Que Cisne É Belo
“Que água é calma como as fontes
mortas de Versalhes.” Que cisne,
de olhar cego em soslaio e
pé gondoleiro, é belo como o
de chinfrim porcelana e tisne
no olhar e ouro dentado
na coleira a mostrar quem lhe é o dono.
Cravado à árvore-lucerna
de Luís Quinze com botões de uma
cor de crista de galo,
dálias, ouriços, semprevivas,
ele se empoleira na espuma
de esculpidas, polidas
flores – calmo, alto. O rei é morto.
Tradução de Adriano Scandolara
Não Há Cisne Tão Lindo
“Não há água tão quieta quanto as
fontes mortas de Versailles.” Não há cisne,
de olhar cego bistre oblíquo
e pernas gondoleantes, tão lindo
quanto o de louça com chintz,
de olhos cor de corça e coleira
de ouro denteada a indicar de quem foi.
Alojado no candelabro de
Luís XV, com botões de matiz de
crista-de-galo, com dálias,
ouriços-do-mar e sempre-vivas,
no mar de ramalhetes de
polidas e esculpidas flores
ele pousa – livre e altivo. O rei é morto.
Tradução de José Antonio Arantes
No Swan So Fine
“No water so still as the
dead fountains of Versailles.” No swan,
with swart blind look askance
and gondoliering legs, so fine
as the chinz china one with fawn-
brown eyes and toothed gold
collar on to show whose bird it was.
Lodged in the Louis Fifteenth
candelabrum-tree of cockscomb-
tinted buttons, dahlias,
sea-urchins, and everlastings,
it perches on the branching foam
of polished sculptured
flowers–at ease and tall. The king is dead.
Marianne Moore
O Cardume de Peixes
passa o
jade baço.
Dentre os mexilhões de um azul-gralha,
um ajusta a borralha;
se abre e cerra, um leque que houvesse
sido,
pois, ferido.
A craca encrusta os lados da onda,
embora não a esconda
lá, que o feixe imerso de dardos do
sol,
como o rol
de vidro em fibra, veloz fulgura
por cada rachadura –
entrando e saindo, iluminando
o
mar azul-
-turquesa de corpos. A água crava
férrea cunha na trava
férrea do penhasco; onde os astros,
rosas
grãos de arroz, as
tintas águas-vivas, o siri
qual verde lírio e
cogumelos marinhos deslizam.
As
máculas
de abusos estão presentes nisso,
esse audaz edifício-
toda característica física
de a-
-cidente há-
a ausente cornija, as queimaduras,
machadadas, ranhuras
de bombas se destacam; morreu a
fossa,
que reforça
todas as provas de que ele vive
do ser que não revive
seu viço. Envelhece o mar nisso.
Tradução de Adriano Scandolara
Os Peixes
vade-
ando negro jade.
Das conchas azul-corvo, um marisco
só ajeita os montes de cisco;
no que vai se abrindo e fechando
é que
nem ferido leque.
Os crustáceos que incrustam o flanco
da onda ali não encontram canto,
porque as setas submersas do
sol,
vidro em fibras sol-
vidas, passam por dentro das gretas
com farolete ligeireza –
iluminando de vez em
vez
o oceano turquês
de corpos. A correnteza crava
na quina férrea da fraga
uma cunha de ferro; e estrelas,
grãos
de arroz róseos, mães-
d’água tintas, siris que nem lírios
verdes e fungos submarinos
vão deslizando uns sobre os outros.
As
marcas externas
de mau-trato estão todas presentes
neste edifício resistente –
todo resquício material
de a-
-cidente – ausência
de cornija, machadadas, queima e
sulcos de dinamite – teima em
ressaltar; já não é o que era
cova.
Repetida prova
demonstrou que ele pode viver
do que não pode reviver
seu viço. O mar nele envelhece.
Tradução de José Antonio Arantes
The Fish
wade
through black jade.
Of the crow-blue mussel-shells, one keeps
adjusting the ash-heaps;
opening and shutting itself like
an
injured fan.
The barnacles which encrust the side
of the wave, cannot hide
there for the submerged shafts of the
sun,
split like spun
glass, move themselves with spotlight swiftness
into the crevices—
in and out, illuminating
the
turquoise sea
of bodies. The water drives a wedge
of iron through the iron edge
of the cliff; whereupon the stars,
pink
rice-grains, ink-
bespattered jelly fish, crabs like green
lilies, and submarine
toadstools, slide each on the other.
All
external
marks of abuse are present on this
defiant edifice—
all the physical features of
ac-
cident—lack
of cornice, dynamite grooves, burns, and
hatchet strokes, these things stand
out on it; the chasm-side is
dead.
Repeated
evidence has proved that it can live
on what can not revive
its youth. The sea grows old in it.
Marianne Moore
Um Túmulo
Homem olhando o mar,
roubando a vista de quem tem tanto direito à ela quanto você mesmo,
é da natureza humana ficar no meio de alguma coisa,
mas não se pode ficar no meio disto;
o mar não tem nada para dar senão um bem cavado túmulo.
Os abetos repousam em procissão, cada um com a esmeralda de capins em touceira na copa,
reservados como os seus contornos, sem nada dizer;
a repressão, no entanto, não é a mais óbvia característica do mar;
o mar é um colecionador, rápido em devolver um olhar rapace.
Há outros além de você que vestiram esse mesmo olhar –
cuja expressão não é mais um protesto; os peixes não mais os investigam
pois não restaram seus ossos:
os homens baixam as redes, sem saber do fato de que estão profanando um túmulo,
e vão embora remando depressa – as lâminas dos remos
juntas se deslocam como os pés de aranhas d’água, como se a morte fosse algo que não existisse.
As rugas progridem entre si numa falange – belas sob redes de espuma,
e somem sem ar enquanto o mar farfalha nas algas;
as aves nadam pelo ar em máxima velocidade, assobiando como outrora –
o casco da tartaruga flagela os pés dos penhascos, em movimento sob elas;
e o oceano, sob o pulso dos faróis e o ruído dos sinos das boias,
avança como sempre, parecendo não ser aquele mesmo oceano em que as coisas que caem são fadadas a afundar –
em que, se elas se viram e se torcem, é sem volição e tampouco consciência.
Tradução de Adriano Scandolara
Uma Cova
Homem mirando o mar,
tirando a visão daqueles que têm tanto direito a ela quanto você tem,
é da natureza humana ficar no meio das coisas,
mas no meio desta você não pode ficar.
o mar nada tem a dar a não ser uma cova bem cavada.
Os abetos se erguem em procissão, cada qual com um pé de peru esmeralda no alto,
discretos como seus contornos, dizendo nada;
repressão, no entanto, não é a mais óbvia característica do mar;
o mar é um coletor, pronto para devolver um olhar rapace.
Outros fora você ostentaram este olhar –
cuja expressão não é mais um protesto; os peixes não mais o investigam
porque seus ossos não sobreviveram:
os homens lançam redes, inconscientes de que profanam uma cova,
e partem vogando velozes – as pás dos remos
movendo-se juntas que nem patas de aranhas-aquáticas, como se não existisse a morte.
Os franzidos das águas marcham em falange – belos sob as malhas de espuma,
e somem arfando enquanto o mar vai e vem bramindo entre as plantas marinhas;
os pássaros cruzam o ar num zás, soltando guinchos como dantes –
a concha da tartaruga açoita os pés das rochas, em movimento embaixo delas;
e o oceano, sob a pulsação de faróis e ruídos de bóias sonoras,
avança como sempre, como se não fosse o oceano no qual as coisas que caem estão fadadas a afundar –
no qual, se se viram e reviram, é sem vontade e sem consciência.
Tradução de José Antonio Arantes
A Grave
Man looking into the sea,
taking the view from those who have as much right to it as you have to it yourself,
it is human nature to stand in the middle of a thing,
but you cannot stand in the middle of this;
the sea has nothing to give but a well excavated grave.
The firs stand in a procession, each with an emerald turkey-foot at the top,
reserved as their contours, saying nothing;
repression, however, is not the most obvious characteristic of the sea;
the sea is a collector, quick to return a rapacious look.
There are others besides you who have worn that look –
whose expression is no longer a protest; the fish no longer investigate them
for their bones have not lasted:
men lower nets, unconscious of the fact that they are desecrating a grave,
and row quickly away — the blades of the oars
moving together like the feet of water-spiders as if there were no such thing as death.
The wrinkles progress among themselves in a phalanx – beautiful under networks of foam,
and fade breathlessly while the sea rustles in and out of the seaweed;
the birds swim throught the air at top speed, emitting cat-calls as heretofore –
the tortoise-shell scourges about the feet of the cliffs, in motion beneath them;
and the ocean, under the pulsation of lighthouses and noise of bell-buoys,
advances as usual, looking as if it were not that ocean in which dropped things are bound to sink –
in which if they turn and twist, it is neither with volition nor consciousness.
Marianne Moore
Fonte: ver aqui
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