anfiteatro coroado de sebes - ou se agita e sintoniza com os Beócios, à sombra do arvoredo que se mexe à esquina das culturas.
    A ópera-cómica refracta-se sobre um palco no ponto de intersecção de dez separadores montados entre a geral e a rampa.»






Arthur Rimbaud. O Rapaz Raro. Iluminações e poemas. Tradução de Maria Gabriela Llansol. Relógio D' água, Lisboa, 1998., p. 117

« - Uma rajada de vento dispersa os limites da lareira.»


Arthur Rimbaud. O Rapaz Raro. Iluminações e poemas. Tradução de Maria Gabriela Llansol. Redógio D' água, Lisboa, 1998., p. 93
(...)

«Ri-me para a queda da água que, por entre os pinheiros, desgrenhava a sua cabeleira loura: pela crina prateada, reconheci a deusa.

  Então, um a um, levantei os véus. Na alameda, agitando os braços. Pela planície, onde a denunciei ao galo. Na grande cidade, a deusa fugia através de cúpulas e campanários e, correndo no cais de mármore como um mendigo, fui atrás dela.

  Ao cimo da estrada, perto da mata de loureiros, cobria com os seus véus arrebanhados a esmo, e senti, ao de leve, o seu corpo imenso. A madrugada e a criança caíram aos pés do bosque.
   Ao despertar, era meio-dia.»




Arthur Rimbaud. O Rapaz Raro. Iluminações e poemas. Tradução de Maria Gabriela Llansol. Redógio D' água, Lisboa, 1998., p. 89

pusilânime


adj. 2 g
1. Excessivamente tímido.
2. Que não tem coragem para reagir.
3. Que dá indícios de pusilanimidade.
 
s. 2 g.
4. Aquele que tem fraqueza de ânimo ou cobardia.

Esse Lobo das Estepes tinha de morrer...

«Esse Lobo das Estepes tinha de morrer, tinha de pôr termo, pela sua própria mão, à sua odiosa existência - ou então, fundido no fogo mortal de uma renovada inspecção a si próprio, transformar-se, arrancar a máscara e recriar um novo eu. Ah! Este processo não era novo nem desconhecido, conhecia-o bem, já várias vezes o experimentara nos estádios de supremo desespero.»



Hermann Hesse. O Lobo das Estepes. Tradução de Sara Seruya. Edições Afrontamento. 3.ª edição., p. 73

«De neve sacio a minha goela ardente,
E a minha pobre alma ao diabo entrego.»

Hermann Hesse. O Lobo das Estepes. Tradução de Sara Seruya. Edições Afrontamento. 3.ª edição., p. 72

ulular

               
      (latim ululo, -are, uivar)   

v. intr.

1. Soltar voz triste e lamentosa.
2. Uivar; ganir.
3. [Figurado] [Figurado] Gritar aflitivamente; queixar-se, gritando.
v. tr.
4. Exprimir, gritando lamentosamente. = VOCIFERAR
s. m.
5. Ululação, uivo.

presciência

 
s. f.
1. Qualidade de quem é presciente.
2. Pressentimento, previsão.

«Supões, como Fausto, que duas almas já são demais para um só peito, e a acabam por despedaçá-lo.»


Hermann Hesse. O Lobo das Estepes. Tradução de Sara Seruya. Edições Afrontamento. 3.ª edição., p. 66
«No entanto, no cúmulo da felicidade alcançada, Harry apercebeu-se subitamente de que a sua liberdade era uma morte, que estava sozinho, que o mundo o deixava sinistramente em paz, que ele próprio já não ligava nada às pessoas, aliás nem tão pouco a si próprio, que lentamente ia asfixiando numa atmosfera cada vez mais rarefeita de vedação e isolamento.»



Hermann Hesse. O Lobo das Estepes. Tradução de Sara Seruya. Edições Afrontamento. 3.ª edição., p. 53

sábado, 3 de dezembro de 2011

sexta-feira, 2 de dezembro de 2011

Uma das características do Lobo das Estepes era ser um homem nocturno.

«Uma das características do Lobo das Estepes era ser um homem nocturno. Para ele a manhã era a pior hora do dia. receava-a e dela nunca lhe adviera nada de bom. Jamais, em manhã alguma da sua vida, estivera propriamente bem disposto, jamais, em hora alguma antes do meio dia, fizera qualquer coisa de bom ou tivera algum bom pensamento, jamais conseguira propiciar alegria a si próprio e a outros. Só com o decorrer da tarde ia lentamente aquecendo e animando, e fecundo, vivo, ocasionalmente ardente e jovial.»



Hermann Hesse. O Lobo das Estepes. Tradução de Sara Seruya. Edições Afrontamento. 3.ª edição., p. 51/2
«Era infeliz a maior parte do tempo, isso não vamos negar, e sabia também fazer infelizes os outros, sobretudo quando gostava deles e eles de si.»


Hermann Hesse. O Lobo das Estepes. Tradução de Sara Seruya. Edições Afrontamento. 3.ª edição., p. 49

Vieram-me então à memória os anos esquecidos da juventude...

«Vieram-me então à memória os anos esquecidos da juventude - como amava então essas noites sombrias e pesadas de outono e inverno tardio, e com que sofreguidão e embriaguês absorvia as impressões de solidão e melancolia!»


Hermann Hesse. O Lobo das Estepes. Tradução de Sara Seruya. Edições Afrontamento. 3.ª edição., p. 35

quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

Este manuscrito

«Representa textualmente uma viagem através do inferno, viagem ora amedrontada, ora destemida, através do caos de um mundo espiritual obscurecido, empreendida com a firme determinação de cruzar o inferno de lés-a-lés, de oferecer o flanco ao caos, de suportar o mal até ao fim.»

Hermann Hesse. O Lobo das Estepes. Tradução de Sara Seruya. Edições Afrontamento. 3.ª edição., p. 27

lucubração


nome feminino
1. trabalho intelectual nas horas destinadas ao repouso; serão; vigília
2. meditação profunda

(Do latim lucubratiōne-, «idem»)
«Não, estou convencido que não se suicidou. Ainda está vivo, arrastando algures as pernas cansadas para subir ou descer as escadas de casas em nada suas, fixando algures, deliciado, soalhos de parqué com lustro puxado e araucácias impecavelmente cuidadas, passando os dias nas bibliotecas e as noites nas cervejarias ou preguiçando nalgum divã alugado, sentindo pulsar para lá dos vidros o mundo e as pessoas, sabendo-se excluído - mas não se mata, porque um rasto de fé lhe diz que tem de beber até à última gota aquele cálice, aquela amaldiçoada dor que tem no coração, e que é esse sofrimento que tem de lhe dar a morte.»



Hermann Hesse. O Lobo das Estepes. Tradução de Sara Seruya. Edições Afrontamento. 3.ª edição., p. 26

«Em vez de lhe aniquilarem a personalidade, apenas tinham conseguido ensiná-lo a odiar-se a si próprio.»

«Desde então e para toda a vida, era contra si próprio, contra esse objecto inocente e nobre que dirigia toda a genialidade da sua imaginação, toda a força da sua faculdade de pensamento, Pois ao desencadear antes de tudo e acima de tudo contra si próprio toda a acerbidade, todas as críticas, violências e repudiações de que se servia, era Cristo de pessoa inteira, era mártir de pessoa inteira. No que respeitava aos outros, ao mundo circundante, continuamente se esforçava, em luta das mais heróicas e sérias, por amá-los, fazer-lhes justiça, não lhes fazer mal, pois o ''amor ao próximo'' estava tão profundamente cravado nele como o ódio a si próprio; e assim toda a sua vida era um exemplo de que sem amor a si próprio também o amor ao próximo é impossível, que o ódio a si próprio é exactamente a mesma coisa que o egoísmo nu e cru, e acaba por gerar o mesmo sinistro isolamento, o mesmo desespero.»



Hermann Hesse. O Lobo das Estepes. Tradução de Sara Seruya. Edições Afrontamento. 3.ª edição., p. 17

«Apercebi-me de que Haller era um génio do sofrimento e que, no sentido de várias afirmações de Nietzsche, acumulara em si uma capacidade de sofrimento genial, ilimitada e terrível. Ao mesmo tempo reconheci que a base do seu pessimismo não era o desprezo pelo mundo mas sim o desprezo por si próprio pois, por impiedosa e destrutiva que fosse a crítica de pessoas ou instituições, nunca se excluía a si próprio de tal tratamento, e era contra si próprio que em primeiro lugar apontava a sua flecha, era a si próprio que antes de tudo odiava e reprovava.»


Hermann Hesse. O Lobo das Estepes. Tradução de Sara Seruya. Edições Afrontamento. 3.ª edição., p. 16

Harry Haller

«(...), e nas coisas do espírito mostrava a objectividade quase gelada, o sólido pensamento e o firme saber só próprio dos que são verdadeiramente intelectuais, despidos de toda a ambição, e jamais apostados em brilhar, persuadir ou ter a última palavra.»



Hermann Hesse. O Lobo das Estepes.  Tradução de Sara Seruya. Edições Afrontamento. 3.ª edição., p. 14
«Nasci em finais de época moderna, pouco antes de iniciar-se o retorno à Idade Média, sob o signo de Sagitário e a benévola influência de Mercúrio. O meu nascimento teve lugar num quente dia de Julho, à primeira hora do crepúsculo, e toda a vida gostei, e desejei inconscientemente, a temperatura daquela hora. Chorei-a dolorosamente quando me faltou. Nunca pude viver em países frios, e todas as viagens que fiz da minha livre vontade foram em direcção ao Sul.»



Hermann Hesse em 1972, época em que foi publicado O LOBO DAS ESTEPES

CIDADES (II)

     «Isto são cidades! Uma gente para quem foi produzido o espectáculo desses Apalaches e Líbanos de sonho. Chalés de cristal e de madeira que se deslocavam sobre linhas férreas e roldanas invisíveis. As velhas crateras, cingidas de colossos e palmeiras de cobre, rugem melodiosamente nas fornalhas. Festins de amor ressoam sobre canais suspensos nas traseiras dos chalés. Um mecanismo de carrilhões brada nas gargantas. Corporações de cantores gigantes acorrem em tranjos e auriflamas tão deslumbrantes como a luz dos cimos. Sobre plataformas, no meio dos abismos, Rolandos proclamam a sua bravura. Nas pontes suspensas sobre o precipício e nos telhados de retiros erótico-gastronómicos, a ardência do céu embandeira em arco. O desabar das apoteoses regressa às regiões celestes onde seráficas fêmeas de centauros dançam entre as avalanchas. Para lá das mais altas cristas, um mar revolto, carregado de frotas orfeónicas e do rumor das pérolas e dos búzios preciosos, perturba-se com o eterno nascimento de Vénus -, por vezes, o mar atravessa momentos sombrios com um mortal estrépido. Pelas encostas, bramem colheitas de flores, grandes como as nossas armas e as nossas taças. Das ravonas, emergem cortejos de Mabs vestidas de ruivo, de opalino. Lá no alto, com as patas metidas entre cascatas e silvas, os veados mamam em Diana. As Bacantes da periferia soluçam, enquando a lua incendiada uiva. Vénus penetra nas caveras dos ferreiros e dos eremitas. Campanários em bandos cantam os ideários dos povos. De castelos feitos d'ossos, exala-se a melodia desconhecida. Entram em evolução todas as lendas e ímpetos do entusiasmo saem desalmados às ruas da cidade. Soçobra o paraíso das tempestades. Os selvagens, ininterruptos, dançam a festa da noite. E, por uma hora, misturei-me ao bulício de um bulevar de Bagdad onde vários bandos cantaram a alegria do trabalho do novo, debaixo de uma brisa densa, circulando sem conseguir fingir que não viam os fantasmas fabulosos dos montes onde nós devíamos encontrar.
    Que braços aprazíveis, que feliz hora me voltarão a dar esse mundo de onde me vêm os sonos e todos os movimentos, mesmo os imperceptíveis?»






Arthur Rimbaud. O Rapaz Raro. Iluminações e poemas. Tradução de Maria Gabriela Llansol. Redógio D' água, Lisboa, 1998., p. 73/5

pálio rico

vestimenta nova e luxuosa, fato novo

euménide

nome feminino
 
1. MITOLOGIA cada uma das três Fúrias que, segundo a mitologia, atormentavam as almas dos condenados no Inferno
2. figurado remorso; pungir da consciência

(Do grego Eumenídes, «Euménides», pelo latim Eumenĭdes, «idem»)
(...) «Temos fé no veneno. Sabemos dar todos os dias a nossa vida por inteiro.
      Eis chegado o tempo dos fumadores de haschisch.*»


*Traduzido literalmente, dos assassinos. (N.T.)



Arthur Rimbaud. O Rapaz Raro. Iluminações e poemas. Tradução de Maria Gabriela Llansol. Redógio D' água, Lisboa, 1998., p. 59

VIDAS

I

  Oh!, as extensas áleas da terra sagrada, as esplanadas do templo! Que destino deram ao brâmane que me explicou os Provérbios? De então, e desse país, revejo ainda tudo, as velhas, inclusive! Recordo-me das horas de prata e de sol a declinar para os rios, a mão dos campos pousando-se-me sobre os ombros, e das nossas carícias, de pé, nas planícies salgadas. - Uma revoada de pombas escarlates brada em volta do meu pensamento. - Exilado aqui, dispus de um palco onde representar as obras-primas dramáticas de todas as literaturas. Sublinharia, só para vós, essas riquezas inesquecíveis. Atento na história dos tesouros que haveis encontrado. Prevejo já a sequência e a consequência! A minha sabedoria é tão desprezada como o caos. O que é o meu nada comparado com a estupefacção que vos espera?

 II

   Sou o inventor em que nada desmereço, antes pelo contrário, de quantos me precederam; inclusivamente de um músico que tivesse encontrado a clave do amor. Agora, que sou morgado de terras ácidas sobre um céu parco, tento emocionar-me com a lembrança de uma infância de mendigo, dos anos de aprendizagem ou da chegada em tamancos, das discussões, das cinco ou seis vezes que enviuvei, e de algumas pândegas onde a minha cabeça de mula me impediu de vibrar em uníssono com os camaradas. Não me arrependo do quinhão que, em tempos, tive da alegria divina: a atmosfera frugal destas terras ácidas nutre intensamente o meu cepticismo atroz. Mas, como esse cepticismo não pode mais ser posto em prática, e dado ter-me entregue a uma nova inquietação - estou à espera de me tornar um louco particularmente maligno.

III

   Num sótão onde fui trancado, tinha eu doze anos, fiquei a conhecer o mundo, ilustrei a comédia humana. Num celeiro aprendi a história. Numa qualquer festa nocturna, numa cidade do Norte, encontrei todas as mulheres dos pintores passados. Numa velha galeria de Paris, fui introduzido nas ciências clássicas. Numa mansão magnífica rodeado pelo Oriente inteiro, realizei uma imensa obra e passei uma reforma ilustre. Revolvi o meu sangue, de lés a lés. Foi-me reconhecida a missão que me cabia. É ponto assente, e do passado. Pertenço realmente ao mundo trespassado, chega de mandatos.



Arthur Rimbaud. O Rapaz Raro. Iluminações e poemas. Tradução de Maria Gabriela Llansol. Redógio D' água, Lisboa, 1998., p. 49/51

OSTENTAÇÃO

      Cabeças ocas espadaúdas. Muitos deles exploram os vossos mundos. Frugais, e nada apressados em pôr a funcionar as suas brilhantes faculdades e a experiência que têm das vossas consciências. Que homens experientes que eles são! Olhos atónitos como noites de verão, vermelhos e negros, tricolores, olhos de aço picotados de estrelas d'oiro; rostos disformes, plúmbeos, pálidos, incendiados; rouquidões zombeteiras! O modo cruel de andar dos ouropéis! - Alguns são novos - , como encarariam eles Querubim? - dotados de vozes aterradoras e de alguns truques perigosos. São mandados pavonear-se pela cidade, com trapos de um luxo repugnante.
      Oh, o mais violento Paraído do esgar colérico. Nada que se compare com os vossos faquires, e outras truanices cénicas. Em fatiotas improvisadas ao gosto do sonha mau, representam lamúrias, tragédias de malandrins e de etéreos semideuses, como a história ou as religiões jamais foram. Chineses, hotentotes, ciganos, néscios, hienas, Molochs, demências de antanho, demónios sinistros, misturam as rábulas populares, maternais, com as poses e as ternurices de besta. Interpretam novos trechos e canções inofensivas de raparigas. Mestres em prestigitação, transformam as pessoas e os sítios, sem esquecer a comédia hipnótica. Os olhos cospem chamas, o sangue canta, os ossos expandem-se, escorrem lágrimas e fios vermelhos. A chacota que fazem ou o terror que causam dura um minuto, ou meses inteiros.
      Só eu tenho a cifra desse pavonear selvagem.




Arthur Rimbaud. O Rapaz Raro. Iluminações e poemas. Tradução de Maria Gabriela Llansol. Redógio D' água, Lisboa, 1998., p. 43
   «Pode-se aceder ao êxtase pela destruição, rejuvenescer com a crueldade! O povo não rosnou. Ninguém se prestou a dar opinião.»


Arthur Rimbaud. O Rapaz Raro. Iluminações e poemas. Tradução de Maria Gabriela Llansol. Redógio D' água, Lisboa, 1998., p. 41
«Caía sem sobreaviso sobre as pessoas deixando-as dispersas, aos pedaços.»


Arthur Rimbaud. O Rapaz Raro. Iluminações e poemas. Tradução de Maria Gabriela Llansol. Redógio D' água, Lisboa, 1998., p. 41

quarta-feira, 30 de novembro de 2011

         «Um homem que sabe do seu ofício é apreciado sempre e em toda a parte.»


Ernst Jünger. Eumeswil. Tradução de Sara Seruka com a colaboração de João Barrento para a Tradução dos Poemas. Editora Ulisseia., p. 31

''Poesia sem perdão ou esquecimento.''




Herberto Helder. A colher na boca. Edições Ática., p. 130

terça-feira, 29 de novembro de 2011

Velho ditado

«Se não queres ser roubado sem clemência,
Esconde o teu ouro, a tua fé, a tua ausência.»


Ernst Jünger. Eumeswil. Tradução de Sara Seruka com a colaboração de João Barrento para a Tradução dos Poemas. Editora Ulisseia., p. 24
«As nuvens cinzentas acumulavam-se sobre o alto mar, todo ele feito de uma eternidade de lágrimas amargas.»



Arthur Rimbaud. O Rapaz Raro. Iluminações e poemas. Tradução de Maria Gabriela Llansol. Relógio D' água, Lisboa, 1998., p. 35
(...) « Águas e tristezas, cresçam, e alteai os Dilúvios.»


Arthur Rimbaud. O Rapaz Raro. Iluminações e poemas. Tradução de Maria Gabriela Llansol. Redógio D' água, Lisboa, 1998., p.
«Eu olho, e a mulher é a palavra.»


Herberto Helder. A colher na boca. Edições Ática., p. 109

«A mulher senta-se no tempo e a minha melancolia
pensa-a, »

Herberto Helder. A colher na boca. Edições Ática., p. 108

                  «Amanhã vou morrer. Tenho
vinte e nove bocas urdindo
a falsa doçura da confusão.»


Herberto Helder. A colher na boca. Edições Ática., p. 97

''A colher de súbito cai no silêncio da língua.''

Herberto Helder. A colher na boca. Edições Ática., p. 86
«Porque as ervas têm pálpebras abertas
sobre estas imagens tremendamente puras.»


Herberto Helder. A colher na boca. Edições Ática., p. 85

segunda-feira, 28 de novembro de 2011


«Mãe, pouco resta de ti na exaltação deste mundo. Às
            vezes
misturas-te um pouco nos terrores da noite ou olhas-me,
vertiginosa e triste,
através das palavras impuras da minha vida
de poeta.»



Herberto Helder. A colher na boca. Edições Ática., p. 74
« - Trazem liras nas mãos, trazem nas mãos brutais
pequenos cravos de ouro ou peixes delicados
de música fria.»




Herberto Helder. A colher na boca. Edições Ática., p. 59

«o peixe que vai nadando até se consumar em lento
lírio.»


Herberto Helder. A colher na boca. Edições Ática., p. 50

«FEDIA - Não temo ninguém porque sou um cadáver.»


Leão Tolstoi. O Cadáver vivo. Círculo de Leitores, Lisboa, 1980., p. 233
LIZA (Sorrindo.) - (...)  Mas não me impeça...não me impeças de dizer o que sinto. O que mais me atormentava era sentir que gostava de dois homens. Porque isto significava que sou uma mulher sem moral.»



Leão Tolstoi. O Cadáver vivo. Círculo de Leitores, Lisboa, 1980., p. 205

«Suicidar-te-ás para que eles, esses dois entes, tenham piedade de ti. E eu ... matar-me-ei para que o mundo compreenda o que perdeu.»



Leão Tolstoi. O poder das trevas seguido de O Cadáver vivo. Círculo de Leitores, Lisboa, 1980., p. 200
«Mas para nós, cujos cabelos já vão embranquecendo, é-nos difícil compreender a juventude.»


Leão Tolstoi. O poder das trevas seguido de O Cadáver vivo. Círculo de Leitores, Lisboa, 1980., p. 183

domingo, 27 de novembro de 2011

«É para mim demasiado doloroso olhá-la nos olhos. E para ela também...Acredita no que te digo.»


Leão Tolstoi. O poder das trevas seguido de O Cadáver vivo. Círculo de Leitores, Lisboa, 1980., p. 174
« - E o poema faz-se contra o tempo e a carne.»


Herberto Helder. A colher na boca. Edições Ática., p. 41

          (...)                      « e eu caminho pelas ruas frias com
o místico desejo do teu corpo.»

Herberto Helder. A colher na boca. Edições Ática., p. 39
                             «O meu desejo traz
o perfume da tua noite.»


Herberto Helder. A colher na boca. Edições Ática., p. 37

« e a tua boca penetra a minha voz como a espada
se perde no arco.»



Herberto Helder. A colher na boca. Edições Ática., p. 31
«Beberei sua boca, para depois cantar a morte
e a alegria da morte.»




Herberto Helder. A colher na boca. Edições Ática., p. 30

O AMOR EM VISITA


Dai-me uma jovem mulher com sua harpa de sombra
e seu arbusto de sangue. Com ela
encantarei a noite.
Dai-me uma folha viva de erva, uma mulher.
Seus ombros beijarei, a pedra pequena
do sorriso de um momento.
Mulher quase incriada, mas com a gravidade
de dois seios, com o peso lúbrico e triste
da boca. Seus ombros beijarei.

Cantar? Longamente cantar.
Uma mulher com quem beber e morrer.
Quando fora se abrir o instinto da noite e uma ave
o atravessar trespassada por um grito marítimo
e o pão for invadido pelas ondas,
seu corpo arderá mansamente sob os meus olhos palpi-
                tantes,
ele - imagem inacessível e casta de um certo pensa-
               mento
de alegria e de impudor.
Seu corpo arderá para mim
sobre um lençol mordido por flores com água.

(...)


Herberto Helder. A colher na boca. Edições Ática., p. 29
«Se a busco? Esfaimadamente a busco,
tacteando com a memória a forma com que era
nas noites de amor.»



Herberto Helder. A colher na boca. Edições Ática., p. 24

«Humildemente teço minhas palavras gratas
sobre a bela ferocidade
da vossa carne, ergo minha taça,
oiço o rumorejar oculto da fonte.
Humildemente dissipo a solidão, aceito o vosso apelo de
          esperma,
mereço a poesia.

Humildemente repudio a morte.»



Herberto Helder. A colher na boca. Edições Ática., p. 19

«Transforma-se o amador na coisa amada»

«Transforma-se o amador na coisa amada» com seu
feroz sorriso, os dentes,
as mãos que relampejam no escuro. Traz ruído
e silêncio. Traz o barulho das ondas frias
e das ardentes pedras que tem dentro de si.
E cobre esse ruído rudimentar com o assombrado
silêncio da sua última vida.
O amador transforma-se de instante para instante,
e sente-se o espírito imortal do amor
criando a carne em extremas atmosferas, acima
de todas as coisas mortas.

Transforma-se o amador. Corre pelas formas dentro.
E a coisa amada é uma baía estanque.
É o espaço de um castiçal,
a coluna vertebral e o espírito
das mulheres sentadas.
Transforma-se em noite extintora.
Porque o amador é tudo, e a coisa amada
é uma cortina
onde o vento do amador bate no alto da janela
aberta. O amador entra
por todas as janelas abertas. Ele bate, bate, bate.
O amador é um martela que esmaga.
Que transforma a coisa amada.

Ele entra pelos ouvidos, e depois a mulher
que escuta
fica com aquele grito para sempre na cabeça
a arder com o primeiro dia do verão. Ela ouve
e vai-se transformando, enquanto dorme, naquele grito
do amador.
Depois acorda, e vai, e dá-se ao amador,
dá-lhe o grito dele.
E amador e a coisa amada são um único grito
anterior do amor.

E gritam e batem. Ele bate-lhe com o seu espírito
de amador. E ela é batida, e bate-lhe
com o seu espírito de amada.
Então o mundo transforma-se neste ruído áspero
do amor. Enquanto em cima
o silêncio do amador e da amada alimentam
o imprevisto silêncio do mundo
                                                 e do amor.




Herberto Helder. A colher na boca. Edições Ática., p. 16/7
«Falemos de casas como quem fala da sua alma,
entre o incêndio,
junto ao modelo das searas,
na aprendizagem da paciência de vê-las erguer
e morrer com um pouco, um pouco
                                                         de beleza.



Herberto Helder. A colher na boca. Edições Ática., p. 15

quarta-feira, 23 de novembro de 2011

Cortejar as boas graças

«Cortejar as boas graças»: também isto é uma arte. A expressão deve ter sido inventada por alguém que teve a mesma sorte da raposa com as uvas. É verdade que, uma vez o cortejador com assento no gabinete, as coisas modificam-se. A massa é como a amante, que se entrega de bom grado ao senhor, mal se lhe abre a porta da sua alcova.»




Ernst Jünger. Eumeswil. Tradução de Sara Seruka com a colaboração de João Barrento para a Tradução dos Poemas. Editora Ulisseia., p. 14
«Os caçadores têm especial prazer em matar o belo.»


Ernst Jünger. Eumeswil. Tradução de Sara Seruka com a colaboração de João Barrento para a Tradução dos Poemas. Editora Ulisseia., p. 13
«Se ficas a saber tudo, em pouco tempo pões-te velha.»



Leão Tolstoi. O poder das trevas seguido de O Cadáver vivo. Círculo de Leitores, Lisboa, 1980., p. 108

20 de Janeiro ou 30 anos

A tua idade enche-me de medo
defende-te e acusa-me.
ignoras o vento da tormenta
com o seu fardo, mas paira sobre ti
o favor de uma musa que volto a encontrar
no rosto. Ao acaso iremos traduzir
amanhã alguns versos de Emily
em conjunto. E virás
com o teu casacão azul-cobalto.
Alma viva, sabes dar-me vida
a mim que ignoro e ando às cegas
num tempo que voa
com os teus trinta anos.





Eugenio Montale. Poesia. Selecção, tradução, prefácio e notas de José Manuel de Vasconcelos. Assírio&Alvim, Lisboa, 2004., p. 325

terça-feira, 22 de novembro de 2011

Cedo ou Tarde

Desde criança acreditei que não é o homem
que se move mas o cenário, a paisagem.
Foi quando, imóvel, vi desenrolar-se
o lago de Lugano, no vaudeville
de um tal Dall ' Argine que provavelmente
em homenagem a si mesmo, nomen omen,
não deixou nunca a margem. Depois dei-me conta
do meu pueril engano e agora sei
que volante ou pedestre, estase ou movimento
em nada diferem. Há quem goste de
beber a vida gota a gota ou a jorros;
mas a garrafa é a mesma, não se pode
enchê-la quando se esvazia.



Eugenio Montale. Poesia. Selecção, tradução, prefácio e notas de José Manuel de Vasconcelos. Assírio&Alvim, Lisboa, 2004., p. 291

A forma do mundo

Se o mundo tem a estrutura da linguagem
e a linguagem tem a forma da mente
a mente com os seus cheios e os seus vazios
é nada ou quase nada e não nos tranquiliza.

Assim falou Papirio. Estava já escuro
e chovia. Vamos para um sítio seguro
disse e apressou o passo sem se aperceber
que falava a linguagem do delírio.





Eugenio Montale. Poesia. Selecção, tradução, prefácio e notas de José Manuel de Vasconcelos. Assírio&Alvim, Lisboa, 2004., p. 281

sobre a felicidade


«Tem um preço demasiado alto, não é para nós e quem a tem
não sabe o que fazer com ela.»


Eugenio Montale. Poesia. Selecção, tradução, prefácio e notas de José Manuel de Vasconcelos. Assírio&Alvim, Lisboa, 2004., p. 255
«Chove
de um céu que não tem
nuvens.»




Eugenio Montale. Poesia. Selecção, tradução, prefácio e notas de José Manuel de Vasconcelos. Assírio&Alvim, Lisboa, 2004., p. 247

domingo, 20 de novembro de 2011

«ANISIA - É bem verdade o que dizem do pudor das raparigas: não passa da soleira da porta. Uma vez atravessada a porta, tudo se esquece! Que grande descarada!»




Leão Tolstoi. O poder das trevas seguido de O Cadáver vivo. Círculo de Leitores, Lisboa, 1980., p. 64
8

«E o paraíso? Existe um paraíso?».
«Creio que sim, minha senhora, mas os vinhos doces
já ninguém os quer».





Eugenio Montale. Poesia. Selecção, tradução, prefácio e notas de José Manuel de Vasconcelos. Assírio&Alvim, Lisboa, 2004., p. 233
5

«Desci, dando-te o braço, pelo menos um milhão de escadas
e agora que já cá não estás é o vazio em cada degrau.
Mesmo assim a nossa longa viagem foi breve.
A minha ainda dura, mas já não me acontecem
as coincidências, as reservas,
as ciladas, os dissabores de quem crê
que a realidade é aquilo que se vê.

Desci milhões de escadas dando-te o braço
e não porque com quatro olhos talvez se veja mais.
Contigo desci-as porque sabia que nós os dois
as únicas verdadeiras pupilas, ainda que ofuscadas,
eram as tuas.»



Eugenio Montale. Poesia. Selecção, tradução, prefácio e notas de José Manuel de Vasconcelos. Assírio&Alvim, Lisboa, 2004., p. 233

«Dizem que a poesia no seu cume
glorifica o Todo em fuga,»


Eugenio Montale. Poesia. Selecção, tradução, prefácio e notas de José Manuel de Vasconcelos. Assírio&Alvim, Lisboa, 2004., p. 229

ustório


adjectivo
1. que queima
2. que inflama

(Do latim ustu-, «queimado» +-ório)
«Não sei como extenuada tu resistes
neste lago
de indiferença que é o teu coração; talvez
te salve um amuleto que guardas
junto ao bâton dos lábios,
à borla do pó-de-arroz, à lima das unhas: um ratinho branco,
de marfins; e é assim que existes!»



Eugenio Montale. Poesia. Selecção, tradução, prefácio e notas de José Manuel de Vasconcelos. Assírio&Alvim, Lisboa, 2004., p. 161

extenuar

verbo transitivo
causar grande cansaço a; enfraquecer
verbo pronominal
1. debilitar-se
2. gastar-se
(Do latim extenuāre, «enfraquecer; tornar ténue»)
«A tua agitação faz-me pensar
nas aves de arribação que vão contra os faróis
nas noites de tempestade:
também a tua doçura é uma tempestade,
rodopia e não aparece,
e as suas pausas são também mais raras.»




Eugenio Montale. Poesia. Selecção, tradução, prefácio e notas de José Manuel de Vasconcelos. Assírio&Alvim, Lisboa, 2004., p. 159
«regressa ao caminho onde contigo me entristeço,
àquele que apontou um chumbo seco
às minhas, às tuas noites:
volta às primaveras que não florescem.»




Eugenio Montale. Poesia. Selecção, tradução, prefácio e notas de José Manuel de Vasconcelos. Assírio&Alvim, Lisboa, 2004., p. 155

                                        «Hoje volto
até junto de vós mais forte, ou estarei enganado, se bem que o coração
pareça abrir-se em recordações ledas e atrozes.»



Eugenio Montale. Poesia. Selecção, tradução, prefácio e notas de José Manuel de Vasconcelos. Assírio&Alvim, Lisboa, 2004., p. 139

pélago


nome masculino
1. mar alto
2. profundidade do mar
3. figurado abismo; voragem
4. figurado imensidade
(Do grego pélagos, «idem», pelo latim pelăgu-, «idem»)

sábado, 19 de novembro de 2011

samovar

nome masculino
utensílio de cobre ou de latão, de origem russa, com que se aquece a água para preparar o chá e que é munido de uma pequena fornalha de carvão vegetal

(Do russo samowar, «que ferve por si próprio», pelo francês samovar, «idem»)
«Tens passado a vida a sofrer por causa desse carunchoso, e quando enviuvares terás de ir pedir esmola.»


Leão Tolstoi. O poder das trevas seguido de O Cadáver vivo. Círculo de Leitores, Lisboa, 1980., p. 41/2
«Se encontrares uma mulher melhor do que eu, esquecer-me-ás, mas se for pior, recordar-te-ás.»


Leão Tolstoi. O poder das trevas seguido de O Cadáver vivo. Círculo de Leitores, Lisboa, 1980., p. 36

domingo, 13 de novembro de 2011

« o Poeta escancarava as chagas do seu peito
como lírios da noite abertos ao luar,»




António Feijó. Á Janella do Occidente. Poemeto. Magalhães & Moniz Editores, Porto, 1884., p
                                           ...To die, to sleep;
             To sleep! perchance to dream; ay there is the rub.

                      (Shakespeare, Hamlet, act. 3º.sc.I.ª)
«Decerto - disse consigo mesmo - o tempo não tem nenhuma realidade. É uma pura ilusão do nosso espírito. Ora, se ele não existe, como poderei trazer a minha morte?...Será que viverei eternamente? Não, mas daí concluo que a minha morte é e foi sempre a mesma  que será para sempre. Eu não a sinto ainda, e todavia ela é, e não a devo temer, porque seria uma loucura temer a vida de uma cousa que já veio. Ela existe como a derradeira página de um livro que eu leio e ainda não acabei.»


Anatole France. Thaïs. Tradução de Sodre Viana. Irmãos Pongetti Editores, Rio de Janeiro, 2ª ed., p. 149

Estou farta de tudo o conheço e quero buscar o desconhecido.

« - É verdade, Nicias - respondeu Thaïs - estou fatigada de viver com homens como tu, risonhos, perfumados, benévolos, egoístas. Estou farta de tudo o conheço e quero buscar o desconhecido. Senti que a alegria não é a alegria, e este homem ensina-me que a dor é a verdadeira alegria. Acredito nele, porque possui a verdade.»



Anatole France. Thaïs. Tradução de Sodre Viana. Irmãos Pongetti Editores, Rio de Janeiro, 2ª ed., p. 146
«Enquanto falava, as suas pupilas despediam chamas; parecia que dos seus lábios saíam brasas e, sem querer, os que o rodeavam o ouviam.»



Anatole France. Thaïs. Tradução de Sodre Viana. Irmãos Pongetti Editores, Rio de Janeiro, 2ª ed., p. 144
« - Vai ser triste viver, quando a sua porta estiver fechada.»



Anatole France. Thaïs. Tradução de Sodre Viana. Irmãos Pongetti Editores, Rio de Janeiro, 2ª ed., p. 141
«Thaïs, tudo aquilo que tocaste deve ser devorado pelo fogo até ao âmago.»



Anatole France. Thaïs. Tradução de Sodre Viana. Irmãos Pongetti Editores, Rio de Janeiro, 2ª ed., p. 137
« - É preciso - respondeu Paphnucio - seguir aquele que te veio procurar. Ele te arrancará ao mundo como o vidimador extirpa o cacho que apodreceria na árvore, e o leva à prensa para transformá-lo em vinho perfumado.»



Anatole France. Thaïs. Tradução de Sodre Viana. Irmãos Pongetti Editores, Rio de Janeiro, 2ª ed., p. 131/2
«Thaïs
Mas não tens medo de sujar a tua alma nos braços de uma mulher?

ZENOTHEMIS
O corpo pode ceder ao desejo, sem que a alma tenha nada com isso.

Thaïs
Vai-te! Gosto que me amem com o corpo e com a alma. Todos esses filósofos são uns bodes!

Uma a uma as lâmpadas extinguiam-se. Um dia pálido, que penetrava pelas frestas das cortinas, golpeava as fisionomias lívidas e os olhos congestos dos convivas.»



Anatole France. Thaïs. Tradução de Sodre Viana. Irmãos Pongetti Editores, Rio de Janeiro, 2ª ed., p. 126/7

«Por minha culpa os meus filhos estão afogados na vida amarga.»


Anatole France. Thaïs. Tradução de Sodre Viana. Irmãos Pongetti Editores, Rio de Janeiro, 2ª ed., p. 121
«(...) o chão dos caminhos bebeu o sangue inocente.»


Anatole France. Thaïs. Tradução de Sodre Viana. Irmãos Pongetti Editores, Rio de Janeiro, 2ª ed., p. 121

tição

nome masculino
1. pedaço de lenha aceso ou meio queimado
2. brasa
3. carvão
4. figurado, popular pessoa muito suja ou enfarruscada
5. figurado, popular pessoa muito morena ou muito escura
(Do latim titiōne-, «idem»)
«Não tenho sentidos; nem sentimento. Não tenho limite.»


Eugenio Montale. Poesia. Selecção, tradução, prefácio e notas de José Manuel de Vasconcelos. Assírio&Alvim, Lisboa, 2004., p. 111
«ANTIGO, fico embriagado pela voz
que sai das tuas bocas quando se abrem
como verdes sinos e voltam
para trás desaparecendo.
A casa dos meus longínquos estios
ficava a teu lado, como sabes,
naquela terra onde o sol abrasa
e os mosquitos soltam nuvens pelos ares.
Agora como então emudeço na tua presença,
mar, e não me acho digno já
do solene ensinamento
da tua respiração. Foste o primeiro a dizer-me
que o ínfimo fermento
do meu coração era apenas um momento
do teu; que eu tinha bem fundo
a tua audaciosa lei: ser vasto e diferente
e ao mesmo tempo constante:
e esvaziar-me assim de toda a sujidade
como tu fazes quando lanças nas areias
entre cortiças algas e estrelas do mar
os inúteis despojos do teu abismo.»



Eugenio Montale. Poesia. Selecção, tradução, prefácio e notas de José Manuel de Vasconcelos. Assírio&Alvim, Lisboa, 2004., p. 101

«Na idade de ouro florida nas margens felizes
também um nome, uma veste, eram um vício.»



Eugenio Montale. Poesia. Selecção, tradução, prefácio e notas de José Manuel de Vasconcelos. Assírio&Alvim, Lisboa, 2004., p. 91

efígie


nome feminino
1. representação ou imagem de uma pessoa
  2. figura de personagem importante representada em moeda ou medalha
3. retrato


  (Do latim effigĭe-, «idem»)

fulmíneo


adjectivo
1. relativo a raio
2. figurado brilhante ou destruidor como o raio

(Do latim fulminĕu-, «idem»)
      (...)

«                                     Ardes
também tu entre as lages do estio,
coração que desfaleces! E de maneira incauta
ensaias novas notas na tua flauta.»




Eugenio Montale. Poesia. Selecção, tradução, prefácio e notas de José Manuel de Vasconcelos. Assírio&Alvim, Lisboa, 2004., p. 57

sábado, 12 de novembro de 2011

«A morte é outra espera.»



Miguel de Unamuno. Creio no futuro. Textos, traduzidos e dispostos ritmicamente por Manuel Simões. Editorial A. O., Braga, p. 106

«É muita a água deste mar,
Tenho fogo no coração.»


Miguel de Unamuno. Creio no futuro. Textos, traduzidos e dispostos ritmicamente por Manuel Simões. Editorial A. O., Braga, p. 97

TUDO PASSA

«LEMBRO-ME que te lembrava
E já teu nome me tortura.

Assim o que amamos decorre,
Assim passa assim acaba
E surge a nova ventura.

Assim se esquece,
Assim se morre.»




Miguel de Unamuno. Creio no futuro. Textos, traduzidos e dispostos ritmicamente por Manuel Simões. Editorial A. O., Braga, p. 83
«Não adoeça o coração
De esperar.»

Miguel de Unamuno. Creio no futuro. Textos, traduzidos e dispostos ritmicamente por Manuel Simões. Editorial A. O., Braga, p. 70
«Nascer é outra morte,
Morrer um nascimento,»


Miguel de Unamuno. Creio no futuro. Textos, traduzidos e dispostos ritmicamente por Manuel Simões. Editorial A. O., Braga, p. 64
«No silêncio dos céus arde
           O Verbo criador,»




Miguel de Unamuno. Creio no futuro. Textos, traduzidos e dispostos ritmicamente por Manuel Simões. Editorial A. O., Braga, p. 53
« - Não busques sonhos perdidos.»



Miguel de Unamuno. Creio no futuro. Textos, traduzidos e dispostos ritmicamente por Manuel Simões. Editorial A. O., Braga, p. 44
assinar a rogo assinar por quem não sabe escrever

ADÃO ONDE ESTÁS?

«TREME a terra das almas; range
A humanidade; agacham-se os povos,
Escurece o céu e nas nuvens
Forja-se o raio das noites claras
De tempestade; a génese do mundo
Alumia outra vez o abismo do nada.

As estrelas já não guiam como outrora
O navegante. Quem espera o sol?

E levanta-se do fundo do abismo
O sussurro de Deus quando chamava:
- («Adão, Adão» e o homem se escondia
Por detrás da mulher angustiada,
Envergonhado, nu e temeroso,
Vendo a sua sombra nas eternas águas.

Nuvens escuras sobem desde a terra
Levam ao alto a negra catarata
Que rebenta nos ares e o dilúvio
Varre cidades, lava o pó caído.

Prossegue o lodo subjugando a luz,
A história foge e o milagre passa.»




Miguel de Unamuno. Creio no futuro. Textos, traduzidos e dispostos ritmicamente por Manuel Simões. Editorial A. O., Braga, p. 37/8

esfinge

nome feminino
 
1. MITOLOGIA monstro fabuloso com rosto de mulher, corpo de leão e asas de ave de rapina, que propunha enigmas, devorando todos aqueles que não os decifrassem
2. representação desse monstro
3. na arte egípcia, estátua de leão deitado com cabeça humana que representa uma divindade
4. figurado pessoa calada ou impenetrável
5. figurado mistério; enigma

(Do grego sphígx, monstro que estrangulava, pelo latim sphinge-, «esfinge»)

APELO

«MAIS perto...mais...
Arranca-me de mim
Que me afundo
No meu nada.

Dá-me a minha alma,
Que sem alma
Para que quero eu o mundo?»



Miguel de Unamuno. Creio no futuro. Textos, traduzidos e dispostos ritmicamente por Manuel Simões. Editorial A. O., Braga, p. 22

REPOUSO CORDIAL

«Já trespassado de golpes,
Coração, a tua polpa
Macerada no martírio
Em doçura amadurece.

Depois te farás terriço
Que adubará no sepulcro
A semente que criaste
Para eterna carnadura.

Benditos golpes; são beijos
Dessa pura e santa boca
De Deus nosso Pai terrível;

Beijos que matam de angústia
De amor que adivinha a morte
E chupa o sangue da alma.

Furioso acometias,
Coração, e a tua fúria
Valeu-te o seres batido.

Repassado de doçura
Descansarás feito terra
Na terra que foi teu berço.

A terra será teu céu
E o céu será teu berço.»



Miguel de Unamuno. Creio no futuro. Textos, traduzidos e dispostos ritmicamente por Manuel Simões. Editorial A. O., Braga, p. 20

A FÉ E A NOITE

«SONHEI  que acabava o sonho
E acordei. Fazia escuro;
Não via estrelas nem lua
Estava sozinho no mundo.

Voltei para trás o olhar
Perdi a fé por não ver;
Ganhei-a ao olhar em frente
Pois só se crê no futuro.



Miguel de Unamuno. Creio no futuro. Textos, traduzidos e dispostos ritmicamente por Manuel Simões. Editorial A. O., Braga, p. 16

COMBATE SEM FIM

OLHA, Josué, não te enganes,
Não pares  sol, a luta;
Mas deixa correr as horas
Pois cada hora é a última.

Também se luta de noite,
E dormindo se duvida;
Também morrendo se vive,
Não há resposta sem pergunta.

«Não podeis ir aonde eu vou» (1)
Dizia Jesus à turba.
E disseram os Judeus:
- Irá ele suicidar-se?

Nem Quem Faz se suicida
Nem se apaga o sol; sepulta
O lume debaixo da terra
E alumia-lhe as entranhas.

Josué deixa que a noite
A paz do berço nos traga;
Amanhã é outro dia,
São o mesmo sempre e nunca.


Miguel de Unamuno. Creio no futuro. Textos, traduzidos e dispostos ritmicamente por Manuel Simões. Editorial A. O., Braga, p. 11
«fome de ser mais, fome de Deus, fome de amor eterno»



Miguel de Unamuno. Creio no futuro. Textos, traduzidos e dispostos ritmicamente por Manuel Simões. Editorial A. O. - Braga
«É o coração que sente a Deus e não a razão» (Pens. 278) disse arriscadamente Pascal, já que o coração tem razões que a razão não conhece » (Pens, 277).»

quarta-feira, 9 de novembro de 2011

« Se muitos foram os benefícios que recebemos de uma pessoa, é justo suportar os desprazeres que dela nos vêm.

Terêncio. A Sogra. Textos Clássicos - 26. Introdução, versão do latim e notas de Walter de Medeiros. Instituto Nacional de Investigação Científica., p.129