«Quando não tenho nada no coração, não tenho nada.»
Abbas Kiarostami
domingo, 30 de setembro de 2018
«Por isto, e só por isto, temos existido »
T.S.ELIOT. A Terra sem Vida. Colecção Poesia. Edições Ática. Lisboa., p. 51
« Ossos secos não fazem mal a ninguém.»
T.S.ELIOT. A Terra sem Vida. Colecção Poesia. Edições Ática. Lisboa., p. 51
(...)
«A altura é agora propícia, como ele pensa,
A refeição acabou, ela está cansada e aborrecida,
Tenta captá-la com carícias,
Que não são repelidas, embora não sejam desejadas.
Excitado e decidido, ataca de repente;
As suas mãos pesquisadoras não encontram defesa;
A vaidade dele não exige retribuição
E toma a indiferença por bom acolhimento.»
T.S.ELIOT. A Terra sem Vida. Colecção Poesia. Edições Ática. Lisboa., p. 39
«A altura é agora propícia, como ele pensa,
A refeição acabou, ela está cansada e aborrecida,
Tenta captá-la com carícias,
Que não são repelidas, embora não sejam desejadas.
Excitado e decidido, ataca de repente;
As suas mãos pesquisadoras não encontram defesa;
A vaidade dele não exige retribuição
E toma a indiferença por bom acolhimento.»
T.S.ELIOT. A Terra sem Vida. Colecção Poesia. Edições Ática. Lisboa., p. 39
(...)
«Devias ter vergonha, disse eu, de parecer tão velha.
(E ela só tem trinta e um anos.)
Não é minha a culpa, disse ela, desanimada,
Foram os comprimidos que tomei para o desmancho, disse ela.
(Ela já teve cinco e quase morreu quando nasceu o Jorginho.)»
T.S.ELIOT. A Terra sem Vida. Colecção Poesia. Edições Ática. Lisboa., p. 31
«Devias ter vergonha, disse eu, de parecer tão velha.
(E ela só tem trinta e um anos.)
Não é minha a culpa, disse ela, desanimada,
Foram os comprimidos que tomei para o desmancho, disse ela.
(Ela já teve cinco e quase morreu quando nasceu o Jorginho.)»
T.S.ELIOT. A Terra sem Vida. Colecção Poesia. Edições Ática. Lisboa., p. 31
(...)
«arrastam a carcaça do verde e dos céus sáfaros
como pétalas podres caem mortos os pássaros
e à febre das areias que deliram ao sol
arremessam as águas primeiras do dilúvio
as espinhas dos peixes que dos bruscos terraços
das ondas se despenham em luas de petróleo
Chamávamos Europa ao sítio onde parou
o sangue que a estrela de seis pontas buscava
onde a sede do corpo por fim chegasse à alma
Mal eram começadas as letras que a serpente
sabiam encantar ensanguentou-se o livro»
Natália Correia. Poemas a Rebate. Poesia Século XX. Publicações Dom Quixote, Lisboa, 1975., p. 178
«arrastam a carcaça do verde e dos céus sáfaros
como pétalas podres caem mortos os pássaros
e à febre das areias que deliram ao sol
arremessam as águas primeiras do dilúvio
as espinhas dos peixes que dos bruscos terraços
das ondas se despenham em luas de petróleo
Chamávamos Europa ao sítio onde parou
o sangue que a estrela de seis pontas buscava
onde a sede do corpo por fim chegasse à alma
Mal eram começadas as letras que a serpente
sabiam encantar ensanguentou-se o livro»
Natália Correia. Poemas a Rebate. Poesia Século XX. Publicações Dom Quixote, Lisboa, 1975., p. 178
Nina Simone - Black Is The Color Of My True Love's Hair
Black is the color of my true love's hair
His face so soft and wondrous fair
The purest eyes
And the strongest hands
I love the ground on where he stands
I love the ground on where he stands
His face so soft and wondrous fair
The purest eyes
And the strongest hands
I love the ground on where he stands
I love the ground on where he stands
Black is the color of my true love's hair
Of my true love's hair
Of my true love's hair
Of my true love's hair
Of my true love's hair
Oh I love my lover
And where he goes
Yes, I love the ground on where he goes
And still I hope
That the time will come
When he and I will be as one
When he and I will be as one
And where he goes
Yes, I love the ground on where he goes
And still I hope
That the time will come
When he and I will be as one
When he and I will be as one
So black is the color of my true love's hair
Black is the color of my true love's hair
Black is the color of my true love's hair
Black is the color of my true love's hair
Black is the color of my true love's hair
Compositores: Nina Simone
(...)
«Que direcção tomar? Com os cérebros ligados
à corrente do inferno o medo é um caminho
de espantosos autómatos que acaba no ocaso
Porque o tempo não gosta dos que andam para a frente
e irado os espera com a espada do poente
Se chegarmos às portas do segundo milénio
como larvas activas de um numérico horror
numa pútrida data esperada pelos corvos
terminada a tarefa das flores asfixiadas
nas jarras retorcidas dos fins do oxigénio
a cobrir-nos os olhos teremos como prémio
o astro da fuligem que no umbral do ferro
pelo anjo da raiz quadrada está escrito.»
Natália Correia. Poemas a Rebate. Poesia Século XX. Publicações Dom Quixote, Lisboa, 1975., p. 177
«Que direcção tomar? Com os cérebros ligados
à corrente do inferno o medo é um caminho
de espantosos autómatos que acaba no ocaso
Porque o tempo não gosta dos que andam para a frente
e irado os espera com a espada do poente
Se chegarmos às portas do segundo milénio
como larvas activas de um numérico horror
numa pútrida data esperada pelos corvos
terminada a tarefa das flores asfixiadas
nas jarras retorcidas dos fins do oxigénio
a cobrir-nos os olhos teremos como prémio
o astro da fuligem que no umbral do ferro
pelo anjo da raiz quadrada está escrito.»
Natália Correia. Poemas a Rebate. Poesia Século XX. Publicações Dom Quixote, Lisboa, 1975., p. 177
«nós saímos dos ovos e quisemos ser números »
Natália Correia. Poemas a Rebate. Poesia Século XX. Publicações Dom Quixote, Lisboa, 1975., p. 173
Aretha Franklin - I Never Loved A Man (The Way I Love You)
You're a no good heart breaker
You're a liar and you're a cheat
And I don't know why
I let you do these things to me
My friends keep telling me
That you ain't no good
But oh, they don't know
That I'd leave you if I could
I guess I'm uptight
And I'm stuck like glue
Cause I ain't never
I ain't never, I ain't never, no, no (loved a man)
(The way that I, I love you)
Some time ago I thought
You had run out of fools
But I was so wrong
You got one that you'll never lose
The way you treat me is a shame
How could ya hurt me so bad
Baby, you know that I'm the best thing
That you ever had
Kiss me once again
Don'cha never, never say that we we're through
Cause I ain't never
Never, Never, no, no (loved a man)
(The way that I, I love you)
I can't sleep at night
And I can't eat a bite
I guess I'll never be free
Since you got, your hooks, in me
Whoa, oh, oh
Yeah! Yeah!
I ain't never loved a man
I ain't never loved a man, baby
Ain't never had a man hurt me so bad
No
Well this is what I'm gonna do about it
You're a liar and you're a cheat
And I don't know why
I let you do these things to me
My friends keep telling me
That you ain't no good
But oh, they don't know
That I'd leave you if I could
I guess I'm uptight
And I'm stuck like glue
Cause I ain't never
I ain't never, I ain't never, no, no (loved a man)
(The way that I, I love you)
Some time ago I thought
You had run out of fools
But I was so wrong
You got one that you'll never lose
The way you treat me is a shame
How could ya hurt me so bad
Baby, you know that I'm the best thing
That you ever had
Kiss me once again
Don'cha never, never say that we we're through
Cause I ain't never
Never, Never, no, no (loved a man)
(The way that I, I love you)
I can't sleep at night
And I can't eat a bite
I guess I'll never be free
Since you got, your hooks, in me
Whoa, oh, oh
Yeah! Yeah!
I ain't never loved a man
I ain't never loved a man, baby
Ain't never had a man hurt me so bad
No
Well this is what I'm gonna do about it
''orquídeas de fumo''
Natália Correia. Poemas a Rebate. Poesia Século XX. Publicações Dom Quixote, Lisboa, 1975., p. 168
A VIRGEM DE MEMLING ATRAI COM UMA MAÇÃ
OS SUICIDAS A BRUGES
Que mais pedir à lassidão e ao sonho
que o último tomo de uma geira
neste sonambulismo das coisas
em sua propriedade de cera?
Um cometa de lacre tudo selou
e na liturgia do sossego
inerte e insone a água ficou
num impossível voo negro
Propõem os sinos lêvedas horas
e estátuas jacentes submetidas
e falando uma língua morta
declinam os dias pendões de guildas
mercadoria de reinos mortos
que fundam penados sucursais
Sustendo o pó dois anjos seguram
o céu coroa seca de decimais
Húmida e amarela pinga nos canais
uma luz de sódio lua de gafeira
que as habitantes do esquecimento dá
a sua cor final e verdadeira
E eu peço a estas sombras empalhadas
(embalsamado horror de olhos abertos)
os sete palmos que honestamente vão
do meu coração aos meus desertos
Acaso é uma linha imaginária
a morte que separa este hemisfério
numa cordial agência funerária
de cinzas pó e nada
ou do mistério?
Natália Correia. Poemas a Rebate. Poesia Século XX. Publicações Dom Quixote, Lisboa, 1975., p. 165/6
OS SUICIDAS A BRUGES
Que mais pedir à lassidão e ao sonho
que o último tomo de uma geira
neste sonambulismo das coisas
em sua propriedade de cera?
Um cometa de lacre tudo selou
e na liturgia do sossego
inerte e insone a água ficou
num impossível voo negro
Propõem os sinos lêvedas horas
e estátuas jacentes submetidas
e falando uma língua morta
declinam os dias pendões de guildas
mercadoria de reinos mortos
que fundam penados sucursais
Sustendo o pó dois anjos seguram
o céu coroa seca de decimais
Húmida e amarela pinga nos canais
uma luz de sódio lua de gafeira
que as habitantes do esquecimento dá
a sua cor final e verdadeira
E eu peço a estas sombras empalhadas
(embalsamado horror de olhos abertos)
os sete palmos que honestamente vão
do meu coração aos meus desertos
Acaso é uma linha imaginária
a morte que separa este hemisfério
numa cordial agência funerária
de cinzas pó e nada
ou do mistério?
Natália Correia. Poemas a Rebate. Poesia Século XX. Publicações Dom Quixote, Lisboa, 1975., p. 165/6
«metafísica dos homens sós »
Natália Correia. Poemas a Rebate. Poesia Século XX. Publicações Dom Quixote, Lisboa, 1975., p. 156
''Da fixidez de esperar''
Natália Correia. Poemas a Rebate. Poesia Século XX. Publicações Dom Quixote, Lisboa, 1975., p. 155
sábado, 29 de setembro de 2018
''Actualmente o sentimento de perda é muito mais presente. Hoje conhece-se muito mais pessoas, sítios, realidades e a quantidade de informação nova, que anula ou nos obriga a reformular ideias e até valores, é enorme. A habituação do indivíduo a uma perda constante que gera também uma memória atrofiada; a autonarração da vida é assim desregulada pelo iniciar constante de novos ciclos.''
''suástica crucificação''
Natália Correia. Poemas a Rebate. Poesia Século XX. Publicações Dom Quixote, Lisboa, 1975., p. 137
domingo, 23 de setembro de 2018
«anjo não é cão de guarda»
Natália Correia. Poemas a Rebate. Poesia Século XX. Publicações Dom Quixote, Lisboa, 1975., p. 123
« do fundo dos teus olhos a tua dor rodada»
Natália Correia. Poemas a Rebate. Poesia Século XX. Publicações Dom Quixote, Lisboa, 1975., p. 114
espúrio
es.pú.ri.o
(i)ʃˈpurju
adjetivo
1.
antiquado diz-se de filho de uma relação extraconjugal; bastardo; ilegítimo
2.
que não segue as leis; ilegítimo
3.
diz-se da obra que não pertence ao autor a quem é atribuída
4.
adulterado; falsificado
5.
que não pertence ao vernáculo
6.
não autêntico; não genuíno
7.
regionalismo avarento e de aspecto pouco agradável
«arte de flancos mornos versificando o cio »
Natália Correia. Poemas a Rebate. Poesia Século XX. Publicações Dom Quixote, Lisboa, 1975., p. 111
« No topázio mais triste da minha clarividência, apareceu-me o anjo do Ocidente. Tropeçava de sombra em sombra e a espada com que guardava os jardins com buxos de livros da Europa despedaçara-se em números que espavoridos fugiam uns dos outros. Um horizonte de canções blindadas cantava a parábola das cidades brancas cobertas por noites laboriosas de formigas. As estátuas cambaleavam no alto de temerosos pensamentos. As catedrais eram levadas por um vento de elevadores endemoninhados. Mulheres a arder em revistas ilustradas faziam strip-tease para latas de conserva boquiabertas. E a Europa fugia para trás. Fugia parada na louca pulsação do seu movimento estático. E a Europa era a triste viuvinha no meio de uma roda de crianças que eram índios num filme americano.
Desatei então a correr para o sítio onde se chora. O sítio onde se chora é na penumbra pensativa. No quarto de estalactites da alma onde se fazem poemas. Mas notei que no meu pranto faltava uma lágrima e essa lágrima era Portugal. Percebi finalmente que Portugal era eu a chorar trevos de cinza pela Europa.»
Natália Correia. Poemas a Rebate. Poesia Século XX. Publicações Dom Quixote, Lisboa, 1975., p. 107
«Não, não participo nessa exposição de rosas com fins caritativos que tem amortalhado alguns poetas no ilustre cadáver do presidente da república. Se nimiamente me deixo viver pelo tempo que finge crianças rotas e pedintes é porque a todos espero no domingo de prata que coroará a semana de horrorosos trabalhos que a teia do tirano tece com a baba dos oprimidos. É por pura impaciência que me inscrevo na lista de todos os fuzilados por amor.
Natália Correia. Poemas a Rebate. Poesia Século XX. Publicações Dom Quixote, Lisboa, 1975., p. 102
«na intelegível voz de uma alma devastada.»
José Agostinho Baptista. Jeremias o louco. Centelha/Poesia. Coimbra, 1978., pp. 53
(...)
«cumprindo enfim o ciclo das breves orgias cristãs.
foi então que a descobriram,
o rosto contraído sob o azul de um céu litoral
que a noite escurecia,
agora que os vermes a procuravam, sedentos de
um corpo triste;»
José Agostinho Baptista. Jeremias o louco. Centelha/Poesia. Coimbra, 1978., pp. 50
«tudo o que ao mar se deu e ao mar não regressará...»
José Agostinho Baptista. Jeremias o louco. Centelha/Poesia. Coimbra, 1978., pp. 36