sábado, 25 de junho de 2011

A árvore do Curral

        Esta árvore, Platero, esta acácia que eu próprio semeei, verde chama que foi crescendo, Primavera após Primavera, e que agora mesmo nos cobre com a sua abundante e franca folhagem atravessada pelo sol poente, era, enquanto vivi nesta casa, hoje fechada, o melhor suporte para a minha poesia. Qualquer ramo seu, engalanado de esmeralda por Abril ou de ouro por Outubro, me refrescava o rosto, só de olhá-lo um pouco, como a mão mais pura de uma musa. Que delicada, que grácil, que bonita era!
        Hoje, Platero, é senhora de quase todo o curral. Que densa se pôs! Não sei se se lembrará de mim. A mim, parece-me outra. Neste tempo todo em que me tinha esquecido dela, como se não existisse, a Pimavera foi-a moldando, ano após ano, a seu capricho, fora do agrado do meu sentimento.
          Não me diz nada hoje, apesar de ser uma árvore, e uma árvore plantada por mim. Uma árvore qualquer que acariciamos pela primeira vez, enche-nos de sentido o coração, Platero. Uma árvore que amámos tanto, que tão bem conhecemos, não nos diz nada quando a voltamos a ver, Platero. É triste; mas é inútil dizer mais. Não, já não consigo ver, nesta fusão da acácia com o ocaso, a minha lira pendurada. O ramo gracioso já não me traz o verso, nem a iluminação interna da copa o pensamento. E aqui, aonde tantas vezes vim na minha vida, com uma ilusão de solidão musical, fresca e perfumada, sinto-me mal, e tenho frio, e quero ir-me embora, como outrora do casino, da botica ou do teatro, Platero.



Juan Ramón Jiménez. Platero E Eu. Tradução de Luís Lima Barreto. Edições Cotovia, Lisboa, 2007, p.64

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