segunda-feira, 23 de dezembro de 2024

 Mulheres na História: Camille Claudel, a musa de Auguste Rodin

''Camille Claudel, nome artístico de Camille Athanaïse Cécile Cerveaux Prosper, nasceu a 8 de Dezembro de 1864 na cidade de Aisne e cresceu na aldeia de Villeneuve-sur-Fère, em França. O seu pai, maravilhado com o talento precoce de Camille, proporcionava-lhe todos os meios de desenvolver as suas potencialidades. Já a mãe de Camille não via com bons olhos a vocação artística da filha.
A vida de Camille Claudel foi sempre alvo de especulações e a razão de tal facto deve-se à sua relação amorosa com o seu professor, mentor intelectual e amante - o também escultor Auguste Rodin.
Dotada de enorme talento que pode ser claramente visto no seu trabalho, desde jovem, Camile demonstrava mestria na utilização do barro. Ela preferia a sensação de tocar o material à de desenhar. Quando a familia de Camille mudou de casa passou a morar no bairro "Nogent-sur-Seine" e tornaram-se praticamente vizinhos de Alfred Boucher, importante escultor do século XIX. O pai de Camille levou os seus trabalhos para a apreciação de Boucher que, impressionado com o talento da jovem, levou esses mesmos trabalhos para a apreciação de outro famoso escultor Paul Dubois. Após a aprovação desses dois nomes destacados da escultura foi fácil para Camille entrar para a "Académie Colarossi" uma das raras academias abertas também para mulheres.
Em seguida, juntou-se a um grupo de três outras escultoras e começaram a ter aulas informais com Boucher. Quando em 1883 Boucher se mudou para Itália, Rodin assumiu a responsabilidade perante os estudantes de Boucher. O deslumbramento pelo enorme talento da artista e os encontros sucessivos entre Rodin, 43 anos e Camille, 19 anos, levou-os a uma relação que durou quinze anos, relacionamento que influenciou toda a técnica utilizada por Camille nos seus trabalhos até então.
O período em que a escultora esteve no estúdio de Rodin como sua assistente foi considerado o mais produtivo da vida do famoso escultor e para Camille, a pior fase para a sua afirmação como escultora, independente dele.
Camille esculpiu o busto de Rodin e fez transparecer um homem rude e forte. Rodin, modelava Camille raramente como uma vencedora (escultura A França). A obra mais famosa de Camille, A Valsa, marca o coroamento da relação de ambos e da sua realização como escultora.
O romance com Rodin terminou em 1898. Camille resolve afastar-se dele, tanto pelo facto de Rodin ainda manter uma relação com outra mulher mas também porque a escultora queria continuar o seu trabalho sozinha. Longe dele começou a ter problemas financeiros e a demonstrar sinais de distúrbios mentais. Em 1906, ela destrói grande parte de seu próprio trabalho sendo internada num hospital para doentes mentais.
A eclosão da Primeira Guerra Mundial levou-a a ser transferida para Villeneuve-lès-Avignon, onde passou os últimos trinta anos de sua vida e lá morreu, em 1943, sem nunca ter recebido a visita da sua mãe.''



 nossa vida é nossa primeira ficção

Eliane Brum

 Meus desacontecimentos 

 «Lembro que, quando tudo começou, era escuro. E hoje, depois de todos esses anos de labirinto, todos esses anos em que avanço pela neblina empunhando a caneta adiante do meu peito, percebo que o escuro era uma ausência. Uma ausência de palavras. Essa escuridão é minha pré-história. Eu antes da história, eu antes das palavras. Eu caos.»

Eliane Brum




«Hoje tudo é (ou parece/pretende ser) importante, urgente e incrível, sendo recorrente uma amplificação acrítica, hiperbólica e distorcida de pessoas, situações, contextos.»

Artigo de Opinião de Paulo Pires
Diário do Sul


«E a chamada “motricidade fina”, é mesmo o quê? Ainda sabemos escrever manualmente, de forma legível e escorreita? Nas mãos, derivado da híper-demanda digital, parece haver agora uma prazerosa ditadura rotativa com apenas três protagonistas, que sabe a pouco: o polegar, o indicador e o médio. E apenas duas tarefas básicas: clicar e deslizar, deslizar e clicar, em incessante loop. Sobram quatro dedos, dois exilados em cada mão – condenados à dormência física, ao atrofiamento motor, ao analfabetismo sensitivo?»

Artigo de Opinião de Paulo Pires
Diário do Sul


''(...) Dostoievski escreveu que, um dia, a tolerância chegará a tal ponto que as pessoas inteligentes serão proibidas de fazer qualquer reflexão simplesmente para não ofender os imbecis.''

Artigo de Opinião de Paulo Pires
Diário do Sul

 «Representava um corvo solitário no alto de uma árvore despida e tinha a seguinte legenda: « Um corvo obstinado ao amanhecer: as chuvas de junho. Kazan.»

 Yasunari Kawabata. O Som da Montanha. Tradução de Francisco Agarez. D. Quixote., p. 202

 «Os seios dela eram de uma mulher que nunca tivera filhos, mas Shingo não achou que fosse virgem. Ficou espantado quando encontrou vestígios da pureza dela no seu dedo. Sentiu-se desconcertado, mas não culpado.»

 Yasunari Kawabata. O Som da Montanha. Tradução de Francisco Agarez. D. Quixote., p. 200

''electrificação doméstica''

Yasunari Kawabata. O Som da Montanha. Tradução de Francisco Agarez. D. Quixote., p. 198

 «Costuma-se dizer que as tempestades fortalecem a raiz das árvores.» 

 Yasunari Kawabata. O Som da Montanha. Tradução de Francisco Agarez. D. Quixote., p. 194
 «Posso falar? Estou a ferver por dentro e posso descontrolar-me um bocadinho.»
«Fala.»
«É sobre a jovem senhora.» Engasgou-se com as palavras. «Penso que ela fez um aborto.»

 Yasunari Kawabata. O Som da Montanha. Tradução de Francisco Agarez. D. Quixote., p. 188

terça-feira, 17 de dezembro de 2024

''pruridos teus''

 Yasunari Kawabata. O Som da Montanha. Tradução de Francisco Agarez. D. Quixote., p. 170

«Se nos tivesses contado, não terias precisado de sofrer tanto.»

Yasunari Kawabata. O Som da Montanha. Tradução de Francisco Agarez. D. Quixote., p. 170

 


                                                                                             KATIA BERESTOVA

''Um pano bordado pendia sobre as gavetas.''

 Yasunari Kawabata. O Som da Montanha. Tradução de Francisco Agarez. D. Quixote., p. 170

 «(...), caíram-lhe os olhos num título surpreendente:

«Lótus com dois mil anos dá flor.»


 Yasunari Kawabata. O Som da Montanha. Tradução de Francisco Agarez. D. Quixote., p. 169

domingo, 15 de dezembro de 2024

A cicatriz das tuas derrotas

José Tolentino Mendonça. A Noite Abre Meus Olhos. 4ª Edição, Assírio&Alvim, Porto, 2021. p. 486

 


Herberto Helder, no livro “Ofício Cantante”. (Ed. Assírio & Alvim; 1.ª edição [2009]).

 as mãos vazias são selvagens na sua beleza
duras mesmo se vulneráveis
são o esconderijo ideal para guardares relâmpagos
e verdades ferozmente concisas


José Tolentino Mendonça. A Noite Abre Meus Olhos. 4ª Edição, Assírio&Alvim, Porto, 2021. p. 483
 volta com o balde ao poço
mas desce tu nele com a água até à cintura


José Tolentino Mendonça. A Noite Abre Meus Olhos. 4ª Edição, Assírio&Alvim, Porto, 2021. p. 481
 (...)

mas no fundo acinzentado do desejo
entre pragas cosidas umas às outras
uma pedra atirada há mil anos
agita ainda as águas


José Tolentino Mendonça. A Noite Abre Meus Olhos. 4ª Edição, Assírio&Alvim, Porto, 2021. p. 465

ALÇAPÃO

 O tempo é um alçapão mas não te fies
o que omites acaba por ressurgir
como intruso escava uma saída
rasteja por vias desconhecidas
na distância do que pensavas perdido
e chega a tua casa antes de ti


José Tolentino Mendonça. A Noite Abre Meus Olhos. 4ª Edição, Assírio&Alvim, Porto, 2021. p. 456

TRISTEZA

 Nas noites lentas que nos fazem guerra
não há pensamento que possa mudar
a tristeza, essa música minúscula
nem precisamos morrer para nos sentirmos mortos
quando a sua cabeleira varre a terra
e nos recolhe como flores
de uma coroa deposta

rogamos à vida que responda
mas a vida só se expressa na agulha dos fogos
em línguas desconhecidas
no soprar ora longínquo
ora próximo do vento

e quando abrimos a garganta
em busca de um fio de voz
ela tornou-se inaudível
como se jamais nos tivesse pertencido

José Tolentino Mendonça. A Noite Abre Meus Olhos. 4ª Edição, Assírio&Alvim, Porto, 2021. p. 455

O silêncio é também visual

José Tolentino Mendonça. A Noite Abre Meus Olhos. 4ª Edição, Assírio&Alvim, Porto, 2021. p. 454

o solitário ladrar de um cão

 José Tolentino Mendonça. A Noite Abre Meus Olhos. 4ª Edição, Assírio&Alvim, Porto, 2021. p. 452

CRONOMETRIAS

 Nos dias de Heródoto usavam-se
modos mais exactos de medir o tempo
o gotejar da água para a ânfora
o escorrer da areia, grão a grão
a viagem da sombra, como se não fosse

José Tolentino Mendonça. A Noite Abre Meus Olhos. 4ª Edição, Assírio&Alvim, Porto, 2021. p. 449
 sentirás o que sente um sonâmbulo
às voltas da noite interminável

José Tolentino Mendonça. A Noite Abre Meus Olhos. 4ª Edição, Assírio&Alvim, Porto, 2021. p. 448

A vida exige de ti ainda mais escuro

José Tolentino Mendonça. A Noite Abre Meus Olhos. 4ª Edição, Assírio&Alvim, Porto, 2021. p. 448

PARTIR SEM CHEGAR

 Precisarás de tempo para alcançar a margem
o ramo do tamarindo onde te espera
o assobio do barqueiro
não é o primeiro
deverás tactear a escuridão da folhagem
e enganares-te tantas vezes
que te convenças que não sabes

estreita é a corrente invisível que nos conduz 
por corredores, registos, águas em queda
àquele momento talvez involuntário
onde palavra dita e palavra calada 
se tocam


 José Tolentino Mendonça. A Noite Abre Meus Olhos. 4ª Edição, Assírio&Alvim, Porto, 2021. p. 441

Porte de Saint-Cloud, Paris, 1950
Sabine Weiss



 

If He Had Changed My Name

Música de Nina Simone

I told Jesus it would be alright if He changed my name
I told Jesus it would be alright if He changed my name
I told Jesus it would be alright if He changed my name

And He told me that I would go hungry if He changed my name
And He told me that I would go hungry if He changed my name
Yes, He told me that I would go hungry if He changed my name

But I told Jesus it would be alright if He changed my name
I told Jesus it would be alright if He changed my name
So I told Him it would be alright and the world would hate me
That I would go hungry if He changed my name

Compositores: Robert Mac Gimsey






 O pescador solitário sabe
que nenhum peixe tem como ele
escamas tão geladas


 José Tolentino Mendonça. A Noite Abre Meus Olhos. 4ª Edição, Assírio&Alvim, Porto, 2021. p. 430
 A vastidão do mundo
para o peregrino
não é mais do que um quarto vazio


 José Tolentino Mendonça. A Noite Abre Meus Olhos. 4ª Edição, Assírio&Alvim, Porto, 2021. p. 410

A begónia refloriu

José Tolentino Mendonça. A Noite Abre Meus Olhos. 4ª Edição, Assírio&Alvim, Porto, 2021. p. 399

 Não aceites sem protesto
a redução 
das estações

 José Tolentino Mendonça. A Noite Abre Meus Olhos. 4ª Edição, Assírio&Alvim, Porto, 2021. p. 394

The Other Woman


The other woman finds time to manicure her nails
The other woman is perfect where her rival fails
And she's never seen with pin curls in her hair anywhere
The other woman enchants her clothes with French perfume
The other woman keeps fresh cut flowers in each room
There are never toys that's scattered everywhere
And when her own man comes to call
He'll find her waiting like a lonesome queen
Cos' when she's by his side
It's such a change from old routine
But the other woman will always cry herself to sleep
The other woman will never have his love to keep
And as the years go by the other woman
Will spend ... her life alone
Compositores: John Carl Parker.
 ''a boca cheia de silêncio
saindo do rio''

 José Tolentino Mendonça. A Noite Abre Meus Olhos. 4ª Edição, Assírio&Alvim, Porto, 2021. p. 385
 Qualquer dom
não deixa de ser também
um enigma

 José Tolentino Mendonça. A Noite Abre Meus Olhos. 4ª Edição, Assírio&Alvim, Porto, 2021. p. 384
 O que buscamos
uns nos outros
é sempre a noite


 José Tolentino Mendonça. A Noite Abre Meus Olhos. 4ª Edição, Assírio&Alvim, Porto, 2021. p. 383
I abandoned Mick and then I abandoned me. I left me lying in the road, anorexic and shooting up heroin. Heroin does make you lose interest in food but it was more than that. I wanted to disappear completely, get smaller and smaller and go down the plughole.


Marianne Faithfull


Só uma vez soube para que servia a vida.
Em Boston, de repente, eu entendi.
Andei junto ao rio Charles,
observei as luzes se mimetizando,
todas de néon, luzes estroboscópicas, abrindo
suas bocas como cantores de ópera;
Contei as estrelas, as minhas pequenas defensoras, as minhas cicatrizes de margarita, e percebi que passeava o meu amor pela margem verde noite e chorei esvaziando o meu coração para os carros do leste e chorei esvaziando o meu coração para os carros do oeste e levei a minha verdade sobre uma pequena ponte curvada e apressei minha verdade, seu encanto, para casa.
E guardei estas constantes até o amanhecer só para descobrir que tinham desaparecido.

Só uma vez.

Anne Sexton

Lola Young - Messy


You know I'm impatient
So why would you leave me waiting outside the station
When it was like minus four degrees?
And I, I get what you're sayin'
I just really don't wanna hear it right now
Can you shut up for like once in your life?
Listen to me, I took your nice words of advice
About how you think I'm gonna die lucky if I turn 33
Okay, so yeah, I smoke like a chimney
I'm not skinny, and I pull a Britney every other week
But cut me some slack, who do you want me to be?
Because I'm too messy, and then I'm too fucking clean
You told me, "Get a job", then you ask where the hell I've been
And I'm too perfect 'til I open my big mouth
I want to be me, is that not allowed?
And I'm too clever, and then I'm too fucking dumb
You hate it when I cry unless it's that time of the month
And I'm too perfect 'til I show you that I'm not
A thousand people I could be for you, and you hate the fucking lot
You hate the fucking lot
You hate the fucking lot
You hate, you hate
It's taking you ages
You still don't get the hint, I'm not asking for pages
But one text or two would be nice
And please, don't pull those faces
When I've been out working my ass off all day
It's just one bottle of wine or two, but hey
You can't even talk, you smoke weed just to help you sleep
Then why you out getting stoned at four o'clock
And then you come home to me?
And don't say hello 'cause I got high again and forgot to fold my clothes
'Cause I'm too messy, and then I'm too fucking clean
You told me, "Get a job", then you ask where the hell I've been
And I'm too perfect 'til I open my big mouth
I want to be me, is that not allowed?
And I'm too clever, and then I'm too fucking dumb
You hate it when I cry unless it's that time of the month
And I'm too perfect 'til I show you that I'm not
A thousand people I could be for you, and you hate the fucking lot
You hate the fucking lot
You hate the fucking lot
Oh, and I'm too messy, and then I'm too fucking clean
You told me, "Get a job", then you ask where the hell I've been
And I'm too perfect 'til I open my big mouth
I want to be me, is that not allowed?
And I'm too clever, and then I'm too fucking dumb
You hate it when I cry unless it's that time of the month
And I'm too perfect 'til I show you that I'm not
A thousand people I could be for you, and you hate the fucking lot
You hate the fucking lot
You hate the fucking lot
You hate the fucking lot
You hate the fucking lot


Compositores: Lola Young, Conor Dickinson

 «Destruíste espiritualmente a tua esposa, causaste-lhe um dano irreparável.»


 Yasunari Kawabata. O Som da Montanha. Tradução de Francisco Agarez. D. Quixote., p. 164
 «Parece que a família toda está de olhos postos na Kikuko», disse Shuichi, olhando para o pai de lado. «De vez em quando adoce, como qualquer pessoa.»
« E qual é a doença dela?», perguntou Shingo em tom irritado.
«Um aborto», disparou Shuichi.»

 Yasunari Kawabata. O Som da Montanha. Tradução de Francisco Agarez. D. Quixote., p. 163

 «Por fim, Shingo cheirou a flor.

«Cheira a mulher mal lavada.» Foi um comentário infeliz. 


 Yasunari Kawabata. O Som da Montanha. Tradução de Francisco Agarez. D. Quixote., p. 153


KATIA BERESTOVA (b. 1992, St. Petersburg) is a self-taught photographer, painter, graphic artist, poet, and filmmaker. 

«Vê só. Tenho um suor frio a correr-me entre os seios.»

 Yasunari Kawabata. O Som da Montanha. Tradução de Francisco Agarez. D. Quixote., p. 149

'' (...) quando menstruada, usava então as camélias avermelhadas.''
 « Estás cansada.
« Estou histérica, queres tu dizer. Cansada estás tu. As únicas pessoas que não estão cansadas nesta casa são o avô e a avó.»


Yasunari Kawabata. O Som da Montanha. Tradução de Francisco Agarez. D. Quixote., p. 143

 The Story of JoyDivision’s Unknown Pleasures Album Cover


“As Saville explains, the cover is directly linked to a figure in The Cambridge Encyclopaedia of Astronomy (1977 edition)–a stacked plot of radio signals from a pulsar.”



''As pessoas devem partir quando são ainda amadas.''

Yasunari Kawabata. O Som da Montanha. Tradução de Francisco Agarez. D. Quixote., p. 142

 «És bondoso de mais para ela. É por isso que ela chora por tudo e por nada»


 Yasunari Kawabata. O Som da Montanha. Tradução de Francisco Agarez. D. Quixote., p. 141

« Quando um casal se suicidava, o marido deixava uma mensagem e a esposa não. Porque a esposa deixava que o marido falasse por ela, ou porque agiam de comum acordo?»

 Yasunari Kawabata. O Som da Montanha. Tradução de Francisco Agarez. D. Quixote., p. 141

 «É estranho. Não tem nenhuma razão para chorar. Histeria, é o que é. Pura histeria.»


 Yasunari Kawabata. O Som da Montanha. Tradução de Francisco Agarez. D. Quixote., p. 140

''peças sobresselentes''

Yasunari Kawabata. O Som da Montanha. Tradução de Francisco Agarez. D. Quixote., p. 134



Clarice Lispector, no livro “A Hora da Estrela”. (Editora Rocco; 1.ª edição [1998]).

''meio viúva''

 « Que quer dizer ''meio-viúva''?
«Não se casou, mas o homem por quem estava apaixonada morreu na guerra.»


 Yasunari Kawabata. O Som da Montanha. Tradução de Francisco Agarez. D. Quixote., p. 131

 «Um sonho esquecido não podia ser reconstituído.»


 Yasunari Kawabata. O Som da Montanha. Tradução de Francisco Agarez. D. Quixote., p. 127

pântano marido-mulher

 « A expressão «pântano marido-mulher» significava apenas que marido e mulher sozinhos, tolerando erros mútuos, aprofundavam o pântano com passar dos anos.»


 Yasunari Kawabata. O Som da Montanha. Tradução de Francisco Agarez. D. Quixote., p. 126

Um casamento era como um pântano perigoso, que suga para sempre as faltas dos cônjuges.

 «Quantas vezes iria Kikuko, agora com vinte e poucos anos, ter de perdoar a Shuichi para poderem viver juntos até às idades de Shingo e Yasuko? A sua capacidade de perdoar não teria limites?
 Um casamento era como um pântano perigoso, que suga para sempre as faltas dos cônjuges.»



 Yasunari Kawabata. O Som da Montanha. Tradução de Francisco Agarez. D. Quixote., p. 125


Ormond Gigli,
Mulher em viela,
Portugal, 1952
 

''ataques de sentimentalismo''

 Yasunari Kawabata. O Som da Montanha. Tradução de Francisco Agarez. D. Quixote., p. 124

 «Há uma coisa que eu lhe digo muitas vezes quando o vejo tratá-la mal.» Estava sentada, de cabeça baixa e mãos enlaçadas em cima dos joelhos. «Digo-lhe que ele também volta para casa ferido. Volta para casa como um soldado ferido.»

 Yasunari Kawabata. O Som da Montanha. Tradução de Francisco Agarez. D. Quixote., p. 118

 «Nadaste calmamente pela vida enquanto toda a gente ia ao fundo.»

 Yasunari Kawabata. O Som da Montanha. Tradução de Francisco Agarez. D. Quixote., p. 109

 ''Não sangrava, mas ficava áspera e encarniçada.''

 Yasunari Kawabata. O Som da Montanha. Tradução de Francisco Agarez. D. Quixote., p. 109

sábado, 14 de dezembro de 2024

O Voo das Bruxas

(em espanhol: Vuelo de Brujas, também conhecido como Bruxas em Voo ou Bruxas no Ar), é uma pintura de óleo sobre tela concluída em 1798 pelo pintor espanhol Francisco Goya.


“It’s strange. I felt less lonely when I didn’t know you.”

Jean Paul Sartre

quinta-feira, 12 de dezembro de 2024

 

“Eu fecho os olhos e todo o mundo cai morto; eu levanto minhas pálpebras e tudo nasce de novo. Acho que te inventei (dentro da minha cabeça)”


Minha casa estava ardendo e eu só podia salvar uma coisa.
Decidi salvar o fogo.
Não tenho onde morar, mas o fogo mora em mim.
E me defende discretamente de tudo o que é impuro. O meu futuro já não é importante.
Apenas conta a intensidade do instante.

Jean Cocteau

Chove Chuva

  Conto de Dalton Trevisan

A fumaça da chuva sobe pela chaminé das casas e se espalha sobre a cidade. Um fio de silêncio cai de cada gota. As gatas dengosas se viram de costas para dormir. Chove chuvinha, um lado da palmeira nunca se molha.

A casa das formigas não tem porta, e quando chove, não se afogam? Piam milhares de pardais entre as folhas do chorão. Não existe melhor conchego que um barzinho. Nada como a meia grossa de lã. Apaixonadas ou não, mocinhas espirram na fila do ônibus.

Neste instante há no mínimo três mil pessoas infelizes com o sapato furado. Basta que não chova eu me chamo Felipe, o Belo. Como pisar na lama, garotas da várzea, sem sujar as sapatilhas? Orelhas de piás são puxadas por brincarem na chuva. Os mascates que vendem maçã na rua, em desespero comem as maçãs?

Não estivesse chovendo eu teria sete filhos.

Guardas de trânsito abrem os braços na esquina e apitam: por que choves, Senhor? Chove que chuva, apaga o meu recado de amor no muro.

Mães pensam nos filhos tão longe, uns dedos trêmulos na vidraça: dona mãe, me deixa entrar. Em cada lata vazia repicam os sinos da chuva.

As mãos no bolso não esquentam. Alguns viúvos choram na fila, esse ônibus nunca vem. Ora, gotas de chuva, pensam os vizinhos. Todos querem esse guarda- -chuva esquecido num dia de sol, quando havia sol.

Os rabanetes no canteiro pulam as cabecinhas de fora.

Os armários das velhas casas estalam. Antigos baús são abertos, dia ruim para as traças. Há medo de vampiro na cidade.

Asinhas encharcadas, filhotes de pardais caem das árvores e se afogam nas poças.

As vovozinhas choram de frio na beira do fogão de lenha. Cães arranham a porta, licença para entrar. A sopa de caldo de feijão, epa! te queimou a língua.

Mesmo com chuva, há pares de namorados à sombra das árvores. Nem a chuva tira uma solteirona da janela.

Chapinhando as poças investe uma trinca de gordalhufas – pra cá pra lá, bundalhões hotentotes tremelicantes!

Senhor, tão bom se não chovesse. Ah, não chovesse, eu usaria barbicha. Não tivesse chovido eu casava com a Lia e não a Raquel.

Pra onde fogem os sorveteiros quando chove? Se chove, mais difícil enfrentar o vento sul sem perder o chapéu. Homens chegam em casa esfregam o pé no capacho e sentam para comer, dizendo: chuva desgracida.

Uma rosa no teu jardim abre as mil pálpebras do único olho.

O vento despenteia a cabeleira da chuva sobre os telhados.

Mesmo quando para a chuva, as árvores continuam chovendo.

A chuva lava o rosto dos teus mortos queridos.


Namorada


Depois que vê a garota ele corre se olhar no espelho: não pode negar, meio feio? quase feio? Numa palavra, feio. Dia seguinte desiste do bigode ralo. Quem sabe costeleta ou cavanhaque?

A menina o enfeitiça. Possuído, sim. Febrícula, sonho delirante, falta de ar, sede mas não de água.

Ela surge enrolada no garfo do suculento espaguete à bolonhesa. De sainha xadrez na primeira tarde, ó deliciosa bolacha Maria com geleia de uva. Formigas de fogo mordem sob a camisa quando ela vem na rua, brincando com o arco-íris na ponta dos dedos.

Consegue afinal apertar-lhe a mãozinha na luva de crochê, ri (descuidoso de ser feio) dentro de seus olhos glaucos. Discutem o narizinho, quem sabe arrebitado, segundo ela. E para ele, nada mais bonito que tal narizinho.

Meio do sono acorda, olho arregalado no escuro. A sua imagem o percorre, impetuoso vento por uma casa de portas abertas. Ninguém por perto, fala sozinho. A mãe o acha mais magro. Quem dera ser o terceiro motociclista do Globo da Morte.

Em guarda no portão, as mãos suadas, fumando. Ela aparece: um caramanchão florido de glicínia azul. Olhinho esquivo que fixa e foge. O sorriso (uma virgem fatal?) na pequena boca fresca.

Um dentinho ectópico no lado esquerdo, onde a palavra tiau esbarra quando sai. Ah, se ela deixar, passa o resto da vida adorando esse dentinho.

Espera outras vezes, fumando aflito, um cigarro aceso no outro. Ele mesmo um cigarro em chamas. A mocinha não quer lhe dar a mão. Como pode, uma santinha disfarçada na terra? Depois, deu.

Brava, ainda mais linda. Toda rosa, o lenço no pescoço, gatinha na janela depois do banho. A curva altaneira da testa, os cachos loiros arrepiados ao vento.

Ai, não, uma pérola na orelha. A pérola da orelha. Uma divina orelhinha esquerda, sabe o que é?

A voz meio rouca: Adivinhe o que eu tenho na mão? “Bem, pode ser tanta coisa.” Bala de mel, seu bobo. Pra você que não merece.

Já esquecido de timidez e feiura: “Sabe o que eu mais quero? É embalar você no colo.”

Pronto, ofendida, lhe negaceou o rosto.

De mal, até amanhã. Amanhã nosso herói vai cultivar uma barbicha.


 Conto de Dalton Trevisan

 Desencontro

Jorge de Sena

Só quem procura sabe como há dias
de imensa paz deserta; pelas ruas
a luz perpassa dividida em duas:
a luz que pousa nas paredes frias,
outra que oscila desenhando estrias
nos corpos ascendentes como luas
suspensas, vagas, deslizantes, nuas,
alheias, recortadas e sombrias.
E nada coexiste. Nenhum gesto
a um gesto corresponde; olhar nenhum
perfura a placidez, como de incesto,
de procurar em vão; em vão desponta
a solidão sem fim, sem nome algum -
- que mesmo o que se encontra não se encontra.

Jorge de Sena, in 'Post-Scriptum'
Nada volta a ser
o mesmo duas vezes.
Nem o amor,
nem as pessoas,
nem a vida...
Com o tempo, tudo passa.
Vi, com um pouco de paciência,
o inesquecível se transformar
em esquecimento, e o que era
essencial se tornar supérfluo.

Gabriel García Márquez

terça-feira, 10 de dezembro de 2024

Árias Pequenas. Para Bandolim


Antes que o mundo acabe, Túlio,
Deita-te e prova
Esse milagre do gosto
Que se fez na minha boca
Enquanto o mundo grita
Belicoso. E ao meu lado
Te fazes árabe, me faço israelita
E nos cobrimos de beijos
E de flores
Antes que o mundo se acabe
Antes que acabe em nós
Nosso desejo.

Hilda Hilst

domingo, 1 de dezembro de 2024

 "Tomei consciência de que o corpo humano é triste, que está cheio de zonas côncavas, macias e vulneráveis, como braços, axilas, peito e virilha; que é um corpo que nasceu para abraçar e desejar o abraço de alguém".

"A aula de grego", Han Kang.



                                                    Photograph by Romualdas Rakauskas