domingo, 28 de outubro de 2012

(...)

«Já vos disse que me deixeis,
neste campo,
chorando.»



Frederico García Lorca. Antologia Poética. Selecção de Eugénio de Andrade com um estudo de Andrée Crabbé Rocha e um poema de Miguel Torga. Coimbra Editora, 1946., p. 73
(...)

«eu
vejo o punhal
no coração.»



Frederico García Lorca. Antologia Poética. Selecção de Eugénio de Andrade com um estudo de Andrée Crabbé Rocha e um poema de Miguel Torga. Coimbra Editora, 1946., p. 71
«Chora por coisas
longínquas.
Areia quente do Sul
que pede camélias brancas.
Chora a flecha sem alvo,
a tarde sem manhã,
e o primeiro pássaro morto
sobre os ramos.
Oh, guitarra!
Coração despedaçado
por cinco espadas.»




Frederico García Lorca. Antologia Poética. Selecção de Eugénio de Andrade com um estudo de Andrée Crabbé Rocha e um poema de Miguel Torga. Coimbra Editora, 1946., p. 67
(...)

«Chora Rosa, a dos Cambórios,
sentada na sua porta
com seus dois seios cortados
e postos numa bandeja.
Outras raparigas correm
perseguidas pelas tranças,
enquanto no ar rebentam
rosas de pólvora negra.»



Frederico García Lorca. Antologia Poética. Selecção de Eugénio de Andrade com um estudo de Andrée Crabbé Rocha e um poema de Miguel Torga. Coimbra Editora, 1946., p. 61
«Porém eu já não sou eu,
nem minha é já minha casa.»



Frederico García Lorca. Antologia Poética. Selecção de Eugénio de Andrade com um estudo de Andrée Crabbé Rocha e um poema de Miguel Torga. Coimbra Editora, 1946., p. 43
(...)

«Ela fica na varanda,
a carne e o cabelo verdes,
sonhando com o mar salgado.»


Frederico García Lorca. Antologia Poética. Selecção de Eugénio de Andrade com um estudo de Andrée Crabbé Rocha e um poema de Miguel Torga. Coimbra Editora, 1946., p. 43

Prelúdio


Partem as alamedas
mas deixam o reflexo.

Partem as alamedas
mas deixam-nos o vento.

Porém, deixam ecos
flutuando à flor dos rios.

Um mundo de pirilampos
invadiu minha lembrança.

E um coração pequeno
vai-me nascendo nos dedos.



Frederico García Lorca. Antologia Poética. Selecção de Eugénio de Andrade com um estudo de Andrée Crabbé Rocha e um poema de Miguel Torga. Coimbra Editora, 1946., p. 37

domingo, 21 de outubro de 2012


Separando os poetas «em pessoas que fazem a sua poesia andando pelos caminhos» e «pessoas que fazem a sua poesia sentados à sua mesa»

Andrée Crabbé Rocha




Frederico García Lorca. Antologia Poética. Selecção de Eugénio de Andrade com um estudo de Andrée Crabbé Rocha e um poema de Miguel Torga. Coimbra Editora, 1946., p. 19
 
«Fui sempre ridículo, mas nem sempre me senti ridículo.»
 
 
Raúl Brandão. O Doido e a Morte. Edição de A «Renascença Portuguesa», Porto, 1923., p. 157
«De resto o que é a loucura e o que é o juízo? Simples pontos de vista e mais nada. O doido pode seguir à vontade o seu sonho, sem que ninguém se meta com ele. Tem quem lhe dê de comer, de vestir e calçar nos manicómios.»
 
 
Raúl Brandão. O Doido e a Morte. Edição de A «Renascença Portuguesa», Porto, 1923., p. 153
«O doido diz tudo quanto lhe passa pela cabeça. (E continuando a falar impertubável faz-lhe sinal que volte para trás e aproxima o dedo da campainha.) Ninguém estranha.
    O doido pode andar de chinelos de ourelo pelo Chiado. Quem tem juízo vive constrangido e está sujeito a mil complicações.»
 
 
 
 
«Raúl Brandão. O Doido e a Morte. Edição de A «Renascença Portuguesa», Porto, 1923., p. 152/3
«Aqui jaz um homem de génio que não teve tempo de se revelar.»
 
 
Raúl Brandão. O Doido e a Morte. Edição de A «Renascença Portuguesa», Porto, 1923., p. 149

«Saiba morrer quem viver não soube.»

Raúl Brandão. O Doido e a Morte. Edição de A «Renascença Portuguesa», Porto, 1923., p. 147

terça-feira, 16 de outubro de 2012


«...Que distância há entre o homem e o homem? entre o homem correcto, o homem de todos os dias e o homem capaz de cometer um crime?...»


Raúl Brandão. O Rei Imaginário. Monólogo..Edição de A «Renascença Portuguesa», Porto, 1923., p. 125

«É estranho o que se passa na alma em certos momentos. Estranho e horrível. Uma coisa imunda começa a falar, a pregar, a obrigar-nos a fazer aquilo a que não nos supúnhamos destinados...Julgar? mas julgar o quê?...O homem que tu és? ou o homem que está por detrás de ti? Julgar-te! julgar uma alma! Uma alma!...Foi talvez por isso que Aquele que sabemos disse um dia: - Não julgarás! (...)»


Raúl Brandão. O Rei Imaginário. Monólogo..Edição de A «Renascença Portuguesa», Porto, 1923., p. 124/5

segunda-feira, 15 de outubro de 2012

«Cada noite significava-lhe um nada, uma sepultura, uma extinção. Ele ainda não tinha aprendido a morrer ao fim de cada dia sem se preocupar.»
 
 
 
Robert Musil. O Jovem Törless. Edição «Livros do Brasil» Lisboa, 1987., p. 55
««(...), sem poder explicar a ninguém o que já sabia ser, e ansiar por alguém que o compreendesse...Isso é amor! Mas para senti-lo é preciso ser jovem e solitário.»
 
 
Robert Musil. O Jovem Törless. Edição «Livros do Brasil» Lisboa, 1987., p. 55

A paixão é apenas um refúgio, no qual estar com o outro significa solidão duplicada

 
«Se Bozena fosse bela e pura, e se nessa época ele fosse capaz de amar, talvez a mordesse toda, exasperado até à dor o seu prazer sexual e o dela. Pois a primeira paixão adolescente não é de amor por uma pessoa, mas sim de ódio a todas as pessoas. Sentir-se incompreendido e não compreender o mundo não é o efeito de uma primeira paixão, mas a sua causa. A paixão é apenas um refúgio, no qual estar com o outro significa solidão duplicada.»
 
 
 
Robert Musil. O Jovem Törless. Edição «Livros do Brasil» Lisboa, 1987., p. 48

domingo, 14 de outubro de 2012

fome interior

«À noite, sabemos que vivemos mais um dia, que aprendemos isto e aquilo, cumprimos o horário, mas permanecemos vazios, quero dizer, vazios por dentro, e continuamos com uma fome interior...»
 
 
 
Robert Musil. O Jovem Törless. Edição «Livros do Brasil» Lisboa, 1987., p. 35
 
«Há sempre um momento em que já não sabemos mais se estamos a mentir, ou se o que inventamos é mais verdadeiro do que nós próprios. Bom, não quero dizer, textualmente. Nós sempre sabemos que estamos a mentir; apesar disso, a coisa de repente parece tão plausível, que, de certa forma, nós parecemos enredados nos nossos próprios pensamentos.»
 
 
 
Robert Musil. O Jovem Törless. Edição «Livros do Brasil» Lisboa, 1987., p. 34
«Os seus olhos não eram sonhadores, mas impassíveis e duros. O hábito de ler livros em que nenhuma palavra podia ser tirada do seu lugar sem alterar o significado oculto do texto, a avaliação prudente de cada frase em busca do seu sentido e até do seu duplo sentido, deram aos seus olhos essa expressão particular.
   Só de vez em quando os seus pensamentos perdiam-se num nevoeiro de suave melancolia.»
 
 
Robert Musil. O Jovem Törless. Edição «Livros do Brasil» Lisboa, 1987., p. 28/9

Sofia
Para o que a gente nasce!...Só para sofrer.


Candidinha
Só! Quem é pobre é para o que nasce. Depois vem a velhice e ainda é pior. E se a gente pede pão dão-nos escárnio.

Raúl Brandão. O Gebo e a Sombra.Edição de A «Renascença Portuguesa», Porto, 1923., p. 106
«...Tenho o coração negro como a noite...É uma coisa tão funda que não sei donde vem.»

Raúl Brandão. O Gebo e a Sombra.Edição de A «Renascença Portuguesa», Porto, 1923., p. 100

«Neste mundo onde se grita, ninguém ouve os gritos dos que sofrem?»

Raúl Brandão. O Gebo e a Sombra.Edição de A «Renascença Portuguesa», Porto, 1923., p. 93
 
«Há duas noites que não durmo. Que reflicto e comparo...A nossa vida humilde, fazendo todos os dias as mesmas coisas talvez inúteis, é a vida? A resignação é a vida? É a pobreza e a desgraça - ou há outra vida?»






Raúl Brandão. O Gebo e a Sombra.Edição de A «Renascença Portuguesa», Porto, 1923., p. 91

Sofia, num grito abafado.
Nenhum de nós se conhece. Nenhum de nós se conhece! Temos aqui vivido há muitos anos dominados por uma sombra. Eu já não posso mais!...

Gebo
Filha!

Sofia
Tenho-lhe medo! Tenho-me medo! Antes o não tornasse a ver! O seu coração pôs-se pedra. De noite acorda aos gritos e o seu riso gela-me.

Gebo
Oh!

Sofia
Se o pai visse como eu o vejo!...Se o ouvisse!...



Raúl Brandão. O Gebo e a Sombra.Edição de A «Renascença Portuguesa», Porto, 1923., p. 90

João

«Que te posso eu dizer da minha vida e de mim mesmo que tu entendas?»



Raúl Brandão. O Gebo e a Sombra.Edição de A «Renascença Portuguesa», Porto, 1923., p. 73

segunda-feira, 8 de outubro de 2012

O AMOR


O amor, quando se revela,
Não se sabe revelar.
Sabe bem olhar p'ra ela,
Mas não lhe sabe falar.

Quem quer dizer o que sente
Não sabe o que há-de dizer.
Fala: parece que mente
Cala: parece esquecer

Ah, mas se ela adivinhasse,
Se pudesse ouvir o olhar,
E se um olhar lhe bastasse
Pr'a saber que a estão a amar!

Mas quem sente muito, cala;
Quem quer dizer quanto sente
Fica sem alma nem fala,
Fica só, inteiramente!

Mas se isto puder contar-lhe
O que não lhe ouso contar,
Já não terei que falar-lhe
Porque lhe estou a falar..

Fernando Pessoa

sábado, 6 de outubro de 2012

anuência

nome feminino
 
acto de anuir; consentimento; aquiescência
 
(Do latim annuentĭa, particípio presente neutro plural de annuĕre, «consentir»)

quinta-feira, 4 de outubro de 2012

«(....) Gastou-se a sonhar, gastou-se a sofrer.»

Raúl Brandão. O Gebo e a Sombra.Edição de A «Renascença Portuguesa», Porto, 1923., p. 41

Gebo

Todas as vidas são assim.

Doroteia

Mas tão monótona, tão fria que me pesa! Às vezes não sei se estou viva se estou morta. Às vezes nem o sonho que sonho me é possível. Está no fio.



Raúl Brandão. O Gebo e a Sombra.Edição de A «Renascença Portuguesa», Porto, 1923., p. 38

segunda-feira, 1 de outubro de 2012


»(...) quantas vezes me tenho lembrado de morrer.»



Raúl Brandão. O Gebo e a Sombra.Edição de A «Renascença Portuguesa», Porto, 1923., p. 31

acinte

 
nome masculino
acção praticada com a intenção de contrariar, irritar ou provocar alguém; teima; pirraça
 
advérbio
intencionalmente;
 
por acinte de propósito, de caso pensado
 

Tremia, mas não corava de pejo.


 
«Casimiro amava Cristina, Cristina ia chorar com ele, e sabia em que sombras de árvores, ou margens de ribeiras o moço ia chorar.
    E ela ia, tremendo de medo e paixão, e a pedir resguardo às asas dos anjos, buscá-lo onde ele estivesse. Tremia, mas não corava de pejo. As flores, que a viam, invejavam-lhe a pureza. Arquejava-lhe o seio cansado de retrair-se: cuidava a doce criatura que o espirar alto a denunciava. Era o ofegar daquele seio como o da avezinha ansiada, que bisca, de fronde em fronde, o ninho que lhe desfizeram. As lágrimas têm seu odor: só lho não pressentem os que as deixam gotejar sem misericórdia, sem dó.»



Camilo Castelo Branco. O Bem E O Mal. Obras Completas. Publicadas sob a direcção de Justino Mendes de Almeida. Vol. IV Romances/Novelas. Lello & Irmão Editores, Porto, 1985., p. 41